REDE GLOBO vs. CESAR MAIA
Família pede que Cidade da Música não tenha o nome de Roberto Marinho
‘A família do jornalista Roberto Marinho (1904-2003), criador da TV Globo, pediu à Prefeitura do Rio que retirasse o nome do empresário da Cidade da Música, obra de R$ 518 milhões que será inaugurada na próxima quinta-feira na Barra da Tijuca (zona oeste do Rio). O prefeito Cesar Maia (DEM) aceitou o pedido.
O complexo cultural é uma das obras mais polêmicas de Maia. Consumiu cerca de um quarto dos investimentos da cidade neste ano e tem sido alvo de oposicionistas. Nas eleições municipais, foi considerada um ‘elefante branco’ por quase todos os candidatos.
José Roberto Marinho, um dos filhos do empresário, disse ao secretário das Culturas, Ricardo Macieira, em carta datada de quinta, que a família constatou que ‘o vínculo, mesmo que indireto com nosso grupo de comunicação e com um nome tão forte pode significar certo empecilho na obtenção de patrocínios vindos, especialmente, de outras empresas com interesse na mesma área’.
A carta foi publicada no ‘Diário Oficial’ do Rio ontem, junto ao decreto renomeando o complexo de, simplesmente, Cidade da Música.
‘Fique certo o amigo que o que nos move é exclusivamente o espírito de somar, de colaborar para que o Rio tenha em breve um centro para música que seja motivo de orgulho para a cidade, para o Estado e para o país’, diz a carta.
A homenagem fora decidida logo após a morte do jornalista, em agosto de 2003, primeiro ano da obra. No dia 8 daquele mês, um decreto nomeou o complexo Cidade da Música Roberto Marinho.
Maia afirmou, por e-mail, não acreditar que as críticas tenham influenciado na decisão da família. ‘A carta é explicativa e me convenceu.’
Questionadas sobre o motivo do pedido a uma semana da inauguração, as Organizações Globo afirmaram que a carta dá a sua posição sobre o caso, também não respondendo se há relação com a polêmica sobre os custos da obra.
O valor supera, ao menos, 30% do previsto. Os contratos e seus aditivos comprometem R$ 518,5 milhões. Em junho de 2007, o custo estimado era de cerca de R$ 400 milhões.’
MÍDIA & CULTURA
Presa no vazio
‘Embora tenha fechado as portas há uma semana, continua sem desfecho a 28ª Bienal de São Paulo. Caroline Pivetta da Mota, 24, presa em flagrante quando participou da invasão dos pichadores ao pavilhão do Ibirapuera, no dia de abertura da mostra, completava ontem 49 dias encarcerada.
Uma decisão da Justiça [após o fechamento desta edição] poderia soltar a pichadora, conhecida como Caroline Sustos, mas, mesmo que ela venha a responder em liberdade, o episódio já desencadeou uma onda de debates e ações de protesto que abalou o meio artístico.
O diretor de teatro José Celso Martinez Corrêa chegou a classificar o caso como ‘coisa de AI-5’. A maioria dos artistas, críticos e curadores ouvidos pela Folha também critica a Fundação Bienal e os curadores Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen pelo que classifica de silêncio, omissão e a perda de uma oportunidade para um debate mais amplo sobre o caso.
Dirigentes de instituições culturais e representantes do poder público também se manifestaram sobre o fato. O ministro da Cultura, Juca Ferreira, vê exagero na prisão. O governador José Serra diz que não pode intervir.
Está marcada para amanhã em São Paulo uma reunião de artistas para discutir a natureza da ação dos pichadores. Também circula na internet um abaixo-assinado a favor da liberdade de Mota. Até o início da tarde de ontem, reunia 233 nomes. Entre eles, os dos artistas Laura Lima, Renata Lucas, Angelo Venosa, Carlito Carvalhosa e Thiago Rocha Pitta; e os dos curadores Luiz Camillo Osorio, Cauê Alves, Marcelo Rezende e Lisette Lagnado.
Mota, que fez aniversário ontem dentro de uma cela, participou de ‘ataques’ coordenados à galeria Choque Cultural, em Pinheiros, e ao Centro Universitário Belas Artes. Enquadrada no artigo 62 da Lei do Meio Ambiente, por destruição de patrimônio cultural, pode pegar até três anos de prisão.’
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‘A prisão prolongada de Caroline Pivetta da Mota, 24, que pichou o andar vazio da Bienal, foi vista pelo diretor teatral José Celso Martinez como eco do regime militar e punição excessiva. ‘Os agentes culturais são, de repente, os agentes policiais, como eram os militares em 1968, no AI-5’, diz o fundador do Oficina.
‘Isso é exagerado e pode macular o momento de liberdade de expressão que estamos vivendo’, avalia o ministro da Cultura, Juca Ferreira, que ligou para o governador José Serra e o presidente da Fundação Bienal, Manoel Francisco Pires da Costa, pedindo uma intervenção a favor de Mota.
‘Esses dias na prisão são ruins para a cultura, a Bienal e o Brasil; ela não destruiu um patrimônio público, ela pichou uma sala vazia numa Bienal em que o público foi convidado a interagir’, acrescenta Ferreira.
Artistas, críticos e curadores ouvidos pela Folha também enxergam o andar vazio desta Bienal como um convite velado ao ataque dos pichadores.
‘A curadoria, quando apresenta um andar vazio, faz uma provocação’, diz o ator Ivam Cabral. ‘Eles têm de arcar com as conseqüências.’
‘Isso tudo foi o que a curadoria provocou, tem de suportar, tem de saber lidar’, concorda o curador Agnaldo Farias. ‘Se eu fosse a curadora, teria de responder pelo andar vazio, ainda mais quando havia a visão de que isso tirava dos artistas um espaço que lhes é de direito’, completa a diretora do Museu da Imagem e do Som e do Paço das Artes, Daniela Bousso.
Outra suposta provocação, esta mais direta, foi a fala da curadora Ana Paula Cohen na entrevista coletiva que antecedeu a mostra, sobre a ameaça de um possível ataque de pichadores. ‘Estão convocando gente da periferia da cidade para fazer isso, e essas pessoas não sabem no que estão se metendo.’
‘O discurso da curadoria era um pouco estranho. Dizer ‘gente da periferia’ é um grande engano’, afirma o curador Cauê Alves, um dos signatários do manifesto que circula na internet a favor da soltura de Mota.
Silêncio
‘A penalização exacerbada desta jovem é indecente’, opina o videoartista Maurício Dias, em e-mail que divulgou. ‘Muito mais grave do que o crime de uma jovem pichadora são os de colarinho branco, de corrupção da já velha direção da própria Fundação Bienal.’
Na opinião de outros artistas e curadores, a omissão da Bienal sacrificou a oportunidade de transformar o episódio em debate. ‘Acho lamentável que não tenha havido um diálogo’, afirma Lisette Lagnado, curadora da 27ª Bienal. ‘Será que essa discussão não interessaria mais do que a série de debates que eles fizeram durante a Bienal, que não passava de uma conversa entre amigos?’, questiona Daniela Bousso.
Outros artistas e galeristas reconhecem, no entanto, que houve um ato de vandalismo, passível de punição. ‘Desconsidero que isso seja expressão artística’, afirma a artista Adriana Varejão. ‘Esses pichadores exageram no argumento.’
‘Quem depreda patrimônio tem de ser punido, mas tem o lado injusto de que ela certamente virou um bode expiatório’, afirma a galerista Márcia Fortes.’
ACADEMIA
Escritor Cícero Sandroni é reeleito na ABL
‘O escritor e jornalista Cícero Sandroni, 73, foi reeleito por unanimidade, na tarde de anteontem, presidente da Academia Brasileira de Letras, assim como os membros da atual diretoria. Ele foi eleito pela primeira vez em 2003.
Sandroni anunciou 2009 como ‘o ano Euclides da Cunha’, com uma grande exposição em homenagem ao autor de ‘Os Sertões’, além de um ciclos de palestras.’
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Folha de S. Paulo