Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Clóvis Rossi


‘Aqui e ali, ainda muito timidamente, vai-se infiltrando a tese de que Severino Cavalcanti é a redenção da pátria.


Redenção, primeiro porque é transparente. Faz e diz de público aquilo que a maioria dos políticos prefere fazer e dizer escondidinho.


Não tivéssemos perdido totalmente o rumo, a esse fenômeno se chamaria de cara-de-pau, jamais de transparência. Não há mérito em fazer e dizer de público o que outros fazem e dizem escondido. Ambas as coisas estão erradas. Não se corrigem os defeitos da política por arrotá-los em praça pública.


Redenção, também, porque seria algo como a voz do povo, o último homem no país tropical a ter sensibilidade para entender os problemas da pátria, na medida em que os supostamente bem-educados e formados nas mais luminosas pós-graduações do exterior ou os formados na universidade da vida e, ainda assim, alçados a postos de mando, não conseguem fazê-lo.


De novo toma-se o defeito alheio como qualidade de Severino. Que idéia sobre o Brasil desenvolveu o presidente da Câmara em sua já longa carreira política? Zero. Quem, mesmo entre os que agora descobrem nele méritos que os mortais comuns não conseguem enxergar, o convidaria para um seminário que fosse discutir o desenvolvimento?


Poderia até ser convidado, como enfeite de mesa, já que é o presidente da Câmara. Mas não creio que a sala ficasse lotada de gente ansiosa para ouvi-lo a não ser à espera de mais uma gafe (ou, vá lá, de mais uma ‘transparência’).


Vamos ser realistas, pelo amor de Deus. Severino nem precisa ter idéias sobre o que fazer com o Brasil. Elege-se e reelege-se ajudando ‘cachaceiros’ de João Alfredo que não estão nem aí para o teor de suas idéias. É um dos mais acabados retratos do atraso brasileiro.


Já descemos o suficiente na política. Não precisamos inventar mais um falso estadista, por favor.’



MORAIS CENSURADO


Mariana Caetano e João Unes


‘Juiz manda apreender livro de Morais ‘, copyright O Estado de S. Paulo, 05/05/05


‘A pedido do deputado Ronaldo Caiado (PFL-GO), a Justiça de Goiás determinou ontem que todos os exemplares do livro Na Toca dos Leões, de Fernando Morais, sejam retirados do mercado. O juiz da 7.ª Vara Cível de Goiânia, Jeová Sardinha, ordenou a busca e apreensão em livrarias e bancas de todo o País. Mais: em despacho anterior, o mesmo juiz proibiu o autor, a editora e o publicitário Gabriel Zeillmeister de se pronunciarem sobre episódio citado no livro envolvendo Caiado, sob pena de pagar multa de R$ 5 mil por cada declaração publicada na imprensa.


O deputado alega ter sido caluniado e desde o início do mês passado tenta impedir a circulação da obra sobre a história da W/Brasil, seus fundadores e o seqüestro de Washington Olivetto, editada pela Planeta Brasil. O motivo da ira de Caiado está na página 301. Em 1989, candidato à Presidência, o então presidente da União Democrática Ruralista procurou a agência para fazer sua campanha. Sobre o encontro, Zeillmeister conta que o candidato, médico, defendeu a esterilização das mulheres por meio de um remédio adicionado à água. Seria a solução para o maior problema do País, ‘a superpopulação dos estratos sociais inferiores, os nordestinos’. Zeillmeister chama Caiado de louco. O deputado sustenta que não foi ouvido no livro e nega ter dito essa frase.


No dia 13, Sardinha determinou a apreensão da obra na sede da editora, mas foram encontrados três exemplares. A censura para os envolvidos vale desde então e causou revolta. Circula entre publicitários e jornalistas abaixo-assinado em defesa da liberdade de expressão. O assunto será debatido hoje em reunião da Federação Nacional dos Jornalistas. ‘O único Poder que censura hoje no Brasil, desobedecendo a Constituição, é o Judiciário’, afirmou Fred Ghedini, vice-presidente da Fenaj.’



AUDIOVISUAL


Eduardo Simões


‘Cortes no MinC atrasam produção audiovisual’, copyright O Estado de S. Paulo, 05/05/05


‘Diretores e produtores de projetos premiados no ano passado nos editais do Ministério da Cultura até agora não viram a cor do dinheiro. Cineastas como Murilo Salles e o pernambucano Cláudio Assis, que em edições anteriores levaram às telas filmes como, respectivamente, ‘Seja o que Deus quiser’ e ‘Amarelo manga’, assinaram o contrato com o MinC em dezembro, cerca de um mês depois do anúncio dos 103 vencedores.


– Normalmente, o dinheiro era para ter saído dois meses após a assinatura de contrato. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o ‘Seja o que Deus quiser’ – diz Murilo Salles, cujo ‘Uma história real’ foi um dos vencedores do concurso para longas de ficção de baixo orçamento, com prêmio no valor de R$ 1 milhão. – Agora não há nenhuma previsão porque o MinC diz que está nas mãos do Planejamento. O problema é que, se não pagarem até agosto, o dinheiro volta para o Tesouro.


De acordo com Orlando Senna, secretário do Audiovisual do MinC, o pagamento dos prêmios sofreu com o corte de mais de 55% no orçamento para o ministério em 2005. Senna diz que já foram pagos os prêmios para os projetos de curtas-metragens de um minuto e os de desenvolvimento de roteiro – pouco mais de R$ 600 mil do montante total de quase US$ 11,3 milhões. O secretário garante ainda que até o início de agosto tudo será pago.


O pagamento, conta Senna, está sendo feito a conta-gotas, mensalmente, e de acordo com um escalonamento e tendo como prioridade o pagamento do conjunto de um edital. Os próximos pagamentos, avisa o secretário, irão para os longas de ficção de baixo orçamento. Em seguida virão, na ordem, os prêmios dos projetos de documentários de baixo orçamento, curtas de ficção, curtas de animação e desenvolvimento de longas-metragens de animação.


– Nesta quinta (hoje) o ministro Gilberto Gil terá uma reunião com o presidente Lula com a proposta de voltar ao orçamento original para este ano – diz Senna. – Parece-nos que um corte num orçamento que corresponde a menos que 1% do geral da nação não tem um grande reflexo na economia do país.


O atraso, no entanto, já tem reflexos negativos nas produções. Cláudio Assis, cujo projeto de ‘Baixio das bestas’ foi outro vencedor do edital para longas de ficção de baixo orçamento, pretendia ter iniciado as filmagens em abril, acabou remarcando para setembro, mas, diante do problema, já pensa em modificar novamente suas datas.


É preciso vergonha na cara, diz Assis


– O filme vai ser mais uma vez adiado e ainda corro o risco de perder o dinheiro e ter que recomeçar do zero. Isso é uma irresponsabilidade – reclama Assis, pouco esperançoso. – Até que o Lula venha falar com o Palocci, e o Palocci resolva, morre o burro e quem o tange. É preciso ter vergonha na cara e pagar, afinal é um concurso público.


Outro problema causado pelo atraso é quanto à captação de recursos. Caso de ‘A marca do Zéfiro’, de Allan Sieber, vencedor do edital de desenvolvimento de longa de animação:


– É uma bagunça, porque não tenho nada para mostrar para os investidores. Estou paralisada – reclama a produtora Denise Garcia.’