Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Folha de S. Paulo

ELEIÇÕES NOS EUA
Fernando Rodrigues

Eleição imprevisível

‘WASHINGTON – Prever resultado de campanhas eleitorais é arte traiçoeira. Essa tentação deve ser evitada, sobretudo em uma disputa tão complexa e aberta como a norte-americana. Há inúmeros elementos à disposição apontando em sentidos opostos.

O cenário de superfície mostra uma onda a favor do democrata Barack Obama. Por essa lógica, o republicano John McCain estaria marcado para uma derrota sem precedentes na terça-feira.

Só 25% aprovam o governo de George W. Bush, republicano como McCain. A Guerra no Iraque continua um pântano para a Casa Branca. A crise internacional empurra a economia para um buraco sombrio como não se via em décadas.

Quando McCain olha do outro lado do muro, poderia começar a chorar. Obama já gastou US$ 270 milhões em comerciais contra apenas US$ 125 milhões do republicano.

Quem anda nas ruas das grandes cidades percebe fácil: o entusiasmo está do lado do democrata.

Mas eis um fato curioso. As pesquisas não mostram um massacre pró-Obama. Sobretudo porque, por algum motivo obscuro, as margens de erro nos EUA são generosas. Em levantamentos estaduais é comum haver margens de três a quatro pontos percentuais. Assim, estar cinco ou seis pontos à frente não garante muita coisa.

Os indecisos, perto de 8%, são um enigma à parte. A maioria é composta por gente mais velha, de classe média baixa, muitos na zona rural. A América profunda. Não têm o perfil pró-Obama. Seriam, argumentam os republicanos, os envergonhados dispostos a votar no candidato branco na última hora.

Tudo somado, Obama de fato parece estar à frente. Mas não há ainda como assegurar que já tenha encaçapado a vitória. Só saberemos na terça-feira à noite -ou depois, dado o histórico de lentidão na apuração dos votos por aqui.’

 

 

LÍNGUA
Ruy Castro

A língua frouxa

‘RIO DE JANEIRO – O poeta Ezra Pound dizia que era preciso manter a língua eficiente. Palavras corrompidas, usadas fora de contexto, e a substituição arbitrária e compulsória de umas por outras tornam a língua pobre, imprecisa, ineficiente. Com isso, produzem pensamentos frouxos, e a vida vai para o beleléu.

Ao agradecer, por exemplo, quase ninguém mais diz ‘Obrigado’. O gato comeu o primeiro ‘o’. Milhões agora gorgolejam um excruciante ‘Brigado’. Não que isso seja novidade -apenas tornou-se uma regra não escrita. Naturalmente, o mesmo empobrecimento que produz o ‘brigado’ impede que, se for uma mulher, ela diga ‘Obrigada’.

Da mesma forma, quando alguém hoje nos lisonjeia com um ‘Obrigado’ (ou seu correspondente ‘Obrigada’), abandonamos a resposta clássica, sóbria e elegante, ‘De nada’ ou ‘Por nada’. Em vez disso, cacarejamos ‘Imagina!’ -como se ficássemos sinceramente ofendidos por alguém estar nos agradecendo. Há casos em que, não contente, a pessoa ejacula: ‘Magina!’. Proponho o seguinte: se alguém nos diz ‘Brigado!’, fica liberado o uso de ‘Magina!’ -uma elocução merece a outra.

E o que dizer do ‘Com certeza!’? Há anos, mandou para o limbo uma variedade de opções, como ‘Claro!’, ‘Sem dúvida!’, ‘Evidente!’ ou ‘Certo!’, além do melhor e tão mais simples ‘Sim!’. Jogadores de futebol, nas torturantes entrevistas que concedem ao fim da partida, são os grandes abonadores do ‘Com certeza!’. Quase sempre, sem saber o que significa.

O locutor pergunta: ‘Fulaninho, vocês perderam por 10 a 0. Como será o próximo jogo?’. O craque responde: ‘Com certeza. Agora é levantar a cabeça e trabalhar duro para vencer o próximo jogo e conquistar nossos objetivos’. O locutor só pode agradecer: ‘Brigado!’.

E o craque, retrucar: ‘Magina!’.’

 

 

MENSALÃO
Ana Flor

Duda Mendonça pede desbloqueio de bens

‘Os advogados do publicitário Duda Mendonça pediram ao STF (Supremo Tribunal Federal) o desbloqueio dos bens dele e de sua sócia, Zilmar Fernandes da Silveira. Advogados alegam que o congelamento dos bens está causando a ‘asfixia’ de empresas do publicitário.

Duda -que fez a campanha vitoriosa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002- teve os bens bloqueados por envolvimento no esquema do mensalão. Em 2005, ele admitiu ter recebido no exterior o equivalente a R$ 10,5 milhões como forma de pagamento por campanhas petistas.

O bloqueio de bens foi determinado pelo STF em junho de 2006, após pedido do Ministério Público Federal.

No pedido do desbloqueio enviado ao STF, os advogados alegam que o publicitário já fez o pagamento de mais de R$ 5 milhões, assumiu a sonegação fiscal e tem pagado prestações de valores devidos.

O documento fala ainda que Duda e Zilmar ‘sofreram longa e minuciosa devassa promovida pela Receita Federal’, além de terem as contas de suas empresas examinadas.

O advogado de Duda, Tales Castelo Branco, afirma que ‘dois anos se passaram e nada foi apurado que pudesse comprovar prejuízos causados à administração pública em razão de fraudes em licitação’. Esse foi o argumento utilizado pela Procuradoria Geral da República para pedir o bloqueio.

O pedido ao Supremo informa ainda que a vida do publicitário, desde o escândalo, foi ‘esquadrinhada’. Os reflexos financeiros teriam sido o fechamento de escritórios de suas empresas e demissões.

O advogado disse ainda que o bloqueio dos bens é uma antecipação indevida da pena.

A empresa de Duda foi colocada sob suspeita na CPI dos Correios em agosto de 2005. Na CPI, ele disse ter sido orientado por Marcos Valério, apontado como um dos articuladores do esquema do mensalão, a abrir uma empresa ‘offshore’ nas Bahamas para receber dívidas do PT com campanhas.

Antes de prestar depoimento, Duda transferiu de sua conta no BankBoston R$ 2,5 milhões para a Nov Patrimonial Ltda. A transferência teria ocorrido, segundo a CPI, porque ele temia ter o dinheiro retido, o que acabou ocorrendo, com a indisponibilidade de bens decretada pelo Supremo em junho de 2006.

Duda e Zilmar são acusados pela Procuradoria Geral da República, entre outras coisas, de lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Depois de ficar afastado de campanhas políticas em 2006, segundo ele, por causa do escândalo do mensalão, Duda Mendonça voltou ao marketing político neste ano, vencendo campanhas em Fortaleza, Belém, São Luís e Belo Horizonte, onde atuou como consultor no segundo turno.’

 

 

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Publicitário fez campanhas de Lula e Maluf

‘Processado por evasão de divisas e lavagem de dinheiro, publicitário baiano Duda Mendonça é considerado um dos profissionais mais bem-sucedidos do país nessa área. Na política, foi responsável por inúmeras vitórias. Neste ano, depois de ficar de fora das eleições de 2006, fez pelo menos seis campanhas. Venceu em Fortaleza, Belém, São Luís e Belo Horizonte -onde entrou na disputa quase no final do segundo turno.

Em 2004, fez a campanha de Marta Suplicy à Prefeitura de São Paulo. Ela foi derrotada pelo tucano José Serra. Em 2002, trabalhou nas vitórias de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência e de Aloizio Mercadante para o Senado. Fez ainda as campanhas de José Genoino (PT), para o governo de São Paulo, e Benedita da Silva (PT), para o governo do Rio. Em 2000, assessorou Antonio Palocci (PT) para a Prefeitura de Ribeirão Preto. Antes, fez as campanhas de Paulo Maluf (1992) e de Celso Pitta (1996) à prefeitura paulistana.

CPI

Em 2005, foi chamado à CPI que investigava o mensalão no Congresso e confirmou que recebeu R$ 10,5 milhões no exterior como forma de pagamento de dívidas da campanha de 2002. Ele afirmou que foi orientado pelo empresário Marcos Valério, suspeito de ser um dos principais articuladores do mensalão, a abrir uma empresa ‘offshore’ nas Bahamas. O bloqueio dos bens de Duda foi determinado pelo STF em junho de 2006.’

 

 

REINO UNIDO
Pedro Dias Leite

Trote a ator leva a punição de apresentador e diretora da BBC

‘Uma brincadeira (de péssimo gosto) em um show de rádio se transformou em um dos maiores escândalos dos últimos anos na BBC e levou à suspensão do astro mais bem pago da emissora e à demissão de uma das principais executivas do grupo.

Jonathan Ross, apresentador de um programa nas noites de sexta e com um salário anual de 6 milhões de libras (R$ 20,5 milhões), está suspenso até janeiro, sem pagamento. Russell Brand, uma estrela irreverente, pediu demissão. Lesley Douglas, diretora da rádio BBC2, a mais popular do Reino Unido, também deixou o cargo.

Tudo começou a dar errado quando Ross e Brand decidiram deixar recado na caixa postal do ator Andrew Sachs, 78, que cancelou em cima da hora sua participação em um programa que estava sendo gravado pelos dois na rádio BBC2.

Em meio a risos, os dois revelaram que Brand havia transado com a neta de Sachs, Georgina Baillie, de 23 anos e integrante do grupo Satanic Sluts (algo como ‘Vadias Satânicas’). Foi a primeira de uma série de mensagens com conteúdo sexual ofensivo deixadas na secretária eletrônica do ator, muito querido entre os britânicos por seu personagem como garçom na série consagrada ‘Fawlty Towers’.

O programa -que tem 400.000 ouvintes- não era ao vivo, mas havia sido pré-gravado dois dias antes. Mesmo assim, foi ao ar. O caso não despertou muita revolta até ser destacado por um tablóide no domingo passado. Desde então, a tensão não parou de aumentar, a ponto de o premiê Gordon Brown ter pedido punição pelo caso. As reclamações à BBC ficaram nas dezenas nos primeiros dias, mas ontem tinham chegado perto das 40.000.

O caso provocou ainda mais polêmica por ser na BBC, emissora pública que é financiada por taxa anual paga por todos que têm TV. A revolta com o caso levou a reunião extraordinária do BBC Trust, entidade responsável por supervisionar as atividades da emissora, que decidiu pelas punições.

A condenação aos dois apresentadores foi quase unânime, com algumas poucas vozes dissonantes. Um dos que saíram em defesa de Brand foi Noel Gallagher, da banda Oasis. ‘Na pior das hipóteses, foi uma travessura juvenil que não deixa de ser sem graça, mas é dificilmente ofensiva’, disse o roqueiro.’

 

 

TELEVISÃO
Mônica Bergamo

Lewis Hamilton e o gerenciamento da crise

‘No evento em que o inglês Lewis Hamilton promoveu a campanha Piloto da Vez, de consumo responsável de bebida, no restaurante Museum, anteontem, a preocupação não era a lei seca, mas os programas humorísticos. ‘Se o ‘Pânico’ perguntar alguma coisa, a gente traduz?’, quis saber o diretor de marketing do fabricante de uísque que promoveu a festa. ‘Não sei, porque ‘Pânico’ já é gerenciamento de crise’, opinou uma moça da organização.

Além de Silvio e Vesgo, do ‘Pânico’, estava no salão Rafinha Bastos, do ‘CQC’. Todos com ‘presentes’ para o piloto e disputando espaço com jornalistas de várias nacionalidades. Às 20h21, Hamilton desponta no cenário e autografa um painel da campanha. ‘Ele desenhou uma coisa fálica’, informa Rafinha CQC. ‘É pornográfica’, concorda Vesgo Pânico. O inglês gasta o português para cumprimentar o público: ‘It’s boa nuit?’. Também arranha o nome da iniciativa do patrocinador: ‘Pilôt de vez’. Diz que, quando sai com os amigos, um deles sempre passa a noite ‘sem combustível’, para levá-lo para casa. ‘Eu te levo!’, grita Monique Evans, outra das ‘jornalistas’ da platéia.

Quase no fim, algo é lançado na direção de Hamilton. É o ‘presente’ do ‘CQC’, uma camisa do Vasco. Rafinha Bastos diz, em inglês mesmo, que o time é um dos piores do Campeonato Brasileiro e que o presente é para que o piloto perca a corrida amanhã. Minutos depois, o ‘Pânico’ joga sua prenda: um gato preto de pelúcia, ‘símbolo de ‘good luck’ no Brasil’. E não adiantou contar com boicote da intérprete. Para azar dos organizadores, o inglês de Vesgo também estava em dia.’

 

 

Laura Mattos

Governo vai financiar três séries para jovens

‘O governo federal irá financiar três minisséries dirigidas a jovens das classes C, D e E.

Os projetos, de produtoras independentes, serão selecionados por um júri composto por membros do Ministério da Cultura (MinC), do mercado audiovisual e de TVs públicas, que deverão veicular as séries.

Na primeira etapa, serão escolhidos oito finalistas, que terão de produzir um episódio inaugural, a ser exibido por canais públicos e educativos.

Após submeter os programas a pesquisas qualitativas, os jurados vão determinar os três que serão transformados em minisséries de 12 capítulos.

O valor total do financiamento é de R$ 8 milhões, o que representa cerca de R$ 180 mil por episódio. O valor é baixo, mas viável, na opinião de Fernando Dias, presidente da Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão (ABPI-TV). Para se ter uma idéia, um capítulo de novela da Globo custa em média R$ 300 mil. Já ‘Alice’, série brasileira da HBO, gasta R$ 1 milhão por episódio, provavelmente o mais alto da televisão no país.

O financiamento das três minisséries faz parte do programa Mais Cultura, do MinC. O anúncio foi feito nesta semana, em um seminário realizado na Cinemateca de São Paulo, a fim de definir regras do edital de convocação das produtoras.

Mário Borgneth, coordenador-executivo do Mais Cultura Audiovisual, disse que o edital será lançado entre 10 e 15 de dezembro. A escolha dos oitos finalistas se dará, segundo ele, em março, e a exibição dos episódios inaugurais, de outubro a dezembro de 2009. Já as minisséries provavelmente entram no ar em 2010. De acordo com ele, já há TVs públicas interessadas em veicular os programas, entre elas a Cultura de SP, que participou do seminário. É certo que as séries contarão com a TV Brasil, que pertence ao governo federal.

Dias, da ABPI-TV, afirmou que a escolha dos jovens como público-alvo é positiva. ‘Todo mundo quer trabalhar com esse nicho na TV, que ninguém conseguiu ainda conquistar.’

O próximo passo do Mais Cultura Audiovisual é financiar uma revista eletrônica cultural.’

 

 

Folha de S. Paulo

Cena em que gay se diz são-paulino cai na rede

‘Já está bombando na web cena de anteontem em que o homossexual Orlandinho (Iran Malfitano) revela ser são-paulino, quando Halley (Cauã Reymond) dá de presente para seu filho uma roupinha do Corinthians.’

 

 

Cristina Fibe

‘Projeto 48’ volta a SP para realizar curta

‘Em sua sétima edição, o ‘Projeto 48’, reality que acompanha a confecção de um curta-metragem em 48 horas, volta a São Paulo -o programa já foi produzido também em países como México e Argentina. As 48 horas são estendidas para cinco episódios, exibidos aos sábados, a partir de hoje.

Além das etapas que envolvem a realização do filme, o TNT mostra a seleção do grupo que colocará seu roteiro em prática.

Segundo o apresentador, o ator Babu Santana, ‘mais de 130 equipes’ apresentaram suas idéias. No episódio inicial, cada uma das três equipes finalistas escolhe um lugar de São Paulo para a reunião/entrevista final (dois deles querem a Vila Madalena, é claro).

Recheada de clichês, a última conversa antes da escolha não é focada no roteiro. É um bate-papo de perguntas iguais, com respostas parecidas, em meio a pérolas como ‘[devemos ser escolhidas] porque somos as panteras, lindas e maravilhosas, e lutamos de salto alto’.

Sobe música de suspense, os escolhidos festejam; depois de tanta emoção e ‘união’, o segundo programa promete dar início aos arranca-rabos que tanto interessam ao espectador de reality show.

PROJETO 48

Quando: hoje, às 16h15; reprises às segundas, às 17h

Onde: no TNT

Classificação indicativa: não informada’

 

 

POESIA
Noemi Jaffe

Rascunhos revelam Ana Cristina Cesar

‘V iviana Bosi, uma das organizadoras de ‘Antigos e Soltos’ -lançado agora pelo Instituto Moreira Salles, com fac-símiles de uma pasta rosa de Ana Cristina Cesar, onde ela guardava desde guardanapinhos a cartas e poemas incompletos-, diz, na introdução ao livro, que Ana buscava a ‘apreensão impossível da vida enquanto acontece’.

Somos nós, agora, seus leitores, a buscar a mesma apreensão impossível do que era sua vida e sua poesia (no caso específico dela, inseparáveis), no momento urgente mesmo em que ela acontecia.

E acontecia muito; com intensidade, presença e verdade. São nesses papéis rabiscados, rasurados, que lemos a aproximação de coisas como ‘segredo’ e ‘secreção’, duas palavras com a mesma origem e que Ana C.

soube justapor poeticamente.

Sua poesia é como uma secreção de segredos; palavras, fragmentos e fraturas que vão saindo do corpo da poeta e atingindo o nosso em lugares onde essas secreções acabam se alojando como pequenos segredos. É como se entrássemos nos bastidores de uma poesia e de uma vida que já era toda costurada de esconderijos e descaminhos; vamos tropeçando em seu ‘trôpego silêncio’ e também em seu descozido barulho.

Ana C. pensa, pensa, mistura, acumula, subtrai, até chegar ao ponto de dizer que ‘perdeu o/ paladar/ de tanto pensar que/ comia’. O livro propõe a possibilidade de acompanharmos justamente a construção sempre inquieta de uma vida poética, que pende entre o pensamento, a raiva, o corpo e a inocência.

Afinal, a entrega é tamanha que, mesmo nos momentos mais pensantes e duros, permanece a inocência daqueles que acreditavam em mudar o mundo: ‘changer la vie’, e que, para isso, sentiam até a raiva de forma pura.

Aventura

É difícil (e provavelmente indesejável e desnecessário) assumir a postura de uma leitura crítica diante de um livro cujo pressuposto é o trabalho editorial, que é belíssimo, e cujo conteúdo são papéis que não se pretendiam publicáveis. Seria absurdo emitir juízos sobre a qualidade desses proto-poemas, cartas e bilhetes.

Sendo assim, como a própria autora diz, assistimos à sua ‘aventura de registrar a fenda’, tentando encaixar-nos por entre os buracos que sua escrita vai formando, como dizia Clarice Lispector (de alguma forma próxima de Ana C.), quando dizia que seus leitores, para entendê-la, precisariam colocar-se entre as linhas do que ela escrevia. Como espiões convidados, escondidos entre uma linha e outra, buscando compreender sentidos velados.

Afinal, revirar uma pasta escondida é um pouco isso, mesmo quando se trata dos guardados de uma poeta reconhecida.

Darmo-nos a licença de um certo voyeurismo e a possibilidade cada vez mais necessária do espanto, palavra solitária que Ana C. desenha em letra branca numa página solta. Modesto Carone, ao escrever sobre Kafka, diz que ‘o espantoso é que o espantoso não espanta mais’. Um livro assim deve ser capaz de reavivar em nós esse exercício um tanto esquecido.

ANTIGOS E SOLTOS

Autor: Ana Cristina Cesar

Editora: Instituto Moreira Salles

Quanto: R$ 70 (480 págs.)

Avaliação: ótimo’

 

 

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Publicação tem desde relatos de viagem a cartas

‘‘Antigos e Soltos’ reúne poemas, fragmentos de diário, anotações em cadernos de aula, relatos de viagem, bilhetes e cartas nunca enviadas da poeta Ana Cristina Cesar. Após a morte da escritora, em 1983, todo esse material foi preservado por sua mãe, Maria Luiza. A família doou tudo ao Instituto Moreira Salles, que hoje abriga os originais.

Os escritos estavam reunidos na chamada ‘pasta rosa’ e seu conteúdo foi catalogado por Manoela Daudt d’Oliveira e reorganizado, em sete seções, para a edição do IMS, pela professora de literatura e ensaísta Viviana Bosi.

Os documentos foram reproduzidos como fac-símiles e, para facilitar a compreensão, os textos foram transcritos em letra de imprensa.

Já à venda no site do instituto (www.ims.com.br), a publicação se junta a uma série de reedições da obra de Ana Cristina Cesar que o IMS vem fazendo em parceria com outras editoras, como a Ática (‘A Teus Pés’, ‘Inéditos e Dispersos’, ‘Crítica e Tradução’, organizados por Armando Freitas Filho) e Aeroplano (‘Correspondência Incompleta’, que tem organização de Freitas Filho e Heloisa Buarque de Hollanda).’

 

 

 

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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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