‘Vence hoje o contrato da agência Duda Mendonça com o governo federal para cuidar da imagem institucional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da Presidência da República. O Palácio do Planalto deseja interromper esse relacionamento, evitando a renovação automática que é a praxe nesses casos. O marqueteiro presidencial resiste à idéia. Tem negociado intensamente o assunto nos últimos dois dias.
O contrato atual foi firmado em agosto de 2003 entre Duda e a extinta Secom (Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica), hoje apenas Subscretaria de Comunicação Institucional. Além do baiano, compartilham essa conta as agências Matisse e Lew, Lara. O gasto publicitário previsto para 12 meses é de até R$ 150 milhões.
A regra depois do escândalo do ‘mensalão’ no governo federal tem sido desligar da administração pública agências de publicidade que estiverem sob suspeição.
Foi o que aconteceu com a DNA e a SMPB, das quais o empresário Marcos Valério de Souza é sócio. Ambas as agências tiveram seus serviços suspensos no Banco do Brasil e nos Correios.
Duda Mendonça resiste a entregar suas contas federais, inclusive a da Secom, pois montou uma grande estrutura em um edifício luxuoso em Brasília para atender ao governo federal depois da vitória de Lula. O Planalto trata com reserva esse caso. Ninguém se manifesta em público.
Alternativa
A avaliação geral dentro do governo é que se tornou insustentável manter o publicitário -ele estaria cuidando da imagem do presidente depois de ter admitido em público o recebimento de R$ 10 milhões de caixa dois na campanha eleitoral de 2002.
Como o marqueteiro resiste, a Folha apurou que o Planalto chegou a cogitar oferecer a Duda uma operação de alto risco. O baiano anunciaria ‘espontaneamente’ sua decisão de abrir mão da conta da Secom. Mais adiante, seria facilitada a sua entrada em alguma outra conta estatal federal. Essa saída é uma espécie de último recurso e não há consenso entre os governistas sobre sua eficácia.
A maioria dos conselheiros de Lula acha que o ideal é dar a Duda Mendonça o mesmo destino que tiveram as agências de Marcos Valério. Nesse caso, o prejuízo seria grande para o publicitário responsável por renovar a imagem do PT na eleição de 2002.
Além da Secom, a agência Duda Mendonça tem outros dois contratos no governo federal -Petrobras e Ministério da Saúde.
Em 2003 e 2004, teve um faturamento total de R$ 120 milhões por serviços prestados a esses órgãos. Foram R$ 35 milhões em 2003 e mais R$ 85 milhões em 2004. Não há valores disponíveis para 2005.
Esses R$ 120 milhões se referem ao recebido por Duda para o pagamento de propaganda veiculada para os três contratos. Não é conhecido o valor da receita bruta e do lucro líquido do publicitário.
Antes do governo Lula, a agência de Duda Mendonça já era prestadora de serviços para a administração federal, no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O baiano chegou a cuidar das contas do Banco Central e da Petrobras Distribuidora. Não estão disponíveis os valores faturados, mas eram negócios de menor relevância se comparados aos do governo atual.’
Regina Alvarez
‘Duda Mendonça deve perder a conta da Presidência’, copyright O Globo, 18/08/05
‘O publicitário Duda Mendonça deve perder formalmente, a partir de amanhã, o posto de marqueteiro da Presidência no governo Lula. O contrato da agência Duda Mendonça & Associados com a Secretaria de Comunicação (Secom) vence hoje e não deverá ser prorrogado por causa da repercussão do depoimento de Duda, que admitiu crimes ao confessar ter recebido dinheiro de caixa dois do PT, pelo esquema de Marcos Valério, numa empresa nas Bahamas.
A decisão está nas mãos do ministro Luiz Dulci, titular da Secretaria Geral da Presidência da República, mas fontes do Palácio do Planalto consideram remota a possibilidade de renovação do contrato com Duda, depois que o publicitário confessou em depoimento na CPI ter recebido R$ 10,5 milhões de Marcos Valério no exterior.
O contrato de Duda Mendonça com a Secom foi assinado em 19 de agosto de 2003 pelo prazo de um ano e prorrogado em agosto de 2004. Nova prorrogação seria praticamente automática, não fosse o envolvimento do publicitário no escândalo do esquema de Marcos Valério. Pela lei de licitações, os contratos podem ser prorrogados até o prazo limite de 60 meses, se houver interesse das partes.
Duda cuida da imagem do presidente Lula desde a campanha presidencial de 2002 e mantinha com o presidente uma relação muito próxima. Sua permanência no posto é considerada imprópria por assessores do presidente, pois poderia servir para aproximar ainda mais a crise do Palácio do Planalto, passando a imagem de condescendência com os crimes admitidos pelo publicitário, como evasão de divisas e sonegação fiscal.’
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‘Contrato rende R$ 113 milhões ao publicitário’, copyright O Globo, 18/08/05
‘Desde que assinou contrato com a Secom, a agência do publicitário Duda Mendonça já recebeu R$ 113 milhões pelos serviços prestados à Presidência da República. A conta é dividida em três agências: Duda Mendonça, Lew Lara e Matisse, mas a maior fatia de serviços fica com a agência de Duda. Em 2003 e 2004, os gastos da Presidência da República com publicidade foram de R$ 175,2 milhões, segundo levantamento feito no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) pela assessoria técnica do PFL no Senado. Desse total, a agência Duda Mendonça ficou com R$ 85,2 milhões, o equivalente a 48,6%. Em 2005, a agência de Duda já recebeu R$ 27,8 milhões pelo contrato com a Presidência.
Duda mantém duas outras contas no governo, com a Petrobras e o Ministério da Saúde, mas como os contratos estão em andamento, não há, por ora, decisão de cancelá-los.
Depoimento de Valério na CPI complica Duda
A situação de Duda no governo Lula começou a se complicar quando o empresário Marcos Valério revelou à CPI dos Correios que Zilmar Fernandes da Silveira, sócia do publicitário, recebera R$ 15,5 milhões da SMP&B, uma das agências de Valério. Duda e Zilmar inicialmente negaram os saques nas contas da SMP&B, mas acabaram admitindo o recebimento dos recursos com um agravante. A maior parte, segundo o próprio Duda, foi recebida através de uma conta do publicitário nas Bahamas. O dinheiro seria para pagar dívidas de campanha de 2002 e outros serviços prestados ao PT em 2003.
CPI e Ministério da Justiça rastreiam R$ 10,5 milhões
A partir dos documentos fornecidos por Duda e Zilmar, a CPI dos Correios e o Ministério da Justiça passaram a rastrear o caminho dos R$ 10,5 milhões que o publicitário admitiu ter recebido no exterior. Os depósitos na offshore Dusseldorf , aberta por Duda nas Bahamas, partiram de quatro instituições: a empresa Trade Link Bank, o BAC Florida Bank, o Israel Discount Bank of New York e o Banco Rural Europa. A Polícia Federal pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) o bloqueio da conta usada por Duda para receber os recursos do PT.
A CPI, o Ministério Público e a Polícia Federal também estão rastreando outras contas de Duda no exterior, que ligariam o publicitário ao esquema de remessa ilegal de recursos do ex-prefeito Paulo Maluf (PP). Duda trabalhou em várias campanhas de Maluf e isso fez com que o PT resistisse, num primeiro momento, a torná-lo o marqueteiro oficial de Lula.’
Contardo Calligaris
‘‘Mensalão’, caixa dois e outras falcatruas: essência ou acidentes?’, copyright Folha de S. Paulo, 18/08/05
‘A filosofia clássica tenta estabelecer a diferença entre essência e acidentes.
Por exemplo, a laranja tem uma forma arredondada e, quando madura, apresenta uma cor entre o vermelho e o amarelo: isso, junto com o tempo necessário e o clima próprio para a maduração, é parte da essência da laranja.
Mas uma laranja pode estar amassada e pode ser cortada no meio para extrair suco, ou dividida em gomos para ser saboreada: esses são acidentes, ou seja, são traços apresentados pela laranja que tenho na mão, mas não são implicações da essência da laranja.
Note-se que há acidentes que só se tornam possíveis por causa dos traços essenciais da laranja. Ninguém, em princípio, quer o suco de uma fruta amarga e fedorenta: o gosto agradável da laranja (que faz parte de sua essência) é responsável por sua transformação (acidental) em suco.
A distinção entre essência e acidentes é também evocada no consultório dos terapeutas. Em geral, quando as coisas não dão certo, os humanos preferem pensar que é por acidente, não por essência. Se a relação com meu filho é uma série ininterrupta de brigas infelizes, prefiro pensar que isso não tem nada a ver com o meu ou o seu jeito de SER: é porque eu ESTOU nervoso por causa do trabalho ou porque ele ESTÁ tenso por causa da chata da namorada. Conseqüência: pede-se ao terapeuta que ele arrume a situação, de maneira que ambos ESTEJAM diferentes. Mas, pelo amor de Deus, que ele não comece a colocar perguntas sobre a infância ou outras ‘baboseiras’ que não têm ligação nenhuma (não é?) com o que está acontecendo, que é apenas um acidente passageiro, circunstancial.
A mesma distinção entre essência e acidentes foi central nos debates ao redor do fracasso do socialismo real. Quando ruiu o sistema soviético, alguns diziam que o desastre era acidental: fruto da mediocridade dos burocratas, das contingências (a Primeira Guerra Mundial) que produziram o socialismo logo num país atrasado como a Rússia de 1917 ou do fato de que a Rússia ficou isolada, defendendo sozinha a bandeira do socialismo num mundo hostil. No extremo oposto, outros afirmavam que o desastre era a conseqüência de vícios essenciais no projeto leninista ou no pensamento do próprio Marx.
Acho difícil não pensar nessa discussão hoje, enquanto muitos amigos petistas ou simpatizantes do PT parecem entender a crise atual como um mero acidente. Ao ouvi-los, para que o sol volte a raiar basta excluir os quadros, os deputados e os senadores ‘ruins’. A idéia é a seguinte: uma turma de elementos suspeitos se insinuou (acidentalmente) nas fileiras do PT e do governo, a solução é a purga que os eliminará. Só sobra esperar a lista completa dos maus sujeitos. O único suspense é: o presidente está ou não entre eles?
Poucos levantam a hipótese de que a crise não seja apenas um acidente, mas o efeito de um problema de essência. Ora, para a segurança de qualquer cesta de maçãs, é bom separar as maçãs bichadas, mas é crucial se assegurar que o bicho não seja endêmico no tipo de maçã ou na colheita que a gente escolheu.
Estamos dispostos a apontar a relação entre as falcatruas da direita e os vícios essenciais do liberalismo. Por exemplo, a corrupção ‘collorida’ foi a obra de uma quadrilha ‘acidental’ que trabalhava em prol de seu próprio bolso, mas uma quadrilha desse tipo é também o efeito previsível da ‘essência’ de um sistema que exalta o enriquecimento individual acima das necessidades da comunidade.
Por razões sobretudo sentimentais, parecemos menos dispostos a interrogar a relação entre as falcatruas de hoje e o ideário político e social da esquerda.
Ora, se alguns mal-aventurados usaram de recursos infaustos para garantir e estender o alcance do poder do PT e do governo, talvez isso não seja apenas um ‘acidente’ de percurso (a obra de maçãs bichadas). Talvez isso seja também uma expressão (‘essencial’, então) do projeto político e social com o qual muitos de nós sonharam ou ainda sonham.
Ao que parece, os supostos ‘feiosos’ (Zé Dirceu, Delúbio, Silvio Pereira etc.) são acusados de uma confusão que se realizou a cada vez que um modelo socialista chegou ao poder.
Só para lembrar: regularmente, os socialismos realizados ampliaram o Estado para colocá-lo ao serviço do governo e ampliaram o governo para colocá-lo ao serviço do partido. Nesses casos, quase sempre, sem hesitar, os funcionários de Estado, governo e partido (assim confundidos) agiram contra a legalidade democrática, por se considerarem depositários de um ideário absoluto, nobre e bem-intencionado. A convicção de ter o monopólio do bem autorizou qualquer embuste ou crime sem nem sequer produzir os tormentos da culpa moral.
Não é uma razão para renunciar, de repente, a nossas melhores esperanças sociais. Mas é uma ocasião, isso sim, para reconsiderar com cuidado os projetos que pretendem realizá-las.
Um exemplo básico: alguém, hoje, pensaria ainda que estatizar seja um jeito de tornar nossa sociedade mais democrática?’
Leonencio Nossa
‘Mais denúncias podem surgir, diz Lula ‘, copyright O Estado de S. Paulo, 18/08/05
‘O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reclamou ontem que não são poucos os que querem jogar dentro do Palácio do Planalto erro ou processo de corrupção. Em discurso de improviso num assentamento rural de Vitória da Conquista, cidade baiana a 510 quilômetros de Salvador, ele sugeriu que espera mais denúncias contra o governo e o PT por parte da oposição, mas nem por isso perdeu o rumo da situação política. ‘Sei que existem (problemas) e podem surgir muitos outros.’
‘Sou um homem que não esqueceu de onde veio e sabe muito bem para onde vai.’ A uma platéia de 3 mil pessoas, segundo cálculos da Polícia Militar, Lula relatou que, diante da crise, costuma contar até 10, por recomendação da primeira-dama, Marisa Letícia, em vez de ‘berrar’ e perder a paciência. No mesmo dia em que o PFL pediu a investigação das contas da campanha presidencial de 2002, Lula disse que tem a consciência ‘limpa e tranqüila’ e não teme ser investigado. ‘Sou mais aberto do que coração de mãe. Não tem nada mais sensível e maleável que coração de mãe, e não haverá nada de nossa parte que não possa favorecer qualquer investigação.’
No discurso de 34 minutos, ele voltou a defender punição para os culpados pelas práticas ilícitas, mas se posicionou contrário aos que pedem julgamentos injustos contra inocentes, com ‘abuso de poder e desordem’. ‘Sou um homem que crê em Deus e nunca tive nada fácil na vida. Nunca tive a certeza que ia ser fácil governar o Brasil e não ia ter problemas. Sei que existe uma crise política e os objetivos dela.’
Embora tenha se exaltado pelo menos três vezes no discurso, Lula disse que ‘o povo não gosta de presidente que fica gritando e berrando’. ‘Qualquer cidadão pode ficar nervoso e xingar. Mas toda vez que fico meio nervoso, a Marisa é a primeira a dizer: ‘Você não pode, você é o presidente, tem que contar até 10 antes de falar’.’
Lula disse que o povo quer um presidente que converse como pai e mãe conversam com o filho. Dirigindo-se a ministros, na solenidade de inauguração do sistema de eletrificação do Assentamento Amaralina, afirmou que não pode perder de vista sua trajetória política e a responsabilidade de pedir, como presidente, punição aos que erraram. ‘A vida inteira, eu e milhares de companheiros lutamos por justiça social e ética, valores fundamentais da família brasileira’, disse. ‘Meu trabalho não é apenas administrar a grande política de Brasília, mas trabalhar pela harmonia e paz das famílias.’
Ele disse que defende uma sociedade ‘exemplar’, em que todos devem pagar pelos próprios erros. ‘Isso vale para minha casa, meu partido, meus amigos sindicalistas e o povo brasileiro’, afirmou.’
O Estado de S. Paulo
‘Tela de galinheiro para afastar repórteres ‘, copyright O Estado de S. Paulo, 18/08/05
‘ARAME: O cerimonial e a Secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto usaram tela de galinheiro e arame farpado para evitar que jornalistas se aproximassem do presidente Lula e autoridades no Assentamento Amaralina. Um corredor de 400 metros de comprimento e um metro e meio de largura foi construído com a orientação de funcionários do Planalto na estratégia de impedir que repórteres circulassem no meio da multidão. Era por meio do corredor que se chegava à área reservada à imprensa. Após a solenidade, o presidente cumprimentou os populares. Já os jornalistas ficaram afastados. A prefeitura de Vitória da Conquista, cidade administrada pelo PT, tampou os buracos das principais vias de acesso ao assentamento e da área urbana para a visita de Lula. Anteontem, funcionários da prefeitura ainda trabalhavam nas melhorias da cidade. Um grupo de estudantes da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia ligados ao PSOL, partido da senadora Heloísa Helena (AL), organizou uma manifestação contra Lula, mas o presidente acabou não passando pela estrada em que eles estavam. Já no assentamento, Lula só recebeu aplausos. O presidente chegou a constranger parte dos populares ao falar do Programa Brasil Sorridente, que presta atendimentos odontológicos. ‘Quando olho para vocês, fico lembrando do Brasil Sorridente, porque neste país muitas meninas e meninos não podem sorrir com vergonha de mostrar a janela na boca.’’