Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Folha de S. Paulo

RIO 2016
Luiz Fernando Vianna

A esquerda gentil e a perereca

‘RIO DE JANEIRO – Pelo menos até os acontecimentos de ontem, o momento era de euforia no Rio. Tem escrito a imprensa local: ‘O Rio vai voltar aos anos dourados’; ‘nunca antes na história a cidade terá visto tantos investimentos’; ‘a hora é essa’. O prefeito Eduardo Paes e o governador Sérgio Cabral já devem estar que nem o ministro Guido Mantega: enjoados de notícias positivas.

Embalada pelo otimismo dominante, a esquerda gentil se reúne em galerias, restaurantes da zona sul e apartamentos de novela de Manoel Carlos para ‘pensar’ o futuro da cidade. Tem necessidade de oferecer sua inteligência. Quem quer comprar?

Não os responsáveis pela marcha do ‘progresso’ que está partindo rumo a 2016. Eles querem trem-bala, supermetrô, trens coreanos, ônibus expressos, tudo veloz: licitações, gastos, ideias.

O pragmatismo venceu. Desde a década de 80 o Rio (Estado e capital) não elege um governante que tenha um mínimo de utopia. Todos atacam o bolo antes que ele acabe. E, agora, o bolo vai crescer.

A esquerda gentil, que carregava estrelinhas no peito antes de o PT ser o apêndice preferido dos locatários do poder fluminense, agora é verde -ainda que o PV tenha apoiado vários dos mandatários locais nas duas últimas décadas. Por falta de opções, os idealistas resistem. Se, como Lula provou melhor do que ninguém, o mundo é dos pragmáticos, o negócio é colorir as favelas e recuperar as praças.

Não é pouco, mas dificilmente será esta a cara do Rio de 2016. Para os donos da chave do cofre, os pensadores gentis são como a perereca de Seropédica, que atrasa as obras do Arco Metropolitano por estar em período de reprodução e já foi defendida neste espaço por Ruy Castro: têm direito a um pouco de diversão enquanto o trator não passa.’

 

TELECOMUNICAÇÕES
Elio Gaspari

As teles dormiram e acordaram a BandaBrás

‘AS OPERADORAS de telecomunicação deram-se conta de que, na copa do Planalto, cozinha-se a criação de uma rede estatal de acesso à internet por banda larga. Condenando a ideia, Otávio Marques de Azevedo, presidente da Andrade Gutierrez, sócia da Oi, disse que em 1998, quando a União vendeu o controle do Sistema Telebrás, fez opção pelo modelo privado de telecomunicações e concluiu: ‘O retrocesso não faz sentido’.

Calma. A criação de uma BandaBrás pode ser um erro, mas essa conversa de ‘retrocesso’ embute uma satanização do Estado que fez a desgraça da privataria tucana, para alegria de alguns gatos gordos. Onze anos de gestão privada resultaram numa fenomenal expansão da rede de telefonia e também no seguinte:

Segundo a União Internacional de Telecomunicações, o Brasil tem o serviço de celular mais caro do mundo. As operadoras respondem que isso é consequência de um carga tributária de 40% sobre o valor da ligação. Tudo bem, tirando-se 40% do indicador da UIT, o minuto brasileiro sai pelo preço do argentino com os impostos e custa oito vezes mais que o indiano.

O Brasil tem 5,3 ligações de banda larga na internet para cada cem habitantes. A Argentina e o Chile têm 8,8. As leis do mercado fizeram com que o número de paulistas ligados à rede veloz (2,4 milhões) seja maior que o de todos os clientes das regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste (2 milhões). Metade dos municípios brasileiros está fora da rede.

Os teletecas do governo planejam utilizar uma base já existente de 31 mil quilômetros de fibras ópticas para levar a banda larga a 87% da população, em 4.245 municípios. Comparando-se esse projeto com os resultados e os preços oferecidos pelas operadoras, retrocesso seria deixar as coisas como estão. A ideia de o governo concorrer com a rede privada não faz mal a ninguém.

O que prejudicou o país, e muito, foi o monopólio da rede estatal. Em 1995, a Embratel tinha uma fila de 15 mil pessoas esperando acesso a um provedor de internet. Um telefone valia US$ 10 mil na Barra da Tijuca e 2.000 votos no interior do Estado do Rio.

Se as operadoras não conseguem, ou não querem, ir além do filé mignon do negócio da internet, o melhor que pode acontecer é a entrada do Estado.’

 

CENSURA
France Presse

Ativista pega dez anos de prisão na China

‘Guo Quan, ex-professor da Universidade de Nanquim e fundador do ‘Novo Partido Democrático da China’, foi sentenciado a dez anos de prisão por ‘subversão contra o poder do Estado’. Defensor de eleições pluripartidárias, ele está preso desde novembro de 2008, após publicar artigos endereçados ao presidente Hu Jintao. Os textos aludiam aos problemas sociais da China, como o desemprego entre operários e camponeses que perderam suas terras.’

 

TELEVISÃO
Sérgio Dávila

Elenco de ‘Seinfeld’ está de volta (mas não muito)

‘Desde o dia 20 de setembro, a tribo formada pelos órfãos de ‘Seinfeld’ nos EUA se reúne nos domingos à noite para assistir ao que mais perto se vai chegar de uma reunião daquela que é considerada por críticos a melhor série cômica já exibida pela TV americana.

Desde então, ‘Curb Your Enthusiasm’ (HBO) inseriu em sua trama o que seriam os bastidores do elenco original de ‘Seinfeld’ se reunindo para fazer mais um episódio da série, que foi de 1990 a 1998 e marcou um dos últimos momentos de criatividade de um formato -a sitcom, com três câmeras e riso da plateia- inventado nos anos 50 e que dura até hoje.

Sendo Larry David o autor e ator de ‘Curb’, a reunião não será de verdade. É o que a tribo de espectadores vem descobrindo a cada semana. Por exemplo, nos quatro episódios exibidos até agora, os quatro atores de ‘Seinfeld’ só aparecem em um -nos outros, são só mencionados, aparecem em pequenas cenas ou nem isso.

Coautor de ‘Seinfeld’, David é o John Lennon para o Paul McCartney de Jerry Seinfeld. Desde o fim da série, ele é o que manteve uma carreira mais coerentemente fértil. Seu ‘Curb’, em que interpreta a si mesmo em situações plausíveis mas exageradas para efeitos cômicos, entrou na sétima temporada com sucesso.

No plot armado por ele para fazer ‘a reunião que não é reunião’, cria um motivo torpe para chamar os ex-colegas a atuar com ele: quer dar um papel secundário à ex-mulher, Cheryl (Cheryl Hines), e assim reconquistá-la. Para sua surpresa, Seinfeld e o elenco aceitam.

Assim, Seinfeld, Julia Louis-Dreyfus, Michael Richards e Jason Alexander interpretam a si mesmos interpretando a si mesmos enquanto falam com Larry David sobre a volta para mais um episódio -tudo dentro de ‘Curb’. Confuso? É para ser assim, disse David.

Nos convites individuais, ele mente a cada um que os outros já aceitaram. Seinfeld desconfia dos verdadeiros motivos do amigo que ele conhece muito bem. Alexander acha bom uma volta para redimir o péssimo último capítulo da série -uma crítica verdadeira que se faz ao encerramento do programa.

Richards não presta atenção, atoleimado que está com os cartazes de mulheres nuas do restaurante a que David o levou, e acaba dizendo sim. E cabe a David vender a volta à NBC. No meio do caminho, ele briga com o executivo da emissora e corre o risco de ficar sem reunião -e sem mulher.

É nesse momento em que os fãs estamos pendurados. O episódio em que tudo acontece foi o terceiro, exibido em 3 de outubro. Desde então, mais um foi ao ar, domingo passado, e nada de ‘Seinfeld’. Hoje é dia de ‘Curb’ nos EUA. E a série vai caminhando para o final…’

 

***

Apenas atriz que faz Elaine se deu bem após fim da série

Passados 11 anos do fim da série, nem todos os ex-’Seinfeld’ se deram bem no meio que os revelou. Do trio de atores principais (não incluído Jerry Seinfeld, é claro), apenas Julia Louis-Dreyfus tem uma carreira digna do nome.

Depois de uma tentativa fracassada de voltar à TV -a subestimada série ‘Watching Ellie’, em que interpretava uma cantora, durou 17 episódios, entre 2002 e 2003-, a atriz recuperou parte do espírito de seu personagem Elaine em ‘New Adventures of Old Christine’, em que ela interpreta a ‘velha’ Christine citada no título.

A sitcom é líder de seu horário nos EUA, 20h de quarta-feira, com 7,5 milhões de espectadores. No Brasil, a série é exibida pelo canal pago Warner. Como em ‘Seinfeld’, um dos segredos do sucesso é o roteiro bem amarrado e o elenco de apoio, liderado pela excelente comediante negra e gay Wanda Sykes.

Jason Alexander, o George Costanza, seguiu uma carreira desimportante em pequenos papeis no cinema e tentou voltar à telinha por duas vezes: com as sitcoms ‘Bob Patterson’, que durou nove episódios em 2001, e ‘Listen Up’, 22 episódios entre 2004 e 2005. Na primeira, é um guru de autoajuda; na segunda, um coapresentador de um ‘talk show’ de esportes; em ambas, medíocre.

E Michael Richards, o inesquecível Kramer, enterrou-se após o episódio de explosão racista que teve durante uma apresentação cômica em Los Angeles, em 2006. Na sequência, fez uma aparição no programa de David Letterman patrocinada por Seinfeld para se desculpar publicamente.

Antes, tinha tentado seguir na TV com ‘The Michael Richards Show’, que durou apenas sete episódios em 2000. O ator nunca mais daria entrevistas sobre o assunto até a reunião de ‘Seinfeld’. Há duas semanas, falou à revista semanal ‘Entertainment Weekly’:

‘A coisa toda foi que eu perdi a calma e só falei um monte de besteira. O próximo passo foi eu mudar e passar a ter mais alegria de viver e ser bem mais aberto às pessoas na minha vida. Clubes são um ambiente muito ruim para se trabalhar. É muito duro. Eu não tinha mais ânimo para aquilo. Não mais, pelo menos’.’

 

Folha de S. Paulo

Amaury Jr. vai comandar programa no canal pago E!

‘Amaury Jr., 59, está prestes a se tornar atração internacional. Contratado pelo canal pago E!, especializado em celebridades, o apresentador comandará a partir do início de novembro um semanal de 30 minutos, em horário nobre.

Isso não significa que abandonará o ‘Programa Amaury Jr.’, exibido de segunda a sexta, e o ‘Amaury Jr. Show’, aos sábados, ambos pela RedeTV!.

‘É uma parceria estratégica para as duas partes, pois serei o representante do Brasil em eventos internacionais, como o Oscar, e matérias interessantes para o E! serão exibidas mundialmente’, conta Amaury, há 27 anos no ar.

Perto de renovar seu contrato com a RedeTV!, solicitando apenas entrar no ar um pouco antes da meia-noite, Amaury inaugura no dia 22 a casa noturna Club A, da qual é sócio.

Localizado no World Trade Center de São Paulo, o clube quer representar o que o ‘Gallery’, famosa casa noturna, significou nos anos 80: um local ‘inovador’ e de elite. Para isso, terá ‘passaporte’ de entrada (forma de avaliação e triagem de sócios).

O apresentador também trabalha em um novo livro. Depois de ‘Bisbilhotices’, é a vez de ‘Bisbilhoteca’, ainda sem data de lançamento. ‘O livro traz as coisas mais divertidas, que acontecem fora do ar, quando as pessoas estão mais desarmadas’, conta o apresentador, orgulhoso das 78 palavras que arrancou do difícil João Gilberto.

Amaury rebate seus críticos: ‘Acham que sou frívolo. Mas isso é porque ninguém assiste ao programa diariamente. Tem ótimas informações lá’.

Bem-humorado, diz ‘morrer de rir’ com sua imitação no ‘Pânico na TV’, o personagem Amaury Dumbo, sempre com um copo de bebida na mão e mais ‘alegre’ do que deveria.

‘De fato, por conta de um patrocínio de espumantes, apareci muito com o copo na mão nos últimos dois anos. Mas considero a imitação uma homenagem.’

CARANDIRU

Feita após o sucesso do filme ‘Carandiru’, dirigido por Hector Babenco com base no livro ‘Estação Carandiru’, de Drauzio Varella, a série ‘Carandiru -Outras Histórias’ chega amanhã à terra natal do cineasta, a Argentina. Essa é a segunda venda da Globo Internacional ao Canal 7 argentino – ‘Cidade dos Homens’ também foi exibida este ano.

DE CARA NOVA

O ‘Zona de Impacto’, do SporTV, ganhará cara nova em 2010. Além da entrada do apresentador Gabriel Moojen na atual equipe, o programa será feito na rua, em gravações externas, deixando o cenário. O foco continua nos esportes radicais, mas as matérias passarão a mostrar também práticas esportivas que sejam incomuns e curiosas.

CONTRA A BAIXARIA

Hoje, em comemoração à quarta edição do Dia Nacional contra a Baixaria na TV, será divulgado o resultado de enquete sobre o melhor programa da TV aberta. No site da campanha Ética na TV, o ‘CQC’, da Band, lidera com mais de 70% dos votos.

GIL NA MTV

A MTV Brasil vai exibir em novembro, na faixa de programação dedicada a documentários, um especial inédito do cantor Gilberto Gil. Com produção da Conspiração, ‘Gilberto Gil Apresenta: Bandadois’ terá trechos de show que o ex-ministro da cultura fez no começo do mês no teatro Bradesco, além de imagens da carreira. Esse é o primeiro projeto da MTV em parceria com a Conspiração, e é dirigido por Andrucha Waddington.

NOVIDADES NA MIXTV

Amanhã estreia a nova grade da Mix TV. A programação própria da emissora, do mesmo grupo da Rádio Mix FM, cresce de cinco para 12 horas diárias de conteúdo voltado ao público jovem e ao universo musical. Uma das novidades é o reality show ‘Cozinhando pra Fora’, no qual fãs têm que preparar o prato predileto de seus ídolos.

O GORDO EM DVD

Os melhores momentos do programa humorístico ‘Viva o Gordo’, de Jô Soares, exibido pela Globo nos anos 80, serão lançados em dois DVDs, pela Globo Marcas. Com duração total de 5h30, a série trará personagens clássicos como Reizinho, Venturoso, Zé da Galera e Zezinho, com preço de R$ 50.

RONALDO

Hoje, às 19h, vai ao ar o ‘Programa Silvio Santos’ (SBT) em que o jogador Ronaldo, atacante do Corinthians, conversa com o apresentador -que patrocina o time do jogador com as marcas Baú e Grupo Pan-Americano.

PREMIAÇÃO 1

O programa ‘Teatro Rá Tim Bum’, da TV Cultura, está entre os indicados ao Japan Prize 2009, concurso internacional criado em 1965 e que premia os melhores conteúdos educativos ao redor do mundo. A atração representa o Brasil na categoria pré-escola, pela exibição de ‘A Semente da Verdade’.

PREMIAÇÃO 2

A reportagem ‘Moradores de Rua’, feita pela repórter Sandra Aparecida Granzotti, da TV Globo – EPTV Campinas, foi a vencedora da categoria destinada à TV na 31ª edição do prêmio Vladimir Herzog.’

 

Mônica Bergamo

Lilia Cabral se prepara para a gravação da novela ‘Viver a Vida’

‘Lilia Cabral, que rouba a cena em ‘Viver a Vida’, se firma como estrela de primeira grandeza depois de muitos anos em que, às vezes, se sentiu, como diz, ‘assim… poxa, abandonada’ na TV

‘Tem duas datas que uma mulher nunca esquece: a do casamento e a do divórcio’, diz Tereza, a ex-mulher. Já Lilia, a que dá voz e corpo à primeira, acha graça. Não que nunca tenha se separado ou casado. É, como diz à repórter Audrey Furlaneto, ‘uma mulher de verdade’: divorciou-se aos 36 anos, ‘sem traumas’, depois de sete anos de casamento, e, agora, vive com o segundo marido ‘o conforto, o aconchego e a cumplicidade de querer ficar o fim da vida juntos’.

Aos 52 anos, Lilia Cabral interpreta Tereza na novela ‘Viver a Vida’, da Globo. Ao contrário da personagem -ressentida por ter sido traída e deixada pelo marido após abandonar a carreira por ele-, a atriz, ‘graças a Deus’, não acumula dores de cotovelo. ‘Eu sou assim: me separei da primeira vez [do cineasta João Jardim] e não foi traumático, nada disso. Foi normal. Estou casada pela segunda vez há mais de 14 anos, e a gente já é um casal maduro.

Temos uma filha de 12 [Giulia], tenho 52, meu marido [o economista Iwan Figueiredo], 60. Quer dizer, pensamos no futuro dela, pensamos pra frente.’

Ainda assim, ela conhece algumas Terezas. ‘Uma amiga até me disse: ‘Você precisava lembrar na novela que a gente nunca esquece data de casamento e divórcio?’, diz, gargalhando em seguida. Para compor a personagem, ela só usou ‘referências da vida’. ‘É muito de dia a dia mesmo, de você ver num filme um certo olhar de uma atriz ou um ator, amargurado ou triste, por chegar a um determinado tempo da vida e jamais ter imaginado que um piano pode cair na cabeça.’

Por piano que cai, leia-se: o divórcio. Ele, aliás, foi o que Lilia chama de ‘mudança radical’ em sua vida: ‘Quando eu me separei da primeira vez, sim, eu mudei completamente. Me vi independente, comprei meu apartamento, tinha 35 anos.

Não olhei pra trás’. Tereza, sua personagem, olha. ‘Ela é uma mulher que sempre teve tudo.

A partir do momento em que deixou de ser modelo e casou, o marido contornou a falta que fez a profissão com tudo aquilo que ela queria. Então, ela foi mal-acostumada. Ela tem aquela mansão de Búzios, propriedades, dinheiro, viagens…’

Na vida da atriz, não foi o marido, mas o pai, Bertolli Gino, um italiano que imigrou para o Brasil como mecânico de uma fábrica da Itália, quem quis que ela abandonasse a profissão.

Foi assim que, aos 26, depois de fazer a Escola de Arte Dramática, em SP, Lilia saiu de casa brigada e se mudou para o Rio.

‘Ele não queria que eu viesse, que eu tivesse uma vida independente. Imagina? Eu já tinha 26 anos. Ele estava louco?’, conta. Mais tarde, fez as pazes.

‘Fiz, mas não precisava ter brigado. E, depois, eles [o pai e a mãe, Almedina Cabral] já estavam mais velhos e faleceram, e eu fiquei sem um e sem outro.

Por outro lado, eu também fui muito responsável comigo mesma, com meus sentimentos, não abri mão do que eu mais quis na minha vida.’

Lilia é contratada da TV Globo há 25 anos, fez 24 novelas, mas foi só em 2006, com a polêmica Marta, a avó que não tolerava a neta com síndrome de Down, em ‘Páginas da Vida’, que conseguiu sua ‘ascensão’.

Em seguida, interpretou Catarina, que apanhava do marido em ‘A Favorita’ (2008), e protagonizou ‘Divã’, uma das maiores bilheterias do cinema nacional em 2009 (mais de 1,85 milhão de espectadores). Antes, porém, atuou em papéis mais leves, de mulheres divertidas, como a Aldeíde Candeias de ‘Vale Tudo’ (1988) ou a Amorzinho de ‘Tieta’ (1989).

‘Chegavam a emocionar, a divertir, mas pegar um personagem que, quando você está assistindo, fica com engulhos daquela pessoa, isso eu nunca tinha feito’, diz. ‘A televisão só me deu prazer, mas não posso dizer que, às vezes, eu não me senti, assim… poxa, abandonada. Pensava que poderia ter feito alguma coisa melhor, não sei o quê. Em algumas novelas, queria ter papéis melhores, e não tive.’ Ela completa: ‘Eu não tenho ‘panelas’, trabalho com todo mundo, com vários diretores, autores. Isso também não significa que eu não tenha, em algumas situações, ficado frustrada, triste, como em todas as profissões’.

Foi Manoel Carlos quem lhe deu os primeiros ‘personagens complexos’. ‘Ele acreditava que eu podia ser capaz de fazer o outro lado que não o histriônico, divertido. Ele me vê como uma mulher forte’, diz Lilia. Os papéis mais densos renderam convites para dar palestras. O tema? ‘Sobre a vida’, ela ri. ‘Eu não sei, eu seria um blefe. Tem gente que se arrisca, vai lá, dá palestra, ganha cachê. Eu não me arrisco. Não posso, é contra a minha ética’, diz. ‘Trabalho com a verdade. Não engano.’

Lilia é discreta. Na última quarta-feira, no Projac, vestia calça e camisa em tons pastéis, sapatilhas amarelas, tinha o cabelo impecável -com laquê da personagem, que ela cuida para manter. ‘Sou uma Barbie que você veste e fica durinha!’ E era só sorrisos e abraços com camareiras, maquiadores e contrarregras. Com 1,74 m e olhos claros, herança do pai italiano, já foi até convidada para posar nua na ‘Playboy’ aos 30, quando fazia ‘Vale Tudo’.

‘Eu falei ‘não’ direto. Nem por muito dinheiro, nada’, diz.

‘Minha formação não é essa de pensar se a ‘Playboy’ chama, se você vira capa de revista, quantas capas você vai fazer… A maior exposição da gente é todo dia no horário nobre.’ Nem publicidade ela faz muito. Quando soube que o amigo José Mayer, ator que interpreta o ex-marido de sua personagem na atual novela, ganhou cachê de R$ 800 mil por anúncios da Vale (que acabaram engavetados pela mineradora), disse: ‘Ô, Zé, eu quero ser você amanhã!’

A atriz diz que ‘adora ter uma vida comum’ -embora não tenha férias há cinco anos por não conseguir negar convites para novelas. Gosta de andar a pé pelo bairro onde mora, o Jardim Botânico, na zona sul do Rio, coleciona canetas e lápis de cor, escreve diários e, depois de 22 anos, interrompeu a análise. ‘Quando você passa dos 50, sabe, começa a pensar que, não é que tenha que resolver os problemas, mas é mais curtir a vida do que propriamente enxergar os problemas. E eu tô nessa, sabe?’’

 

Bia Abramo

‘Filhos do Carnaval’ volta bom como antes

‘PENA QUE seja só lá no HBO. Na segunda temporada, ‘Filhos do Carnaval’ voltou com a qualidade da primeira -e algumas coisinhas a mais.

Se nos seis primeiros episódios, exibidos em 2006, a série sobre o mundo da contravenção carioca tinha uma textura quase cinematográfica, tanto em termos do roteiro como do tratamento visual, desta vez ela se aproxima ainda mais do ritmo e das possibilidades narrativas de um seriado.

E isso não é um problema, pelo contrário. Significa, no mínimo, duas coisas: que havia ali, já da primeira vez, personagens e situações ao mesmo tempo bem construídas e abertas o suficiente para continuar se desenvolvendo e, de uma forma mais geral, que de 2006 para cá se aprendeu a fazer séries por aqui.

Como da primeira vez, ‘Filhos…’ recomeça com uma morte -o episódio 1 mata o filho predileto e herdeiro dos negócios escusos de Anésio Gebara; desta vez, é o velho quem morre. O império constituído por um esquema de jogo do bicho, máquinas caça-níqueis e lavagem de dinheiro na escola de samba -cardápio clássico da máfia à carioca- está nas mãos do caçula, Claudinho. Os dois filhos bastardos e não reconhecidos do bicheiro, Brown e Nilo, estão, de início, alijados da disputa.

Quando o velho morre, Claudinho precisa dos irmãos -é daí que a coisa parte. Os conflitos entre os irmãos e a aparição de um tio vingativo, numa não disfarçada referência aos chefões de Coppola, fazem o tecido narrativo andar para frente. Mas as diferenças entre eles é que criam o substrato dramático. E, claro, falando de diferenças, aqui não há muita sutileza sociológica: elas estão, num primeiro momento, estampadas à flor da pele dos personagens.

O que há de sociologia, entretanto, é tratado de forma tão inteligente e, de certa forma, irônica pelo roteiro que se desvia, folgadamente, do estereótipo para ir em direção a outra coisa. Nesta segunda temporada, então, quando entram, de maneira mais decisiva, as mulheres e os filhos dos três irmãos, tudo se complica ainda mais, como se pode imaginar a partir dos dois episódios já exibidos e do que vai ao ar hoje, às 21h.

E, de resto, tanto a exuberância visual como a direção de atores, se mantém no nível de acerto da primeira. É de lamentar a ausência de Jece Valadão, morto em 2006, logo após a primeira temporada ter sido exibida. Mas a entrada de Walmor Chagas, a ampliação das excelentes participações femininas (Mariana Lima, Roberta Rodrigues e Shirley Cruz) e do adolescente Vitor Thiré (no papel de Cris, o filho de Claudinho) são muitíssimo bem-vindas.’

 

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