SEGUNDO MANDATO
Revista aponta acordo irregular Jader-governo
‘O governo federal aprovou, no fim de 2006, a transferência da concessão da TV Bandeirantes no Pará entre empresas controladas pelo deputado federal Jader Barbalho (PMDB-PA).
Reportagem da revista ‘Veja’ desta semana afirma que a empresa que perdeu a concessão tem dívidas com a União de R$ 82,4 milhões. A que recebeu a TV estaria saneada, o que, conclui a revista, sinalizaria um possível acordo Jader-governo para a concessão não ser usada para pagar a dívida.
Jader é aliado do governo na Câmara dos Deputados e foi elogiado na quarta-feira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele é ainda do mesmo partido do ministro Hélio Costa (Comunicações), que assina, com Lula, a transferência da concessão -da Rede Brasil Amazônia de Televisão para o Sistema Clube do Pará de Comunicação.
Jader conseguiu o controle seu e de familiares sobre o Sistema Clube do Pará um mês antes de aprovada a transferência.
O ministro das Comunicações negou interferência politica no episódio. ‘Qualquer informação tem que ser dirigida ao departamento jurídico do Ministério das Comunicações’, afirmou.
A assessoria do ministério afirmou que a Rede Brasil Amazônia estava em situação regular.
Segundo a revista ‘Veja’, o procurador da República no Distrito Federal Rômulo Moreira Conrado vai ajuizar uma ação civil pública para cancelar a transferência.
A Folha não conseguiu falar ontem com o procurador nem com Jader.’
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Beijando o Kassab
‘UM DIRETOR norte-americano me contou outro dia que sofre de um distúrbio que o impede de entrar em museus.
Ao entrar em uma sala de exposição, seja numa exibição de ciência ou de arte, compulsivamente se sente obrigado a ler todos os textos escritos ao pé dos quadros.
Se não percorrer todas as palavras escritas na sala, não consegue olhar para as pinturas. Sente-se aprisionado pelos textos, como se fossem uma doença que lhe tirasse a visão para as imagens (e é um diretor especialmente cuidadoso com suas imagens).
Disse que este é um distúrbio muito comum, mas que, por mais que tente, não consegue se livrar dele; sua solução foi deixar de freqüentar museus.
Lembrei desta história na semana passada, ao vir pela avenida Tiradentes em direção ao viaduto do Chá. Quando passei diante do prédio da Receita Federal, tive uma visão que me surpreendeu e me inundou de alegria: a cidade de São Paulo estava linda.
Como nós, paulistanos, amamos odiar nossa cidade, estranhei e pensei que a sensação poderia ter sido uma ilusão causada pela luz do sol de final de tarde ou pelo céu especialmente limpo naquele dia, mas não era nada disso.
É que, depois de anos, eu finalmente estava vendo São Paulo ao invés de lê-la. Todas aquelas palavras retiradas das empenas dos prédios e das ruas parecem ter liberado meu cérebro para que ele pudesse ver o que estava por trás.
Me encantei com dezenas de lindas fachadas decô, outras tantas fachadas ecléticas, tão paulistanas, construções do início do século passado ainda intactas, mas antes escondidas por lambris metálicos que sustentavam letreiros.
Percebi então que a compulsão do meu amigo americano talvez seja mesmo um distúrbio comum, eu também sofro deste mal e nem sabia. Me senti orgulhoso como um argentino andando em Buenos Aires, fascinado pela idéia de poder voltar a ver nossa cidade.
E como é bonita São Paulo. E está cada vez mais limpa, mais verde (as paineiras rosa estão prometendo um novo show este ano) e agora também desobstruída das palavras escritas.
Nós não o elegemos, mas sejamos justos, o prefeito Gilberto Kassab (DEM, ex-PFL), como um oftalmologista competente, nos devolveu a visão ou ao menos a paisagem urbana (para que eu não pareça exagerado.) Se eu o visse cruzando alguma daquelas ruas naquele momento, certamente desceria do carro para beijá-lo e agradecer:
– Valeu, doutor.
Fernando Meirelles, 51, que nunca votou em nenhum candidato do PFL, mas está dando o braço a torcer, é cineasta, diretor de ‘Cidade de Deus’ e ‘O Jardineiro Fiel’’
TELEVISÃO
O ‘Sex and the City’ das quarentonas
‘Saem as mulheres solteiras de 30 e poucos anos, equilibrando-se nos saltos de seus Manolo Blahnik, em busca do ‘amor verdadeiro’. Entram as quarentonas suando a lingerie La Perla para conquistar ‘realização profissional e melhorar a auto-estima’. Em ‘Selva de Batom’, que acaba de sair no Brasil, a americana Candace Bushnell, autora do best-seller que deu origem à série ‘Sex and the City’, apresenta heroínas mais preocupadas com sucesso e poder do que com suas relações com os homens, bah.
Para Wendy, a poderosa presidente de um estúdio de cinema; Nico, a poderosíssima editora de uma revista de cultura pop, e Victory, uma poderosérrima estilista, ‘sex’ é, de longe, menos importante do que cifras. O que fica evidente no ‘frisson quase sexual’ que uma delas diz ter ao sobrevoar de helicóptero a ‘selva de batom’ (= Nova York). Ou na ambição de outra, que se confunde com um ‘desejo ardente’.
Em entrevista feita por e-mail à Folha, Bushnell defende os valores de sua nova galeria de personagens: as mulheres precisam do seu próprio dinheiro, de um desejo de assumir responsabilidade total por suas vidas, e de entrar numa relação de igual para igual com seus parceiros.
‘Dinheiro é poder, e seria maravilhoso se mais mulheres pudessem ganhar mais’, sustenta Bushnell, cujo ‘feminismo pop’ a tornou rica e famosa. ‘Num sentido mais restrito, o dinheiro dá a elas o poder de alimentar e tratar os dentes de seus filhos. No mais amplo, ele dá o poder para influenciar potencialmente o mundo, para fazer com que seus pontos de vista sejam ouvidos e viabilizados, e não apenas os dos homens, belicistas e competitivos.’
Superpoderosas
Na ficção de sua ‘Selva de Batom’, que em setembro estréia como seriado na TV americana, estrelado por Brooke Shields, Bushnell questiona, através de suas personagens, se o sucesso profissional traz mesmo felicidade. Duas delas vêem seus casamentos desmoronar. Solteira, a terceira se envolve com um bilionário, portanto mais poderoso do que ela, e que põe em xeque o significado de seu sucesso nos negócios. Ainda assim, a autora defende suas garotas superpoderosas como um bom modelo para se seguir:
‘As mulheres mais felizes que conheço são as muito bem-sucedidas, que também são mães. Elas freqüentemente têm maridos mais jovens, dispostos a assumir sua parcela no cuidado dos filhos, e que entendem que, quando um homem está com suas crianças, não está sendo babá, mas pai’, diz Bushnell, 48, dez anos mais velha do que o marido, e firme em seu manifesto mais realista e menos bem-humorado do que aquele que marcou ‘Sex’.
‘Não consigo imaginar um cenário ruim para mulheres bem-sucedidas e poderosas. Para mim, o pior dos casos é o de mulheres sem dinheiro ou trabalho, completamente dependentes de seus maridos e filhos. Quando eles as deixam, não sobra nada. Acho que nossas atenções deveriam se voltar para estas mulheres, não aquelas que têm competência para dirigir uma grande empresa.’
Para Bushnell, ‘Selva de Batom’, como ‘Sex and the City’, espelha o espírito do tempo. A escritora afirma que encontra personagens parecidos com os seus em qualquer lugar dos EUA. ‘É uma questão de atitude. Há mulheres da ‘Selva de Batom’ que trabalham no meio-oeste americano como gerentes de supermercados’, extrapola Bushnell, que optou pelas carreiras glamourosas de mídia, cinema e moda apenas porque conhece bem o métier.
‘Mas eu também passo por mulheres assim que trabalham com economia, política ou em grandes corporações. A chave do sucesso delas é que precisam amar seu trabalho e sentir que estão fazendo algo diferente. Dinheiro e um carro possante não bastam. A diferença entre homens e mulheres bem-sucedidos é que eles realmente querem os mimos do sucesso. Querem o carro veloz, o iate, a casa grande, e é por isso que eles lutam. Enquanto as mulheres sabem que um carro possante não vai resolver o problema da paz no mundo.’
Também à frente da adaptação do livro para a TV, que ainda não tem data para passar no Brasil, Bushnell não arrisca falar de sua expectativa para o desempenho da nova série, aguardada como espécie de continuação de ‘Sex’. ‘Não tenho idéia de como será a reação do público. Se soubesse, seria um bocado mais rica. E provavelmente teria aquele iate’, diz a escritora, que, pelo visto, também prefere mimos, e seu ‘hype’, em dinheiro.’
Noemi Jaffe
Livro se entrega ao capitalismo
‘Para nós, brasileiros, US$ 100 mil ainda soam como um valor bem substancioso, portanto é estranho ver como executivos nova-iorquinos lidam com US$ 1 milhão como se fosse uma ninharia. Trata-se de uma das maiores inversões (ou perversões) do supercapitalismo americano: a naturalização do artifício e a artificialização da natureza. É como se o dinheiro, produto artificial, fosse um dado da natureza, como uma banana ou uma montanha. Algo inevitável a que precisamos nos adaptar; um fenômeno tão inquestionável quanto a lei da gravidade.
É isso o que se lê em ‘Selva de Batom’, o último livro de Candace Bushnell.
Mulheres altamente bem-sucedidas, agora na faixa dos 40 anos, usando relações amorosas e familiares simplesmente como extensão de seu repertório monetário.
E, por incrível que pareça, o livro não faz a crítica desse quadro; ao contrário, as ironias são fórmulas cosméticas para disfarçar um elogio dessa situação.
Como se fosse um tratado feminista, mostrando o quanto as mulheres conseguiram chegar ao topo e ainda se preocupar com o amor e com os filhos.
Mas não é. Wendy, Nico e Victory, as protagonistas, macaqueiam o que as mulheres sempre criticaram como o lado mais detestável dos homens: manipulam, dissimulam e têm convicção de seus objetivos. É como se a igualdade feminina fosse, enfim, tornar-se tão terrível quanto os piores homens.
O livro parece uma série de TV adaptada para a linguagem escrita. Tiradas, diálogos constantes, cenas dinâmicas e curtas. E o espectro terrível que ronda a todas as personagens é o ‘loser’, esse monstro ameaçador. A meta de ‘perder’ ou ‘ganhar’ na vida transforma tudo num jogo. É melhor perder a ter de concordar com isso.
SELVA DE BATOM
Autor: Candace Bushnell
Lançamento: Record
Preço: R$ 50 (436 págs.)
Avaliação: ruim’
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Autora É A ‘Sharon Stone’ Do Jornalismo
‘Candace Bushnell teve a grande chance de sua carreira quando, em 1994, passou a assinar a coluna ‘Sex and the City’ no semanário ‘New York Observer’. Compiladas no best-seller homônimo, as aventuras sexuais e amorosas de Carrie Bradshaw, seu alter ego, e suas amigas viraram série de sucesso, que ficou no ar de 1998 a 2004. De Bushnell, apelidada de ‘Sharon Stone’ do jornalismo, a editora Record lançou ‘Sex and the City’, ‘Quatro Louras’ e ‘Janey Wilcox, Alpinista Social’.’
Adriana Ferreira Silva
TramaVirtual estréia segunda temporada no Multishow
‘Da internet para a televisão, o programa TramaVirtual -cuja segunda temporada estréia hoje, às 18h, no Multishow- mantém o foco voltado para o circuito independente, o que fez desse portal um dos mais importantes para a música indie no Brasil.
A atração segue apostando no formato de mesclar shows em estúdio com dicas e coberturas de festas e festivais. A novidade dessa fase é o quadro ‘12 Horas no Estúdio’, que, a cada episódio, acompanha uma banda iniciante gravando uma música. A primeira a encarar o desafio é a Rock Rocket, que mostra a novíssima faixa ‘Tequila Baby’.
Apesar de simpática tentativa de mostrar ao espectador como nasce uma canção, a fórmula mostra que pode se esgotar rapidamente. É esperar para ver.
Entre os destaques desta noite, está o cantor Rômulo Fróes, músico ‘cool’ no circuito de inferninhos paulistanos. Em parceria com os artistas plásticos Nuno Ramos e Clima, Fróes é autor de sambas melancólicos, interpretados com uma pegada rock.
A melhor sacada do TramaVirtual, a cobertura de shows e eventos, reestréia acompanhando o festival de rock mineiro Jambolada, em Uberlândia, que apresenta bandas de que poucos ouviram falar, como Besouro do Rabo Branco, Trilöbit, Kayapy e Dead Smurfs.
Falta, no entanto, a interatividade com o público, que garante o sucesso do TramaVirtual na rede.’
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Novo Canal Estréia Na Próxima Terça
‘Começam, na próxima terça-feira, dia 17, as transmissões da TVJB, canal que ocupará o espaço da extinta CNT. A nova programação entrará no ar das 18h à 0h e incluirá um telejornal com Boris Casoy e um talk-show com o deputado Clodovil Hernandes. O canal poderá ser sintonizado em São Paulo pela Net, no canal 4; e pela Sky+DirecTV, no canal 24.’
Bia Abramo
Novo ‘Sítio’ respeita imaginação infantil
‘NÃO DEVE ser tarefa simples adaptar as histórias infantis de Monteiro Lobato. Elas configuram uma espécie de patrimônio imaginário de várias gerações, mas, ao mesmo tempo, estão fortemente enraizadas num Brasil há muito perdido, que tem poucos laços com a experiência das crianças de hoje.
Apesar desse desafio, parece que acertaram a mão nesta nova temporada que estreou na última segunda-feira. Depois de uma tentativa bem bisonha de transformar o programa numa noveleta pré-adolescente, volta-se a um sítio mais infantil e mais próximo das aventuras originais.
Claro, nada vem de graça. ‘O Sítio do Picapau Amarelo’ perdeu o status de programa independente: agora, é atração de um ‘TV Xuxa’ reformado, com teor mais educativo, aparentemente dedicado a mostrar a diversidade ‘cultural’ brasileira. A reforma é tão epidérmica quanto as transformações cosméticas de Xuxa, a eterna garota-propaganda de si mesma: dropes aqui e ali sobre brincadeiras tradicionais, no meio dos desenhos e propagandas de sempre.
Se a estratégia de usar o ‘Sítio’ também para alavancar a audiência da manhã vai dar certo, ainda não se sabe, mas é fato que essa nova versão das reinações de Narizinho, Pedrinho e Emília representa um outro degrau de qualidade.
O truque foi ficar mais colado ao formato das histórias originais -que, basicamente, tratam de crianças curiosas e inteligentes vivendo aventuras imaginárias, uma receita que, se feita com honestidade, dá certo em 90% dos casos. Além disso, até agora há muito cuidado com a qualidade dos diálogos, que são outro ponto essencial de Lobato.
As crianças estão bem dirigidas, fazem um Pedrinho e uma Narizinho com bastante espontaneidade, e Tatyane Goulart achou o tom certo -desaforado, maquinativo e desbocado- para sua Emília. A subtrama dos habitantes do Arraial dos Tucanos, que conta com a participação de excelentes atores como Duda Mamberti, Renato Borghi e Agildo Ribeiro, consegue dar conta de trazer para as crianças das cidades grandes algo do cenário rural, provinciano no qual são ambientadas as histórias de Lobato -e em relação ao qual a sabedoria de Dona Benta e a impertinência de Emília representavam um contraponto.
É esse caráter contestador, claramente a favor do conhecimento, da autonomia de pensamento, ao mesmo tempo respeitador da capacidade imaginativa das crianças, que faz do Lobato infantil um autor ainda tão atual -e, talvez, diante do que se vê mais habitualmente na TV, cada vez mais necessário.’
Laura Mattos e Silvana Arantes
Prova de química
‘Por que a audiência de ‘Paraíso Tropical’ não decola? ‘O casal principal não tem química’, taxou a professora e pesquisadora da USP Renata Pallottini, autora do livro ‘O Que É Dramaturgia’, em reportagem publicada na Ilustrada a respeito da crise de ibope da nova novela das oito da Globo.
Mas, afinal, o que é essa ‘química’ na ficção? Sua suposta falta poderia explicar por que ‘Paraíso’ dificilmente consegue passar os 40 pontos de média no Ibope no horário em que a emissora costumava ultrapassar os 50?
Alessandra Negrini e Fábio Assunção dão química como Paula e Daniel, o casal romântico de ‘Paraíso Tropical’?
Os autores, Gilberto Braga e Ricardo Linhares, garantem que sim. E contam que não houve teste antes da estréia para checar se Negrini (escalada porque Cláudia Abreu, a primeira opção, ficou grávida) e Assunção teriam ‘faísca’.
Já Marcílio Moraes, autor da bem-sucedida ‘Vidas Opostas’ (Record), escolheu os atores que fariam o casal central só ao ver a ‘prova de química’. Diretor do ‘Big Brother’, Boninho também se preocupa com a química dos pares ‘reais’.
‘Casal sem sal não cola.’’
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‘Química’ dos casais preocupa autor de novela
‘Gilberto Braga, autor de ‘Paraíso Tropical’, acha que os protagonistas da novela, Fábio Assunção e Alessandra Negrini, têm, sim, a tal da ‘química’.
O novelista não vê ‘como explicar racionalmente’ esse fenômeno, que, acredita ele, tem a ver tanto com os atores quanto com os personagens.
Segundo Braga, essa é uma das grandes preocupações dos autores ao pensar nos papéis e escalar o elenco. ‘Claro que pensamos muito nisso’, diz.
O autor conta que nunca fez testes com os atores para avaliar antecipadamente a química. ‘No meu caso, vamos na intuição’. E ela falhou, ele admite, em ‘Celebridade’, sua novela anterior. ‘Um casal que não tinha química era Maria Clara [Malu Mader] e Fernando [Marcos Palmeira]. Ótimos atores, ótimos personagens, e não houve química. Isso mostra que não há como definir a química’, pondera.
Mas há como disfarçar a ausência dela, de acordo com a atriz Bruna Lombardi. ‘Existem atores que têm o ‘métier’ tão apurado que conseguem driblar a falta de química.’
Mas quando a química rola, ‘ajuda muito’, conta Bruna. Aconteceu com ela, na novela ‘Aritana’ (Tupi, 1978). ‘Quando conheci o Ri [o ator Carlos Alberto Riccelli, seu marido], a química foi muito produtiva.’
A atriz diz que ‘a química altamente produtiva é aquela em que o cara [diretor] fala ‘corta’, e o casal continua se beijando. É até um excesso. Não é necessário, mas pinta uma coisa.’
Ricardo Linhares, também autor de ‘Paraíso Tropical’, conta que a pesquisa com os grupos de telespectadores feita pela Globo apontou que não há críticas ao casal principal. ‘Alessandra e Fábio têm excelente química’, afirma.
O espectador mostrou também ter curiosidade para saber como seria a relação entre Daniel e Taís, irmã gêmea de Paula. Será que a química entre Assunção e Negrini-má dá mais faísca do que a entre Assunção e Negrini-boa? O ‘triângulo de dois’ foi antecipado para alavancar a audiência e deve ter início ainda nesta semana.
Prova de química
Linhares diz que autores e diretores pensam nisso antes de escalar elenco, mas ‘novela não é uma ciência exata’. ‘Um casal pode ter química num trabalho e não ter em outro. Depende dos personagens e da história.’
De acordo com Linhares, na TV brasileira não há tradição em testes para avaliar a química dos mocinhos e mocinhas.
‘Isso poderia ser visto como prova de talento, tanto por parte dos artistas como da imprensa. Se saísse em uma revista que fulana não teve química com sicrano, eles correriam o risco de ter sua capacidade posta em dúvida. No entanto, esse processo nada tem a ver com carisma ou experiência.’
Já Marcílio Moraes, ex-Globo e autor de ‘Vidas Opostas’, novela da Record que tem registrado ibope surpreendente, conta ter realizado ‘prova de química’ para definir os atores que fariam o casal central.
Apesar da presença de veteranos e ex-globais no elenco, os papéis principais ficaram com os iniciantes Léo Rosa e Maytê Piragibe. ‘No teste, de imediato, eu e os diretores percebemos que eles tinham ‘química’. Estávamos certos’, afirma.
Para ele, ‘é muito difícil, se não impossível, explicar o que é ‘química’. ‘Tem a ver com os mistérios do amor. Por que uma pessoa nos atrai e outra não? Está além da nossa vontade e da nossa compreensão.’
Manoel Carlos concorda. ‘Esse negócio de química é complicado porque, na maioria das vezes, só se descobre a ausência dela com a novela no ar. Quem entende disso é o público, e não adianta contrariá-lo, dando a atores e atrizes papéis inadequados a seus perfis.’
Apesar das críticas ao casal formado por Sônia Braga e Edson Celulari em ‘Páginas da Vida’, trama de sua autoria que saiu do ar no mês passado, ele disse: ‘Entre as minhas novelas, não me lembro de nenhum caso notório de rejeição a um casal por falta de química, mas posso estar esquecido’.
Vida real
J.B. de Oliveira, o Boninho, também tem de se preocupar com a formação de casais ao escalar um elenco para o ‘Big Brother Brasil’, cuja edição tem um quê de novela. ‘Não é possível antecipar se haverá casais e quais serão, mas procuramos geralmente por solteiros e aí é questão de tempo. Bonitos, alegres, soltos e carentes. Alguém fica com alguém’, disse o diretor do ‘reality show’.
Para ele, ‘antes de mais nada, química é fundamental, e o telespectador é muito crítico quanto a isso’. ‘Casal sem sal não cola. Na novela, depende fundamentalmente da escalação para parecer real e emocionar. Já no ‘BBB’, tem que ter algo real para não parecer armação entre os participantes.’
De todas as sete edições, o casal com mais química, em sua opinião, é Alemão e Siri, do ‘BBB 7’. ‘Já os que não convenceram: Tarciana e Jeferson pagodeiro [‘BBB 2’], Rogério e Solange ‘Iuarnuou’ [‘BBB 4’]. Esses foram péssimos.’’
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Especialistas explicam o que gera a ‘faísca’
‘A ‘química’ pode até ser uma definição bastante vaga para medir a voltagem das relações amorosas, mas não é imprópria, na opinião da engenheira química Ligia Senise Bussad.
‘Acho que faz todo o sentido. A química nada mais é do que dois elementos reagindo e formando um produto’, afirma.
A inexistência da química entre um casal também tem certa coerência científica. Seria uma reação ‘endotérmica’, que consome energia, e não ‘exotérmica’, que produz energia, explica a engenheira química.
Saber que elemento causa (ou não) a combustão é que são elas. ‘Acho que não é uma coisa física, hormonal. No meu entendimento, é mais espiritual’, afirma Bussad.
Tem outra avaliação o psicólogo Esdras Guerreiro Vasconcelos, professor da disciplina ‘Amor: Um Fenômeno Social e Existencial’, no Departamento de Psicologia da USP. ‘O amor e tudo o que envolve o sentimento têm a ver com a química corporal. Duas pessoas que têm química, aquela coisa de pele, como dizem, são as que, juntas, geram maior liberação de alguns hormônios, como a ocitocina [apelidado de ‘hormônio do amor’], e neurotransmissores, como dopamina e serotonina, relacionados ao prazer.’
Em sua opinião, para que uma cena romântica na novela convença o público é preciso que o casal ficcional libere essas substâncias. De verdade, não uma ‘liberação técnica’.
‘Elas têm que ser liberadas porque influenciam os gestos e a expressão. Assim, o espectador também acaba liberando esses hormônios, e a novela vai ao encontro de suas fantasias.’
O psicanalista Chaim Samuel Katz, membro da Formação Freudiana e doutor em comunicação pela UFRJ, diz que ‘a ‘química’, para Freud, se dá através de processos de identificação’. ‘Na TV a ‘química’ se produz de acordo com afetos que se dirigem a algum cume. O desdobrar da ‘vida’ de um casal parece se dirigir para um encontro teleológico, único, ao qual se denomina ‘amor’, e o tal Himalaia seria o resultado de uma ‘química’: quem já viu alguma heroína ou herói fazer xixi em novela?’.’
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