Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Folha de S. Paulo

ESCOLA
Laura Capriglione

A guerra das palavras

‘Poeta e professor de literatura, Oswaldo Martins Teixeira, 47, foi demitido no dia 11 de setembro da Escola Parque do Rio de Janeiro, onde lecionava para turmas de 7º e 8º anos do ensino fundamental. Pais de alunos descobriram que Teixeira escreve poemas eróticos; ele os publicou em livros e em um blog. Pediram a cabeça do professor.

A escola moderna, construtivista, mensalidade de R$ 1.161, unidades na Barra da Tijuca e no aristocrático bairro da Gávea, que funciona sob o lema ‘Uma escola que estimula a expansão cultural’, demitiu.

Formado em letras pela Pontifícia Universidade Católica, o professor Teixeira obteve o título de mestre na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, com a dissertação ‘Erotismo e Gramática, Índices da Defloração – Uma Leitura de Manoel de Barros’, de 1992. Há quatro anos, prepara seu doutorado na Universidade Federal Fluminense sobre o poeta, escritor e dramaturgo italiano Pietro Aretino (1492-1556).

‘Diverti-me escrevendo os sonetos que podeis ver. A indecente memória deles, eu a dedico a todos os hipócritas, pois não tenho mais paciência para as suas mesquinhas censuras, para o seu sujo costume de dizer aos olhos que não podem ver o que mais os deleita.’

O texto é de Aretino. Refere-se aos ‘Sonetos Luxuriosos’, escritos em linguagem explícita a partir de 16 gravuras eróticas de Giulio Romano, discípulo de Rafael Sanzio, um dos maiores mestres em pintura e arquitetura, contemporâneo de Michelangelo e Da Vinci.

Aretino e Giulio Romano nasceram no ano da descoberta da América, durante o Renascimento das carnes e dos sentidos. Juntos, elaboraram uma obra-prima do despudor.

‘Ousei criar poemas à moda de Aretino’, justifica o professor em tempos politicamente corretos.

Autor de quatro livros publicados pela 7 Letras -’Desestudos’ (2000), ‘Minimalhas do Alheio’ (2002), ‘Lucidez do Oco’ (2004) e ‘Cosmologia do Impreciso’ (2008)-, Teixeira mantém um blog (http:// osmarti.blogspot.com).

‘a alice no país das baboseiras/ é uma garota esperta// prefere foder com a coleguinha/ usar celular/ batom// cortar as cabeças/ dos mendigos.’ O poema figura na ‘Cosmologia do Impreciso’.

Fogueira ardendo

Foi na preparação da Semana Literária da Escola Parque (realizada em maio) que a fogueira do professor começou a arder. ‘A coordenação me pediu que fosse às salas de aula do 7º e do 8º anos para divulgar o meu processo de escrita e o blog. Contei como eu criava, falei de minha paixão pela literatura, tentei mostrar que inclui saber ler as estrelas no céu, os passos até a banca de jornal.’

Na mesma semana, os garotos deram um ‘google’ e descobriram o blog do professor na internet. Escândalo.

Pais foram até a coordenação pedagógica reclamar do que consideravam ser um conteúdo inadequado, pornográfico, obsceno. O professor foi chamado a se explicar: ‘Eu disse que não via problema nenhum, que a literatura erótica é tão antiga quanto a própria literatura.’

A lista de livros sugeridos neste ano para os alunos do primeiro ano do ensino fundamental da Escola Parque inclui ‘Poemas para Brincar’ e ‘Olha o Bicho’, de José Paulo Paes (1926-98). Um ‘google’ no nome do poeta e vem ‘Fodamos, meu amor, fodamos presto. Pois foi para foder que se nasceu…’. É a tradução dos ‘Sonetos Luxuriosos’ de Aretino, que Paes providenciou -a primeira feita para o português.

Na biblioteca da Escola Parque, pode-se ler o livro ‘Belo Belo e Outros Poemas’ de Manuel Bandeira (1886-1968), o mesmo autor de ‘A Cópula’ -só vendo.

A luta da poesia

Na Feira do Livro, edição de 2002 da Escola Parque, os alunos prestaram homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade, cujo centenário era comemorado naquele ano.

‘A língua lambe as pétalas vermelhas da rosa pluriaberta; a língua lavra certo oculto botão, e vai tecendo lépidas variações de leves ritmos. E lambe, lambilonga, lambilenta, a licorina gruta cabeluda, e, quanto mais lambente, mais ativa, atinge o céu do céu, entre gemidos, entre gritos, balidos e rugidos de leões na floresta, enfurecidos.’

No início de setembro, o professor Teixeira foi chamado para uma reunião no Instituto Moreira Salles, que fica na mesma rua da Escola Parque.

Foi no local construído nos anos 1950, um monumento ao modernismo carioca, que se comunicou a demissão.

‘Disseram-me que havia um parecer de psicólogos e juristas condenando a combinação do professor com o escritor em uma só pessoa’, lembra Teixeira. ‘Não pude discutir com nenhum pai, não houve debate nenhum’, diz. ‘Impôs-se a sombra da censura e do controle porque a escola simplesmente decidiu ceder a um grupo de pais dos quais nem sequer sei os nomes.’

Casado há 24 anos, pai de três filhos, o professor mora no bairro de Laranjeiras. ‘Meu problema não é a empregabilidade. Estou muito mais preocupado com o obscurantismo, com a certeza dos censores. A poesia luta contra isso. E foi muito trabalho até me transformar em um poeta. Não posso abrir mão disso’, diz.’

 

 

Luiz Costa Lima

Arbítrio dos outros

‘Procuro pensar sobre a incidência de dois fenômenos de nosso cotidiano, que encontram na mídia tratamento oposto.

O primeiro, o que está na cara de qualquer um, teria uma ‘bibliografia’ considerável.

Bastará ouvir os informativos televisivos sobre ‘fatos diversos’ -como a preservação dos casarões das velhas fazendas de café do Vale do Paraíba ou a arte das rendeiras no interior do Ceará- ou ler jornais que ofereçam uma cobertura mais ampla do país e do mundo. Poder-se-á verificar que cada vez mais se acentua a tendência de reutilização de dejetos industriais e orgânicos -desde latas de cerveja até papelões de tamanhos variados ou dos restos do dia-a-dia de um restaurante.

Ser esse fenômeno amplamente noticiado não precisa de explicação: a reutilização de dejetos vai positivamente de encontro a uma sociedade do desperdício.

Nesse sentido, faz parte de uma mais ampla mudança de hábitos: diz respeito à conduta da sociedade quanto às fontes naturais, cuja abundância começa a escassear.

Poderíamos acrescentar que as modificações aludidas se tornam forçosas pelo próprio modo de produção capitalista; que, por conseguinte, enfatizá-las seria optar pela adoção de paliativos, em vez de ressaltar-se a própria raiz do problema.

Sem que seja falsa, essa resposta, no entanto, torna-se cada vez menos eficaz.

A queda do Muro de Berlim (1989) não decretou que, a partir de então, o capitalismo não tinha alternativa.

A queda do muro, no máximo, escancarou para todos o que o pensamento político mais agudo há décadas já havia formulado: o socialismo havia deixado de ser uma alternativa para o capitalismo desde que se impôs o padrão stalinista.

(Suponho que ninguém pensará que a atual combinação chinesa de poder ditatorial e produção regida por um capitalismo selvagem represente alguma alternativa).

Se, portanto, o modo de produção capitalista deixou de ter um competidor pelo menos desde 1928, quando Stálin assumiu o poder absoluto na União Soviética, a queda do muro era apenas a primeira manifestação patente da dissolução, mais rápida do que qualquer outra já sucedida, do império soviético.

Se o estado de coisas acima descrito é acessível mesmo a um não especialista como eu, parece evidente que a oposição ao modo de ser, pensar e agir capitalista precisa mudar de estratégia.

Daí que, embora não deixe de ser um paliativo, a reutilização do lixo orgânico e industrial é uma maneira de, quando nada, aumentarmos o tempo de sobrevida de um mundo que, em nome do lucro, se autodestrói; tempo de sobrevida para que, sem o advento de uma catástrofe (nuclear?), a expansão do capitalismo ou assuma outra direção ou seja rompida.

Mas alguém saberá o que, de fato, sucederá? Se, como já foi dito, hoje perdemos a dimensão do futuro e vivemos em um monótono ‘presentismo’, é o caso de nos indagarmos o que já não se perdeu e já não pode ser reciclado.

Reificação

Leio em um texto recente: ‘A arte está morrendo? Cercada por uma natureza segunda e hostil, a arte agoniza entre nós, por nós, mas não para nós’.

Isso me lembra que, há 38 anos, em sua obra póstuma, ‘Teoria Estética’, [o filósofo alemão] T.W. Adorno declarava, a propósito do cubismo, que ‘por ele, pela primeira vez, a arte se dava conta de que a vida não vive’.

A afirmação, contudo, era feita por alguém que discordaria em absoluto da mudança que aqui se defende. Muito ao contrário, para Adorno, qualquer concessão ao mundo das relações reificadas, isto é, ao mundo em que, pelo capitalismo, tudo se converte em coisa e, portanto, em objeto de troca, não merece outro nome senão o de concessão criminosa. Quanto à arte -objeto de seu último livro e a que dedicara seu máximo empenho na vida-, seria então criminosa qualquer tentativa de torná-la comunicável. Para Adorno, é a própria comunicação, a exemplo da que aqui tentamos, que, no tempo do capitalismo avançado, se torna criminosa.

Sem condições

Não vamos daí inferir que sua posição ajudaria a explicar o tom cabalístico de seu estilo. Mais cautelosamente, diríamos: talvez Adorno se permitisse o hermetismo porque acreditasse que, como todo fenômeno histórico, o capitalismo um dia terminaria e, à medida que as relações fossem perdendo seu caráter de puramente reificadas, sua linguagem deixaria de ser o obstáculo que é. Mas o problema com que hoje nos defrontamos é diferente de como se apresentava na década de 1970.

Já não se trata de apostar em que as relações capitalistas algum dia deixarão de ser a bússola reguladora das relações humanas, mas, sim, se sua inflexão drástica será cumprida antes que termine a agonia do que tanto prezamos, a exemplo da arte.

Pois, se os dejetos orgânicos e industriais podem ser reutilizados, é na medida que são matéria, algo passível de reaproveitamento. Essa regra não se aplica ao que supõe um investimento valorativo. Um valor que agonize pode, no melhor do casos, ante condições favoráveis, converter-se em outra coisa.

Que adianta especularmos sobre o que poderá ser a transformação da arte dita autônoma, quando nem sequer sabemos se a humanidade ainda conhecerá condições que a favoreçam? Se acima está a reflexão de imediato despertada pela questão da reciclagem, passemos mais rapidamente para um fenômeno sobre o qual pouco nos detemos.

Sem defesa

Refiro-me especificamente à censura intelectual. Ressalto um fato concreto, que sucede no momento mesmo em que escrevo, e não noutro lugar senão que no Rio de Janeiro. Um professor de português que tem a má sorte de ser também um poeta e ensina(va) em um colégio secundário particular da zona sul, por ter publicado, no seu blog, um conjunto de poemas eróticos, é sumária e discretamente demitido.

A medida foi tomada pela instituição ante a reclamação de pais de alunos, que acharam que escrever poemas eróticos não é tarefa para um professor de seus filhos. Não chamo nem sequer a atenção para o fato de que tal colégio foi fundado com uma plataforma liberal, que, ao ir crescendo, etc. etc.

Pergunto-me, sim: que defesa tem um poeta que, para sobreviver, precisa dar aulas de português, caso sinta a necessidade de escrever poemas eróticos? Não adianta atentar para a cegueira desses pais ou para a covardia hipócrita de tal direção. A questão concreta é como pode alguém, no caso o poeta-professor, defender-se ante uma decisão arbitrária que interfere em sua sobrevivência material?

Não acentuo nem sequer a discrepância entre os princípios de uma sociedade que se diz liberal, recém-saída de uma ditadura, e uma medida assim absurda. Acentuo, sim, que o marginal ao noticiário midiático revela o aspecto autoritário que, como sombra perversa, permanece entranhado na sociedade brasileira.

LUIZ COSTA LIMA é crítico e professor na Universidade do Estado do RJ e na Pontifícia Universidade Católica (RJ). Escreve regularmente na seção ‘Autores’, do Mais! .’

 

 

Laura Capriglione

‘O que um jornal de SP tem a ver com essa história?’

‘‘A escola não vai se pronunciar’, disse a secretária, por telefone, à Folha. ‘Nem adianta insistir. Essa posição veio da Alemanha, onde está a diretora Rita Barbosa Coutinho.’ ‘E os demais diretores, a Mary Ferraz Soares Lopes, a Patrícia Konder Lins e Silva e o Oswaldo Soares Lopes Filho, não tem nenhum que possa falar ao jornal?’, perguntou a reportagem. ‘Não, definitivamente, a escola não vai se pronunciar’, encerrou a secretária.

A tentativa de contato com a direção da Escola Parque começou na noite do dia 30 de setembro, quando o jornal enviou e-mail endereçado à unidade Barra da Tijuca, à unidade Gávea, à secretaria geral e à diretora Rita Coutinho, solicitando a entrevista.

Sem resposta.

No dia seguinte, nova tentativa, desta vez por telefone. Patrícia, que disse ser secretária de Mary Soares Lopes, prometeu retorno. Não deu.

Então, tentou-se contato diretamente com a coordenadoria pedagógica do ensino fundamental 2, da unidade Gávea. Atendeu a professora Tereza, que prometeu retorno do ‘Andrezinho’, a quem identificou como diretor. Também não deu satisfações.

Uma funcionária da secretaria que não se identificou desdenhou: ‘O que é que um jornal de São Paulo tem a ver com essa história?’. Referia-se à demissão do professor.

A escola comunicou por escrito o desfecho do caso: ‘Comunicamos que o professor de redação, Oswaldo Martins Teixeira, não continuará acompanhando as turmas de 8º ano no 4º bimestre de 2008, sendo substituído pela professora […]’. Mesmo texto (28 palavras), foi passado aos alunos e pais do 7º ano.’

 

 

Conheça os poemas

‘‘a alice no país das baboseiras

é uma garota esperta

prefere foder com a coleguinha

usar celular

batom

cortar as cabeças

dos mendigos

Do livro ‘Cosmologia do Impreciso’

discurso

aqui

enquanto o cão afaga

meu corpo vela

meu corpo vala

êxtase do nada

quem será já morto

e ainda fala’

Do livro ‘Lucidez do Oco’

vasto era o pente

a mão

teclava vulgata

sobre a cadeira de palha

tocava guizos

a mulher

molhada

Do livro ‘Desestudos’

Todos os poemas acima são de autoria de Oswaldo Martins.’

 

 

ELEIÇÕES
Thaís Nicoleti de Camargo

Poesia de Mário de Andrade ajuda a refletir sobre vida da metrópole

‘Um pouco de poesia no dia da escolha do novo administrador da capital paulista pode ajudar o eleitor a refletir sobre a sua cidade, essa São Paulo tão amada e tão odiada em suas contradições. É do artista plástico Alex Flemming (veja boxe abaixo) o trabalho realizado sobre as fotografias dos três principais candidatos à Prefeitura de São Paulo (veja acima).

Para emoldurar as imagens dos candidatos, Flemming selecionou alguns versos do poema ‘A Meditação sobre o Tietê’, que Mário de Andrade escreveu pouco antes de sua morte, em fevereiro de 1945.

Embora naquela época já apresentasse os primeiros sinais de degradação (‘É noite. E tudo é noite. Debaixo do arco admirável/ Da Ponte das Bandeiras o rio/ Murmura num banzeiro de água pesada e oleosa’), o rio, fonte de inspiração do poeta, também funciona como um espelho do cenário urbano, refletindo em seu leito noturno as luzes da metrópole, as incontáveis ruas, os arranha-céus, o mundo do trabalho, da fábrica, enfim, a cidade pujante que então já se desenhava.

Diferentemente da maioria dos rios, o Tietê, em vez de correr para o mar, corre para o interior. Surge, assim, na pena do poeta, como poderosa metáfora do paulista desbravador: corajoso, adentra os interiores da terra em sarcástico desafio ao curso normal das águas (‘E te afastas do mar e te adentras na terra dos homens (…)/ Me induzindo com a tua insistência turrona paulista/ Para as tempestades humanas da vida, rio, meu rio!…’).

Em sua meditação, o poeta vê o rio como síntese das contradições da cidade: ‘Estas águas/ Do meu Tietê são abjetas e barrentas,/ Dão febre, dão morte decerto, e dão garças e antíteses’. Crítico, todavia, não se conforma e indaga: ‘A culpa é tua, Pai Tietê? A culpa é tua/ Si as tuas águas estão podres de fel (…)/ Onde estão os amigos? Onde estão os inimigos?’ (…) ‘Por que os homens não me escutam! Por que os governadores/ Não me escutam?’.

À sua maneira, crítica, livre de qualquer pieguice, o ‘bardo mestiço’ homenageia São Paulo e faz sua declaração de amor ao Tietê, que merece ter de volta as suas águas cristalinas, realizando um sonho possível dos paulistanos. Leia o poema na íntegra no site www.jornalde poesia.jor.br/and08.html.’

 

 

Folha de S. Paulo

Senador não responde às perguntas

‘Bispo licenciado da Igreja Universal, o senador Marcelo Crivella, 51, não quis responder às perguntas da Folha.

O coordenador da campanha, Isaias Zavarise, tinha conhecimento da reportagem desde quarta-feira. Afirmou que tentaria marcar um horário com o candidato do PRB, o que não havia ocorrido até a manhã de anteontem.

A Folha foi, na manhã de sexta, à praça das Nações, em Bonsucesso (zona norte), tentar ouvir o senador pessoalmente, assim como foi feito com os outros candidatos. Ele afirmou que não as responderia pessoalmente, apenas por e-mail.

Ao ser informado de que todos responderam pessoalmente, afirmou: ‘Todos os candidatos são todos os candidatos. O Crivella é o Crivella’. Ele só queria responder às questões relativas aos últimos dias de campanha.

A Folha enviou as perguntas para dois e-mails, às 14h10 de sexta, mas, até a conclusão desta edição, na noite do mesmo dia, Crivella não respondeu.

No plano de governo para a saúde, ele afirma que ‘a primeira coisa a ser feita é consertar essa bagunça, arrumar a casa e fazer funcionar bem os serviços de saúde da prefeitura’.

‘Para implantar uma política preventiva, um programa eficiente, moderno e avançado, vamos aplicar o orçamento municipal de forma correta.’

Para combater a desordem urbana, o senador afirma que ‘é preciso urgentemente atualizar a legislação de Posturas Municipais, que é uma colcha de retalhos de 356 leis e decretos sobre a matéria’.’

 

 

INTERNET
Rafael Balsemão

Jovens enfrentam ofensas e violência no mundo virtual

‘Alice (nome fictício) tinha 17 anos e cursava o ensino médio no colégio Faap, em Higienópolis (zona oeste de SP). Estava havia dois anos na escola quando descobriu que haviam sido criadas anonimamente duas comunidades no Orkut contra ela: ‘Eu odeio a tosca da Alice’ e outra com referências preconceituosas ao Estado de origem de sua mãe.

Diante dos ataques, a estudante e sua família acharam melhor mudá-la de colégio. Lá, descobriram que a história tinha se espalhado. A solução foi mandar Alice para fora do país, enquanto eram tomadas providências legais para a retirada das páginas do ar e o rastreamento do autor ou dos autores.

Alice estava no centro de um caso de ‘cyberbullying’, fenômeno que transfere para a internet as agressões típicas que estudantes mais frágeis sofrem dentro da escola. Enquanto o clássico ‘bullying’ acontece na sala de aula, no playground e nos arredores do colégio, a versão virtual transcende os limites da instituição de ensino. As hostilidades se potencializam na rede mundial de computadores, diante da facilidade atual de criar páginas e comunidades na internet. E-mails anônimos, mensagens de celular injuriosas, blogs ofensivos e vídeos humilhantes -todos fazem parte da violência virtual.

‘No mundo real, a agressão tem começo, meio e fim. Na internet, ela não acaba, fica aquele ‘fantasma’, compara Rodrigo Nejm, psicólogo e diretor de prevenção da SaferNet Brasil.

O resultado preliminar de uma enquete sobre segurança na internet realizada no site da ONG assusta: 46% dos 510 adolescentes e crianças que responderam ao questionário afirmam que foram vítimas de agressões na internet ao menos uma vez; 34,8% dizem que foram agredidos mais de duas vezes. Dos participantes, 31% são do Estado de São Paulo, onde há o maior número de relatos segundo a SaferNet.

Os ataques a Alice começaram em 2005, mesmo ano em que a mãe da jovem acionou a Justiça. ‘A adolescente estava completamente abalada quando chegou ao escritório’, recorda o advogado que a defendeu, José Luis de Oliveira Lima, 42.

A polícia conseguiu chegar ao computador que originou as comunidades, de uma colega de classe de Alice. Só havia uma relação entre as duas: Alice era a melhor amiga do então namorado da autora do ‘cyberbullying’. Procurada pela Folha, a direção do colégio Faap não quis se manifestar.

Também vítima de agressões via web, a policial militar Nair Caliguere, 54, teve dificuldade para tomar providências diante das humilhações a que ela e a filha foram submetidas. Só conseguiu fazer um boletim de ocorrência contra o ‘Blog das Porcas’, mantido por alunas do colégio Renovação (zona sul), em 2003, na terceira tentativa.

Na página, seis estudantes atacavam professores e outras alunas. O blog era especialmente virulento contra Mariana Caliguere, que na época era modelo e hoje tem 22 anos e é cadete da PM. ‘O mais pesado foi elas falarem da minha mãe’, lembra a jovem.

O blog era popular pelo tom de diário com que as integrantes falavam de bebedeiras e até de detalhes da vida sexual.

Quando começaram os abusos em relação a terceiros, o que era engraçado ficou sério. Os pais das ‘porcas’ foram chamados ao colégio.

Três das seis jovens foram ‘convidadas’ a deixar a escola, e o blog foi apagado. ‘Os filhos copiam os valores dos pais’, diz Cláudia Baratella, 39, vice-diretora do colégio Renovação. ‘O jovem não pára para pensar que a internet está no mundo. A conseqüência dos crimes contra a honra, de calúnia e injúria na internet é desproporcional ao dano’, afirma Patricia Peck Pinheiro, 33, advogada especializada em direito digital.

Patricia foi uma das responsáveis em formular uma cartilha para o colégio Bandeirantes com orientações sobre a utilização da internet. O colégio São Luís também possui um projeto que visa coibir a prática do ‘bullying’. Quem encabeça a iniciativa é a professora de português Roberta Ramos, 38.

Depois de aplicar um questionário com os estudantes para ver quem se sentia vítima de ‘bullying’, começou um trabalho de conscientização.

Fórum ‘antibullying’

O blog da gaúcha Daniele Vuoto, 22, é outra fonte de consulta (http://nomorebullying.blig.ig.com.br). A estudante de pedagogia, que foi vítima de ‘bullying’ tradicional em três das quatro escolas pelas quais passou no RS, hoje ajuda pessoas nas mesmas condições.

‘O que mais me machucava era me sentir sozinha em escolas enormes, onde todos viam o que acontecia e ninguém fazia nada’, diz Daniele, que passou a ser o alvo por defender alunos que eram ridicularizados. ‘Logo começaram a apontar defeitos em mim: muito branca, magra, notas altas.’ No auge de uma depressão por não ser aceita, a jovem tentou acabar com a própria vida.

A crueldade por parte da turma pode gerar diferentes reações. ‘As conseqüências são problemas de aprendizagem, reprovação escolar, isolamento, depressão e até mesmo suicídio’, diz Cleo Fante, pedagoga pioneira nos estudos sobre o ‘bullying’ escolar no Brasil.

Ela alerta para o surgimentos dos ‘bullycidas’, pessoas que incentivam os jovens que sofrem ‘bullying’ a praticar suicídio. ‘É algo muito recente e difícil de descobrir.’

O incentivo ao suicídio virou tema de peça de teatro. ‘Bate Papo’, do irlandês Enda Walsh, ficou em cartaz na capital paulista durante um ano e deve voltar aos palcos paulistanos no começo de 2009.

Na obra, seis adolescentes teclam na internet sobre Harry Potter, Britney Spears e suicídio. Um deles, deprimido, interpretado por Taiguara Chagas, 20, é virtualmente encorajado por outros da mesma idade, 16 anos, a se matar.

Vítima na escola, o ator se inspirou na própria história para encarnar o personagem. Ruivo, ele era alvo de chacota por causa da cor do cabelo. ‘Fui bastante zoado e me sentia excluído’, recorda Taiguara.

Superação

É também como se sentia V., da escola Projeto Vida, na zona norte de SP. No ano passado, a aluna começou a receber bilhetinhos com insultos de C., sua colega de classe. Depois, vieram as ameaças de agressão física.

As advertências da orientadora educacional não intimidaram a agressora. Em maio, veio a descoberta de que os xingamentos e chacotas haviam migrado para o ambiente virtual.

Em seu blog, C. passou a agir com deboche. ‘Quando vi a página, fiquei com muita vontade de chorar. Depois, [fiquei] com muita raiva’, recorda V., que era representada por uma bonequinha que explodia. ‘Era muita crueldade’, revolta-se a mãe da adolescente.

O mesmo blog que atacava V. foi usado como arma pelos pais da menina para reagir. Com o auxílio de um advogado, fizeram chegar até a escola uma notificação extrajudicial pedindo providências. A diretora pedagógica, Mônica Padroni, 45, assumiu o caso. Chamou C. novamente para conversar. ‘O que a deixou mais abalada foi a possibilidade de seus pais serem processados’, diz. Foi só nessa hora que a garota entendeu a proporção do seus atos. Quis se desculpar.

A diretora sugeriu que C. escrevesse uma carta. ‘Nunca pensei que ela pediria desculpas’, afirma V., hoje com 13 anos. A vítima até tentou mandar uma reposta por escrito para a ex-amiga. Não conseguiu. O que sente em relação a tudo que passou ainda não pode ser expresso em palavras. A agressora hoje sabe que destratar alguém pela internet tem conseqüência. A vítima aprendeu que é muito difícil esquecer.

Colaborou RICARDO SANGIOVANNI, da Reportagem Local’

 

 

***

‘Ficava chateada’, diz namorada de ídolo adolescente

‘Ana Carolina Favano, 20, começou a namorar o então desconhecido Leandro Rocha, 22, em janeiro de 2006. Um ano depois, a banda de Leandro, a NX Zero, estourou e ele virou Gee. Ká, como Ana Carolina é conhecida, percebeu que a sua vida dali para frente nunca mais seria a mesma.

Começou a ser atacada na internet, em uma comunidade no Orkut que afirmava que ela estava atrás do dinheiro de Leandro. ‘Levei um susto. Nunca fiz nada para provocar ninguém’, diz ela. Estudante de medicina em Santos, Ká ligava para a mãe, que mora em São Paulo, chorando. ‘Ela queria ir à delegacia’, disse a mãe.

Com a ajuda de um amigo, Ana Cláudia Favano descobriu em que computador havia sido criada a comunidade contra a filha. Entrou em contato com a menina, residente em Goiânia, e conseguiu tirar a página do ar.

Mas a história de Ká no mundo virtual não parou ali. Logo começaram a surgir centenas de perfis ‘fakes’ (falsos) dela, construídos por adolescentes fãs da banda NX Zero, que se passavam por ela. ‘No começo, ficava bem chateada’, lembra.

Hoje, Ká tem comunidades a favor e contra ela no Orkut. ‘Agora, levo essa história numa boa.’ Já desistiu de tentar acabar com perfis falsos. Um deles chega a ter 521 participantes. ‘Para tirar um ‘fake’ no Orkut, tem que juntar uma série de documentos’, lamenta a verdadeira Ká, diante de um inimigo oculto: ‘Eles nunca mostram a cara’.’

 

 

TELEVISÃO
Daniel Castro

O padeiro do mês

‘Em 2004, o galã português Ricardo Pereira foi convidado pela Globo para fazer ‘Como uma Onda’. A idéia era atrair audiência em Portugal. Mas o rapaz seduziu também o público brasileiro, principalmente o feminino. Agora, duas novelas depois (‘Pé na Jaca’, na Globo, e ‘Prova de Amor’, na Record), Pereira retorna em ‘Negócio da China’, estréia de amanhã às 18h. Será o antagonista. Vai disputar Grazi Massafera com Fábio Assunção. Sua profissão não poderia ser mais adequada: padeiro. ‘O João é correto, puro, honesto. É um ótimo padeiro’, elogia.

Próxima novela das oito mostrará ‘loucos’ em ação

‘Caminho das Índias’ mostrará portadores de doenças mentais em ações cotidianas. A próxima novela das oito da Globo fará campanha pela inclusão social dos chamados ‘loucos’. Mas, diferentemente das últimas tramas de Glória Perez, desta vez o merchandising social não se caracterizará pelo formato de depoimento.

‘Eles [os doentes mentais reais] vão aparecer mostrando o que sabem fazer: bandas, trabalhos artísticos, computação. Eles me pediram para bater no preconceito e mostrar que são capazes, em alguma medida, de se inserir no mercado de trabalho. Querem ser equiparados aos deficientes físicos, para quem existe já uma política de inserção’, diz Glória.

‘Caminho’, que começou a ser gravada na semana passada na Índia, terá também personagens fictícios abordando a questão. Serão dois esquizofrênicos, um pobre, interpretado por Sidney Santiago, e um rico, por Bruno Gagliasso. Glória conta que a idéia é ‘mostrar como esse drama se desenrola entre as famílias pobres, nas quais costuma haver uma rede de solidariedade da vizinhança, e entre as famílias ricas, em que se procura esconder o estigma’.

Haverá ainda um ator, Paulo José, interpretando um louco verdadeiro, o Profeta Gentiliza, que nos anos 80 pintou pilastras de viadutos do Rio. ‘Vamos mostrar sua obra e reproduzir suas falas’, adianta. ‘Mostraremos também as obras de alguns loucos geniais, como Arthur Bispo do Rosário’.

VIAGEM NA PERSONAGEM

Intérprete da cantora Maysa na minissérie homônima da Globo, a atriz Larissa Maciel (foto) fará no final do mês uma viagem de dez dias pela Europa. O inusitado é que Larissa viajará como se fosse Maysa, com as roupas e maquiagem da musa da MPB. ‘A única mala que Larissa levará será a da Maysa’, conta o diretor Jayme Monjardim, filho de Maysa, que na viagem atuará como câmera.

‘Vou filmá-la na janela do avião’, diz. Em Lisboa, um carro de época a receberá. Monjardim irá apenas com Larissa, dois atores e o caracterizador Fernando Torquato. Assim, poderá gravar em locais que não permitem grandes parafernálias.

COZINHA POP

A produtora Prodigo Films começa a gravar em novembro uma série de 13 programas que misturará gastronomia com turismo. Orçada em R$ 705 mil, a atração, ainda sem nome, deverá ir ao ar na Fox ou no Natgeo. ‘Será um programa em que Josimar Melo [crítico gastronômico da Folha], por exemplo, vai a Londres e usa James Bond como referência, visitando restaurantes que o personagem freqüenta nos filmes’, explica o diretor Adriano Civita. A produção percorrerá Brasil, América Latina e Europa.

CROSS MEDIA

O ator Selton Mello está preparando um programa sobre os bastidores de ‘Feliz Natal’, sua estréia na direção de filmes. O longa, exibido na semana passada no Festival do Rio, estréia nos cinemas em novembro. Simultaneamente, o canal Multishow exibirá o programa, intitulado ‘Diário de Bordo’.

FILME ERRADO

A Globo está ficando craque nisso. No mês passado, ilustrou em seu site o filme ‘Vôo 93’ com uma fotografia de ‘United 93’, título da Record. Hoje, no ‘Domingo Maior’, exibirá ‘Baladas, Rachas e um Louco de Kilt’, mas a foto em seu site, até quinta à noite, era de ‘Minority Report’.

PERGUNTA INDISCRETA

FOLHA – O diretor de ‘Big Brother Brasil’ te chamou de cachorra. A sua assessora divulgou na semana passada a morte de sua cadelinha. Onde você quer chegar com essa cachorrada?

JAQUE KHURY (ex-BBB) -Pois é, meu filho (risos). Adoro os animais. Quero ter uma ONG para cuidar de bichos. O Boninho [diretor de ‘BBB’] é amigão meu, falou aquilo de marqueteiro. Mas tô muito mal com a morte da minha cachorrinha. Deixei de ir a trabalhos, fiquei chorando. [Divulguei] Mais para dar uma satisfação para quem me contratou e para os fãs.’

 

 

Lucas Neves

Teatro infantil ‘importa’ sucessos da TV

‘Recado aos pais: não se espantem ao passar os olhos pelos títulos ‘Castelo Rá-Tim-Bum’, ‘Sítio do Picapau Amarelo’ e ‘Cocoricó’ no roteiro de teatro infantil do Dia das Crianças. Vocês não foram parar acidentalmente na programação de TV; eles é que saíram de lá para os palcos paulistanos.

No próximo fim de semana, as turmas de Nino e Narizinho disputarão as atenções da garotada com Julio e sua trupe de bonecos (em cartaz desde 13/ 9). Diretores e produtores têm visões diferentes sobre essa abundância de montagens baseadas em grifes consagradas na televisão -só o ‘Sítio’ está fora do ar atualmente.

Roberto Talma, diretor da peça decalcada das criações de Monteiro Lobato (e também da primeira fase do ‘remake’ da série, em 2001), é taxativo:

‘Hoje em dia, quanto menos risco você correr, melhor. Vamos supor que haja de 30 a 40 mil pais que levarão os filhos para assistir pelo fato de terem conhecimento [da história]. Digamos que gostem e espalhem. A gente então consegue fazer um movimento grande. É diferente quando você faz um espetáculo inédito e parte quase do zero. O universo de espectadores possíveis é muito pequeno. Tem de contar com a sorte.’

Mira Haar, diretora e produtora de ‘Castelo Rá-Tim-Bum: Onde Está o Nino?’, diverge. ‘É preciso correr riscos, sim, para se criar algo novo.’

Mas trata-se aqui da remontagem de uma produção de 97.

‘Eu trabalho por porcentagem de bilheteria. Estou correndo risco. Não vim aqui a negócio. Claro que [o risco] não é tão grande, porque as pessoas amam o ‘Castelo Rá-Tim-Bum’, temos a garantia de que o programa está no coração delas. O desafio é não pasteurizar, diante de tanta tecnologia’, avalia ela, que se valerá de efeitos visuais para encenar truques de mágica não vistos no seriado.

‘Não é caça-níquel’

Fernando Gomes, autor, diretor e manipulador de bonecos de ‘Cocoricó, uma Aventura no Teatro’, afirma que o projeto de levar os personagens ao teatro nasceu junto do programa de TV, em 1996:

‘Nunca pensei: ‘Vamos fazer [no teatro] uma coisa de televisão porque isso terá mais público. Juro que tem muito de poesia, desse sonho de 12 anos. Definitivamente, não é um caça-níquel, até por que abri mão dos hits da série em favor de músicas que se inserissem no contexto do espetáculo.’

Ele diz que a peça demorou a sair do papel pois, sempre que havia um produtor interessado, ‘as ideologias eram diferentes das minhas’. ‘Queriam montar em teatro grande, com telão, ou botar atores fantasiados como os personagens [no programa, só há bonecos]. Eram propostas que me envergonhavam. Nunca quis enganar o público.’

Problema parecido teve Haar ao tentar comprar os direitos de ‘Vila Sésamo’ no ano passado. ‘Disseram que tinha de ser show. Isso eu não topo, porque só se ouve uma música e se vê um boneco ‘cabeção’. Gosto é de fazer teatro.’

Teatro que resulta fidelíssimo à matriz televisiva.

Mesmo intérprete

Em ‘Onde Está o Nino?’ (sobre os efeitos de uma mágica do personagem-título no meio ambiente), a grande ‘importação’ da TV foi justamente o intérprete original, Cássio Scapin -ok, há também Luciano Amaral, o Pedro do programa, que agora é assistente de direção.

O co-criador do seriado, Flávio de Souza, foi outro a fazer a transição -ele assina a dramaturgia. Idem para a trilha de André Abujamra, Arnaldo Antunes, Hélio Ziskind e outros.

No ‘Sítio’ (costura dos livros ‘Reinações de Narizinho’ e ‘O Picapau Amarelo’ com pílulas biográficas de Lobato), além de Talma, a figurinista (Helena Araújo, da primeira versão da série, nos anos 70) pulou da telinha para o palco. Não é pouco o que os produtores prometem: cenário monumental, projeções 3-D, bonecos eletrônicos e vôos sobre a platéia.

É ‘Cocoricó’ que parece mimetizar com mais exatidão seu ‘primo’ televisivo: autor, equipe de manipuladores de bonecos e canções são os mesmos. Tudo para mostrar o alvoroço causado em Cocorilândia pela passagem de um OVNI.

 

 

Caio Jobim

Novela vai da China a subúrbio carioca

‘Um golpe bilionário em um cassino chinês obriga Liu (Jui Huang), nativo oriental, a fugir para Portugal. Ele acaba parando no Brasil, mais precisamente no Parque das Nações, típico bairro do subúrbio carioca. Esse é o mote inicial de ‘Negócio da China’, nova novela das 18h, que a Globo estréia amanhã para tentar reverter a crise de audiência que assola as novelas da emissora -especialmente as exibidas nesse horário. Enquanto esteve no ar, ‘Ciranda de Pedra’ manteve-se abaixo dos 30 pontos no Ibope.

Saem de cena as produções de época e entra o universo cômico -com pitadas de ação e romance- de Miguel Falabella. Originalmente, Falabella apresentou ‘Negócio da China’ para a faixa das 19h. Por sugestão do diretor Roberto Talma, o autor aceitou o desafio de dar início à renovação temática proposta pela emissora para a faixa das 18h, mesmo tendo que alterar a trama para adequá-la à classificação indicativa (livre).

‘Curiosamente, quando revi a novela para o horário das seis e comecei a tirar alguns núcleos marcadamente cômicos, achei que a trama ganhou uma humanidade maior. O humor sempre será a tônica do meu trabalho, porque é por esse prisma que olho a vida, mas ‘Negócio da China’ é basicamente uma aventura, com romances arrebatadores, dentro dos moldes folhetinescos clássicos’, afirma o autor. Da China virão a máfia, conta ele, já que ‘o perigo amarelo está no inconsciente de todos nós, além de ser uma realidade cada vez mais próxima’, e também o kung fu, para as cenas de ação, acrobacias e efeitos.

O núcleo português, que gira em torno da Panificadora Nossa Senhora Desatadora dos Nós, é o centro cômico da trama, que se desdobra ainda no restaurante mexicano El Chaparrito e no trio de suburbanas à procura de companhias masculinas -citação paródica à série ‘Sex and the City’. Para compor o par romântico com Fabio Assunção, a escolhida foi Grazi Massafera. Não sem resistência do autor. ‘Ser protagonista é muito difícil. Requer um carisma especial, que vai além da beleza. É preciso que o público torça pelo protagonista, e isso requer aquele algo mais, que os americanos chamam de ‘star quality’.’

Mesmo antes de entrar no ar, ‘Negócio da China’ gerou polêmica por Falabella ter exigido a regravação de cenas da atriz, ex-’BBB’. ‘Um autor propõe um universo e, até que seja assimilado, leva tempo. Há atores que têm mais experiência e percebem de cara a proposta, outros precisam ser guiados com mão mais firme, mas isso é o excitante do trabalho’, diz Falabella, ressaltando que nunca fez uma novela em que cenas não tenham sido regravadas.

NEGÓCIO DA CHINA

Quando: estréia amanhã, às 17h55

Onde: na TV Globo

Classificação indicativa: livre’

 

 

Bia Abramo

O realismo inverossímil da telenovela

‘A TELENOVELA brasileira vem sofrendo de algo que se pode chamar de ‘realismo inverossímil’. Duas das novelas de maior audiência hoje no ar, ‘A Favorita’ e ‘Três Irmãs’, ambas na Globo, têm muitas semelhanças nesse sentido. O modelo de telenovela que se impôs nos anos 70 e 80 no Brasil parte do princípio que é da sua obrigação usar a ficção para discutir assuntos de relevância no mundo real e, de quebra, tentar representar o Brasil daquele momento.

Hoje, a telenovela continua apostando nesse certo realismo apoiado numa versão muito diluída do nacional-popular, mas perdeu um tanto a mão. O Brasil, afinal, se saiu muito mais diverso e complicado do que se imaginava, e não cabe mais na simplificação da telenovela.

O interessante é que essa espécie de crise do modelo ‘representativo’ atingiu o cerne das narrativas. Seja por causa da pressão de produzir audiência de qualquer maneira, seja por uma certa ignorância ficcional, o fato é que esse realismo cada vez mais de araque vem acompanhado de narrativas esburacadas, personagens ruins, viravoltas previsíveis etc. Para ficar num exemplo simples, ‘A Favorita’ e ‘Três Irmãs’ têm situações geográficas completamente absurdas.

Na primeira, a cidade fictícia, pertíssimo de São Paulo a ponto de os personagens viverem trançando de lá para cá, tem ao mesmo tempo grandes fazendas e indústrias de porte para ter um movimento sindical significativo.

Para a segunda inventaram uma cidade onde os jovens falam e agem como se estivessem num shopping da Barra da Tijuca, os adultos parecem saídos de uma novela ‘nordestina’ dos anos 70 e, bem, alguns personagens direto de um hospício dirigido em conjunto por Walt Disney e Dias Gomes.

Qual é o problema dessa geografia do autor doido? Se ainda, de fato, se quiser representar, de alguma forma, o Brasil, mesmo que numa chave interpretativa bem mais modesta do que já se quis, não adianta eleger temas aparentemente quentes e importantes e fazê-los entrar à força numa moldura ficcional esgarçada, sujeita às alavancagens de audiência e, de fato, incapaz de estabelecer relações empáticas com o público.

Claro que ficção, qualquer uma, exige alguma ‘suspensão da descrença’, mas não a retirada total e absoluta de qualquer coerência, consistência e verossimilhança.

Dessa maneira, deixa de ser ficção e torna-se um nada, recheado de comerciais.’

 

 

ELEIÇÕES NOS EUA
Silas Martí

O pintor de Obama

‘Shepard Fairey tem orgulho de sua última ida à cadeia. O artista foi preso em Denver há pouco mais de um mês por colar cartazes pró-Barack Obama durante a Convenção Nacional do Partido Democrata. ‘A gente estava de preto e tinha os bolsos cheios de adesivos do Obama; os policiais me chamaram de anarquista’, conta o artista em entrevista à Folha, por telefone, de Los Angeles.

Não é a primeira vez -é, na verdade, a 15ª- que Fairey, um dos nomes mais conhecidos da ‘street art’ no mundo, é preso por vandalismo, mas não havia encarado a ira das autoridades desde que virou o artista oficial da campanha do candidato democrata à Casa Branca, episódio que romantiza para evitar a pecha de ‘artista do sistema’.

Isso porque ele ficou conhecido nos anos 80 por liderar uma das primeiras campanhas da chamada ‘arte de guerrilha’ na história. Estampando o rosto do lutador francês de vale-tudo André, o Gigante num cartaz com a palavra ‘obey’ (obedeça), Fairey fez uma crítica de alcance mundial à propaganda, e isso usando tática e estética dos regimes totalitários.

Mas também são dele as linhas fortes e cores gritantes dos pôsteres que servem de respaldo imagético à campanha de Obama -críticos ressaltam até a semelhança fonética entre as palavras ‘obey’ e ‘Obama’ nos desenhos.

O retrato estilizado do candidato, em azul, vermelho e branco, com a mesma herança propagandista da cara do lutador André, foi criado por Fairey para, nas palavras dele, ‘apelar ao rebanho ludibriado’ de eleitores norte-americanos.

Como se não bastasse Obama sozinho, Fairey tem colado o clássico ‘Obey’ ao lado da figura do candidato, numa mensagem que apoiadores do Partido Republicano consideram uma estratégia enviesada de manipular a opinião pública.

‘O ‘Obey’ tem a ver com comunicação’, responde Fairey. ‘É triste precisar de uma imagem para dar força aos candidatos, mas estamos lidando com uma população apática, que não faria nada se não tivesse um estímulo visual.’

Herança maldita

As diretrizes estilísticas desse estímulo Fairey encontrou na iconografia com que os republicanos e o norte-americano médio antipatizam. A imagem de Obama fitando o horizonte, envolto nas cores radiantes da bandeira americana, tem inspiração declarada no célebre retrato de Che Guevara feito por Alberto Korda.

‘Ele achou o ângulo perfeito, e o Che tem esse corte de cabelo, esse casaco ‘cool’, tudo isso que parece rebelde, mas o mais importante é o olhar voltado para o futuro, que é o que eu fiz com o Obama’, conta Fairey.

Sem contar ainda as relações com o realismo socialista -retratos de Lênin e Stalin-, todos na mesma paleta acachapante e traços de denso minimalismo.

Tanto que chegou a circular na internet um manifesto de conservadores associando Fairey aos ideais comunistas. O documento, que dizia trazer os ‘fatos’ sobre o pôster de Obama, tinha até um desenho que o artista fez do russo Vladimir Putin, por encomenda da revista ‘Time’, como ‘prova’ de sua ligação com ‘vermelhos’.

‘Dizer que a imagem é socialista é só um argumento político para amedrontar as pessoas’, relativiza Fairey, que se defendeu das acusações do manifesto em seu blog. ‘Eu gosto de tudo, de Sex Pistols a construtivismo soviético, há muitas influências ali’, diz o artista. ‘Só fiz uma imagem poderosa.’

É verdade, no entanto, que dirigentes da campanha pediram que Fairey mudasse a primeira versão do pôster. No lugar da inscrição ‘progress’, que julgaram ‘socialista demais’, pediram que o artista escrevesse ‘hope’ (esperança) e depois ‘change’ (mudança), as duas palavras-chave para Obama.

Mesmo tendo atendido à demanda, Fairey se diz um artista independente e nega qualquer envolvimento oficial com a política ou ambição de ocupar um cargo público. ‘A estratégia é me infiltrar no sistema e fazer mudanças de dentro para fora’, diz. ‘Sou independente demais para a política da política.’

E a independência rende. Obama ganhando ou perdendo, é certo que a incursão eleitoral de Fairey alavancou seus preços. Terminou ontem em San Francisco uma individual do artista com todas as obras arrematadas -acostumado a vender cartazes a US$ 75, chegou a abocanhar US$ 85 mil por um trabalho, valor que ‘nem eu’, ele diz, poderia pagar.’

 

 

***

Democrata ‘pop’ ganha até apoio de Homer

‘Homer Simpson já escolheu seu candidato. No episódio de ‘Os Simpsons’ que vai ao ar em 2 de novembro nos EUA, dois dias antes de suas eleições presidenciais, um dos personagens do desenho que é um dos mais conhecidos do mundo vota em Barack Obama.

Como ele também vota grande parte de Hollywood, reduto democrata na Califórnia governada por Arnold Schwarzenegger, uma das poucas celebridades que apóiam a candidatura do republicano John McCain. Uma busca no Google por ‘artistas que apóiam’ cada um dos candidatos deu 158 mil resultados para o democrata e apenas 423 para o republicano.

Obama tem como cabos eleitorais gente como a apresentadora de TV Oprah Winfrey, que arrecadou US$ 3 milhões para a campanha do senador, Maria Shriver, a mulher de Schwarzenegger, Ben Affleck, George Clooney, a diva Scarlett Johansson, o comediante Chris Rock, Robert de Niro e a ex-’Friends’ Jennifer Aniston.

O vocalista dos Black Eyed Peas, Will.i.am, escreveu duas músicas em apoio a Obama. ‘Dizem que as palavras de Obama são só palavras, mas nos lembramos da última vez em que usaram palavras para nos dividir e instaurar o medo, quando Bush usou palavras para nos intimidar a votar nele’, escreve o rapper em seu blog.

Ainda no campo musical, fazem shows em apoio ao democrata bandas como Arcade Fire e o rapper Jay-Z. Laurie Anderson, nome forte da música experimental oitentista, acha fora de moda fazer um concerto, mas telefonou para eleitores com mensagens pró-Obama.

A pré-candidata democrata, Hillary Clinton, antes de perder a disputa do partido para Obama, também teve o apoio do estilista Marc Jacobs, que decorou a vitrine de uma de suas lojas em apoio à ex-primeira-dama, e de Elton John.

Stallone com McCain

Entre as poucas celebridades pró-McCain, além do ex-’Exterminador do Futuro’, estão Sylvester Stallone, que compara a realidade a um filme de ação e, por isso, o republicano seria o mais apto a liderar, a feminista Lynnete Long, Stephen Baldwin e Fred Thompson, ator do seriado ‘Law & Order’ e ex-senador do Tennessee, no sul dos EUA, que foi pré-candidato à Casa Branca pela chapa republicana.’

 

 

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Não é de hoje que Estado é mecenas

‘Desde que Adolf Hitler foi rejeitado pela Academia de Belas Artes de Viena, foram poucos os artistas plásticos a entrar de fato na política. Mas não é de hoje que o Estado é um grande mecenas e consegue impor seus ideais por meio da arte oficial.

Primeira entre as vanguardas do século 20, o futurismo italiano acabou virando aliado visual do regime fascista décadas depois. Autor do manifesto que definiu o movimento, Filippo Tommaso Marinetti chegou a se filiar ao partido de Mussolini -suas máquinas e apologia à velocidade ajudaram a embalar a doutrina que se queria imprimir à Itália.

Enquanto isso, Moscou estava em plena ebulição com o chamado realismo socialista: arte de traços estilizados e esquema cromático restrito -quase que exclusiva preferência pelas cores do regime, vermelho, negro e bege-, e retratos dos líderes da Rússia pós-revolução.

Do outro lado do Atlântico, essa produção teve um eco no muralismo de artistas mexicanos como Diego Rivera, Gabriel Orozco e David Siqueiros.

No rastro do ‘crash’ da Bolsa em 1929, a Works Progress Administration, agência subordinada ao New Deal, plano de resgate econômico, financiou a produção de artistas que seguiram, pelo menos no reducionismo das formas, alguns cânones do realismo soviético.

Nos anos 40, o nazismo teve seus ideais propagados pela cineasta Leni Riefenstahl e pelo arquiteto Albert Speer, enquanto Hitler mandava queimar obras de Paul Klee e reunia a arte contra o regime no salão dos degenerados.

Nos EUA de Obama e McCain, Andy Warhol fez um pôster contra Richard Nixon nas eleições de 1972. Mais tarde, a candidata a vice Geraldine Ferraro foi retratada como a Liberdade, numa cópia da alegoria de Eugène Delacroix, durante a campanha presidencial de 1984.’

 

 

LUTO
Maureen Dowd, do New York Times

Newman foi ícone de generosidade e classe

‘Paul Newman me ensinou como descascar um pepino. Meus hábitos alimentares foram tão ruins durante muitos anos que eu não sabia em detalhes como fazer uma salada. Por isso, em 1986, enquanto preparava um perfil sobre ele para a ‘NY Times Magazine’, o homem que obteve US$ 250 milhões para caridade com a linha Newman’s Own de molhos para salada e outros pratos me convidou a ajudá-lo a fazer uma salada, e eu mutilei o pepino a tal ponto que ele o arrancou de minhas mãos e me mostrou como descascá-lo.

Em um momento em que o país se sente zangado, em que nossos líderes perderam o direito à nossa confiança, perdemos um ícone americano que representava traços muito escassos no governo Bush: perspicácia, humildade, decência, generosidade e classe. Quando perguntei ao presidente, em 1999, se ele se identificava com quaisquer heróis literários, disse que não, mas que simpatizava com o ar de desafio do personagem de Newman em ‘Rebeldia Indomável’ (1967).

O texano se via como um anti-herói. Mas, na Presidência, os únicos momentos em que exibia essa atitude indômita aconteceram diante das câmeras, nunca quando calamidades reais nos ameaçam ou atingem.

‘Amoral’

Newman era um dos raros homens de centro-esquerda que apreciava ser definido como ‘liberal’. Foi incluído na lista de inimigos de Nixon por apoiar a candidatura presidencial de Eugene McCarthy, oponente à Guerra no Vietnã. Em 1997, telefonei para ele quando Newman começou a escrever alguns artigos para ‘The Nation’ (revista da qual ele era investidor). O ator criticou ferozmente os ‘direitistas se erguendo de seus buracos de rato’, mas não deixou de atribuir parte da culpa aos Clinton. ‘Tudo gira em torno daquilo que permite vencer, e não da moralidade das questões’, disse. Na política como nas corridas de automóveis, afirmou, ‘você pode fazer qualquer coisa se estiver preparado para enfrentar as conseqüências’.

Bajulação

Eu estava nervosa quando encontrei o astro pela primeira vez, porque ele havia sido uma das minhas paixões de adolescência. O encontro aconteceu em um restaurante no Upper East Side, onde me entrevistou.

Newman: ‘O que sabe sobre desarmamento nuclear?’. Dowd: ‘Uhn’. Newman: ‘Como você justifica a posição do ‘New York Times’ sobre a moratória dos testes atômicos?’. Dowd: ‘Uhn’. Ele se sentia muito desconfortável com a adulação que conquistou por seu trabalho, reconhecendo que ‘há algo que corrompe, na profissão de ator. Ela confere importância exagerada à aparência’. Com um sorriso à moda de Butch Cassidy, ele me disse que imaginava que seu epitáfio seria ‘aqui jaz Paul Newman, que morreu fracassado porque seus olhos se tornaram castanhos’.

Ele não quis falar sobre seus filmes. Preferiu conversar sobre as armas nucleares. Gostava de Bach, de Budweiser e de pregar peças absurdas. A moda o entediava, e mulheres que flertavam ou pediam que tirasse os óculos de sol para exibir os olhos azuis o embaraçavam. Em certa ocasião, quando estava servindo bebidas em um evento de caridade, uma velhinha pediu que ele mexesse o drinque com o dedo.

‘Eu adoraria’, respondeu Newman, ‘mas acabei de tirá-lo de uma garrafa de cianeto’. Ele e a mulher tiveram um dos casamentos vistos como mais felizes de Hollywood, mas Joanne Woodward, sempre franca, disse que precisou de muita terapia para aceitar o fato de que, embora ela tenha ganhado um Oscar primeiro, Newman tenha conseguido se manter como galã por quatro décadas.

Ela disse a uma revista que se sentia ‘sempre desconfortável e até zangada’ por ‘Paul ser tão mais famoso… Porque ele viveu minha fantasia’ de estrelato.

Tradução de PAULO MIGLIACCI’

 

 

PRESIDENTE
Silvana Arantes

Procura-se ator ‘com carisma’ para viver Lula

‘Procura-se um ator que encarne Luiz Inácio Lula da Silva no cinema. Mais de 50 candidatos já foram testados pelo diretor Fábio Barreto, que pretende iniciar em janeiro as filmagens do longa ‘Lula – O Filho do Brasil’, baseado no livro homônimo, de Denise Paraná.

A maratona de testes começou depois que João Miguel, premiado pelas atuações como o sertanejo Ranulpho, de ‘Cinema, Aspirinas e Urubus’, e como o retirante Raimundo Nonato, de ‘Estômago’, recusou o papel.

‘O personagem Lula é uma figura incrível. Óbvio que eu teria interesse em fazer, mas já estava comprometido com dois outros filmes, ‘Quincas Berro d’Água’, de Sérgio Machado, e ‘A Hora e a Vez de Augusto Matraga’, de Vinicius Coimbra. Olhei a agenda e vi que não tinha condições de encarar essa empreitada’, diz o ator.

De volta à estaca zero, o diretor decidiu que ‘carisma’ é a principal característica que deve ter o intérprete do operário que chegou à Presidência.

A semelhança física com Lula ou a capacidade de imitar suas características mais marcantes não caem na prova. ‘Alguns atores chegam para o teste falando com a língua presa’, conta Barreto. Enganam-se.

Até agora, apenas dois nomes estão confirmados no elenco -o de Glória Pires como dona Lindu, a mãe de Lula, e o de Cleo Pires como Lourdes, sua primeira mulher, que morreu durante a primeira gravidez, quando teve hepatite.

Roteiro mal escrito

‘Naquela época [1971], o Brasil detinha um dos maiores índices mundiais de morte no parto ‘, observa Denise Paraná. A coincidência entre aspectos da biografia de Lula e traços marcantes da história do Brasil foi o que motivou Paraná a escrever o livro, que é sua tese de doutorado em história pela USP. ‘Eu ouvia Lula contar a vida dele e pensava: ‘É como um roteiro de filme mal escrito, porque tudo se encaixa’, diz.

Encaixa-se, por exemplo, o momento em que dona Lindu deixa o Nordeste com os filhos em direção a Santos com ‘o maior movimento de migração interna que tivemos’, aponta Paraná. O alcoolismo que marca a trajetória do pai de Lula reflete ‘um momento de incidência epidêmica da doença no Nordeste’, diz ela.

Da mesma forma, é representativo de uma realidade mais geral o fato de que ‘irmãs de Lula passaram a trabalhar como domésticas no Sudeste e irmãos dele tornaram-se operários de pouca qualificação’.

O roteiro foi escrito a seis mãos por Paraná, Fábio Barreto e Daniel Tendler. O escritor Fernando Bonassi se encarrega de dar forma final ao trabalho.

A história começa com o nascimento de Lula e termina no enterro de sua mãe, quando ele tem 35 anos e a condição de líder de massa, como sindicalista. O percurso político-partidário posterior será apenas insinuado, na última imagem.

Barreto diz que a trama contemplará ‘as diversas mazelas do personagem’, porque ‘esse não é um filme chapa-branca’.

‘Lançamento continental’

A produção é de Luiz Carlos Barreto, pai do diretor, e de Paula Barreto, sua irmã. ‘Como produtores, temos de ser megalomaníacos, mantendo os pés no chão’, diz o patriarca do clã.

‘Pretendemos fazer com esse filme o primeiro lançamento continental de um longa brasileiro’, anuncia. A estréia, prevista para o fim de 2009, ocorreria simultaneamente nas Américas e em alguns países europeus, caso se concretizem acordos de co-produção internacional em andamento.

O orçamento também é superlativo para padrões brasileiros -R$ 15 milhões, que Barreto pretende reunir ‘sem subsídio municipal, estadual ou federal’, para evitar críticas.

Para atrair o público a ver ‘a história de Lula, que é a de todos os Silva’, Luiz Carlos Barreto já pensou num slogan: ‘Você conhece o homem. Mas não conhece a sua história’.’

 

 

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Encontro com Marisa serve de teste de elenco

‘O momento em que Lula conhece Marisa Letícia, sua futura mulher, é a cena escolhida pelo diretor Fábio Barreto para testar atores e atrizes candidatos a interpretar os papéis no filme ‘Lula – O Filho do Brasil’.

‘Ela fica viúva e vai até o sindicato, atrás de um carimbo num documento. Lula mistura a coisa de atendê-la com a cantada’, descreve Barreto. ‘A princípio, ela não reage bem, mas, no fim, dá tudo certo, como sabemos’, afirma o diretor.

Para os aspirantes ao papel de Lula, o cineasta propõe também outra cena, ‘de carga emocional forte’. Trata-se de um desabafo de Lula a Marisa, quando recebe a notícia de que Frei Chico, seu irmão, está preso no DOI-Codi e sendo torturado. ‘Ele se revolta com o fato de que um homem honesto e trabalhador possa estar sendo perseguido por suas idéias e diz a Marisa: ‘Eles estão quebrando o Frei Chico. Eles estão me quebrando’, conta Barreto.

O diretor chegou a convidar a atriz Leandra Leal para viver Marisa. Ele diz que Leal não pôde aceitar o convite, envolvida com outros projetos.’

 

 

 

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