Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Eduardo Ribeiro

‘Num agosto negro, novas demissões voltam a jogar sombras sobre o mercado jornalístico. Praticamente cem postos de trabalho foram fechados em pouco mais de uma semana, entre São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte e Londrina. O maior banho de sangue veio da Editora JB, que, numa canetada, pôs 64 jornalistas na rua, a maior parte do próprio Jornal do Brasil e uma parte menor da Gazeta Mercantil. IstoÉ, uma das únicas publicações do País que vinha resistindo e que atravessou a fase mais turbulenta do mercado sem demitir, dispensou 20 profissionais. Por fim, o Jornal de Londrina fez o mesmo, um pouco antes, despedindo 14 jornalistas.

Jornal de Londrina

No caso do Jornal de Londrina, temos uma atenuante, em função de uma decisão da Justiça do Trabalho – decisão que, esperamos, não seja cassada. O Sindicato dos Jornalistas local conseguiu que o juiz Francisco Roberto Ermel, da 2ª Vara do Trabalho, determinasse em antecipação de tutela a nulidade das demissões. A decisão baseia-se no descumprimento da Convenção Coletiva, por parte do Jornal de Londrina. O diário desrespeitou cláusula que determina, em casos de demissão coletiva, a observância de alguns critérios para a efetivação da medida, entre eles (nesta ordem) demissão voluntária, menor tempo de casa, solteiros e, por último, os que tiverem menos encargos familiares. Na teoria, a justiça obriga o jornal a rever sua decisão e reintegrar todos os demitidos, mas na prática sabemos que nem sempre é assim. De todo o modo, parte de nossas atenções estarão nos próximos dias em Londrina, na expectativa de um desfecho menos perverso para os colegas demitidos.

IstoÉ

Há mais de um mês, o zum-zum-zum sobre demissões na IstoÉ era forte nos corredores da Editora Três. Um primeiro corte foi efetivado na sucursal Rio de Janeiro, mas o pior estava reservado para esta segunda-feira, quando outros 20 colaboradores da revista foram dispensados. Saíram Célia Chaim e João Paulo Nucci, respectivamente editora e sub de Economia, o editor de Cultura Apoenan Rodrigues, a editora de Comportamento Carla Gullo, os repórteres Henrique Fruet (A Semana) e Mariana Barros (Ciência e Tecnologia), os fotógrafos Ricardo Giraldez e Hélcio Nagamine, o assistente Vandercy S. de Oliveira Jr, o coordenador do estúdio fotográfico Alex Soleto, a coordenadora da revisão Marlene Rodella, o diagramador Lúcio Fasan, o infografista Moacir Samea, a gerente de apoio administrativo Marcionilia Cristina França e a assistente Dilma Moreira. O editor Mário Chimanovitch também saiu da revista, mas permanecerá na Editora Três.

A sucursal Brasília da revista também foi significativamente atingida, com o fechamento de quatro vagas. Saíram os repórteres Leonel Rocha e Amaury Ribeiro Jr. (ambos, felizmente, já com novos endereços profissionais acertados, respectivamente na sucursal do Estadão e, no caso de Amaury, no Correio Braziliense e Estado de Minas) e os fotógrafos Leopoldo Silva e Ichiro Guerra.

Nas medidas anunciadas pelo diretor de Redação Hélio Campos Mello, incluem-se a fusão das editorias de Comportamento com a de Medicina e Bem-Estar e a nomeação de Mário Simas Filho como seu segundo, na revista, função que chegou a ser ocupada, em vezes anteriores, por Ramiro Alves.

Como consolo, ao menos uma contratação. Natália Rangel regressou à revista, para trabalhar em A Semana.

Jornal do Brasil

No Jornal do Brasil a situação é ainda mais grave pois além de demissão em massa, quem fica está sendo submetido a regras selvagens e a uma desmedida exploração. Exploração que se pratica em nome da sinergia e da economia, e que tem como alvo fazer as equipes da Gazeta Mercantil, do Investnews, do Jornal do Brasil e da Forbes trabalharem de forma constante para todos os veículos (ou quase isso). Exemplo: o JB não mais terá editoria de Economia própria mas continuará tendo matérias da área, que terão de ser produzidas pela equipe da Gazeta Mercantil. Isso já está decidido, embora falte combinar direito isso com os próprios jornalistas. Fala-se que também a editoria de Esportes poderá ser extinta, tão logo os profissionais que foram para Atenas regressem, e que o conteúdo da editoria passaria a ser comprado da Agência Lancenet. E isso é apenas uma parte do filme. Fala-se até que a direção do JB quer obrigar os profissionais a assinar uma cláusula abrindo mão do 13º salário. Se isso for verdade não se pode considerar menos que o fim da picada. Fala-se até que os cadernos de informática, tanto do JB quanto da Gazeta Mercantil, passariam a ser feitos por uma só pessoa, em troca de percentual sobre os anúncios.

Há muita indignação na redação e o Sindicato dos Jornalistas do Município, Aziz Filho à frente, tenta uma mobilização histórica no Rio de Janeiro para reverter essa vergonhosa situação de humilhação e exploração dos jornalistas. A questão é que, mesmo numerosos e talentosos, os jornalistas, neste caso, são o elo mais fraco da cadeia e é com isso que Nelson Tanure conta para perpetrar tamanhos absurdos.

Está tão tranquilo de que todo o barulho que se está fazendo dará em nada, que mandou bala nas demissões. A relação inclui Cezar Faccioli, titular da coluna Informe Econômico e que acumulou, por uma semana, o cargo de editor, e Carla Falcão, seu apoio na coluna. Da mesma editoria, saem Larissa Morais, César Baima, Cláudio Souza, Cristiane Garcia e a estagiária Elizabeth Sucupira. Da Opinião, Moacir Andrade. De Cidade, João Pinheiro, Borges Neto, que começou no jornal nos anos 70, Sabrina Neto e Michel Alecrim. De Brasil, Ruy Sampaio, Fernanda Nidecker e Macedo Rodrigues. Da Internacional, Machado. Do Esporte, Danielle Chevrand e Pedro Lemos. Da Internet, Jana Tabak e Natália Watkins. Da Fotografia, Jorge Cecílio e Peter da telefoto. Da Arte, Robert e Bruno Cavaliere.

Está marcada para as 11h do próximo domingo, 3/9, manifestação no calçadão de Ipanema, em frente ao Posto 9, com a finalidade de alertar os leitores do JB e a opinião pública em geral sobre os riscos que esses expedientes podem causar à qualidade e à ética da informação.

Gazeta Mercantil

As demissões também chegaram, mais uma vez, à Gazeta Mercantil, atingindo dez profissionais. Alguns deles, no entanto, permanecerão trabalhando para o jornal num novo regime de contratação, caso, por exemplo de Arnaldo Lorençato, que continuará assinando uma página semanal sobre gastronomia, sua especialidade, no Caderno Fim de Semana – com status de editor contribuinte. Passam a atuar como frilas fixos os colegas Agnaldo Brito, correspondente em Campinas, e Karlon Aredes, de Belo Horizonte. Elaine Bittencourt, que escreve sobre Artes Plásticas para o Fim de Semana, continuará escrevendo para o jornal, porém como colaboradora e recebendo por matéria produzida. Deixam a empresa o editor de Política Décio Trujilo, as repórteres Christiane Malta (Nacional), Cláudia Marques (TI) e Tatiana Silva (Finanças), o assistente de Arte Carlos Rondio e a secretária Eliane Bittencourt.

No caso de Décio Trujilo, a situação mostrou-se super constrangedora. Portador de um convite para mudar de emprego, um ou dois meses atrás, conforme lembram os colegas de Gazeta, ele abdicou da mudança para permanecer no jornal, atendendo a um apelo e também por acreditar na empresa. Viu, agora, com todas as letras, que errou e que, na sua boa intenção, acabou fazendo papel de ingênuo, para não dizer de bobo. Certamente não lhe faltarão novas oportunidades em outros veículos, até pela respeitável biografia profissional que possui.

Futuro

Está impossível acreditar em dias melhores para a imprensa escrita, com tanto desinvestimento. Não há hipótese de se alavancar tiragens e anúncios com o caminho escolhido, com cortes e mais cortes e mais cortes. Ou não é verdade que as tiragens despencaram nos últimos anos e que, com veículos de pior qualidade, elas continuarão despencando?

Nesse sentido, levo comigo a certeza de que as empresas que investirem em gente, em talento, em juventude amparada na experiência, em relacionamento, em comportamento, terão muitas alegrias e os cofres abarrotados de dinheiro. Fora disso, a meu ver, não há saída factível.’



JB PENHORADO
Ana Claudia Pessoa

‘O feitiço da mulata’, copyright Revista Consultor Jurídico (http://conjur.uol.com.br), 2/09/04

‘A Justiça autorizou a penhora da marca ‘Jornal do Brasil’ e o bloqueio de verba publicitária das Casas Bahia para garantir a execução da sentença do processo movido contra o diário por Adele Fátima, ex-integrante do grupo de mulatas, do célebre sambista Osvaldo Sargentelli.

O valor pleiteado pela autora foi de 5 mil salários mínimos por danos morais e materiais, mas a decisão de segunda instância reconheceu apenas o dano moral e arbitrou a indenização em 300 salários mínimos. O JB não pode mais recorrer da sentença, pois o processo já está em fase de execução.

A ex-dançarina impetrou a ação motivada pela entrevista publicada na edição de 8 de outubro de 1997, sob o título ‘O polêmico requebrado – Dançarinas de samba ganham dia e festa, mas perdem espaço nas casas noturnas’.

À época, Adele iniciava a constituição de uma empresa de produções artísticas e alegou que a publicação de informações inverídicas acarretou prejuízos financeiros decorrentes da dificuldade em fechar negócios. Afirmou ainda que, a partir da publicação, teria passado a receber ‘somente propostas indecorosas’.

A artista disse ter sido ofendida pela divulgação da falsa declaração, segundo a qual teria dito à repórter que, em virtude de sua atividade como produtora de eventos, ‘arrumava de tudo, garçom, cantor, segurança e ‘michê’, gíria utilizada para designar a prostituição ou o preço de serviços pago a prostitutas.

A ex-dançarina, hoje com 50 anos, foi lançada na carreira artística por Osvaldo Sargentelli. Morto em 2002, o empresário ficou conhecido no Brasil e no exterior devido ao grande sucesso dos shows que promovia com dançarinas mulatas em suas boates: Sambão, Sucata e Oba-Oba. Adele, uma de suas preferidas, alcançou fama nacional e internacional. É lembrada também pela atuação em produções picantes do cinema brasileiro na década de 70.

Marca

A marca ‘Jornal do Brasil’, conforme noticiado pelo jornal O Globo, havia também sido penhorada, em fevereiro, por autorização do juiz Roberto da Silva Fragale Filho, da 33ª Vara do Trabalho, como garantia de quitação de uma dívida trabalhista.

A decisão que favorece Adele foi proferida pelo juiz Oswaldo Henrique Freixinho, da 29ª Vara Cível do Rio de Janeiro. O magistrado expediu ofício ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) determinando a penhora da marca.

O advogado da artista, José Antônio de Souza Batista, inicialmente, pediu o bloqueio da receita da anunciante Patrimóvel, que se negou a cumprir a ordem judicial. A segunda alternativa foi garantir a execução pedindo os créditos das Casas Bahia. Com a decisão, as Casas Bahia deverá depositar a quantia correspondente em juízo.

Em 2002, o JB impetrou Agravo de Instrumento no STJ contra decisão que negou um Recurso Especial. O relator do processo, Ministro Aldir Passarinho Jr., entendeu que ‘a jurisprudência do STJ não admite a tarifação da indenização por danos morais, com fundamento na Lei de Imprensa’.

O JB tem capital social registrado no valor de R$ 21 milhões e enfrenta grave crise financeira com diversas dívidas pendentes no mercado — são mais de 160 protestos registrados em cartórios. Além de uma avalanche de ações trabalhistas movidas por jornalistas e colaboradores, o diário responde também por uma ação de execução na 12ª Vara Cível e outras na Justiça Federal.

A indenização deverá ser paga pela sua sucessora, a holding CBM (Cia Brasileira de Multimídia). Com um capital social de R$ 46 milhões, a associação agrega a JB Comercial, Agência Multimídia, Editora JB, JB Online, Phidias S/A, a Boavista e a Docas Investimentos. Segundo informações do advogado da autora, a CBM aluga a marca ‘Jornal do Brasil’.

Processo nº 1997.001.145080-8

Leia a transcrição da reportagem que originou o processo

O polêmico requebrado da mulata

Dançarinas de samba ganham dia e festa, mas perdem espaço nas casas noturnas.

ANABELA PAIVA

Como aconteceu com os índios, que ganharam espaço no calendário oficial à medida em que perderam terreno na sociedade, o 7 de outubro, instituído Dia Estadual da Mulata do Samba pelo governo do Rio e comemorado hoje numa festa no Asa Branca, chega para oficializar que as mulatas já não estão no mapa da cidade. Seus habitats naturais – casas como o Oba-Oba e o Scala – fecharam. Só no segundo andar da churrascaria Plataforma, sobre saltos idem, elas ainda deixam caídos os queixos dos turistas. Lutando para não perder o rebolado num mercado anêmico, mulatas, seus admiradores e empresários da noite se dividiram quanto à instituição de um dia homenageando as mulatas que ganham a vida dançando samba. ‘É um caminho para a profissionalização’, opinou a bailarina Luciana Sargentelli. ‘Acho discriminatório. É como se fizessem um dia só para o cantor de rock’, compara Jorge Perlingeiro, apresentador do programa Samba de Primeira, exibido na TV Bandeirantes.

Nem no programa do Jorge a mulata ainda é a tal. Transferido para as madrugadas de sexta-feira, Samba de Primeira deixou de exibir dançarinas. ‘Optei por um programa de variedades, que atrai um público mais amplo’, justifica, contando que há meses não faz uma apresentação do show Samba de Primeira. ‘Pagam muito pouco’. Luciana Sargentelli que o diga. Para apresentar seu show, em que samba, faz concursos de cantada e ensina a sambar ao som de playback, ela cobra cerca de R$ 1 mil. Com acompanhamento de músicos e outras mulatas, o valor sobe para R$ 3 mil. ‘Às vezes vou por menos. Não tem muita opção’, admite a bailarina de 27 anos, que tenta a carreira de cantora do conjunto de pagode Sambatom, formado só por mulatas. Nada de biquíni de paetês. ‘Usamos uma roupa moderninha, nada muito nua. Tipo ‘Spice Girls’, garante Luciana, lembrando o conjunto inglês.

No show da Plataforma, as dançarinas ganham apenas R$ 350 por mês. ‘As mais bonitas vão trabalhar fora, fazer até quatro apresentações por dia para ganhar US$ 2 mil’, explica Alberico, que contabiliza 30 companhias de shows de mulatas atuando na Europa, no Japão e nos EUA. Um caminho que o pai de Luciana, Oswaldo Sargentelli, conhece de cor e continua a percorrer. Sargentelli até aprova o Dia da Mulata do Samba. Só lamenta não ter sido convidado a participar: ‘Estou marginalizado, não sabem mais que eu existo’, reclamou. Afinal, há pelo menos 15 anos o criador do Oba-Oba instituiu o seu aniversário, 8 de dezembro, dia de Nossa Senhora da Conceição, como Dia Nacional da Mulata. ‘Ele reunia todas nós, de branco, para ir à praia jogar flores para Nossa Senhora’, lembra a lendária Adele Fátima, uma das mais belas dançarinas que integrou o elenco do Oba-Oba, hoje dona de uma empresa de produção de festas (‘Arrumo tudo, garçom, cantor, segurança, michê’).

Hoje as mulatas não são como Adele, explica Alberico Campana, dono da Plataforma: ‘Elas não têm mais aquelas coxonas. São mais magras. A mulata do Lan acabou’, garante, referindo-se ao chargista do JORNAL DO BRASIL, que fez da mulata um dos seus temas principais. Lan achou ‘completamente estúpida’ a idéia. ‘Dia da mulata é todo dia’, diz o argentino, que vê na mestiça um símbolo da cidade. Sua musa Adele a princípio gostou da data oficial. ‘Deve-se festejar o que tem valor, e mulata é patrimônio nacional porque traz divisas’, disse, orgulhosa de ter sido a primeira a fazer comercial e filme de James Bond. Mas, quando percebeu que o nome se referia às dançarinas de samba, fechou a cara. ‘A profissão mulata nunca existiu. Existe cantora, atriz e bailarina. Mulata é apelido que português deu para a mula e que a gente aceita porque mídia é mídia’.’



JB EM CRISE
Eduardo Graça

‘JB é tradição! Tanure, não!’, copyright Direto da Redação (http://www.diretodaredacao.com/), 1/09/04

‘Eu sei. O combinado era escrever sobre Nova Iorque. Mil perdões, Eliakim, mas não vou não. Neste exato momento dona Laura Bush, sorriso amarelo e vestido azul-piscina, ocupa a tevê aqui de casa. Ela acaba de apresentar o seu George, o Bush deles, como um George Washington redivivo. A cidade, meu caro, está entregue a estes seres estranhíssimos. Há o governador-exterminador Shwarzenegger posando de imigrante-modelo. Há Jenna e Barbara, as primeiras-gêmeas, testemunhas agradecidas do pai que deixou o álcool pela religião. Há a platéia do Madison Square Garden, irritante, claque passiva em transe hipnótico. Nova Iorque, esta semana, não dá. Ou, como se diz lá no Rio, ninguém merece. Pronto. Vou abrir uma exceção e tratar aqui das tramas cariocas.

Você há de ponderar, eu sei, que a paisagem no Rio não anda lá menos republicana. Mas, Eliakim, justamente esta semana algo de novo acontenceu em meio à desgraceira garotinha, voce viu? Não é que duas centenas de jornalistas – sim, acredite, deu no Globo e na Folha, duzentinhos! – saíram às ruas para protestar contra as demissões de colegas no Jornal do Brasil? E não se trata apenas de solidariedade classista das boas. Não, o buraco, lá, é bem mais embaixo, e diz respeito a nós todos, jornalistas brasileiros no Rio, em São Paulo, Nova Iorque ou Miami.

Deu no Investnews, ou na Gazeta, ou no Jornal do Brasil, vai saber, que o antigo jornal da Condessa e a vetusta empresa dos Levy, em um esforço de ‘sinergia’, passarão a apresentar, nas páginas de Economia, a mesma reportagem. É isso mesmo, Eliakim. Na lógica neocon do atual patronato, não há mais porque diferenciar o empresário que busca a notícia especializada em primeira mão da Gazeta e a cirurgiã-dentista interessada nas novas diretrizes do mercado de trabalho lá do JB. Como o comando das empresas é o mesmo, aplica-se a tal da ‘sinergia’ (será que um dia, meu caro, os mandarins da imprensa verde-e-amarela vão valorizar o vernáculo com o mesmo afã com que tungam os direitos de seus obreiros?), demite-se algumas dezenas de jornalistas e o leitor que se dane.

Fazer jornal, como nós dois sabemos, Eliakim, não é o mesmo que construir navios. E não me venham com este papo furado de convenção republicana de que jornalismo é um negócio como outro qualquer. Não é não. Pelo menos este é o único setor do mercado de trabalho em que se faz plantão no fim de semana sem receber tutu algum, em que se trabalha mais de dez horas/dia no mesmo local de trabalho como pessoa jurídica e em que o repórter agora tem de sair com máquina digital em punhos para tirar foto – sim, tirar foto, porque, Eliakim, diga se estou errado, fotografar ainda é premissa de fotógrafo, não é mesmo? E assim cortam-se empregos, reduzem-se os gastos, investe-se menos no material humano e afina-se o jornal, digo, a empresa, para receber mais benesses do poder público – em todos os seus níveis.

O Jornal do Brasil e a Gazeta Mercantil são títulos importantes da imprensa brasileira que, apesar da crise que os consomem há décadas, mantinham-se de pé – e o leitor sabe disso – por conta de jornalistas talentosos impedidos de buscarem novos rumos por conta de um mercado cada vez mais exígüo. Estes mesmos jornalistas seguem dando impressionante exemplo de conduta profissional. Você sabia que o pessoal da Gazeta se recusou a preencher o espaço vazio da editoria de Economia do JB, mandando a sinergia para a cucuia? E que teve gente muito boa lá no JB se demitindo em solidariedade aos colegas? E que nós, jornalistas, paramos a Avenida Rio Branco três vezes? Não foi uma nem duas não! Três vezes! Nós seguramos até faixa na frente de ônibus, apoiados por um novo sindicato, decidido a fazer história neste momento crítico da imprensa nacional. Falei bonito, Eliakim?

Mil perdões pela retórica de megafone. Deve ser reação natural ao fuzuê republicano que segue lá na tevê da sala. Eu prometo que volto em breve a escrever sobre a ilha. Não demora e a senadora Elizabeth Dole – a mulher do Bob, você sabe – vai pregar contra a minoria homosexual. Tô de olho, Eliakim. Mas vou seguir com a maior curiosidade aqui Direto da Redação de Nova Iorque a batalha travada no JB e na Gazeta. Neste domingo, nós, jornalistas, estaremos lá em Ipanema fazendo o que nos apetece mais: informar o leitor. Nossa cartilha é clara. Nós não concordamos com a cassação de nosso direito de desfrutar e construir uma imprensa pluralista e independente. E, cá entre nós, não posso negar, estou doidinho para terminar o texto, tascar solenemente o OFF no controle remoto da sala enquanto dona Laura Bush tece loas ao cunhado-governador da Flórida, e gritar daqui da minha janela virada para o lado sul da ilha, bem na direção da Rio Branco: ‘JB é tradição! Tanure, não!’. Foi mal, Eliakim…’