‘Omodo petista de informar é insuperável. Já inventaram conselhos, paisagens campestres e uma falsa entrevista do ministro Gilberto Gil na qual ele se referia ao ‘fascismo das grandes corporações da mídia’. O aparelho do comissário Luiz Gushiken fez mais uma: adulterou (de novo) um texto de discurso do presidente da República.
No último dia 18, numa inauguração em São Paulo, Lula disse: ‘Se as pessoas querem continuar tendo progresso nas políticas sociais, não têm outro jeito, dia 3 de outubro é votar na Marta Suplicy para continuar administrando São Paulo’.
Deu bolo. O comissariado podia ter retirado o discurso de Lula da página de ‘íntegras’ do sítio do Palácio do Planalto. Seria uma solução torta, mas seria uma solução. Preferiram adulterar o texto, suprimindo o trecho maldito. Foi a solução desonesta destinada a lograr quem consulta (e sustenta) o sistema oficial de divulgação de notícias.
Não é a primeira vez que alteram discursos de Lula. Em março do ano passado a página de discursos de Lula informou que o companheiro dissera o seguinte:
‘Napoleão Bonaparte disse: ‘A China é um gigante adormecido, que o dia que acordar o mundo vai tremer’. E a China acordou, e o mundo está, pelo menos, preocupado com o potencial de crescimento da China. Antes de Napoleão Bonaparte ter visitado a China, o hino brasileiro já falava que nós somos um gigante.’
Foi mal. Napoleão nunca pôs o pé na China.
Semanas depois, fizeram um peeling no discurso. Lula passou a dizer assim:
‘Napoleão Bonaparte, ele fez ecoar uma frase que ficou muito famosa junto aos chineses. Disse ele: ‘A China é um gigante adormecido. No dia em que a China acordar, o mundo vai tremer’. Possivelmente, se ele, na mesma época, tivesse visitado o Brasil, também diria o mesmo.’
Lula deveria criar um Conselho de Jornalismo Petista só para ‘orientar, disciplinar e fiscalizar’ as atividades da brigada do comissário Gushiken.’
Ives Gandra da Silva Martins
‘Os três governos do PT’, copyright O Estado de S. Paulo, 22/09/04
‘O Brasil é governado por três PTs, a saber: o PT da economia, o PT do poder e o PT ideológico.
O primeiro tem num ‘quadrilátero de ouro’ a essência de seu sucesso.
Palocci, Meirelles, Furlan e Rodrigues dirigem, com consciência, a economia do País, acertando muito mais do que errando e gerando respeitabilidade internacional, por cumprirem metas acordadas, inspirando confiança em investidores nacionais e internacionais. O ‘boom’ da economia mundial, semelhante àquele que houve antes do primeiro choque do petróleo, no final da década de 1960, indiscutivelmente facilita a desenvoltura com que dirigem a economia brasileira, só não sendo mais brilhantes em face de uma dose excessiva de juros e tributos e de uma esclerosada burocracia – que Nelson Jobim, presidente do STF, sugere, quando ineficiente e corporativa, seja tratada a pontapés.
Palocci consegue driblar as oposições internas e administrar uma política econômica fora do ideário petista, que tem gerado empregos e desenvolvimento. Meirelles administra bem a política cambial e monetária, tendo a inflação sob controle. Rodrigues – apesar dos incendiários do MST e de seu descompassado líder, cujas teorias econômicas são da idade da pedra e das cavernas – fez do agronegócio um espetacular sucesso empresarial. E Furlan dá autênticos ‘shows’ no palco das exportações. O ‘PT não petista’ vai muito bem!
O segundo PT é o PT do poder. Do ponto de vista estratégico – segundo o plano previamente estabelecido -, também vai bem. Vai bem para o PT, o que não quer dizer que vá bem para a Nação. é, como nunca negaram os seus líderes, um partido socialista e, por essa razão, pretende impor o dirigismo econômico e político com o mínimo de resistências e o máximo de redução dos valores de uma sociedade pluralista. O ‘PT do poder’ quer uma sociedade, se possível, unitária, no estilo do ditador cubano, mas, se não for possível, com a oposição reduzida a sua expressão quase nenhuma. O PT do poder, estrategicamente, é hábil, lançando suas idéias, recuando quando necessário, mas acuando a sociedade, em suas teses. José Dirceu, Tarso Genro, Jaques Wagner e outros são seus idealizadores, havendo um contínuo processo de lançar tentáculos sobre as instituições para reduzir seu poder de reação.
Exemplo destas incursões redutoras da força de uma sociedade pluralista está no controle Judiciário (controle externo), no controle da imprensa (Conselho Federal de Jornalismo), no controle das universidades privadas (estatização de vagas das universidades privadas), no controle das agências regulatórias (retirada do seu poder de ação), no controle da intimidade do cidadão (quebra do sigilo bancário por mero decreto, a favor da polícia), no controle da terra (passando-a para seus correligionários do MST), no controle das finanças públicas (contratação sem licitação, em contratos ditos de emergência com empresas amigas), no controle dos servidores (contratação de emergência de correligionários sem concurso público, que passam a doar 30% de seus vencimentos ao partido), no controle das eleições (graças às doações de correligionários e empresas, o PT é hoje o maior detentor de recursos para a promoção de seus candidatos), no controle da advocacia (obrigar a revelar sigilo profissional) e em diversos outros controles que facilitarão a introdução de uma República socialista no País.
O PT do poder, por seus artífices, é absolutamente coerente com tudo o que sempre pregou, razão por que não aceito a alegação dos que dizem que age de má-fé. Age é na convicção daquilo que sempre foi seu objetivo político – que, embora, a meu ver, equivocado, é o que sempre idealizou.
Por fim, há o PT ideológico (de um Rossetto ou daqueles dentro do partido que, ostensivamente, combatem a política econômica do governo e o modelo adotado), gerando intrigas, algumas desventradas pela imprensa, cujo objetivo seria a implantação de uma nova Cuba ou de uma nova Venezuela, causando luta de classes e perseguindo aqueles que não pensam como seu movimento. é neste segmento que o desrespeito à lei, como as invasões de terras, é tolerado e os ataques verbais destemperados contra as autoridades, feitos pelo medíocre economista que os lidera, não são punidos pelo governo.
À ação dos três PTs, o presidente Lula assiste, deslumbrado com a recepção – de resto, merecida – que vem recebendo no mundo e com o apoio, ainda sem eficácia, de países emergentes à candidatura de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU para o Brasil. Correndo o mundo, cometendo escorregões verbais, mas acertando muita vezes, deverá, com seu novo avião, intensificar essa peregrinação turístico-governamental pelos quatro cantos do mundo, com o que, certamente, os três PTs do governo manterão a sua linha de conduta. E dizer que Fernando Henrique foi duramente criticado pelo candidato Lula por fazer algumas viagens ao exterior…’
Ricardo Noblat
‘Jornalistas dão vexame’, copyright Blig do Noblat, 24/09/04
‘Treze jornalistas representantes de emissoras de rádio de diversos Estados protagonizaram um vexame ao entrevistar ontem Lula. Primeiro, vários deles presentearam o presidente com cds e bebidas típicas de suas regiões. Depois, fizeram perguntas amenas, deixando de lado os temas mais polêmicos. A ponto de o próprio Lula se queixar como hoje registram alguns jornais:
– Vocês vieram de alma aberta e não foram constrangidos por ninguém dizendo que deveria fazer essa ou aquela pergunta. Vocês perguntaram o que quiseram e como quiseram. Espero que tirem lições dessa nossa conversa e que na outra vocês possam ser um pouco mais duros com o presidente.
Voltou a insistir:
– Agora estejam certos de uma coisa: de minha parte não haverá em nenhum momento qualquer informação e qualquer tema que não possa ser debatido. Eu pensei que vocês iriam entrar em temas polêmicos, não entraram, nas coisas mais polêmicas que deram briga nesses dias, mas eu estou disposto a debater qualquer tema. Para mim não tem tema proibido. Não tem tema que não possa ser discutido.
(Boa parte dos jornalistas brasileiros trata os poderosos com um temor reverencial. Perguntam como se pedissem desculpas por perguntar. Isso não decorre apenas de eventual despreparo. A maioria dos veículos de comunicação do país pertence a grupos políticos ou depende deles. Em ocasiões como a de ontem, os jornalistas temem irritar seus patrões e perder o emprego ferindo temas considerados delicados.)’
Felipe Bueno e Tânia Monteiro
‘Bem-humorado, ele cobra perguntas mais duras’, copyright O Estado de S. Paulo, 24/09/04
‘Na entrevista coletiva que concedeu a radialistas de todo o País, ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava descontraído e bem-humorado. Não demonstrou irritação com as perguntas e chegou a reclamar de que esperava ser mais cobrado. Lula animou-se ao ganhar do jornalista Geraldo Freire, da Rádio Jornal do Commercio, de Pernambuco (seu Estado natal), uma garrafa de cachaça e uma de licor, fabricadas na cidade de Triunfo, no interior pernambucano.
O repórter disse que ficou com receio de dar a cachaça e o licor – hábito cultivado nos encontros anteriores – por causa da recente polêmica com o jornal americano The New York Times sobre o hábito do presidente de consumir bebidas alcoólicas.
Freire disse que ouviu do presidente, além do agradecimento, comentários sobre o crescimento das exportações da cachaça e sobre o fato de ser essa a legítima bebida brasileira. O presidente aproveitou para lembrar que a caipirinha hoje é moda no mundo. Freire deu ao presidente também um CD da dupla de repentistas Ivanildo Vilanova e Geraldo Amâncio.
Lula entrou na sala poucos minutos depois das 8 horas. Cumprimentou rapidamente uma fileira de jornalistas, fez menção de sentar-se à mesa, mas se levantou e saudou os restantes, que estavam do outro lado, um por um. ‘Um pouco de atraso não vai prejudicar a entrevista’, justificou. Acomodou-se e daí perguntou: ‘Querem um pouco de cansaço?’
O presidente afirmou que a sua viagem aos Estados Unidos tinha sido muito puxada. E não deve ter dormido cedo na quarta-feira. Afinal, fez várias referências à derrota do Flamengo para o Santos pela Copa Sul-Americana, jogo que acabou por volta da meia-noite.
Reforma – Como sempre, não faltaram referências ao futebol. Indagado sobre eventual reforma ministerial após as eleições, ele usou o velho ditado ‘em time que está ganhando não se mexe’. Voltou a citar o esporte ao explicar a elevação da meta de superávit fiscal para 4,5% do PIB. Disse que, no Brasil, há três assuntos de que todas as pessoas entendem: futebol, economia e saúde.
Lula mostrou otimismo e entusiasmo com a economia. Falou com expectativa sobre projetos futuros, especialmente quando se dirigiu aos jornalistas do Norte e do Nordeste. Pediu a ajuda dos radialistas para divulgar as boas notícias que, segundo ele, virão por aí.
Além das 13 perguntas previstas, três jornalistas, escolhidos por sorteio, tiveram a chance de fazer uma segunda questão. Após prometer que outras conversas virão, Lula, já fora do ar, convocou: ‘Agora vamos tomar um café de verdade!’ Veio a confraternização: apertos de mão, abraços, fotografias, presentes, brincadeiras.’