‘Poucos dias atrás, o presidente Lula mencionou ‘Mani Pulite’ (mãos limpas), a operação da magistratura italiana que, ao longo dos anos 90, combateu a corrupção na política da península. A alusão servia para prometer perseverança na investigação das denúncias que assombram Parlamento e governo.
Para os italianos, ‘Mani Pulite’ foi um resgate da consciência cívica. Alguém, de repente, parecia levar a República a sério; quem sabe, todos seguissem o exemplo e se tornassem cidadãos para valer.
Diga-se de passagem, nos últimos anos de ‘Mani Pulite’, alguns magistrados pareciam mais sedentos de glória e sangue do que de justiça. Pairou a dúvida de que a operação fosse mais uma politicagem.
Seja como for, a alusão do presidente me fez pensar nos percalços pelos quais passam nossas tentativas (frustradas) de constituirmos, enfim, uma sociedade.
Inventar o cidadão é a maior dificuldade moderna. Sua formulação básica é a seguinte: como se constitui uma consciência que dê valor à coletividade numa cultura em que, sem retorno, o indivíduo é o valor prioritário?
Voltemos à Itália. Entre o fim do século 19 e a Primeira Guerra Mundial, os ideais modernos impunham uma efetiva reorganização social (apesar da persistência da monarquia). Foram décadas dominadas por um ilustre primeiro-ministro centrista, Giovanni Giolitti, que era especialmente sensível ao fato de que os tempos exigiam um novo tipo de subjetividade política. Uma sociedade que valoriza o indivíduo (a ponto de contar o voto de cada um) não se mantém unida sem o sentimento de um destino e de um bem comuns. Mas, se o indivíduo é um valor superior à comunidade, como conferir dignidade ao que é social e coletivo?
Uma solução de Giolitti consistia em idealizar o serviço público. Uma sociedade, mesmo composta de indivíduos separados, existe quando o cargo público não é percebido nem como encosto nem como fracasso social nem como ocasião para gozar do poder, mas como exemplo de dedicação, como forma de excelência moral.
Não deu certo. Os esforços para constituir um novo laço entre indivíduos produziram caricaturas do espírito comunitário da sociedade tradicional. É sempre assim quando, incapazes de inventar o futuro, ressuscitamos um morto: o morto reaparece na farsa ou no horror.
Na época de Giolitti, surgiu o nacionalismo que sustentou tanto as conquistas coloniais (farsa) quanto a Primeira Guerra Mundial (horror). Mais tarde, para convencer os italianos de que eles eram um povo só, veio o fascismo (farsa e horror).
Floriano Peixoto e Prudente de Morais, pelo que entendo, sonhavam com a mesma dignidade da República e do serviço público republicano. Perderam-se tentando afirmar a unidade da nação pelo massacre da revolta catarinense e do povo de Canudos (nota: se você quiser refletir sobre essa história, não perca ‘A Luta, parte 1’, quarto ‘capítulo’ de ‘Os Sertões’, em cartaz até o fim de junho, no Teatro Oficina).
Como no exemplo italiano, não deu certo. Em vez da unidade republicana, veio o fascismo na versão Vargas e, mais tarde, na versão da ditadura militar.
Claro, houve intermezzos, em que a tentativa de construir uma sociedade de indivíduos não produziu nem farsa nem horror. Na era de Juscelino, o sonho visionário da modernização propôs à nação uma grande aspiração comum.
Mais recentemente, apesar de algumas sacudidas, houve a sensação de uma gestão dedicada e eficiente (uma espécie de modernidade alcançada), nos primeiros quatro anos de Fernando Henrique, mas a sensação morreu nas negociatas para a renovação do mandato.
E houve a eleição de Lula. O país manifestou sua decisão de se dar um governo capaz de pensar num interesse superior, no bem comum (que na modernidade -dificuldade suplementar- inclui o respeito da liberdade dos indivíduos).
Ora, pensar no bem comum não significa apenas resistir à cobiça de quem tenta saquear a coisa pública. Significa também evitar a tentação de agir para ser amado (é o risco populista) e significa sobretudo resistir ao charme abstrato do exercício do poder. Esse é o risco que mais espreita quem governa: considerar que a prioridade não é transformar o mundo, mas se manter no governo e aumentar o alcance de seu poder.
Se a denúncia e os indícios da prática do ‘mensalão’ atingem, hoje, a esperança coletiva, não é pela cobiça de quem teria vendido seu mandato (aqui, nenhuma surpresa). Mas é porque tudo parece indicar que a razão da compra teria sido uma vontade abstrata de ampliar limites do poder.
Os votos que teriam sido comprados não eram votos que faltassem para aprovar uma reforma necessária (a própria reforma política, por exemplo). Nesse caso, Maquiavel (ao menos ele) compreenderia: aproveita-se a corrupção de um mundo decrépito, para transformá-lo.
Se os indícios se confirmarem, foram comprados votos para não ter que distribuir cargos, ou seja, para estender abstratamente o poder: te pago para que eu governe.
Um personagem de Hemingway, na Guerra Civil espanhola, contempla os aviões republicanos, que vão para uma batalha da qual já se sabe que será perdida, e comenta: ‘Nous sommes foutus’, como sempre.’
Eugênia Lopes e Vasconcelo Quadros
‘Marinho envolve Gushiken e sugere devassa na publicidade ‘, copyright O Estado de S. Paulo, 23/06/05
‘Em um depoimento de cerca de 12 horas à CPI dos Correios, o ex-chefe de departamento Maurício Marinho elegeu como alvo o PT e aumentou a tensão entre os governistas. Lançou suspeitas sobre a lisura de dois diretores da empresa indicados pelo secretário-geral do partido, Sílvio Pereira, e levou para a CPI o nome do ministro Luiz Gushiken, da Secretaria de Comunicação de Governo, ao defender uma devassa nos contratos do Departamento de Marketing da estatal.
Marinho chegou mesmo a traçar um plano de investigação, apontando 14 procedimentos dos Correios que, em sua avaliação, precisam ser apurados, incluindo os contratos de publicidade. Antes de apresentar o levantamento, o ex-chefe do Departamento de Administração e Contratação contou que os Correios, em caráter emergencial, compraram 500 impressoras da empresa HHP. De acordo com ele, a aquisição teria sido feita por determinação do diretor de Tecnologia da estatal, Eduardo Medeiros, nomeado por indicação do secretário-geral do PT. ‘Sílvio Pereira é ligado à área de tecnologia’, disse Marinho.
O depoimento de Marinho começou na noite de terça-feira, foi interrompido já na madrugada de ontem e retomado de manhã. Assim como o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), o funcionário dos Correios não apresentou provas de nenhuma das suspeitas que levantou. Ele repetiu exaustivamente em seu depoimento que os diretores de Operações, Maurício Coelho Madureira, e Tecnologia eram os responsáveis pela maioria dos contratos vultosos da estatal. Confirmou ainda que teve conhecimento de que o substituto de Eduardo Medeiros na diretoria de Tecnologia seria Robison Couri, suplente do senador Ney Suassuna (PMDB-PB), e não Ezequiel Ferreira de Souza, indicação do senador Fernando Bezerra (PTB-RN).
O único momento em que Marinho envolveu o nome do presidente licenciado do PTB em seu depoimento foi quando disse que recebeu Joel Santos Filho, que se dizia representante de uma multinacional, a pedido de Marcus Vinícius Vasconcelos Ferreira, que é genro de Roberto Jefferson. Joel foi um dos que gravaram a conversa com Marinho, na qual ele recebe R$ 3 mil e fala de um suposto esquema de corrupção nos Correios comandando por Jefferson. ‘O Marcus Vinícius me fez três visitas nos Correios, e nos telefonemas sempre me pedia para atender algum empresário’, contou.
Marinho procurou eximir o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de qualquer envolvimento com eventuais irregularidades nos Correios. Garantiu que nunca se encontrou com o dono da empresa Novadata, Mauro Dutra, que é amigo pessoal de Lula e tem contratos com a estatal. ‘Sei que a Novadata foi vencedora de algumas licitações na área de tecnologia. Mas não tenho conhecimento de partidos por trás dela’, afirmou Marinho. Ele disse ainda que não conhece o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza – dono das empresas DNA e SM&B, que têm contrato com os Correios.
BRAVATAS
Assim como fez no depoimento à Polícia Federal, Marinho voltou a afirmar ontem que falou ‘bravatas’ na conversa gravada com o suposto representante da multinacional. Ele confirmou como verdadeiras declarações que aparecem na fita, como a que diz que o ‘PTB ficou com um rombo nas eleições porque o PT não cumpriu o acordo’. Para Marinho, o empresário Arthur Waschek Neto, que vai depor hoje na CPI, não é o único responsável pela gravação da conversa. ‘Não creio que seja só ele que está por trás dessa gravação.’
No longo depoimento, os deputados do PT tentaram desqualificar as declarações de Marinho e lembrar, a todo instante, que ele foi flagrado recebendo propina. ‘A trajetória dele nos Correios é complexa. Ele usa a mesma tática do deputado Roberto Jefferson, para se defender sem ter uma única prova’, disse o deputado Jorge Bittar (PT-RJ).’
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‘Ministro reage a ‘insinuações levianas’ ‘, copyright O Estado de S. Paulo, 23/06/05
‘Em nota, Secom alega que os contratos de publicidade de todos os setores do governo são administrados de forma descentralizada
Antes mesmo da conclusão do depoimento do ex-chefe de departamento dos Correios Maurício Marinho, a Secretaria de Comunicação de Governo (Secom) divulgou nota para defender seu titular, o ministro Luiz Gushiken. Isso porque Marinho recomendou que a CPI investigasse os contratos de publicidade da estatal e citou Gushiken.
A secretaria alega que os contratos de publicidade de todos os setores do governo são administrados de forma descentralizada pelos respectivos órgãos e entidades oficiais. ‘A Secom tem a faculdade de participar das comissões de licitações, conforme determinação legal, mas sua presença restringe-se à análise das propostas técnicas apresentadas’, diz a nota.
O texto classifica de ‘infundadas e levianas’ as afirmações de Marinho: ‘É lamentável que o depoente, ao buscar se eximir de responsabilidades, faça tentativas de encobrir os fatos e de desviar o foco das investigações em curso.’ No depoimento, ao ser questionado se tinha conhecimento dos contratos dos Correios com agências de publicidade, Marinho disse que conhecia apenas os contratos da agência da SPM&B, de Marcos Valério de Souza, ligados à Secretaria de Comunicação.
Eis a nota da Secom: ‘Em relação ao depoimento do sr. Maurício Marinho, que fez hoje (ontem) insinuações infundadas e levianas, a Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica (Secom) esclarece que os contratos de publicidade e a gestão das licitações do Poder Executivo Federal competem aos respectivos órgãos e entidades. A Secom tem a faculdade de participar das comissões de licitações, conforme determinação legal, mas sua presença restringe-se à análise das propostas técnicas apresentadas. A licitação, a assinatura, a execução e o acompanhamento dos contratos são processos de responsabilidade exclusiva do órgão ou entidade licitante. Nesse sentido, esclarecimentos já foram feitos pela diretoria dos Correios, que tem se colocado à disposição das autoridades para prestar informações. É lamentável que o depoente, ao buscar se eximir de responsabilidades, faça tentativas de encobrir os fatos e de desviar o foco das investigações em curso. Depoimentos dessa natureza em nada contribuem para uma investigação séria e responsável da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI).’’
Mário Augusto Jakobskind
‘Uma carta que fala de traidores e infiltrados ‘, copyright Bafafá Online (http://www.bafafa.com.br/), 23/06/05
‘Um amigo ítalo-uruguaio, que mora em Gênova e de vez em quanto baixa por estas bandas, pediu que eu fizesse uma análise sobre os últimos acontecimentos no Brasil. É que ele não confia nas análises e informes produzidas por agências internacionais comprometidas com interesses poderosos e que muitas vezes manipulam os fatos. Aí, saiu o que se segue:
Caro Mario del Gaudio
É madrugada neste Rio de Janeiro. Estes dias ando trabalhando por demais. Hoje decidi fazer serão, para tentar acompanhar os lances mais recentes desta crise pré-fabricada pela direita e que tem também a marca da incompetência do PT.
O Lula caiu numa armadilha do esquemão. Agora, ou ele se enquadra maneiro, como quer a direita gênero Fernando Henrique Cardoso, e o império também, ou pula fora. Não tem reeleição, ou melhor, a direita daqui e o império só aceitam um segundo mandato totalmente enquadrado. Ou seja, ou Lula cede ainda mais, ou desestabilização sem trégua, com denúncias e mais denúncias, com ou sem provas. A direita capitaneada por FHC está assanhadíssima. Está balizando o Lula e defendendo com unhas e dentes o Ministro Antonio Palloci, o gerente das finanças que está fazendo tudo o que interessa ao capital financeiro. O esquema PSDB-PFL quer privatizar o que o Cardoso não conseguiu em oito anos, quer fazer reforma trabalhista e sindical para ferrar os trabalhadores e enfraquecer ainda mais as suas representações. A direita está de olho nos Correios, no Instituto de Resseguros do Brasil, Caixa Econômica Federal, Furnas, Banco do Brasil.
O serviço sujo
Eles querem que o Lula faça o serviço sujo. Para isso, surge o deputado Roberto Jefferson, um político que foi leal a Fernando Collor de Mello e, de repente, recebeu um cheque em branco do Lula, com quem se aliou e agora decidiu fazer denúncias do tipo que ele ouviu dizer. Tem mesada de R$ 30 mil para partidos aliados do Lula, como o PL e PP, segundo Jefferson, que não poupou o Zé Dirceu, a quem acusou de chefe de quadrilha.
Que Jefferson não tem credibilidade, nunca teve, disso ninguém duvida. A mídia, ou pelo menos setores dela, decidiu, na prática, encampar as novidades do deputado ex-tropa de choque de Collor.
E o Dirceu? Sempre foi uma figura dúbia: uma hora ataca a política econômica neoliberal administrada por Antonio Palloci, o companheiro, outra hora afirma que a VI Licitação do Petróleo, o tal leilão que entregou nossa riqueza energética para multinacionais exportarem, foi um dos pontos altos do governo Lula. Afinal, o que pensa Dirceu em termos de que é bom para o país? Ele está em cruzada para que o PT se aproxime do movimento social, mas ao mesmo tempo elogia a política econômica do governo com algumas ressalvas. Não aceita o posicionamento da esquerda do PT, que pede a revisão-já dessa política, por considerá-la perniciosa aos interesses do povo.
Não vamos discutir o passado de Dirceu, que ele agora tenta reviver a todo momento, para dizer que sempre foi de luta . Pode até ter sido, mas agora? Precisa provar bem provado se considera Palloci um companheiro ou acha que ele faz o jogo dos setores que querem enquadrar o Lula de qualquer maneira. Passado sem presente, camarada Dirceu, não absolve ninguém. O FHC mesmo, na época da ditadura, foi considerado um combatente. E daí? De que adianta evocar o passado se no presente ele chega a pedir a Bush que enquadre a América Latina para evitar um novo Chávez? Cardoso não é só traidor da pátria, acho até que ele é a própria infiltração (do império). Ele esta visivelmente querendo provar que bom para os Estados Unidos é ele e o seu PSDB, mas que Lula, por mais que se esforce, é uma incógnita (para Washington), mesmo que os lucros dos banqueiros em seu período de governo tenham batido recordes.
O perigo maior
O momento que o Brasil atravessa é grave, sem dúvida, mas o maior perigo é se possibilitar a volta do PSDB-PFL ao poder. Seria o fim da picada.
Neste dias vi a propaganda do PSDB na TV. Será que os seus adeptos e lideranças acham que o povo brasileiro é debilóide? O traidor-inflitração FHC chegou a dizer que os 10 anos de política econômica ‘começavam a dar resultado’….. etc e tal.
A atual crise ganhou mais intensidade (coincidência?) depois que FHC voltou de Washington, como lembrou o jornalista Laerte Braga, quando ele pediu a Bush que se ocupasse mais da América Latina. Chegou até a prever uma crise institucional. Alguns jornalistas, como Chico Nader, Morgana White e Alberto Salvador, do Jibra (jornalistas independentes do Brasil), garantem que no apartamento de FHC, no bairro paulistano de Higienópolis, vários segmentos da direita e da mídia (Abril, Estado de S. Paulo etc) se reuniram algumas vezes, inclusive gente do Consulado estadunidense, para analisar a conjuntura e propor medidas. Nestas reuniões teriam sido traçados os planos de desestabilização do governo Lula.
FHC vendeu vergonhosamente o Brasil. A Petrobrás, por exemplo, deixou de ser totalmente brasileira e o Estado não tem a força que tinha anos atrás na empresa. 49,5 da ações estão na mão de investidores estrangeiros. Na bacia de Campos tem áreas em que brasileiro não entra, segundo denunciam dirigentes da Associação dos Engenheiros da Perobras (Aepet). 16% dos acionistas são testas-de-ferro de grupos estrangeiros. Pouca gente sabe disso. Quando tento levar discussões para esse campo, as pessoas me olham achando que falo grego (epa!) ou estou cascateando. LAMENTAVELMENTE, É A PURA VERDADE.
FHC não teve força política para avançar em certas áreas. Deixou o serviço para o Lula, que corre o risco se tornar definitivamente um Lech Walesa da AL. Que triste papel faria este político que veio de baixo e tinha compromissos com as mudanças…
Fórmula para a mudança
Mas, de repente, no meio da crise Lula pode até reverter o quadro se tiver vontade política nesse sentido. Se ele optar por uma mudança de rumo terá que se aliar ao movimento social. Muitos ainda acreditam que Lula mude, outros não e até afirmam, como o sociólogo Francisco de Oliveira, que não se conhece no mundo Ocidental nenhum partido que tenha entrado em declínio e se recuperado. Ou seja, em vez de fazer alianças com partidos espúrios, como continua a defender a cúpula do PT, leia-se grupo Articulação, Lula voltaria a dar ênfase à linha programática original do seu partido e voltaria a abraçar os compromissos da campanha com que se elegeu em 2002.
Se nos primeiros dias depois da posse convocasse uma cadeia nacional de rádio e TV para informar ao povo que país encontrou depois de 8 anos do traidor-infiltração e pedir a mobilização da sociedade, nesta altura não estaria enfrentando as dificuldades atuais. Mas não, Lula optou pelo caminho trilhado historicamente pelas elites, ou seja, por alianças com os setores que dominam o país e são responsáveis pelas imensas desigualdades sociais e por este Brasil de inúmeras outras injustiças.
Bom, mas com tudo isso, o esquema que está tentando o retorno é ainda pior do que o atual, embora muita gente, erradamente, entenda que já não há mais diferenças. Ainda as há, pode crer. Com FHC ou algum preposto, não teríamos cúpula com os árabes, recentemente realizada em Brasília, a contragosto do império, não teríamos Celso Amorim como chanceler, mas sim o Celso Láfer, o tal que deixou se revistar, tirando os sapatos, quando entrava nos Estados Unidos. Não teríamos aproximação com o governo popular e democrático da Venezuela. É provável até que se FHC ou algum preposto estivesse no governo, o Brasil até aprontaria contra Hugo Chávez, a mando de Washington. Com FHC, certamente, o movimento social estaria sendo reprimido a bala, embora o Lula tenha aprovado transformar um batalhão do Exercito em Campinas para agir como repressor interno.
E, pode crer, amigo del Gaudio, tudo isso está desagradando profundamente o governo Bush, em cujo segundo mandato veio para arrasar na América Latina. O Departamento de Estado prefere o esquema original chefiado pelo traidor-infiltração FHC Nem mesmo um Lulinha paz e amor serve mais…
Os linhas-auxiliares
De vez em quando, é bom ler, ver e ouvir o que dizem os colunistas amestrados e os tais celulares (pré-pagos), linhas-auxiliares do sistema… Um tal de Arnaldo Jabor, por exemplo. É impressionante como neste momento de crise ele tem dado o recado do sistema podre da traição e entrega de mão beijada do que ainda resta do país.
A última do esquema é tentar cooptar o Lula, mas sem o PT. Afinal, ‘esses bolchevistas do PT’…. Essa é a linguagem que o Jabor anda usando.
Pode parecer perda de tempo a gente citar o Jabor, mas não. Ele ocupa a posição que ocupa, diariamente falando para uma audiência de mais de 60 milhões de telespectadores, tentando fazer um gênero Glauber, para dar o recado do sistema. Ele foi contratado para isso, recebe orientação nesse sentido. De vez em quanto dá uma na ferradura para despistar. Afinal, hoje em dia pega bem de vez quando gente do sistema dar umas estocadas e até chamar o Bush de babaca , como fez o Jabor recentemente ao ser entrevistado pelo Jô Soares…
Um jornalista lá de São Paulo me contou que cerca de umas duas ou três semanas antes do inicio do teatro Jefferson (cooptado para fazer o que está fazendo) andou vendo o Jô e observou que o show-man da Globo começava a ironizar o Lula de forma como nunca tinha feito depois da eleição do presidente. O amigo jornalista, Alípio Freire, garantiu que comentou com a mulher: ‘ai vem coisa. Se este sabujo do Jô está tratando o Lula assim é sinal de que alguém deve ter dado o sinal verde para entornar o caldo. Não deu outra!
Nesta altura você deve estar imaginando que este escriba está meio louco. Afinal esculhambou o Lula e agora parece demonstrar o contrário. Não é bem assim, o Lula, como já disse, se aliou à escória, seja ela sofisticada ou não. Jogou fora toda a credibilidade que tinha em nome da ‘governabilidade’. Agora está recebendo o troco.
Pois bem, para terminar: hoje no mundo, paises como o Brasil, Ucrânia, Geórgia etc, os governantes precisam demonstrar mais coisas para o império. Não basta ser amigo do Bush ou aliado dele. É preciso mostrar que tem condições de governabilidade. O cara da Ucrânia, o Leonid Kuchma mandou até tropa para o Iraque. Acabou caindo por ação da CIA. O Eduard Shevardnadze, que prestou excelentes serviços aos EUA quando era chanceler do Mikhail Gorbachev e mesmo depois como homem forte da Geórgia, acabou defenestrado por uma revolução. Mesmo aliadíssimo, Shevardnadze não conseguiu demonstrar estar em condições de manter a governabilidade.
O Lula é amigo e até aliado do Bush (haja vista as tropas brasileiras enviadas ao Haiti), mas mesmo assim não é nenhum FHC, como quer o Departamento de Estado norte-americano. O FHC quer provar, sobretudo para Washington, que o Lula não tem condição de governabilidade e por isso não deve ficar mais tempo no governo.
Pior que estamos sem alternativas e precisamos demonstrar que o atual governo não é verdadeiramente de esquerda, mas um arremedo.
Vou ficando por aqui. Espero ter ajudado ao amigo a entender melhor o que se passa neste país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza, como diria o Jorge Ben, que virou Benjor.
Um abraço do
Mário Augusto Jakobskind
(*) esta carta foi escrita em 20 de junho de 2005, em plena crise política montada pela direita.’
Emir Sader
‘Os golpes cotidianos ‘, copyright Agência Carta Maior (www.agenciacartamaior.com.br), 22/06/05
‘Na era neoliberal, já não são necessários golpes militares. Bastam os mercados. É esse o golpismo cotidiano que está por trás da ação da oposição, da criação do clima de ingovernabilidade, com acusações que a mídia monopolista multiplica. A saída da crise passa por mobilização popular e propostas alternativas
Noam Chomsky afirmou que já não são necessários golpes militares – como os que derrubaram João Goulart, Salvador Allende, Isabel Perón, entre tantos outros. Na era neoliberal, de reino dos capitais especulativos, bastam os mercados. Os golpes se tornaram golpes de mercados. Os múltiplos ataquess especulativos, com fugas concentradas e maciças de capitais, desferem poderosos petardos de instabilidade, deixando governos fragilizados pela dependência desses capitais, em situações de ingovernabilidade.
Nós conhecemos bem esses ataques, esses golpes. Eles nos atacaram durante o Plano Cruzado, levando o país à moratória em situação difícil. Atacaram-nos em 1998, quando se tornava insustentável a política monetária do governo FHC, ataque camuflado durante a campanha eleitoral, para permitir a reeleição do então presidente – com todas as compras de votos que a imprensa denunciou, mas que a própria maioria comprada pelo binômio PSDB-PFL impediu transformar em CPI e apurar – e logo em seguida desatar-se como crise aberta, que levou o governo a elevar as taxas de juros a 49,5% (sic).
Voltaram a atacar o Brasil durante a campanha presidencial de 2002. O medo do que poderia ser o governo Lula levou a uma enorme fuga de capitais, com brusca desvalorização do real, atentando contra a vontade majoritária do povo brasileiro de terminar com as políticas de FHC e construir um governo centrado nas políticas sociais.
É esse o golpismo cotidiano que está por trás da ação da oposição. Eles não precisam bater às portas dos quartéis – como muitos deles fizeram em 1964 e fizeram carreira política blindados pela ditadura, de que os casos de ACM e Jorge Bornhausen são exemplares. Apóiam-se nas ameaças de fuga de capitais, contam com a equipe do Banco Central infiltrada no governo, pegando carona numa vitória que foi contra eles e que descaracterizaram com suas políticas.
A criação do clima de ingovernabilidade, com acusações diárias que a mídia monopolista privada recolhe e multiplica, poupa o processo já constituído contra Henrique Meirelles, recheado de provas e evidências, porque é seu aliado, porque foi eleito senador pelos tucanos de Goiás, porque mantêm dentro do governo as políticas de FHC. Mas acusam cotidianamente, baseados em seus novos aliados – Severino Cavalcanti e Roberto Jefferson -, não batem às portas dos quartéis, mas telefonam para os bancos, para as redações dos jornais – são as novas vivandeiras que açoitaram a política brasileira ao longo dos anos 50 e 60, até conseguirem dar o golpe de 64.
Completa-se o quadro com o presidente que produziu a fragilidade da economia brasileira, aquele que anunciou que a estabilidade monetária traria todas as felicidades para o povo brasileiro, que a globalização era um ‘novo Renascimento’ (sic) para a humanidade, que promoveu o maior processo de corrupção da história brasileira, com a privataria do patrimônio público que promoveu – de que agora ele e seus ex-ministros recolhem dividendos com pagamentos milionários por conferências e por assessorias.
Esse é o golpe cotidiano de cada dia. Até que se mude de política econômica, se termine com a ditadura das taxas de juros, dos superávits fiscais, da estabilidade monetária. Aí o golpismo especulativo ficará definitvamente fora de moda. Até lá, só a mobilização popular e as propostas alternativas – como aponta a Carta ao Povo Brasileiro, lançada pelos movimentos sociais – podem superar positivamente a crise que sangra o governo e ameaça repor no governo a direita brasileira, empoleirada na aliança PSDB-PFL.
Emir Sader, professor da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), é coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj e autor, entre outros, de ‘A vingança da História’.’
O Globo
‘Gasto da Câmara sobe com agência de Valério’, copyright O Globo, 23/06/05
‘Os gastos com publicidade da Câmara dos Deputados praticamente dobraram depois que a agência SMP&B, de Marcos Valério de Souza, apontado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como um dos emissários da entrega de R$ 4 milhões do PT ao PTB, passou a atender à instituição. Em 2003, os gastos somaram R$ 5,9 milhões. Em 2004 pularam para R$ 10,5 milhões. A SMP&B fez a campanha do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) à presidência da Câmara e, no fim de 2003, durante sua gestão como presidente, ganhou a licitação e a conta da instituição.
Em 2004, a Câmara gastou R$ 5,5 milhões em uma só campanha. João Paulo disse não considerar impedimento ético o fato de a agência de Marcos Valério ter feito sua campanha e depois ter participado da licitação:
– Em 2004, o gasto com publicidade cresceu porque fizemos a divulgação de reformas e leis, além da execução de novos produtos – disse o deputado.
João Paulo diz que conheceu Marcos Valério durante a campanha e que ficou próximo do publicitário. Por isso, afirma, seu nome apareceria na agenda da ex-secretária de Marcos Valério Fernanda Karina Somaggio. Ele rebate a acusação do PFL de que o gasto com publicidade de sua campanha não foi registrado. Segundo João Paulo, o PT pagou R$ 150 mil, em três parcelas. O presidente do PT, José Genoino, apresentou documento provando que o partido declarou ao Tribunal Superior Eleitoral esses pagamentos.
PF vai abrir inquérito para investigar denúncias
A Polícia Federal vai abrir inquérito para investigar as denúncias da ex-secretária contra Marcos Valério. A PF decidiu abrir a nova frente de investigação porque, em segundo depoimento prestado anteontem, Fernanda Karina confirmou as acusações que fizera ao publicitário e a dirigentes petistas em entrevista ao ‘Jornal Nacional’. Esse será o primeiro inquérito sobre o mensalão.
O diretor da PF, Paulo Lacerda, determinou que Fernanda Karina receba proteção. Ela disse que foi ameaçada de morte por um motoqueiro. Mesmo assim, decidiu revisar o depoimento que prestara semana passada e voltou a insinuar que Marcos Valério mantinha relações suspeitas com dirigentes petistas.
Em nota, Marcos Valério afirmou que a ex-secretária vem contradizendo todos os depoimentos o que, segundo ele, evidenciaria falsas acusações. E lembra que ela está sendo processada por tentativa de extorsão. O PT também reagiu às acusações de Fernanda Karina de que viu malas de dinheiro entregues ao partido. Genoino disse que irá processá-la, mas confirmou que dirigentes petistas tiveram encontros com o publicitário.’
TODA MÍDIA
Nelson de Sá
‘Atentado ‘, copyright Folha de S. Paulo, 23/06/05
‘Na Globo, as imagens da agressão ao jornalista Lúcio Sturm
– Falsidade, não.
A frase, truncada, surgiu em meio ao ataque, assim noticiado no ‘Jornal da Globo’, madrugada de ontem:
– Às dez da noite, o repórter Lúcio Sturm, o cinegrafista Gilmário Batista e o técnico Marçal Araújo foram agredidos por desconhecidos quando gravavam reportagem na frente da sede do PT, no centro.
Eram ‘desconhecidos’, mas nem tanto. Ontem no ‘SPTV’, mais cenas e detalhes:
– O ataque começou junto ao carro da TV Globo. Um dos três homens atacou usando o tripé da câmera. Ao fugir, os agressores ainda atiraram pedras.
E mais:
– Um dos agressores usava adesivo com a inscrição ‘chapa 2’. A polícia investiga se pertence a uma chapa que disputa o sindicato dos bancários, que fica próximo ao local.
No ‘Jornal Nacional’, depois, Fátima Bernardes encerrou o breve relato dizendo:
– O técnico Marçal Araújo sofreu fratura no maxilar e será submetido a cirurgia. O presidente do PT, José Genoino, manifestou solidariedade e qualificou a agressão como atentado à liberdade de imprensa.
Foi depois de semanas em que petistas diversos, em listas de discussão, ‘spams’ de e-mail e outras fontes, espalharam a teoria do complô de mídia contra a democracia e o PT.
Complô que era questionado por comentaristas da Globo, já no ‘Bom Dia Brasil’:
– De toda a reação do governo diante da crise, a pior é alimentar a idéia de que há uma conspiração em marcha.
E alimentar a violência.
Após apresentar Dilma Rousseff como ‘camarada em armas’ e de espalhar o complô por semanas e novamente na sua despedida como ministro, o deputado José Dirceu levou suas armas à Câmara.
Antes, à tarde, anunciou por todo lado, nos sites e rádios, que faria um discurso contido, até ‘light’. Mas a violência o seguiu e, após ser transmitida pelos canais de notícias, foi parar na escalada dos telejornais.
Do ‘Jornal da Band’:
– Vaias, aplausos e agressões na volta de José Dirceu.
E da Folha Online:
– Confusão marca retorno.
Dos três blogueiros com ‘live blogging’, que se concentraram ontem no discurso:
– Jair Bolsonaro grita terrorista e Severino pede respeito… Galeria chama Bolsonaro de fascista. Galerias são evacuadas… Fechou o tempo. Empurrões, berros, ofensas… A Câmara patrocina um espetáculo deprimente. Virou campo de guerra. E ainda tem deputado rindo… Chega, eu estou mais do que satisfeito por hoje.
Escalada do ‘JN’ ontem, sem a agressão aos jornalistas, mas com todo o resto:
– O homem que provocou a maior crise do governo Lula depõe na CPI. Maurício Marinho pede proteção policial e põe sob suspeita uma lista de contratos. A deputado Raquel Teixeira confirma proposta de dinheiro e acusa Sandro Mabel de ter feito a proposta. O deputado nega. Depois de confirmar que dinheiro do ‘mensalão’ saiu da empresa de Marcos Valério, a ex-secretária também pede proteção à Polícia Federal.
E por aí foi a escalada, com mais duas novas CPIs, inclusive sobre Waldomiro, o tumulto na volta de Dirceu etc.
Emir Sader, no site Carta Maior, próximo do governo, prosseguia com a teoria do complô, falando do ‘golpismo cotidiano’ dos mercados ‘que está por trás da ação da oposição, do clima de ingovernabilidade, com acusações que a mídia monopolista multiplica’.
Já Ricardo Kotscho, amigo de Lula, no Nomínimo:
– Na sexta, em busca de respostas e de amigos, criei ânimo para ir ao ato em defesa do PT… Zé Dirceu, como de costume, levantou a platéia com discurso inflamado, convocando à guerra em defesa da história do PT. Notei, porém, que estávamos mais velhos e faltavam jovens… A enxurrada de denúncias bateu fundo na alma.
EM WALL STREET
O correspondente Larry Rohter, em registro sobre a nomeação de Dilma Rousseff como chefe da Casa Civil, ontem no ‘New York Times’, seguiu Gilberto Gil e qualificou a ministra de ‘Dama de Ferro’, no título, e de ‘Joana D’Arc da Guerrilha Urbana’ e ‘O Bulldog’.
O ‘Wall Street Journal’, de sua parte, tratou de destacar outra face da troca de José Dirceu por Dilma. No enunciado, à pág. A9, ‘Acusações de suborno rasgam o Brasil, ajudando o ministro da Fazenda’.
Na abertura da reportagem, enviada do Rio e que foi editada com imagem do ministro (reproduzida acima), ‘Enquanto um escândalo enfraquece o governo do presidente do Brasil, Lula da Silva, um homem emerge fortalecido pela confusão: Antônio Palocci’.’