Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Clóvis Rossi


‘PARIS – No meio do que seu assessor internacional Marco Aurélio Garcia chama de ‘período difícil’, a estada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Paris funcionou como uma espécie de bálsamo para a alma, a parte claramente mais afetada.


Paris, aliás, é sempre um bálsamo, até para quem não tem a alma ferida. É impossível não se encantar com essa cidade, mesmo em dias como ontem, em que ela parecia o Saara de tão quente e de tão forte o sol.


Além de Paris, há música para os ouvidos de governantes sempre que são hóspedes oficiais de países que sabem receber -e a França sabe, ainda que nem sempre queira.


Quem não se sentiria reconfortado ao ouvir, como Lula ouviu ontem de Jacques Chirac: ‘Sinto-me orgulhoso de estar a seu lado, desde o princípio, na busca de mecanismos de ajuda ao desenvolvimento mais adaptados à realidade do mundo’. Refere-se ao financiamento para o combate à fome, tema que os dois presidentes discutirão em mais detalhes hoje (entre eles, atenção viajantes, uma taxa sobre passagens aéreas).


Os franceses acarinharam Lula o tempo todo. E os brasileiros que vivem na França não tiveram nenhum gesto de hostilidade. Não se viu nem se ouviu um só petista desiludido, como os muitos que escrevem para os jornais no Brasil.


Lula não sabe, mas a imagem dele está preservada em gente de quem ele jamais ouviu ou ouvirá falar. O motorista do táxi que serpenteou por Paris tarde da noite ontem, para escapar da baita confusão no trânsito provocada pelos fogos de artifício na Torre Eiffel, me disse que não sabia o nome de nenhum presidente brasileiro anterior, mas sabia bem o de Lula. O rapaz é de Gana e está em Paris há 20 anos.


O problema é que Paris é uma só. Como o presidente está disposto a reduzir as viagens internacionais ao indispensável (como foi essa visita), terá que ficar mais tempo no Brasil e enfrentar no próprio país esse, digamos, ‘período difícil’.’


 


Cida Fontes


‘‘O Brasil não merece isso’, diz Lula’, copyright O Estado de S. Paulo, 15/7/05


‘Pela primeira vez, ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva explicitou sua preocupação com a crise no Brasil durante sua viagem à França. ‘O Brasil não merece tudo isso que está acontecendo, merece coisa muito melhor’, disse, em resposta a uma pergunta de jornalista da Bandnews após visita ao Espaço Brasil, pavilhão com exposições de arte popular e contemporânea do País que ficará montado até setembro em Paris.


Cercado por seguranças, o presidente esquivou-se, ao máximo, da imprensa, afirmando que só falaria ‘merci beaucoup’ (obrigado). Em meio aos tumultos, Lula observou que estava gostando muito da recepção em Paris. ‘A França está nos tratando com muita dignidade’, disse à TV Record.


A viagem a Paris tem servido como trégua à crise e também como elixir para melhorar o astral, depois de tantos problemas políticos no Brasil. No Espaço Brasil, Lula comoveu-se a ponto de encher os olhos de água quando Elba Ramalho cantou, à capela, o refrão de ‘Sandália de prata’, de Ary Barroso. ‘Isso aqui ô, ô, é um pouquinho de Brasil, iá,iá. Desse Brasil que canta e é feliz, feliz. É também dono de uma raça. Que não tem medo de fumaça ai, ai. E não se entrega, não’.


Quem contribuiu para dar o toque emocionante foi o ministro da Cultura, Gilberto Gil, que pediu a música em homenagem a Lula. ‘Como a gente está num momento difícil, ter um bom impacto é positivo’, avaliou o assessor especial para assuntos internacionais do Planalto, Marco Aurélio Garcia. Para ele, a recepção calorosa ajuda.


O assessor informou que partidos de esquerda de vários países têm telefonado para prestar solidariedade e manifestar apoio ao governo brasileiro. Citou, por exemplo, a Frente Ampla do Uruguai, a Frente Sandinista de Nicarágua, o Partido Revolucionário Democrático (PRD) e a Frente Farabundo Marti de El Salvador.


Segundo ele, a todos os interlocutores, o governo reconhece a situação difícil, mas explica que as denúncias de corrupção estão sendo investigadas e que o PT já fizera as mudanças necessárias em seu comando.


O próprio presidente Lula terá hoje a chance de tratar do assunto diretamente com o secretário-geral do Partido Socialista Francês, François Hollande, um representante expressivo da esquerda francesa que esteve dez anos no poder. Os socialistas também foram alvos de denúncias de irregularidades em seu partido durante o governo de François Mitterrand.


Na avaliação de Marco Aurélio, a crise envolvendo o PT afetam a imagem do governo. ‘Mas a forma franca como estamos enfrentando vai ajudar a resolver a situação’, completou. Segundo ele, o governo precisa tocar a administração e, se for responder a denúncias todos os dias, ‘está frito’. ‘O governo tem de governar’, emendou. A reformulação do PT, para ele, vai ajudar o governo a superar os problemas políticos.’


 


Reali Júnior


‘FHC inveja sucesso de Lula, diz ‘Figaro’’, copyright O Estado de S. Paulo, 15/7/05


‘Entre tantos artigos que, nos últimos dias, foram dedicados ao Brasil pela imprensa francesa, coube ao conservador Le Figaro publicar aquele que, certamente, mais agradará ao governo e à platéia petista. ‘O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que não engole o sucesso de Lula no cenário internacional, achou bom aconselhá-lo a não se candidatar à reeleição, para que buscasse uma saída honrosa’, diz no diário francês a jornalista Lamia Oualalu. ‘É pouco provável’, prossegue a autora, ‘que a oposição (brasileira) tente um processo de destituição contra o chefe de Estado. Ela se prejudicaria frente à opinião pública, diante da qual Lula continua popular’.


Segundo a jornalista, deixar o vice-presidente José Alencar completar o mandato ‘poderia ser um erro tático (dos tucanos)’, pois este, conhecido por suas críticas ao modelo econômico, ‘poderia revelar-se bem menos maleável do que um Lula enfraquecido’.


A avaliação dos sentimentos de FHC a respeito de seu sucessor aparece numa análise sobre a crise vivida pelo governo e pelo PT desde as denúncias do deputado Roberto Jefferson. A conclusão da jornalista é que, hoje, muitos eleitores acreditam que o PT ‘não vale mais que os outros (partidos)’ e que talvez os eleitores não o perdoem (em 2006). E Lula, mesmo que se reeleja, poderá ser um prisioneiro do Congresso: ‘Dos 98 deputados petistas’, arrisca ela, ‘apenas uns 50 deverão preservar seus mandatos em outubro de 2006’.


A comparação entre o presidente anterior e o atual, feita por lideranças políticas e culturais, é bem mais fina e elegante. Lula, para muitos deles, não tem o brilho do intelectual Fernando Henrique Cardoso, mas a autenticidade e a franqueza de um presidente ex-operário, mais preocupado com os problemas sociais de seu país. É o que diz, por exemplo, Jack Lang, ex-ministro da Cultura de François Mitterrand.


O primeiro impressionou pelo seu discurso na Assembléia Nacional Francesa, mas Lula conquistou com sua simplicidade a classe política francesa, à direita e à esquerda. O primeiro, como antigo professor em Nanterre nos tempos da ditadura brasileira. O segundo, como antigo sindicalista próximo à CFDT, uma das grandes centrais sindicais francesas.


O próprio Lula, no seu improviso de ontem, no Palácio do Eliseu, onde foi recebido pelo presidente Jacques Chirac, falou de sua proximidade com a França e recordou: ‘Quando venci as eleições, aqui estive como presidente eleito e fiquei imaginando qual seria minha relação com o presidente Chirac, sua ajuda a um desenvolvimento mais adaptado ao mundo de amanhã.’ Lula está convencido, hoje, de que Chirac é um verdadeiro homem de Estado, pois ele foi o primeiro entre os líderes dos países desenvolvidos a assimilar a causa da luta contra a fome. E Chirac está convencido de que o projeto franco-brasileiro contra a fome e a miséria, apoiado por cerca de 50 chefes de Estado, deve avançar bastante a partir de setembro, com a Assembléia da ONU em Nova York. Ontem, na recepção pelo 14 de Julho, uma fonte francesa revelou que o país deve reafirmar nas próximas horas, por meio de Chirac, sua posição de apoio à candidatura do Brasil a uma cadeira no Conselho de Segurança das Nações Unidas.


A recepção do 14 de Julho é uma oferecida todos os anos, pelo presidente da França, nos jardins do Palácio do Eliseu a cerca de 5 mil pessoas de diferentes regiões, com suas diferentes gastronomias.


Este ano, em homenagem ao Brasil, uma barraca brasileira serviu carne de uma famosa churrascaria de São Paulo, frutas e doces brasileiros. Duas baianas, vestidas com as cores do Brasil e da França, distribuíram fitinhas amarelas do Bonfim, até para Chirac, sua mulher, Bernadette, e para o casal presidencial brasileiro.’


 


DASLU E CPI


Eliane Cantanhêde


‘PF versus CPI’, copyright Folha de S. Paulo, 15/7/05


‘BRASÍLIA – Enquanto as CPIs comem na mão da imprensa e se consomem em depoimentos estéreis e recheados de mentiras durante horas e horas, a Polícia Federal age. A diferença é que CPIs são sempre contra os governos, enquanto a PF acaba sendo a favor. Como agora. A CPI dos Correios alimenta a crise política. A PF vai atrás da Daslu e de sonegadores e distrai a atenção, tirando o foco de Brasília para o Brasil real -que é o que, em 2006, vai votar (ou não) na reeleição de Lula. Antes, quem tinha uma denúncia enviava para as CPIs, que investigavam, descobriam as falcatruas e vazavam indícios, documentos e provas para os jornalistas. Hoje, o denunciante dispensa intermediários e vai direto à imprensa. Inverteu-se o processo: jornais, revistas e até as televisões publicam os escândalos, e a comissão corre atrás. Pelo menos até a quebra de sigilo dos suspeitos. Do outro lado, a Polícia Federal, a Receita e o Ministério Público têm mais agilidade e recursos para pegar, com a boca na botija, ora o sujeito do PT com dólares na cueca, ora os deputados da Igreja Universal com malas imensas de dinheiro, ora o templo do consumo dos ricos. Do ponto de vista político, a ação da PF distribui a lama igualmente, evitando que apenas o PT e o projeto de reeleição afundem nela. O resultado é que a PF neutraliza o efeito da CPI. Em vez de um ‘governo cheio de escândalos’, fica a sensação de que a faxina é geral e é positiva. A estratégia do novo ‘núcleo duro’ (Palocci, Thomaz Bastos e Jaques Wagner) é inverter o jogo: de réu, transformar o governo em vítima dos políticos, juiz dos ricos e purificador das instituições.


Por falar nisso, a reação obsessiva de Serra contra o fim da reeleição só tem uma justificativa: está de olho no futuro. Quer ser candidato, ganhar e se reeleger em 2010.’


 


DASLU


Folha de S. Paulo


‘Butique abastece super-rico, diz jornal’, copyright Folha de S. Paulo, 15/7/05


‘NOVA YORK – O ‘New York Times’ publicou um pequeno texto sobre a operação da Polícia Federal na Daslu, definida pelo correspondente Todd Benson como ‘uma butique de luxo ultraexclusiva que abastece os super-ricos do Brasil’. A reportagem, com uma pequena foto de Eliana Tranchesi, dona da loja, foi publicada na metade inferior de uma página interna do caderno de economia do jornal norte-americano.


O texto cita acusações de evasão fiscal de US$ 10 milhões nos últimos dez meses e fala que a operação da PF aconteceu um mês depois da mudança para a nova loja, que custou US$ 50 milhões. Ouvido pelo correspondente do jornal, um porta-voz afirmou que a Daslu está cooperando com a investigação, mas se recusou a fazer mais comentários.’


 


Barbara Gancia


‘Daslu ou Daslula?’, copyright Folha de S. Paulo, 15/7/05


‘Sei, sei. A senadora Heloisa Helena, que até prova em contrário votou contra a cassação de Luiz Estevão, é a musa das CPIs. E a comerciante Eliana Tranchesi, que mantém 140 crianças na creche de sua loja e oferece escola até a sexta série para filhos de funcionários (com direito a aulas de inglês, balé, capoeira e costura), é vilã.


Sejamos realistas: quantos negócios de importados conseguem sobreviver pagando rigorosamente todos os impostos que são enfiados na goela do comércio? Não falo de lojas que pertencem a grandes corporações e são cotadas em bolsa como a Dior, a Tiffany’s ou a Louis Vuitton. Essas andam na linha. Mas será que existe algum comércio desse tipo que pode se dar ao luxo de não ter caixa dois?


O jurista Dalmo Dallari usou um descabido tom raivoso para dizer, na rádio CBN, logo após a detenção da comerciante, que Eliana Tranchesi é símbolo da desigualdade social.


Alô, ilustríssimo doutor Dallari! O senhor preferiria que a Daslu e os mil empregos diretos que ela gera não existissem? Em lugar nenhum o consumo de luxo causa tanta ira quanto aqui. Só entre nós ainda há quem não entenda que consumir é gerar emprego e prosperidade.


Saiba, doutor Dallari, que a sala que mais chama a atenção na Daslu não é aquela onde está instalada a loja da Chanel ou a da Prada. A sala mais linda da Daslu é a que abriga 36 costureiras, todas funcionárias antigas da casa. Eliana Tranchesi achou que elas mereciam ter instalações privilegiadas e a mais bela vista do prédio. Nem mesmo a sala da dona chega aos pés.


Em protesto pela abertura da nova Daslu, Carlos Massa, o Ratinho, distribuiu bolsas piratas das marcas Gucci e Dior para seu público. Por que a Polícia Federal não foi ao SBT perguntar ao apresentador onde ele arranjou a mercadoria falsificada?


No Alvorada, o presidente diz que as reportagens sobre a empresa do filho são ‘intrusão’ em sua ‘vida privada’. Uma empresa que pertencia ao secretário de Comunicação aumenta seu faturamento ao obter contratos com o governo e, quando o fato vem à tona, em vez de ser demitido, ele é apenas rebaixado.


Se a inversão de valores é a ordem do dia, somos forçados a admitir que Eliana Tranchesi, assim como o petista com dinheiro na cueca, não fez nada que outros não façam. Com a diferença de que ela nunca aparelhou governos de forma stalinista nem teve a pretensão de distribuir 20 mil cargos públicos entre as dasluzetes.’


 


TODA MÍDIA


Nelson de Sá


‘Para tomar fôlego’, copyright Folha de S. Paulo, 15/7/05


‘Como avaliou o espanhol ‘El País’, ontem em título, ‘Lula toma fôlego em Paris’.


Para além dos aplausos de anteontem, havia a cobertura de ontem para dar ‘fôlego’.


Esta coluna buscou se concentrar nos diários ‘Le Monde’, ‘Le Figaro’ e ‘Libération’ e no canal francês TV5, com transmissão por satélite e cabo.


Até desistir no início da noite, já haviam sido contados e lidos 27 textos, entre reportagens e artigos, nas edições impressa e virtual dos três jornais. Sem falar de fotos, a maioria de Lula e Gil, charges, quadros etc.


Está assim excessiva, a imprensa francesa, desde que começou o ‘Année du Brésil’.


De um artigo do ministro-cantor, no ‘Figaro’, a um quase editorial do ‘Libération’, a cobertura dos dois -o primeiro à direita, o outro à esquerda- foi quase toda de apoio aberto ao presidente brasileiro.


No ‘Figaro’ se lia, por exemplo, que FHC ‘não engole o sucesso de Lula no cenário mundial’. No ‘Libé’, em destaque, ‘Lula segue um homem forte’, apesar do escândalo. Quanto à corrupção, ela é ‘endêmica’ em toda a América Latina.


Não foi diferente na TV5, na transmissão ao vivo do desfile de comemoração da tomada da Bastilha, com menções simpáticas a ‘Lula da Silva’ e até à Esquadrilha da Fumaça.


O que mais se esforçou na crítica foi o ‘Le Monde’, de centro-esquerda, mas ainda assim com enunciados contidos, como na primeira página, ontem:


– Paris acolhe Lula fragilizado e festeja a cultura brasileira.


É a síntese da cobertura.


FUMAÇA


A francesa TV5 mostrou ao vivo, com imagens simultâneas, e a TV brasileira reproduziu a apresentação da esquadrilha para Lula e Jacques Chirac.


E o ‘Libération’ destacou ‘O desafio de Lula’


Nove petistas


Abrindo as manchetes do ‘Jornal Nacional’:


– Exclusivo. Um deputado da CPI cruza dados e revela que pessoas ligadas a deputados do PT estiveram na mesma agência do Banco Rural, em Brasília, que se tornou famosa no escândalo do ‘mensalão’.


Entre os nove citados, João Paulo Cunha, Vicentinho etc.


Promessa


Do editorial ‘O escândalo de corrupção do Brasil’, na nova edição da ‘Economist’:


– Quando ele foi eleito, Lula prometia ser muito mais do que apenas mais um político.


Ele não é. E de um editorial do ‘Los Angeles Times’:


– Lula precisa fazer mais do que alegar ignorância.


Para o ataque 1


Avaliação de bate-pronto do site Globo Online, em destaque sob a manchete ‘Oposição parte para o ataque contra Lula’, com o tucano Arthur Virgílio chamando Lula de ‘idiota’:


– Ataques acontecem após pesquisa mostrar que denúncias não afetaram imagem de Lula.


Virgílio reagia a um petista que revelou, na CPI, um de seus financiadores de campanha.


Para o ataque 2


Outro tucano, Aécio Neves, foi ao ataque, fazendo manchetes. Na Folha Online, ‘operação da polícia mineira flagra’ queima de documentos de Valério.


Mais Aécio, na Globo:


– O governo de Minas decide cancelar os contratos com as agências de Valério.


ESSENCIAL A Globo seguiu com a cobertura legalista da Daslu e os comentários de apoio à operação. ‘Wall Street Journal’, à pág. A9, foi na mesma linha, bem como o blog de Luiz Carlos Bresser-Pereira, sob o título ‘A lei existe’:


– A PF prende os Schincariol e agora os empresários da Daslu. Sonegação fiscal. ‘Mas como pode, num país em que se sonega tanto’, perguntam e acrescentam: ‘É represália do PT’. Por que, em vez disso, não reconhecer que, num Estado liberal, o respeito à lei é essencial?’