‘Nos últimos quatro anos, o governo do Acre, administrado pelo petista Jorge Viana, aumentou o valor de um contrato de publicidade de R$ 4 milhões para R$ 27,4 milhões, com 13 termos aditivos.
Fez isso contrariando alguns pontos da Lei de Licitações e postergando por meses a publicação dos relatórios dos aditivos no Diário Oficial do Estado. No total, os 13 aditivos aumentaram em 585% a verba de publicidade em relação ao contrato original.
Os primeiros aditivos ocorreram em 2002, ano da campanha que reelegeu Viana governador do Acre, e os maiores em 2004, quando o petista Raimundo Angelim conquistou a capital do Estado, Rio Branco.
Ao longo das últimas três semanas, o governo Acre se recusou terminantemente a fornecer à Folha os valores dos aditivos. A reportagem obteve cópias dos documentos de outras fontes.
A empresa diretamente beneficiada pelo contrato e por seus aditivos é a Asa Comunicação, com sede em Belo Horizonte.
O contrato foi assinado em abril de 2001 entre o atual secretário de Comunicação do Acre, Aníbal Diniz, e o então sócio da Asa, Paulo Vasconcelos do Rosário Neto.
Por sete anos, divididos em dois períodos (1986 a 1987 e 1990 a 1995), Rosário Neto dirigiu a empresa de publicidade DNA. A DNA, também ligada à SMPB, tem Marcos Valério Fernandes de Souza, um dos pivôs do escândalo do ‘mensalão’, como sócio.
Rosário Neto nega qualquer relação entre o contrato do Acre de 2001 e sua passagem pela DNA. Ele afirma não ter nenhuma relação com a DNA atualmente.
Na época em que trabalhava na DNA, Rosário Neto tinha como colega de diretoria na empresa Marcio Hiran Guimarães Novaes. Hoje, Novaes é sócio de Marcos Valério na Estratégica, empresa do ramo de campanhas políticas.
Na Asa, Rosário Neto assinou apenas o contrato original com o Acre. Os demais aditivos foram lavrados entre o Estado e o presidente da Asa, Edgard Melo. Melo afirma que sua empresa é ‘arrumada e limpa’.
A Asa também tem em seu quadro de diretores o ex-candidato a deputado pelo PT de Minas Américo César Antunes, contratado pela empresa poucos meses depois do início do governo Lula.
‘Eu acho o pessoal do Acre bacana, mas talvez eles tenham descarrilhado. É lamentável’, afirmou Rosário Neto ao ser informado sobre os aditivos irregulares ao contrato que assinou em abril de 2001.
A Lei de Licitações (8.666) veta tanto a extensão desse tipo de contrato por um período superior a 12 meses quanto qualquer acréscimo maior do que 25% sobre o valor do documento original.
O governo do Acre diz ter outro entendimento em relação ao prazo. Na sua interpretação, o contrato vale por 60 meses por se tratar de ‘serviço continuado’.
A lei não trata serviços de publicidade como tal e, mesmo no caso dos ‘serviços continuados’, exige tomadas de preços anuais junto a empresas concorrentes -fato não observado pelo Acre.
Sobre os aditivos maiores que 25%, o secretário de Comunicação do Acre, Aníbal Diniz, afirma que o contrato ‘tem essa elasticidade’. ‘À medida em que as demandas aumentam, há um aumento de despesas’, diz.
Eleições
Os aditivos iniciais e mais elevados ao contrato de 2001 com a Asa Comunicação coincidem com períodos eleitorais em que o PT saiu vitorioso no Acre. Suas publicações também incorrem em mais uma infração à Lei de Licitações.
Um dos aditivos de 2004, o 11º (R$ 1,5 milhão), por exemplo, só foi publicado no Diário Oficial do Estado 164 dias após a sua assinatura. O 12º (R$ 1,6 milhão), só depois de 91 dias.
Segundo a Lei 8.666, a publicação dos resumos de contratos aditivados na imprensa oficial deve ocorrer, no máximo, até o 5º dia útil do mês seguinte ao de sua assinatura.
Segundo especialistas da área de licitações públicas, a prática de postergar por meses a publicação de resumos contratuais em Diários Oficiais geralmente visa esconder do público eventuais irregularidades e criar ‘fatos consumados’ quando elas vêm à tona.’
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‘Secretário de Comunicação nega ilegalidade’, copyright Folha de S. Paulo, 4/07/05
‘O secretário de Comunicação do Acre, Aníbal Diniz, afirma que todos os aditivos contratuais de publicidade do Acre são legais. ‘Esses valores todos estão de acordo com a lei, com o Orçamento aprovado pela Assembléia e foram proporcionais às necessidade de comunicação do Estado’, disse.
Questionado sobre as razões de os principais aumentos estarem concentrados em 2002 e 2004, ele disse que sua área gasta ‘menos no início de governo e mais na reta final, quando o governo atinge sua plena realização e demanda comunicação’. Sobre o fato de os valores superarem os 25% permitidos pela lei, Diniz disse que ‘o contrato tem essa elasticidade’.
Em relação à distância entre a assinatura dos aditivos e sua publicação no Diário Oficial, Aníbal disse que não é responsável pela discrepância. ‘Todos os aditivos são encaminhados para publicação e isso passa pelo critério de prioridades da administração’, afirmou.
O presidente da Asa Comunicação, Edgard Melo, afirmou que os valores da publicidade do Acre ‘são determinados pelo governo [do Estado]’.
Melo justificou os aditivos acima de 25% pelo fato de as tabelas de publicidade dos meios de comunicação terem aumentado além desse patamar.
Melo disse ter pareceres de advogados que justificam, por este motivo, que sejam feitos aditivos acima dos 25%.
‘Minha vida é uma vida arrumada e não quero entrar nessa vala comum do que está ocorrendo na publicidade de Minas’, disse o presidente da Asa.’
Laura Mattos
‘DVD de Jefferson é líder de vendas’, copyright Folha de S. Paulo, 4/07/05
‘O ‘Roda Viva’ com o deputado Roberto Jefferson, autor das denúncias do ‘mensalão’, mais do que triplicou a venda de DVDs do programa da TV Cultura e é considerado um ‘fenômeno’ pela direção da emissora.
Realizada há duas semanas, a entrevista foi copiada em DVDs, vendidos pelas megastores da Saraiva e pelos sites da Cultura Marcas (culturamarcas.com.br) e Submarino (submarino.com).
Com um sistema simples de produção, a rede pôde colocá-los à venda já no dia seguinte ao programa. Até a última quinta, 789 DVDs de Jefferson haviam sido vendidos, a R$ 39,90 cada um, o que gerou receita de R$ 31,4 mil.
Pode parecer um valor inexpressivo para o mercado, mas o ‘Roda Viva’ com o político alavancou, na opinião da direção do canal, a Cultura Marcas.
Até a entrevista com o deputado, a mais vendida havia sido a da geneticista Lygia da Veiga Pereira, com apenas 77 cópias.
Lançado em março, o sistema ‘on demand’ permite que o telespectador encomende de programas exibidos na véspera aos mais antigos. A partir da digitalização do acervo, a Cultura está gerando receita com a produção de baixíssimo custo dos DVDs.
O produto não tem extras, traz só a entrevista sem os intervalos comerciais. Os outros 90 títulos comercializados são mais caros do que o de Jefferson: R$ 49,90.
Em três meses, a emissora pública vendeu 1.142 cópias do ‘Roda Viva’, segundo Ricardo Fiuza, gerente da Cultura Marcas. Há também DVDs dos infantis, sucesso de vendas. O ‘Cocoricó’ está em quarto lugar no ranking do Submarino, só abaixo da trilogia ‘O Senhor dos Anéis’.
A Cultura também licencia seus personagens à Estrela e prepara para setembro o lançamento do DVD com ‘Cassiopéia’, o primeiro longa de animação brasileiro. O faturamento da recém-criada Cultura Marcas deve chegar neste ano a R$ 1 milhão.’
Elvira Lobato
‘Fundos de pensão contratam antigos sócios de Gushiken’, copyright Folha de S. Paulo, 3/07/05
‘Pelo menos cinco fundos de pensão ligados a empresas estatais têm contratos com a Globalprev Consultores Associados, de dois ex-sócios do ministro Luiz Gushiken (Comunicação e Gestão Estratégica).
A empresa -que até 2002 se chamava Gushiken & Associados- presta serviços de assessoria atuarial e tem sido contratada, principalmente, para preparar planos de aposentadoria alternativos que desobriguem estatais de pagar salários da ativa a aposentados. A mudança de nome na Junta Comercial incluiu entre os objetivos empresariais treinamento de pessoal e serviços de organização de festas e eventos.
Levantamento feito pela Folha mostra que são clientes da Globalprev os fundos de pensão de estatais Petros (dos funcionários da Petrobras), Postalis (dos Correios), Portus (do sistema portuário), Cifrão (Casa da Moeda) e Capaf (dos empregados do Banco da Amazônia). O único contrato com valor conhecido é o do Postalis (R$ 120 mil).
A empresa também tem sido contratada por sindicatos e entidades privadas para dar assessorias e treinamentos.
Origem
A Globalprev foi criada pelo atual ministro-chefe da Secretaria de Comunicação (Secom) com o nome Gushiken & Associados, em maio de 1999, para prestar assessoria em gestão empresarial. Em dezembro de 2002, após a eleição de Lula, Gushiken deixou a sociedade para assumir a pasta.
A Globalprev tem como sócios hoje Wanderley José de Freitas e Rafael Tadeu Ferrari, que já trabalharam com Gushiken. A influência do dirigente da Secom sobre os fundos de pensão é conhecida. O titular da SPC (Secretaria de Previdência Complementar, que fiscaliza e regulamenta os fundos de pensão), Adacir Reis, foi seu assessor na Câmara, e o diretor de Atuária da SPC, José Valdir Gomes, foi sócio de Gushiken.
Gushiken se especializou em previdência complementar quando era deputado federal (de 1987 a 1998) e participou da CPI dos fundos de pensão. Junto com Wanderley Freitas, escreveu, para o governo FHC, uma cartilha sobre a implantação da previdência complementar para servidores.
O maior cliente da Globalprev, entre os fundos estatais, é a Petros (patrimônio de R$ 25 bilhões), que, além de atender aos 95 mil funcionários e aposentados da Petrobras, administra 24 fundos de pensão de outras empresas. A Globalprev dá consultoria à Petros e a mais seis fundos de pensão fechados que ela administra.
O último contrato da Petros com a Globalprev é de abril deste ano e vem sendo motivo de intensas críticas à administração da Petros por parte da Associação dos Engenheiros da Petrobras.
Assim como Gushiken, o presidente da Petros, Wagner Pinheiro, foi dirigente do movimento sindical dos bancários em São Paulo, o que, segundo a oposição dos petroleiros, explicaria a preferência pela Globalprev.
O contrato questionado é referente à implantação do plano de previdência complementar para os trabalhadores da Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento, cuja acionista majoritária é a Prefeitura de Campinas.
A Sanasa contratou a Petros para administrar o fundo de pensão e esta terceirizou grande parte do serviço para um consórcio de três empresas: PriceWaterhouseCoopers, Kiman e Globalprev.
Pelo contrato, a Petros receberá 6% do valor das contribuições da Sanasa e dos empregados, como taxa de administração, e pagará ao consórcio R$ 16,22 ao mês por empregado. Uma das críticas feitas pela Aepet é de que o consórcio foi escolhido sem licitação.
O presidente da Petros disse que, quando assumiu o cargo, em fevereiro de 2003, os petroleiros reclamavam que o fundo de pensão contratava assessoria atuarial de multinacionais. ‘Agora criticam a contratação de uma consultoria brasileira, reconhecidamente competente’, afirmou.
A direção da Petros não informa os valores dos outros contratos que possui com a Globalprev, mas confirma que a empresa foi contratada, ainda em 2003, para avaliar a situação econômica do fundo de pensão. Houve um segundo contrato, para assessorar o grupo de trabalho que preparou o novo plano de aposentadoria da Petros, de contribuição definida, que está para ser aprovado pela direção da Petrobras.
Outros contratos
A Globalprev também foi contratada pelo Postalis (com patrimônio de R$ 2,5 bilhões) para opinar sobre o novo plano de aposentadoria que foi lançado em junho deste ano. Segundo o presidente da entidade, José de Souza Teixeira, o plano foi preparado com assessoria atuarial da Mercer, e o conselho deliberativo do Postalis achou por bem contratar uma segunda opinião.
O contrato, no valor de R$ 120 mil, foi feito sem licitação. Segundo Teixeira, os fundos de pensão são entidades privadas e não estão submetidas à lei de licitações públicas. Ele disse que não houve indicação de pessoas do governo para a contratação: ‘Eu não aceitaria. Somos inacessíveis a esse tipo de pressão’, acrescentou.
Os fundos de pensão da Casa da Moeda (Cifrão), das empresas portuárias (Portus), e do Banco da Amazônia (Basa) também contrataram a Globalprev. O Portus tem um déficit técnico de cerca de R$ 1 bilhão. A diretoria do fundo contratou a Globalprev em 2003 para assessorar na montagem de um novo plano de aposentadoria, que ainda não foi implantado. A diretoria não informou o valor do contrato.’
Folha de S. Paulo
‘O amigo publicitário’, Editorial, copyright Folha de S. Paulo, 4/07/05
‘É muito grave o fato de o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza ter servido de avalista para um empréstimo do Partido dos Trabalhadores e saldado para a legenda uma parcela de R$ 350 mil referente à operação.
Valério, acusado pelo deputado Roberto Jefferson de ser um dos operadores do ‘mensalão’, havia afirmado que sua relação com o PT não ia além da amizade com o tesoureiro Delúbio Soares e da participação de suas agências em campanhas da legenda. Sua situação, no entanto, vai se tornando a cada dia mais difícil -ele que já procurou justificar com supostas aquisições pecuárias os cerca de R$ 20 milhões que sacou em numerário do Banco Rural.
Ao confirmar, em nota oficial, as revelações da revista ‘Veja’, o tesoureiro petista confirmou também as suspeitas de que os laços de amizade que mantém com o publicitário são bem mais estreitos do que ambos desejariam admitir. Na nota, Delúbio diz ter omitido informações do presidente da agremiação, José Genoino, que também assina a documentação do empréstimo, e afirma que Valério passou a ser credor da sigla.
Mas, ao que parece, a dívida do partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o amigo do tesoureiro tem sido retribuída com generosidade. As agências das quais ele é sócio obtiveram nos últimos anos contratos milionários com estatais e ministérios. A promiscuidade entre a vida financeira das empresas de Marcos Valério e a do PT tornou-se flagrante.
O episódio não é apenas constrangedor. Trata-se de uma acintosa violação aos mais elementares princípios republicanos. O fato de um publicitário responsável por contas de órgãos governamentais pagar dívida do partido do presidente da República já é, em si, um escândalo.
Não é admissível que o Planalto, em seu imobilismo, continue a contemporizar com uma situação que se vai mostrando insustentável. É preciso que os suspeitos sejam afastados de seus cargos para responder às acusações e que o presidente conclua a reforma ministerial que vem ensaiando há seis meses.’