Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Folha de S. Paulo


VERSÕES DA VERDADE
Clóvis Rossi


O que você não lerá


‘LONDRES – A definição de reportagem que mais me seduz ouvi-a de Carl Bernstein, um dos dois repórteres do caso Watergate. Diz o seguinte: ‘Reportagem é a melhor versão da verdade possível de obter’.


É a admissão de que 90% ou mais dos fatos que os jornais relatam a cada dia ocorrem longe das vistas de seus jornalistas. Logo, os repórteres estão condenados a juntar versões da verdade, ouvidas dos protagonistas, e organizá-las da melhor forma possível e que faça o máximo de sentido.


Esse conceito me vem freqüentemente à cabeça, muito especialmente quando se trata de cobrir viagens presidenciais, como vai acontecer a partir de amanhã, com a visita de Estado de Luiz Inácio Lula da Silva ao Reino Unido.


Cada vez que ouço o relato, pelo próprio presidente de turno ou por seus auxiliares próximos, de como foi a conversa com o presidente xis ou com o primeiro-ministro y, fico com a nítida sensação de que não estou conseguindo obter ‘a melhor versão da verdade’.


Da última vez que acompanhei Lula em Londres (2003), entrei com os fotógrafos, sem querer (e sem poder), na sala em que conversaria com Tony Blair. Lula perguntou quantos meses durava o verão em Londres (fazia muito calor). Tony Blair e acompanhantes riram. ‘Dura dias, não meses’, exagerou Blair, ironizando a conhecida carência de sol de seus compatriotas.


Celso Amorim, o chanceler, brincou: ‘Tivemos um cônsul em Londres que dizia que fora ao cinema e, por isso, perdera o verão’.


Não é esse tipo de diálogo que chega aos jornalistas. Fico me perguntando se, desta vez, Blair vai perguntar: ‘E aí, Lula, teve ou não o tal de big monthly?’. E se Lula não vai contra-atacar observando: ‘Que baita cascata aquela história de armas de destruição em massa no Iraque, hein, Tony?’.


Se o fizerem, não saberemos. Poderosos jamais fingem que são gente. São sempre candidatos à estátua.’




PARA GOSTAR DE LER
Folha de S. Paulo


Renovação de leitores é tema de seminário


‘A ANJ (Associação Nacional de Jornais) vai promover no próximo dia 27 de março, das 9h às 18h, um seminário para debater quais as iniciativas editoriais que podem estimular a leitura de jornais entre os jovens.


O objetivo da associação é atrair para o evento editores de jornais de todo o Brasil para que possam implementar nos veículos em que trabalham experiências vitoriosas em outras empresas.


As palestras serão ministradas tanto por jornalistas brasileiros e por professores universitários e consultores de mídia com experiência internacional.


O evento, dividido em cinco painéis, é inspirado em encontro semelhante promovido em setembro de 2005, em Buenos Aires, pela WAN (associação mundial de jornais, na sigla em inglês) para debater a renovação de leitores.


Entre os palestrantes, Sylvia Colombo, editora do Folhateen, vai falar sobre acertos e equívocos do jornalismo voltado para os jovens, a partir de sua experiência profissional. Outro convidado, Geraldo Leite, diretor da ANJ, vai comentar as dificuldades para cativar os jovens. ‘Vou tentar mostrar como esse público específico se relaciona com os meios de comunicação’, explica.


As inscrições para o evento podem ser feitas no site da ANJ, o www.anj.org.br. Custam R$ 100 para sócios da entidade e R$ 150 para quem mais se interessar pelo tema. O seminário será no Hotel Gran Meliá WTC, em São Paulo.’




LOST IN TRANSLATION
Déborah Yuri


Versão brasileira


‘Eles vivem à sombra de nomes como Gabriel García Márquez e J.K. Rowling. São parte ativa, mas dificilmente lembradas, dos fenômenos literários de vendas -a não ser quando o trabalho merece reparos. Fazem a ponte entre o universo de um autor e a realidade do leitor.


Às vésperas da 19ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que vai expor mais de 200 mil títulos a partir da próxima quinta, a reportagem decidiu conferir como vivem os tradutores de alguns dos livros mais vendidos do país, gente que, embora escore obras de sucesso, não vai aparecer em estandes ou reportagens da temporada literária.


Não há uma regra para definir quando um livro é considerado best-seller, segundo a Câmara Brasileira do Livro. Mas, em país pouco afeito à leitura, uma obra que consegue vender 20 mil exemplares já pode integrar esse seleto rol -tomando por base a tiragem média de um livro normal, que é de 2.000 a 3.000 cópias.


As obras enfocadas aqui ultrapassaram com folga esses números: ‘Harry Potter’, a série de seis livros publicada em 200 países, já vendeu incríveis 2,5 milhões de exemplares no Brasil e ‘Memória de Minhas Putas Tristes’, o último romance do colombiano Gabriel García Márquez, 193 mil exemplares.


Mesmo com o mercado literário bem mais ativo, a tradução dificilmente é a primeira carreira de um brasileiro com nível superior. Paga-se pouco à maioria dos tradutores, o que pode explicar a situação. Um profissional da área editorial ganha, em média, de R$ 13 a R$ 20 por lauda traduzida. As exceções, como Eric Nepomuceno, que recebe por obra traduzida de García Márquez. Mas o panorama melhorou nos últimos anos; agora já dá para viver de tradução, dizem os profissionais. ‘A globalização aumentou as oportunidades de trabalho. Portanto, encorajaria os jovens que se interessam por tradução a expandir seus conhecimentos sobre culturas estrangeiras e também a brasileira’, diz Lia Wyler, por trás da série ‘Harry Potter’.’




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‘Memórias de Minhas Putas Tristes’


‘De havaianas brancas, jeans e camiseta tipo Hering azul, Eric Nepomuceno recebe a reportagem em sua casa de três andares no Jd. Botânico, no Rio. Aos 57 anos, ele acende um cigarro Charm atrás do outro. ‘Só posso fumar Charm porque aí consigo fazer um controle de quanto fumo por dia. Ordens médicas’, explica, ajeitando um cinzeiro na mesa da varanda enfeitada por plantas.


Em seu escritório, no primeiro andar, em meio a livros e jornais amontoados pelo chão e nas estantes, há um exemplar de ‘Notícia de um Seqüestro’ e páginas de ‘O General e seu Labirinto’, ambos de Gabriel García Márquez, com anotações do próprio. Eric mesmo admite: é mais conhecido como tradutor de Gabo, o colombiano Prêmio Nobel de Literatura em 1982, do que como escritor. Eric afirma só traduzir os autores de que gosta -geralmente amigos. ‘Não sou tradutor, não vivo disso; sou escritor. Cheguei a um ponto da vida em que consigo diferenciar o que é bom e o que eu gosto. Às vezes, coincide.’


Ele e Gabo se conhecem desde 1978, quando se encontraram em Cuba. Eric foi morar no México, lar também do colombiano, e os dois se tornaram íntimos.


O tradutor conta que raramente procurou o autor para falar de tradução. ‘Na primeira vez em que o consultei, ele me mandou um fax histórico, dizendo ‘1. Ve tu dicionário. 2. Ve tu dicionário. 3. Ve tu dicionário’. Aí eu mandei de volta um fax assim: ‘Va te a merda’, lembra ele, que não conversou com Gabo durante a tradução de ‘Memória de Minhas Putas Tristes’, na lista de best-sellers desde o ano passado. ‘Ele só me pediu dois favores: faça uma boa tradução e não me consulte para nada. Se você só traduz por afeto, a responsabilidade é muito maior. Eu lia trechos e lembrava de conversas de 15 anos atrás com o Gabo, e ficava vendo como ele remói coisas antigas. O escritor escreve sempre o mesmo livro, como ele mesmo diz.’


Compartilhamento


‘Traduzir é um meio de compartilhar todo esse mundo’, diz. ‘Mas nunca acho que sou o escritor da obra que estou traduzindo. A tradução é uma releitura, embora o texto em português seja meu.’


A mulher, Marta -que ele chama de ‘minha namorada há 35 anos e 29 dias’ e com quem tem um filho de 30 anos- já discordou dessa tese. ‘Muitas vezes, Marta acordava às três da manhã, impressionada com a beleza do ‘meu’ texto -parecia que era eu quem estava escrevendo.’


Eric lembra já ter dito a Gabo que suas obras o emocionaram a ponto de inspirá-lo a escrever. ‘Sou da geração de 48. Existe uma enorme diferença entre fazer amor e se masturbar. Fazendo amor você corre riscos, pode se apaixonar, pode se machucar, pode nunca mais voltar ao normal. Qualquer coisa que eu leia e não mexa o chão embaixo do meu pé não valeu a pena ter sido escrito.’’




***


‘Harry Potter’ – de J.K. Rowling


‘Quem fez a ligação entre a série de best-sellers ‘Harry Potter’ e os milhares de brasileiros fãs da obra que não lêem na língua inglesa? Ela mora na Gávea, no Rio, até os 40 anos tinha concluído apenas o ensino fundamental (o antigo ginásio), teve como principal consultora sua neta mais velha, fanática pelo bruxinho.


Lia Wyler, casada, duas filhas e três netas, trabalha há 36 anos com tradução. ‘Comecei na profissão com textos técnicos. Depois, vieram os verbetes para enciclopédias, artigos de revistas e livros de literatura popular, culta e infantis e juvenis’, conta Lia, que já traduziu Henry Miller, Tom Wolfe, Carl Sagan e Sylvia Plath.


Suas três netas, de 23, 16 e 6 anos, são leitoras de ‘Harry Potter’ e vibram com o envolvimento da avó com a mais popular obra infanto-juvenil da atualidade. Nascida em Ourinhos (SP), Lia foi para o Rio aos cinco anos, e desde então adotou a cidade. A partir dos 40 anos, fez letras português-inglês com especialização em tradução na PUC-Rio e mestrado em comunicação na UFRJ e foi doutoranda em língua e literaturas de língua inglesa na USP.


Como conseguiu um inglês tão bom? ‘O ginásio que fiz era diferente dos ensinos fundamental e médio de hoje. Estudava-se português, latim, francês, inglês e espanhol. Também aprendi inglês com falantes nativos a partir dos 12 anos, casei-me com um homem cuja família só falava inglês, trabalhei para embaixadas e empresas americanas e morei na Europa’. Se sonha em traduzir alguma obra? Sua resposta vem como um soco no estômago dos sonhadores: ‘Tradutor profissional não sonha com obra a traduzir. Ele se preocupa se amanhã terá outra obra para traduzir’.’




AMOR DE NOVELA
Daniel Castro


Autor de ‘Belíssima’ diz que André ama Júlia


‘Nos próximos capítulos de ‘Belíssima’, ficará cada vez mais claro que André (Marcello Antony) é comandado por um misterioso personagem, que ele presta contas de todos os seus passos a alguém que o telespectador ainda desconhece-ou que conhece, caso seja Bia (Fernanda Montenegro) ou outro já em cena.


Segundo Silvio de Abreu, autor de ‘Belíssima’, André não está fingindo quando diz que está apaixonado por Júlia (Glória Pires), a mulher de quem roubou todo o patrimônio. ‘Ele está mesmo apaixonado, mas, pelo fato de estar sendo obrigado a fazer o que faz, ele não pode amá-la nem ficar com ela’, adianta Abreu.


André passará quase toda esta semana ‘fora do ar’. Só reaparecerá no capítulo de sábado, após uma viagem aos EUA. No reencontro com Júlia, a beijará à força.


Na semana seguinte, André dirá a Júlia que está ‘completamente apaixonado’ por ela e proporá à heroína que fuja com ele para o exterior. No fundo, diz Abreu, André quer salvar Júlia de uma iminente tragédia que a ronda.


Ainda nos capítulos vindouros, Érica (Letícia Birkheuer), a filha que foi flagrada com o marido (André) da mãe (Júlia) na cama, descobrirá que está grávida de André. Ela voltará a morar na enorme casa que André roubou de sua mãe na esperança de reconquistá-lo. Érica fará questão de procurar Júlia só para dizer que está morando com André.


OUTRO CANAL


MoneyA contratação de Sonia Braga pela Globo, para ‘Páginas da Vida’, próxima novela das 21h, já é foco de ciumeira. Especula-se que Sonia terá o maior salário do elenco da emissora. À Record, que tentou contratá-la, ela pediu US$ 100 mil mensais. Isso dá mais de R$ 200 mil _o dobro do que a Globo paga a seus principais atores.


TelhadoSBT e Record estão tentando impor um teto salarial a seus apresentadores. Não estariam dispostas a pagar mais de R$ 500 mil, sem contar participações em merchandisings. Foi esse teto que azedou as negociações pela renovação de Gugu Liberato com o SBT. Mas, para contratar Gugu, a Record terá de ignorá-lo.


ReleituraA Globo lança ‘Sinhá Moça’ com festa no próximo sábado no Museu da Casa Brasileira, em São Paulo. No evento, promoverá degustação de café e exposição de carruagens. Como a novela levanta a bandeira abolicionista, a trilha sonora do evento ficará por conta de afrodescendentes: os rappers Negra Li, Helião e Rappin Hood, além de integrantes da escola de samba Vai-Vai.


GalaCumprindo licença-maternidade na Record, a jornalista Maria Cândida, fora do vídeo desde dezembro, volta ao ar hoje à noite. A partir das 21h, ela comandará, ao lado de Rubens Ewald Filho, as transmissões do Oscar pelo canal TNT, diretamente de Atlanta (EUA).




24 HORAS

Lúcio Ribeiro


Jack não morreu


‘O espírito da coisa é mais ou menos assim: se você está são e salvo lendo este texto, é graças a Jack Bauer. Ele já livrou o mundo (tudo bem, os EUA) quatro vezes de ataques terroristas avassaladores e começa no próximo dia 13 a enfrentar ‘o mais difícil de seus dias’ quando outra carga pesada terrorista vem à tona na nova temporada da série ‘24 Horas’, a quinta, que começa a ser exibida no Brasil. Espécie de McGyver moderno, o ‘indestrutível’ agente secreto Jack Bauer é vivido pelo ator Kiefer Sutherland, um dos mais bem pagos de Hollywood.


‘24 Horas’, que mostra um dia inteiro na vida do agente e tem o celebrado formato do ‘tempo real’ (reloginho na tela que indica a hora do dia em que a ação está se passando), começou titubeante em 2001 e hoje atinge recordes de audiência para a Fox americana.


‘Quando começamos o nosso projeto, que era uma série sobre agentes desbaratando ações terroristas, veio o 11 de Setembro. A série quase não foi ao ar. Acreditamos nela e bancamos. Mas ainda assim não deixo de me surpreender com o que ela virou hoje’, disse à Folha, em entrevista em Los Angeles, o ator Kiefer Sutherland (leia mais à pág. E3).


Sutherland se refere aos números que esta quinta temporada alcançou, na estréia americana, em janeiro. A Fox dos EUA botou os quatro primeiros episódios em um domingo e em uma segunda, dois em cada dia. Cerca de 35 milhões de pessoas assistiram à première, nos dois dias, em média, quando nas outras temporadas era raro um episódio chegar a 8 milhões de telespectadores.


Graças à nova temporada, ‘24 Horas’, que acumula 39 indicações ao Emmy e oito ao Globo de Ouro, entrou pela primeira vez e segue com fôlego no milionário grupo dos 25 programas mais assistidos da TV americana. Atravessou fevereiro se equilibrando entre os 12º e 14º lugares.


O sucesso pós-seriado


Sutherland, de repente, está por todo lugar. Em abril, estréia nos EUA ‘The Sentinel’, co-estrelando com Michael Douglas, em um papel que lembra muito o seu em ‘24 Horas’: livrar a Casa Branca de enrascadas terroristas (o filme deve estrear no Brasil em agosto). Além disso, seu rosto está em várias capas de revistas e em programas de entrevista da TV americana. E, recentemente, fundou uma gravadora para apoiar o rock.


No final desta lista de ‘Bauer Power’ está o longa de ‘24 Horas’, que já está sendo formatado entre os intervalos de ação de Sutherland na série e seus outros muitos compromissos. Sutherland já cogitou escrever o roteiro.


Na nova temporada, Bauer está mais vivo do que nunca. Ele, que havia morrido e depois ressuscitado na quarta temporada, para escapar de um conflito internacional com o governo chinês, mudou de nome e se refugiou no interior. Mas, por razões que explicadas aqui seriam ‘spoilers’ (estraga-surpresas), Bauer é forçado a retomar a luta contra o terrorismo.


Junto de Bauer, quem tem ganhado grande destaque desde a última temporada é a nerd de computadores e temperamental Chloe, interpretada por Mary Lynn Rajskub, que entrou na terceira temporada e, graças a sua simpatia ranzinza na série, conquistou papel de destaque no novo filme de Harrisson Ford, ‘Firewall’ (estréia no Brasil dia 10/3).


Outra que lucra com seus papéis em ‘24 Horas’ é a jovem atriz Elisha Cuthbert, que já cavou sua vaguinha na quinta temporada.


No Brasil


No país, ‘24 Horas’ tem relativo sucesso no canal pago em que é exibido, a Fox; na Globo, quando é apresentado nas férias de Jô Soares; e é coqueluche na internet.


Enquanto nas noites de segunda ‘24 Horas’ botou em sua quarta temporada o canal Fox entre as três emissoras mais vistas da TV paga (das 22h às 23h), na Globo manteve uma média de 46% de aparelhos ligados quando foi ao ar no flutuante horário após o ‘Jornal da Globo’.


A Fox prepara uma estréia de gala para a quinta temporada: no domingo que vem, dia 12, às 22h, inicia uma maratona de dia inteiro de reprises da quarta temporada. Quando ela acabar, às 22h de segunda, estréiam o primeiro e o segundo capítulos da quinta.


Mais: para os assinantes de seus serviços, a DirecTV garante que passa o primeiro episódio da temporada nova um dia antes da estréia oficial na Fox. Seria no domingo, 12, em looping, das 14h às 2h, no reservado canal 117.


O trocadilho é em inglês, mas cabe. Jack is back!


O jornalista Lúcio Ribeiro viajou a Los Angeles a convite da Fox’




***


Sutherland quer levar ‘24 Horas’ ao cinema


‘Kiefer Sutherland primeiro bota seu personagem para salvar o mundo, depois corre atrás de dinheiro para bancar bandas de rock e sua coleção de guitarras Gibson.


Em uma sessão de entrevista para a imprensa mundial, da qual a Folha participou em Los Angeles, o ator conta de seu hobby ‘agora profissão’, de como ‘24 Horas’ mudou sua vida e do longa-metragem que vai fazer a partir da série.


Numa compilação das perguntas da entrevista, as feitas pela reportagem da Folha, Sutherland disse o seguinte:


Folha – Como ‘24 Horas’ mudou sua vida como ator? Você, que faz muito cinema, não tem medo de ficar estigmatizado como o durão Jack Bauer mesmo fazendo o papel de um professor de jardim de infância?


Kiefer Sutherland – De modo algum. Estou muito satisfeito com a projeção que me deu e com o resultado que a série está alcançando. Sempre apostei muito nessa série, e fizemos um esforço sobre-humano para que ela pelo menos fosse ao ar do jeito que imaginávamos, numa época difícil para falar em terrorismo.


Se ficarei marcado em qualquer trabalho que eu vá fazer no futuro, esse é um bom preço a pagar para um papel que me deu dinheiro e prestígio. Mas não acho que vou ficar tão marcado assim como agente secreto. Já fiz papel de terrorista e, em ‘The Sentinel’, no qual trabalho com o Michael Douglas, se você olhar bem ele é o Jack Bauer da história.


Folha – A série quase não foi ao ar por causa dos atentados de 11 de Setembro. Como você convenceu os diretores da Fox a exibi-la mesmo com aquele clima de terror que se abateu no país?


Sutherland – A história foi assim: tínhamos cinco episódios prontos, e a série estava marcada para estrear em outubro, quando aqueles eventos aconteceram. Nos primeiros episódios de ‘24 Horas’, também ocorria um acidente de avião provocado por terroristas.


Era tudo complicado, porque a série era projetada para durar longos 24 episódios obrigatoriamente, com um tema daqueles, com um formato daqueles. Não sabíamos o que ia acontecer. Mas fizemos algumas reuniões e decidimos apostar no projeto porque acreditávamos nele, já tínhamos botado muito de nossas vidas nele e não podíamos ficar amarrados tanto a acontecimentos cotidianos. Filmes de guerra continuam sendo filmados quando existe guerra acontecendo.


Folha – O formato da série, de acontecimentos em tempo real, não exclui o telespectador que perde um episódio e já não consegue mais acompanhar a série depois?


Sutherland – Entendo o que você fala, mas tenho uma posição contrária quanto a isso. Quando você perde um episódio de ‘Law & Order’, ou de outra série com história seqüencial, você não deixa necessariamente de assisti-la. E com ‘24 Horas’, pelo o que sabemos, acontece o fenômeno inverso.


Quando uma pessoa perde um episódio, ela se programa para ver uma reprise, assiste pela internet, espera o DVD. Pessoas com uma energia assim a gente não perde. Ela contagia os que não vêem o seriado e nos faz ganhar novos admiradores.


Folha – ‘24 Horas’, o filme, vai mesmo acontecer? Já tem nome?


Sutherland – Estamos bastante empenhados em que ele seja realizado. O projeto, no momento, se chama exatamente ‘24 – The Movie’, mas não sei afirmar se o título realmente vai ser esse.


E, pessoalmente, acredito que séries como ‘E.R’ e ‘Law & Order’, com enredos belíssimos e vivos, dariam excelentes filmes.


Não acho que tenhamos que fazer um filme de ‘24 Horas’ com 100% dos elementos do seriado. Podemos fazer com uma estrutura bastante distinta, personagens diferentes, mais problemas mundanos do que cruciais para a nação. E ainda assim fazer um bom filme. Assim, o filme não seria uma coisa definitiva, que matasse a série da TV.


Também não acho impossível construir um ‘tempo real’ dentro de uma história de duas horas. Temos roteiristas capazes de fazer isso. Mais alguns meses e, acredito, teremos o projeto do filme mais claro nas nossas mãos.


Folha – Você tem uma coleção de 20 guitarras Gibson e agora fundou um selo de rock. A música tem uma importância tão grande para você quanto atuar?


Sutherland – Sempre tive paixão por música. Gosto de vários estilos e sei tocar guitarra um pouco, até hoje tomo lições, mas não me arrisco em público. Como eu nunca desejei tocar em uma banda e ainda assim queria ficar ligado à música de algum modo, eu e um parceiro [Jude Cole] montamos um estúdio, o Ironworks, para ajudarmos jovens artistas de Los Angeles, que têm poucas oportunidades de aparecer num mercado tão exclusivista como o da indústria musical.


Vamos lançar um álbum de uma banda chamada Rocco DeLuca and the Burden já em março, e eu considero sensacional, mas sou suspeito para dizer. No final do ano eles fizeram uns poucos shows na Europa, em países como a Inglaterra, e eu os acompanhei, dando uma de ‘tour manager’. Foi uma experiência eletrizante e acho que, para eles, o futuro vai ser muito bom.’




CIDADE EM DVD
Laura Mattos


‘Cidade dos Homens’ quebra a monotonia do ‘padrão Globo’


‘Vamos direto ao ponto: ‘Cidade dos Homens’ é uma das melhores produções da teledramaturgia brasileira dos últimos tempos. A caixa de DVDs com as quatro temporadas, que sai agora, é uma boa para quem não viu a série na Globo ou assistiu só a alguns episódios. E para os que acompanharam, gostaram e querem ter bons títulos em casa.


‘Cidade dos Homens’ marca a história da TV brasileira por algumas razões. A primeira é ter retratado dramaturgicamente a favela com realismo não-sensacionalista. O morro, o tráfico, as armas, a discriminação, tudo estava lá. Mas as câmeras não eram as jornalísticas da notícia-espetáculo nem as cinematográfica da ‘cosmética da fome’. A favela de ‘CDH’ é ‘só’ -e sobretudo- o lugar onde moram os protagonistas da história, os garotos Laranjinha e Acerola.


Programa independente, ‘CDH’ foi também importante por ter mostrado à Globo que há capacidade de produção televisiva além dos muros do Projac. É o que refresca a programação, quebra a seqüência monótona do ‘padrão Globo de qualidade’ e ainda rende bom ibope.


‘CDH’ é uma criação da produtora O2, de Fernando Meirelles. É neta do especial ‘Palace 2’, exibido pela Globo, que serviu de preparo para que o cineasta rodasse o consagrado longa ‘Cidade de Deus’ (2002). O filme e seu sucesso são pais da série da TV.


Entre outras ousadias, ‘CDH’ usou em seu último episódio desenho animado, que, aliás, foi um balão de ensaio para o lançamento da série em DVD (vamos lembrar que a O2 é a maior produtora de publicidade do país e que os caras sabem ganhar dinheiro).


O capítulo final, dirigido por Meirelles, merece atenção. ‘Em Algum Lugar do Futuro’ é sobre o destino de Laranjinha, Acerola e seus intérpretes, respectivamente, Darlan Cunha e Douglas Silva.


Assim como os personagens, os atores são do morro carioca. E Meirelles joga com as intersecções entre realidade e ficção. Darlan e Douglas têm de abandonar a série pois já têm quase 18 anos (tinham 11 quando tudo começou).


Decidem tentar uma vaga em outra série da Globo e seguem para o Projac com a atriz e ex-paquita Letícia Spiller. Fazem testes para as duas. Na primeira, não conseguem porque são novos. Na segunda, porque o papel é de filho de casal branco, e eles são negros. ‘Por que então eles não usam um casal preto?’, indaga Darlan.


É surpreendente que a Globo tenha veiculado uma porrada tão forte em seu próprio estômago. Os programas fictícios são ridículos, e o episódio ainda satiriza ‘Faustão’ e ‘Globo Repórter’. OK, tudo parece uma brincadeira, mas a acidez está lá, e Fernando Meirelles não nasceu ontem. Se foi descuido ou coragem, não importa. Uma frase do cineasta nos extras do DVD traz uma dica relevante: ‘Talvez o problema maior na TV seja a autocensura de diretores e autores, que deixam de propor algo com medo de ouvir ‘não’ da cúpula’.


Cidade dos Homens


Distribuição: Som Livre (R$ 79,90; preço sugerido; caixa com quatro DVDs)’




PODER FEMININO
Bia Abramo


Mulheres poderosas aparecem na TV


‘Vitória aperta a mão de Júlia, elas se olham nos olhos e se abraçam -um pacto contra a maldade do mundo está firmado. A cena é de ‘Belíssima’, a novela de Silvio Abreu que, contra todas as expectativas, está com índices altos de audiência. Ponto para o autor: em vez de uma heroína romântica, sofredora e solitária, a novela tem duas amigas brigando juntas.


É uma novidade de ‘Belíssima’ trazer para o centro da ação duas mulheres em vez de uma só, boa, em conflito com uma outra, má. Silvio Abreu sempre acreditou em mulheres poderosas (e do bem) -a novela está cheia delas, desde a sestrosa Safira à doce Sabina -, mas dessa vez deu um passo além ao fazer de Vitória e Júlia aliadas leais.


Como se sabe, a lealdade e a amizade entre mulheres é negada de maneira veemente nas sociedades sexistas -a associação solidária de duas mulheres é por demais assustadora.


Sinal dos tempos, com certeza. A TV, conformista que é, sempre foi território dos estereótipos mais tacanhos, das imagens de gênero mais autoritárias, do machismo mais vulgar. Ainda é – na propaganda ou no entretenimento, a objetificação do corpo feminino continua sendo uma tediosa e ofensiva moeda corrente-, mas não só.


Mulheres legais -entenda-se: do bem, donas de seu nariz, de seu corpo, poderosas etc.- , comportamentos e identidades considerados pouco femininos até pouco tempo atrás e sexualidades mais diversas têm aparecido aqui e ali, sobretudo na ficção.


É claro que os seriados norte-americanos incorporaram antes e melhor as conquistas do feminismo (e do pós-feminismo). ‘Sex and the City’ é um exemplo óbvio e ‘The L Word’, idem, mas há muitos outros.


Entre os mais recentes e interessantes, estão os que desafiam algumas da convenções mais intocáveis, como a bondade fundamental da mãe de família, em séries como ‘Weeds’ e ‘Desperate Housewives’.


Ah, sim, e num seriado considerado menor, ‘That 70’s Show’, há a sensacional Donna, um garota grande, meio molecona, que não leva desaforo para casa, sobretudo do namorado.


(Aliás, Maria João, da mesma ‘Belíssima’, também recusa a feminilidade-padrão e vive em atritos com a mãe gostosona e a irmã modelo por conta de suas escolhas identitárias; espero que o autor não a revele lésbica mais adiante).


Aqui, as coisas sempre foram hesitantes nesse terreno, mas, mesmo assim, já são muitas as mulheres bacanas e as garotas superpoderosas que circulam pela TV -uma lista possível teria, além das já citadas, Marinete e Ipanema, do seriado cômico ‘A Diarista’, Penny Lane, de ‘Bang Bang’, Dona Nenê, de ‘A Grande Família’… Viva elas, mesmo que só existam na ficção.’




TRUMAN NA TELA
Moacyr Scliar


Capote Valente


‘Escritores freqüentemente são temas de filmes. Nos últimos anos vimos películas que giravam em torno de Shakespeare, Virginia Woolf, Henry Miller, Sylvia Plath, para citar apenas alguns exemplos. Agora temos como candidato ao Oscar o filme de Bennet Miller, ‘Capote’, que retrata momentos particularmente dramáticos da trajetória de um autor americano de grande sucesso.


Nascido em Nova Orleans em 1924, Truman Capote passou a maior parte de sua vida em Nova York, onde se tornou uma figura conhecidíssima nos círculos sofisticados da ‘Big Apple’. Abertamente gay, chamava a atenção por sua voz aguda, suas roupas conhecidas e sua capacidade de fazer fofoca.


Era também um mitômano contumaz -dizia-se amigo íntimo de Greta Garbo a quem, na verdade, nunca tinha conhecido. Fazia ocasionais pontas em filmes e escreveu roteiros, mas o que o tornou realmente conhecido foi seu trabalho como jornalista e escritor.


Seus textos, especialmente os ficcionais e os de caráter autobiográfico, ajudaram a consolidar o que era conhecido nos anos 50 como ‘estilo homossexual’, um expoente do qual era o dramaturgo Tennessee Williams. O sucesso veio já com os primeiros livros e culminou com ‘Bonequinha de Luxo’ (1958, Companhia das Letras). A personagem principal, Holly Golightly, era uma síntese das mulheres que Capote conhecia: bela, audaz e ansiosa por ascensão social.


Novo jornalismo


Mas o ápice da carreira veio mesmo com ‘A Sangue Frio’ (1966). Em 1959, Truman Capote leu, no ‘New York Times’, uma matéria descrevendo o assassinato, ainda misterioso, de quatro pessoas de uma mesma família na região rural do Kansas. Fascinado pela história, para lá viajou acompanhado de sua amiga e colaboradora Harper Lee, autora do best-seller ‘To Kill a Mockingbird’ (‘O Sol É para Todos’, livro que, Capote insinuava, tinha sido escrito em grande parte por ele).


Nos anos que se seguiram, acompanhou muito de perto a investigação. Seu objetivo inicial era elaborar uma matéria jornalística para a ‘New Yorker’; nesse sentido sua simpatia pessoal e seu poder de sedução desempenharam um papel importante no relacionamento com as pessoas, inclusive e principalmente, os dois assassinos, Perry Smith e Richard Hickock.


Logo ficou claro, porém, que seu método nada tinha a ver com o jornalismo convencional. Para começar, Capote não tomava notas ou gravava entrevistas; memorizava os eventos e as conversas e depois os transformava em texto. Inevitavelmente intervinha aí um processo de seleção emocional, similar à livre associação freudiana e que é a base mesmo da elaboração ficcional.


Essa mistura do objetivo e do subjetivo, do factual e do imaginário, seria a base do chamado ‘novo jornalismo’, do qual Truman Capote foi assim um dos pioneiros.


Por outro lado, o texto foi crescendo e já não cabia nos limites de uma revista, mesmo serializado; nasceu daí o livro que, obviamente, só pôde ser concluído após a execução dos criminosos, o que foi recebido com alívio e até alegria pelo autor (uma atitude que, obviamente, em nada melhorou sua imagem).


Publicado, ‘A Sangue Frio’ transformou-se em best-seller mundial.


Cinema


O filme, magnificamente estrelado por Philip Seymour Hoffman, retrata de maneira muito convincente Truman Capote como escritor e como pessoa. E esse retrato está longe de ser elogioso, pelo contrário.


O que temos aí é um Capote cínico, mentiroso, manipulador, alguém que fará qualquer coisa para obter aquilo que quer, no caso, material para um livro. É verdade que, no momento da execução, vemos o personagem derramar sentidas lágrimas, mas isso não chega a redimi-lo, como aliás aconteceu na vida real.


Depois de ‘A Sangue Frio’, Capote nunca mais publicou algo digno de atenção. Adicto a álcool e drogas, tornou-se um recluso e acabou morrendo de uma overdose aos 59 anos.


O que chama a atenção em tudo isso é o contraste entre o talento e o poder de criação do escritor Capote e a mesquinhez do ser humano Capote. Estamos acostumados a pensar em escritores como pessoas íntegras, generosas, tolerantes, heróicas, até; mas será sempre esse o caso?


Obviamente não, e isso por causa da própria natureza da atividade literária.


Escrever é um ato eminentemente solitário, o resultado de uma funda introspecção. Quando perguntaram a Gustave Flaubert quem era, na realidade, Madame Bovary, a sua resposta foi tão curta quanto enigmática: ‘Madame Bovary sou eu’.


Ou seja, a personagem era uma versão ficcional, uma projeção, do próprio autor. Esse mergulho interior não se faz sem um preço. Como disse o próprio Flaubert: ‘Parece-me que atravesso uma solidão sem fim para ir não sei aonde; sou, ao mesmo tempo, o deserto, o viajante e o camelo’.


O mergulho interior não raro acarreta a perda dos referenciais comuns à maioria das pessoas, inclusive no sentido moral: ‘Não há livros morais ou imorais’, dizia Oscar Wilde (o Truman Capote de seu tempo), ‘há livros bem ou mal escritos’.


E acrescentou, mais tarde, William Faulkner: ‘Escritores são guiados por demônios’. Também é de Faulkner a sentença famosa: ‘Se, para escrever, um escritor tem de assaltar a própria mãe, ele o fará. A ‘Ode a uma Urna Grega’ [do poeta romântico inglês John Keats], vale qualquer número de velhinhas’.


Fica claro que essas sentenças se aplicam perfeitamente ao livro de Truman Capote. E também explicam por que as obras panfletárias do realismo soviético estão de há muito esquecidas. A literatura, como diria Pascal, tem mistérios que a razão comum desconhece.


Moacyr Scliar é escritor, autor de, entre outros, ‘Na Noite do Ventre, o Diamante’ (Objetiva) e ‘Gota d’Água’ (Global).’




PARÓDIAS DE BROKEBACK
Virginia Heffernan


Trocando os papéis


‘Os caubóis gays, ao que tudo indica, têm tudo para se tornarem uma piada que não pára de render outras. As colunas de humor sobre ‘O Segredo de Brokeback Mountain’ começando com ‘quem quer ver isso?’ vêm diminuindo, mas as paródias on-line do filme sobre a dupla de caubóis gays continuam a proliferar tão rapidamente que os sites de museus de vídeos, incluindo youtube.com, gorillamask.net e dailysixer.com (este último, aliás, tem uma seção intitulada ‘Paródias de ‘Brokeback’), não conseguem acompanhar todas as novas sátiras acrescentadas.


Algumas são estúpidas. Outras são espirituosas e muito boas. Mas, como comentários sobre as formas e cerimônias de relacionamentos proto-homossexuais, elas são surpreendentemente argutas. Valem a pena serem levadas a sério.


Todas essas paródias têm o mesmo formato: são trailers de filmes imaginários que reúnem elementos de ‘Brokeback Mountain’ com outros filmes. É claro que os filmes montados não existem na realidade -só existem os trailers. Eles são feitos de maneira anônima, por trupes de humor ou por firmas de criação.


Geralmente as paródias utilizam o tema sexy e melancólico de ‘Brokeback Mountain’, juntamente com os letreiros e as chamadas do trailer do filme, para reenquadrar clipes tirados de outros filmes. A coisa funciona assim: quando cenas entre dois protagonistas homens ou entre um protagonista e um ator coadjuvante são passadas em câmera mais lenta, ao som de música romântica e acompanhadas de letreiros com dizeres carregados do tipo ‘uma verdade que eles não tinham como negar’, a impressão que se tem é que um filme gay surge na tela.


A edição das imagens e o recurso à câmera lenta de fato sugerem que cenas em close, especialmente quando vistas por instantes prolongados, são intrinsecamente eróticas. Tudo aquilo de essas paródias precisam para sugerir o relacionamento homossexual é mostrar o rosto de um dos homens em detalhe, por tempo arrastado, e depois fazer um corte para o outro homem, que parece observar o primeiro com a mesma atenção hipnotizada que o espectador foi obrigado, pela câmera-lenta, a lhe dar. De repente, o subtexto gay parece ser claro e inegável.


Diálogos originais


O que é mais hábil nessas paródias, porém, é a utilização que fazem dos diálogos dos filmes que misturam com ‘Brokeback Mountain’. Muito pouco dos diálogos de ‘Brokeback’ são reapresentados em outros contextos nessas montagens. A maioria deles se esforça ao máximo para arrancar uma trama gay daquilo que já existe nos filmes mais antigos.


O que não faltam nos filmes usados nas montagens -’Fogo Contra Fogo’, ‘Amigos, Sempre Amigos’, ‘Titanic’, ‘Clube da Luta’- são diálogos evocativos que se prestam ao objetivo dos parodistas. Quase toda cena em que um homem mais experiente tenta encorajar outro mais ingênuo a ir atrás de seus sonhos, por exemplo, parece prestar-se a ser interpretado como diálogo gay. ‘Pare de tentar controlar tudo e se solte, cara, deixe rolar!’, diz Tyler Durden (Brad Pitt) ao personagem de Edward Norton em ‘Clube da Luta’. Na paródia de ‘Brokeback’, a fala dá a impressão de fazer parte de uma cena de sedução impositiva.


Em ‘The Empire Breaks Back’ [paródia de ‘O Império Contra-Ataca’], Anakin Skywalker fala: ‘Algo está acontecendo. Eu quero mais, mas sei que não deveria’. Em outro momento, Palpatine o aconselha: ‘Com o tempo você vai aprender a confiar em seus sentimentos’. Quando as falas são justapostas na paródia, elas funcionam convincentemente como cenas de amor.


Outros problemas típicos de heróis hollywoodianos, quando inseridas em novos contextos, soam como expressão sincera e direta dos sentimentos de homens gays. Em ‘Caçadores de Emoção’, o personagem de Keanu Reeves, Johnny Utah, se lamenta: ‘Não consigo descrever o que estou sentindo’. Quando essa fala é dita em ‘Point Brokeback’, a paródia, ela parece exprimir sua incapacidade de encarar seus próprios desejos homossexuais. Para aumentar o ‘frisson’ ou, quem sabe, a autenticidade, algumas das paródias utilizam cenas com atores como Reeves e Tom Hanks, que já representaram personagens gays em outros filmes.


Um problema do herói tradicional dos filmes de ficção científica, especialmente o viajante no tempo, é que ele não consegue descrever seus relacionamentos com outras pessoas.


É o caso de Marty McFly, o personagem de Michael J. Fox em ‘De Volta para o Futuro’. Na cena usada pelos parodistas, Marty apresenta o dr. Brown (Christopher Lloyd) dizendo ‘este é meu -ahn- doc (médico). Meu tio! Doc!’. No novo contexto, soa como a apresentação confusa e gaguejada que um rapaz mais jovem, que ainda não saiu do armário, poderia fazer de seu namorado mais velho, tentando fazê-lo passar por seu chefe, sócio ou tio.


Quase 60 anos atrás, o crítico Leslie Fiedler argumentou que os grandes romances americanos do século 19 dramatizam uma história de amor entre homens, tipicamente um branco e um não-branco: Ishmael e Queequeg (‘Moby Dick’), Natty Bumpo e Chingachgook (‘O Último dos Moicanos’ e outros livros de James Fenimore Cooper), Huck e Jim (‘Huckleberry Finn’).


Fiedler ergueu sua carreira acadêmica brilhante sobre a base dessa tese espantosa, que levou adiante em ‘Love and Death in the American Novel’ [Amor e Morte no Romance Americano], em 1960.


Agora sua tese parece aplicar-se também aos filmes de Hollywood, mas, desta vez, as leituras esmiuçadas que refinaram e ampliaram seu argumento foram feitas não por pós-graduandos, mas por pessoas que brincam on-line, usando pouco mais do que um laptop, uma conexão de banda larga e o software Final Cut Pro.


Mas a minha favorita entre as paródias não exigiu muita tecnologia ou edição, apenas um bom senso das cenas de intensidade emocional entre homens que podem dar lugar a duplos sentidos. É a montagem de ‘Brokeback’ com ‘Fogo Contra Fogo’, o filme subestimado de Michael Mann estrelado por Al Pacino e Robert De Niro. ‘Fogo Contra Fogo’ mostrou uma espécie de tango psicológico no qual os megaatores representam respectivamente um investigador de polícia, Vincent, e um bandido, Neil.


A idéia é que estão falando sobre a vida de tiras e ladrões, mas em ‘Brokeback Heat’, que simplesmente repassa uma cena inteira entre eles, sem truques, a impressão que se tem é que eles estão de fato falando sobre seu amor, sobre o amor gay de modo geral e sobre sua pouca vontade de viver como heteros.


‘Quer dizer que, se você me vir virando aquela esquina, você vai simplesmente abandonar essa mulher?’, pergunta Vincent. ‘Sem nem sequer se despedir dela?’


‘É essa a disciplina’, responde Neil.


‘Isso é omissão, você sabe’, diz Vincent.


‘É o que é’, Neil responde. ‘Ou é isso, ou seria melhor a gente ir fazer outra coisa, meu amigo.’


‘Não sei fazer outra coisa’, fala Vincent.


‘Eu também não’, diz Neil.


‘Nem quero muito fazer outra coisa’, diz Vincent.


‘Também não quero’, diz Neil.


Visto pelo ângulo da interpretação tradicional ou da paródica, isso é simplesmente Pacino e De Niro representando uma cena marcada por emoções fortes contidas. E o que eles querem dizer com isso não é da conta de mais ninguém -só deles.


A íntegra deste texto foi publicada no ‘New York Times’.


Tradução de Clara Allain.’




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Folha de S. Paulo


Sábado, 4 de março de 2006


BRECHAS LEGAIS
Folha de S. Paulo


Limites da publicidade


‘Se há uma questão que desafia a capacidade do legislador de criar regulamentações eficazes é a da publicidade oficial. Todos concordarão que ela é necessária. O poder público precisa manter canais de comunicação com a sociedade para, por exemplo, convocá-la para uma campanha de vacinação e mesmo para prestar contas de suas atividades. O cidadão deve ser informado da destinação dada aos recursos públicos.


O problema é que, não importa muito o que determine a lei, administradores, principalmente aqueles prestes a engajar-se em disputas eleitorais, sempre encontram interstícios legais para transformar o que deveriam ser esclarecimentos públicos em deslavada autopromoção.


O caso do prefeito José Serra, cotado para enfrentar Luiz Inácio Lula da Silva na corrida pela sucessão presidencial, é típico dessa distorção. A prefeitura está colocando no ar uma peça em que alardeia ter recapeado 2,8 milhões de metros quadrados de vias públicas. A sua veiculação abusa do conceito de prestação de contas. A prefeitura veiculou o


comercial em todo o Estado, e não apenas na cidade de São Paulo. A administração procurou justificar a decisão afirmando que a meta é atrair turistas para a cidade, como se asfalto novo atraísse visitantes.


É claro que Serra não é o único a atropelar o espírito da legislação. O fenômeno se repete das prefeituras ao governo federal -neste nível, aliás, está concentrada a maior máquina propagandística. Aprimoramentos na legislação são sempre bem-vindos, mas é praticamente impossível garantir por meio de um enunciado ‘a priori’ o bom uso da propaganda oficial. Não parece, entretanto, irrealista esperar que o aprimoramento da cultura política do eleitor acabará por reduzir o espaço para esse tipo de prática, o que lentamente já tem ocorrido.’




TV DIGITAL
Humberto Medina


Japão não trará fábrica em troca de TV digital


‘Ao contrário do que desejava o governo, representantes da indústria eletroeletrônica do Japão não se comprometeram a instalar no país uma fábrica de componentes (telas e semicondutores). O Brasil queria esse compromisso em troca da escolha do padrão japonês


de TV digital. Ontem houve reunião de representantes das empresas japonesas (Panasonic, Sony, Toshiba e NEC), do governo do Japão e do embaixador do país, Takahiko Horimura, com os ministros Antonio Palocci (Fazenda), Dilma Rousseff (Casa Civil), Sérgio Resende (Ciência e Tecnologia) e Hélio Costa (Comunicações).


Os japoneses não descartaram a instalação de fábricas, mas deixaram claro que não podiam firmar esse compromisso no momento. ‘Achamos que, no futuro, quando houver necessidade ou demanda no mercado brasileiro, interessa às empresas japonesas estabelecer fábricas no país’, disse Akira Okubo, chefe do departamento de Tecnologia e Radiodifusão do Ministério dos Negócios Internos japonês. Segundo ele, no futuro pode haver cooperação entre os países que envolvesse não só a instalação das fábricas, mas também a formação de pessoal.


Dos japoneses, o governo conseguiu só a confirmação dos compromissos já firmados anteriormente – não-cobrança de royalties pela tecnologia da TV digital, financiamento e permissão para que o Brasil tenha representação no conselho que define as normas do padrão japonês de TV digital.


Essas vantagens são semelhantes às oferecidas pelos representantes do padrão europeu (DVB). Dilma disse aos japoneses que o governo pretende tomar a decisão até o final da semana que vem.


Pelos cálculos do governo brasileiro, a instalação de uma fábrica de semicondutores representaria investimento de cerca de US$ 1 bilhão e contribuiria para reduzir em também US$ 1 bilhão o déficit da balança comercial de componentes, que hoje está em cerca de R$ 7 bilhões. Do total do déficit, cerca de US$ 2,5 bilhões são de importação de semicondutores.


O governo irá escolher o padrão de TV digital entre os modelos europeu (DVB), japonês (ISDB) ou americano (ATSC). A disputa no momento está entre o europeu (que daria mais vantagens comerciais, porque é adotado em 57 países) e o japonês (preferido pelas emissoras de TV brasileiras).’




DOWNLOAD ILEGAL
Folha de S. Paulo


Cartel na música digital é investigado


‘O Departamento de Justiça dos Estados Unidos iniciou uma investigação sobre a possível fixação de preços na venda de músicas digitais, de acordo com reportagem publicada pelo ‘Financial Times’. O procurador-geral do Estado de Nova York, Eliot Spitzer, já havia iniciado uma investigação semelhante.


Representantes das quatro maiores gravadoras dos EUA -Universal Music, Warner Music, Sony BMG e EMI- foram notificados das duas investigações. A investigação federal vai verificar se as empresas tiveram discussões impróprias sobre o preço dos produtos, segundo o ‘Financial Times’. As músicas digitais são vendidas via internet, em sites e em programas como o iTunes, da Apple. As vendas de arquivos digitais de música vêm crescendo nos Estados Unidos devido à popularização dos aparelhos tocadores de mp3.


Em 2005, foram vendidos 420 milhões de faixas para download no mundo, segundo a Federação Internacional da Indústria Fonográfica, e essas vendas responderam por 6% das receitas do setor. O aumento das vendas de faixas digitais, porém, ainda não compensa os efeitos da queda das vendas de CDs e da pirataria.


O Departamento de Justiça confirmou que está investigando a possibilidade de haver práticas anticompetitivas no setor de músicas digitais, mas não deu detalhes sobre a investigação. As gravadoras não quiseram comentar o caso.


Preço variável


O preço das músicas digitais é motivo de disputa no setor. A loja digital iTunes, que detém 80% do mercado de venda de downloads de música, defende o preço único de US$ 0,99 por faixa, cobrado desde que começou a funcionar.


As gravadoras, porém, querem valores variáveis para as músicas e dizem que vão mudar o modelo de preços quando os contratos atuais com as lojas on-line expirarem, a partir de abril.’




TV NA DIREÇÃO
Alencar Izidoro e Lucas Neves


Carros poderão ter TVs no painel da frente


‘O governo federal liberou a instalação de DVDs e TVs na parte dianteira dos veículos no Brasil -com a condição de que tenham mecanismos que os desliguem de forma automática quando os carros estiverem em movimento. A nova regra também passou a permitir os aparelhos que orientam os condutores sobre trajetos -como alguns GPSs (sistema de posicionamento global)- inclusive com os automóveis andando.


As mudanças foram fixadas por uma resolução do Contran (Conselho Nacional de Trânsito) publicada no último dia 1º. As decisões do órgão são tomadas por sete conselheiros representantes do governo Lula (PT). As novas normas são polêmicas entre especialistas, para quem elas podem elevar os riscos de acidentes viários.


A resolução 190 do Contran revogou a anterior, 123, de dezembro de 2003, que permitia a instalação de DVDs e TVs de forma que só os passageiros traseiros pudessem visualizar a tela. Embora os motoristas continuem proibidos de ver a imagem quando estiverem dirigindo, técnicos temem instalações indevidas para burlar a fiscalização.


A resolução anterior do Contran já permitia a presença dos GPSs, mas os motoristas podiam usá-los só quando estacionados. Eles precisavam ter a tela coberta por uma tampa quando os veículos estivessem em movimento.


A partir deste mês, esses aparelhos, que já se difundiram no exterior, podem ser usados mesmo com os carros andando, mas as informações dadas por eles, como as rotas programadas por computador, devem ser passadas para quem estiver no volante por meio de áudio e símbolos, e não mapas – que só podem ser exibidos na tela com os veículos parados.


As alterações na legislação do trânsito atendem às reivindicações de fabricantes automotivos, que alegavam atraso tecnológico. Muitos equipamentos foram instalados durante a proibição. Os preços dos DVDs automotivos em duas lojas do centro variavam ontem de R$ 480 a R$ 2.800.


Daniel Bispo, gerente de uma, admitia que muitos clientes já apareciam antes pedindo a instalação no painel e para desligar os mecanismos que impedem seu funcionamento em movimento.


Para Marco Saltini, representante da Anfavea (associação dos fabricantes de veículos) na câmara temática do Contran que sugeriu a mudança, a liberação não afeta a segurança e é semelhante às normas internacionais.’




***


Para especialistas, risco aumenta


‘As novas regras para a instalação e uso de DVDs e TVs automotivos e GPSs que orientam sobre trajetos por meio de imagens é vista com temor por alguns especialistas em segurança no trânsito, para quem elas poderão agravar os riscos de acidentes viários.


‘Quanto mais objetos acessíveis ao motorista, maior a possibilidade de tirar a atenção dele’, afirma José Montal, que é diretor da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego).


O fato de a legislação permitir a instalação na parte dianteira, mas desde que os DVDs desliguem quando os autos estiverem andando, é visto com descrédito por ele. ‘O jeitinho brasileiro é um perigo nessas situações. Muita gente vai querer arrumar um mecanismo para que ele funcione mesmo em movimento’, diz Montal.


Reginaldo Paiva, conselheiro do Instituto de Engenharia, tem uma avaliação semelhante. ‘Tudo que tira a atenção do motorista é ruim e perigoso. Quantos dispositivos já não existem hoje? Vidro, porta, rádio, uma série de coisas’, afirma Paiva, para quem não é possível fazer comparações com as regras fora do país. ‘O comportamento cívico do brasileiro é diferente do europeu. As pessoas aqui testam os limites de aplicabilidade das leis’, diz.


Pela legislação do trânsito, a fiscalização das irregularidades na instalação de DVDs e GPSs deve ser feita pela Polícia Militar. Quem estiver usando os equipamentos de imagem fora das especificações comete uma infração grave, com multa de R$ 127,69 e cinco pontos na carteira de habilitação, além da retenção do veículo para a sua regularização.


O presidente do Contran e do Denatran, Alfredo Peres da Silva, avalia que não há riscos à segurança nas novas regras e que elas corrigem distorções. Ele afirma que, pela norma anterior, inclusive as telas usadas em grandes caminhões e ônibus para auxiliar as manobras ficavam proibidas.


Segundo Marco Santini, dependendo da interpretação, até as mensagens existentes nos painéis dianteiros (que dão informações como aquecimento do veículo e falta do cinto de segurança) poderiam ser contestadas antes de começar a valer a nova resolução. ‘Na Europa, nos EUA, há quem use as telas até para jogo, para ver notícia. Tudo desliga quando começa a andar’, afirma Santini.’




GUGU NA PIOR
Daniel Castro


Sem merchandising, Gugu demite 40


‘O empresário Gugu Liberato já está se adaptando à nova realidade do apresentador Gugu Liberato. Nos últimos dias, a GGP Produções, a produtora de Gugu instalada em Alphaville (Grande SP), demitiu cerca de 40 funcionários, todos ligados à área comercial.


O corte é uma adaptação ao novo contrato que Gugu terá a partir de abril, seja com o SBT ou a Record. Em qualquer das redes, Gugu não terá mais o direito de vender os merchandisings que exibe em seu programa. Assim, toda a estrutura que o apresentador mantinha para a venda de espaços comerciais foi desmontada. ‘Apenas reestruturamos a área comercial e enxugamos as correlatas’, confirma Gugu, cujo contrato com o SBT vence dia 31.


Com a extinção da área de merchandising, a GGP acaba com uma fonte que já gerou uma receita bruta mensal de R$ 2 milhões, mas que estava decadente. A proposta do SBT para renovar o contrato de Gugu toma todo o espaço comercial que ele tinha. Isso deve gerar um corte de 40% nos vencimentos de Gugu _que somam cerca de R$ 1,5 milhão.


A proposta da Record também não dá a Gugu a exploração de merchandisings. Mas a emissora, que espera uma resposta do apresentador na semana que vem, quer terceirizar a produção de seu programa. Ou seja, usará a estrutura da GGP, que continua produzindo comerciais e programas de TV (‘Domingo da Gente’).


OUTRO CANAL


Em casa Sobrinho e conselheiro de Silvio Santos, Guilherme Stoliar deve ser anunciado na semana que vem novo diretor comercial do SBT, cargo que já ocupou há três anos. Assim, o SBT, que sondou profissionais de todas as redes, opta por uma solução caseira.


Música Depois de Rolling Stones e U2 na Globo, será a vez de Carlos Santana… na Band. A emissora irá gravar seu show no Rio, no próximo dia 18, e o exibirá em 2 de abril, a partir das 22h30.


Chá 1 A ministra Matilde Ribeiro (Igualdade Racial), que articula um acordo entre o movimento negro e a Record, está magoada com a rede da Igreja Universal. Recentemente, a ministra veio a SP para uma reunião com o presidente da Record, Alexandre Raposo.


Chá 2 Raposo, no entanto, não compareceu à reunião. Mandou dois assessores, com os quais Matilde Ribeiro se negou a conversar. O executivo da Record diz que não foi ao encontro porque fora chamado às pressas para uma reunião de radiodifusores com a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), em Brasília, para discutir TV digital.


Chapelão Ficou esquisitíssima a mais recente caracterização de Caco Ciocler na minissérie ‘JK’. Para parecer mais cafajeste e com idade próxima dos 60 anos, Ciocler ganhou bigode e um cabelo que tenta ser grisalho. Ficou parecendo vilão de novela mexicana.’




O MELHOR DO PASQUIM
Marcos Augusto Gonçalves


O melhor do ‘Pasquim’ ainda continua bom


‘Contrariando uma das muitas e boas tiradas aforismáticas do jornalista Ivan Lessa, segundo a qual ‘a cada 15 anos os brasileiros esquecem o que aconteceu nos últimos 15 anos’, a lenda do ‘Pasquim’ permanece viva, já passados quase 37 anos da fundação do jornal. É possível que as ‘voltas’ do hebdomadário, à maneira de algumas velhas bandas de rock, tenham ajudado a manter o título em circulação -mas provavelmente também contribuíram para diminuir sua força.


O fato é que nos círculos onde esse tipo de informação importa, mesmo quem não leu ou não era nascido à época sabe que na virada da década de 1960 para a de 1970 surgiu no Rio um jornal independente em cujas páginas desfilavam alguns dos mais talentosos cartunistas, jornalistas, artistas e intelectuais do país.


Agora, chega às livrarias o primeiro volume de um conjunto de três ou quatro livros que reunirá o ‘best of’ do ‘Pasquim’. Organizada pelo jornalista Sérgio Augusto e pelo humorista Jaguar, fundador do jornal, a antologia começa com os primeiros 150 números, editados de 1969 a 1971.


‘O critério de escolha foi altamente subjetivo’, diz Sérgio Augusto, que começou a escrever para o ‘Pasquim’ poucas semanas depois do lançamento, e posteriormente veio a dirigi-lo.


‘Embora alguns artigos e entrevistas tenham ficado envelhecidos, com referências e brincadeiras circunstanciais, nos deparamos com uma quantidade muito grande de coisas boas. Tanto que a idéia era fazer uma seleção dos primeiros 200 números, mas acabamos ficando só com 150’, diz.


O conteúdo do livro realmente não diminui a lenda. Inteligente, bem-humorado, anárquico, o ‘Pasquim’ logo conquistou a simpatia de artistas e intelectuais. Além da produção de sua equipe (ou ‘patota’, como diziam), formada por nomes como Paulo Francis, Tarso de Castro, Millôr Fernandes, Ziraldo, Ivan Lessa e Luiz Carlos Maciel, muitos representantes da intelectualidade e do meio artístico colaboravam com o ‘Pasca’ -entre eles, Vinicius de Morais, Caetano Veloso, Chico Buarque, Glauber Rocha, Dalton Trevisan, Antonio Callado, Rubem Fonseca, Flávio Rangel e Carlos Heitor Cony.


Não é preciso esforço de adaptação mental ao contexto da época para aproveitar a leitura. Vários artigos tratam de temas universais ou de assuntos que ainda despertam interesse. Francis, por exemplo, estréia com um texto sobre o Marquês de Sade. Rubem Fonseca disserta sobre a pornografia. Vinicius escreve sobre mulheres ou traça perfis de personagens como Dorival Caymmi.


Entrevistas


Mas também o sabor de época é curioso e sedutor, presente, entre outras páginas, nos cartuns excepcionais de Henfil e Jaguar, nos textos de Caetano Veloso e Chico enviados da Europa ou nas intervenções de Glauber Rocha. Uma delas, a propósito, merece o epíteto de ‘histórica’: uma entrevista do cineasta com o escritor Gabriel García Márquez, publicada no início de 1971. Cheia de humor e sarcasmo, a conversa transcorre no momento em que Gabo estourava com ‘Cem Anos de Solidão’. Ele, que passara anos fazendo argumentos para filmes mexicanos vagabundos, declara: ‘Tive ódio do cinema. Achei que devia fazer um livro genial, ficar rico e abandonar de vez os países subdesenvolvidos’.


Capítulo à parte são as entrevistas. Ficaram famosas por serem feitas em grupo, regadas a uísque e editadas em registro coloquial. Jaguar garante que a fórmula surgiu ao acaso, por ele não saber copidescar -ou adaptar o texto a um padrão jornalístico. Bem, vamos acreditar.


Uma das mais famosas, a da atriz Leila Diniz, exemplifica muito bem o espírito da coisa. Além dos palavrões (substituídos por asteriscos), as perguntas não eram exatamente convencionais. Basta citar que a dada altura alguém pergunta: ‘Você deu para o seu analista?’.


O Pasquim – Antologia 1969-1971


Organização: Sérgio Augusto e Jaguar


Editora: Desiderata


Quanto: R$ 69 (352 págs.)’




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Tablóide teve influência sobre o jornalismo


‘Embora a modernização da imprensa brasileira seja anterior a seu advento, o ‘Pasquim’ mudou convenções e imprimiu um tom mais autoral e menos empolado à linguagem jornalística, posteriormente absorvido e reprocessado por veículos da grande imprensa.


Fenômeno editorial (chegou a vender 200 mil exemplares, algo considerável mesmo hoje em dia), o tablóide, segundo Sérgio Augusto, acabou por dois motivos: ‘Censura e incompetência administrativa’. A equipe do jornal chegou a ser presa pelo regime militar e, segundo Sérgio, teriam ocorrido desvios na área financeira.


Narcísico e anárquico, o ‘Pasquim’ também foi paroquial em sua ‘ipanemia’ -uma ‘doença fértil’, como escreveu Caetano Veloso. O compositor posteriormente entrou em atrito com o semanário, tendo manifestado, entre outras críticas, discordâncias sobre a maneira como o grupo carioca desprezava o dramaturgo Nelson Rodrigues.


Mas nada disso retira a importância do ‘Pasquim’, um dos melhores espelhos de uma época de obscurantismo oficial mas também de qualidade e criatividade no meio cultural.’




CAUBÓIS GAYS
Folha de S. Paulo


‘Rocky e Hudson’ é destaque em jornal inglês


‘O quadrinho de Adão Iturrusgarai, publicado pela Folha, foi tema de reportagem no ‘Daily Telegraph’ de ontem. O diário conta a história dos personagens Rocky e Hudson, dois caubóis gays, criados por Iturrusgarai em 1991. O quadrinho remete ao favorito ao Oscar deste ano, ‘O Segredo de Brokeback Mountain’, cujos protagonistas são dois caubóis apaixonados. ‘Desenhar caubóis gays foi uma idéia radical naquela época e meus


editores devem ter pensado: ‘Quem é esse doente mental?’ Agora, com o filme, todo mundo está falando sobre eles’, afirmou o cartunista.’




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