Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Francisco Viana

‘Sexo, drogas e economia Diane Coyle Futura 320 páginas R$ 44

Diane Coyle pertence a uma linhagem de escritoras cosmopolitas que tudo vê, tudo analisa e parece estar em toda parte. Colunista do jornal The Independent, analista da BBC londrina, especialista em jornalismo financeiro, ela se movimenta pela caótica economia contemporânea como se estivesse guerreando contra um inimigo invisível, sem linha de frente nem retaguarda, mas que se espalha por toda parte como algo que lembra um gás – letal ou não, a depender de como seja trabalhado.

Essa é a sensação que transpira das páginas de Sexo, drogas e economia, livro que pelas suas peculiaridades – originalidade, seria a palavra correta – chega ao Brasil num momento muito propício. Nele se discute de tudo um pouco: sexo, um negócio com ‘capital de giro na casa de bilhões de libras, euros ou dólares, além de contar com uma enorme força de trabalho’; drogas, um drama em que a política de tolerância zero é impossível de funcionar quando tantos cidadãos usam drogas ilegais; e, ainda, esportes, incidência tributária, internet, desenvolvimento e trabalho, entre muitos outros temas da atualidade. Tudo isso, a autora avalia sob a ótica da economia, com saborosa mistura de pragmatismo e irreverência aliada a uma erudição despojada de pedantismo, fácil de assimilar, deliciosa de ler. Ela cita Keynes, Taylor, Adam Smith, Stuart Mill, Max Weber e Alfred Marshall com a naturalidade de quem dá uma receita de doce.

Para o leitor brasileiro, o livro de Diane Coyle pode perfeitamente começar pelo capítulo 10 – ‘Incidência Tributária’, título lavrado em economês puro-sangue. Ela é taxativa: ‘Apenas as pessoas pagam impostos.’ Para ilustrar a tese de como impostos supostamente comerciais caem sem fazer barulho em grupos inesperados de pessoas, cita o caso da abolição pelo governo britânico de um crédito fiscal que os fundos de pensão vinham recebendo pelo imposto retido em pagamentos de dividendos pelas companhias em que eles detinham ações. À época, o fato passou desapercebido.

Ninguém reclamou. Afinal, quem vai se incomodar com a legislação tributária para grandes fundos de investimento? Não demorou, caiu a ficha para as pessoas que vinham fazendo suas poupanças de aposentadoria com aplicações em fundos de pensão. Um dia despertaram para a traiçoeira realidade. Seus depósitos tinham sido taxados em 23%.

É assim que acontece: ‘A incidência de muitos impostos comerciais depende do tipo de mercado envolvido. O segredo é o grau de sensibilidade da procura e da oferta do produto em relação ao preço. A flexibilidade da oferta e da procura, em outras palavras, determina quanto os preços pagos e as quantidades vendidas mudam quando uma taxa é imposta.’

Assim, as empresas geralmente podem repassar uma parte do imposto para os consumidores, da mesma forma que fazem com suas outras despesas. ‘Se a procura é tão flexível a ponto de fazer as vendas caírem de maneira acentuada quando o preço sobe, elas poderão repassar uma parte menor do imposto para os consumidores do que quando a procura é inflexível.’

A procura do cigarro, por exemplo, é inflexível porque ‘os consumidores são viciados’. A procura da maçã é flexível porque os consumidores mudarão para pêras se o preço das frutas subir. O que a autora sugere é que se olhe para além das aparências. Ao analisar o acordo do tabaco nos Estados Unidos, fixando, em 1998, uma astronômica conta de US$ 206 bilhões em impostos para os fabricantes de cigarros, ela demonstra que os não-fumantes estão muito distantes da vitória que comemoraram. Além de taxar excessivamente os fumantes pobres, as companhias praticamente nada perderam. Os aumentos dos preços, sim, geraram a receita necessária para pagar os advogados.

Se tivesse analisado o caso brasileiro, Diane ficaria estarrecida. Não existe sutileza alguma. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, a classe média paga ao leão – o fisco, melhor dizendo – 67% do dinheiro arrecadado pelo Imposto de Renda e 70% dos impostos sobre o patrimônio. Nesse momento em que se trava uma verdadeira cruzada contra a voracidade fiscal, ler o livro de Diane Coyle é, no mínimo, didático.

Do capítulo 10 é aconselhável saltar para o capítulo 20. Ou, ‘Desenvolvimento, o trunfo da moda’. Com sensatez e humor ferino, ela investe, sem clemência, contra os modismos. Uma das suas primeiras vítimas é a panacéia dos investimentos em máquinas, indispensáveis, segundo alguns teóricos, para conduzir os países pobres ao caminho da prosperidade. A segunda vítima é a panacéia da educação ou investimento em capital humano, como os economistas gostam de dizer.

No passado, cultuou-se o controle populacional. Falou-se muito da dominação imperialista, do determinismo histórico do clima (pois a maioria dos países pobres fica nos trópicos) e até da relação sexual, muito controlada nos países de cultura protestante como os Estados Unidos. Hoje, o tema dominante é a corrupção aliada à inoperância das políticas de governo. E a necessidade de um ‘relaxamento das dívidas’, ou mesmo anulação das dívidas dos países pobres ou em desenvolvimento. Nada disso sensibiliza Diane. Para ela, ninguém detém a pedra filosofal do desenvolvimento.

‘O consenso resultante é que o desenvolvimento econômico depende de um complicado caleidoscópio de políticas e instituições’, argumenta. ‘Coordenar tudo – colocar todos os alvos na mira – é muito difícil… O crescimento parece ser uma questão de entrar em um círculo virtuoso e sair de uma espiral viciosa de pobreza. ‘

O êxito é que reforça o êxito, assim como o fracasso reforça o fracasso. A geografia, como diz a autora, pode não ser um destino, mas ‘domar as forças da geografia pode ser tão difícil quanto sobrepujar a história’. Dos modismos, Diane Coyle abraça um antimodismo: a última moda de que não existe jeitinhos. Esta, sim, diz ela, é encorajadora.

Lendo o livro pela ótica brasileira a lição que fica é a necessidade de um choque de realidade. Quanto mais o país se conscientizar de que não existe mágica, mais poderá se distanciar das aparências das coisas e buscar a essência dos acontecimentos. Mais vale olhar os desafios de livrar-se de estruturas viciadas – dos impostos à burocracia – do que sonhar com um crescimento econômico de fantasia que amanhã se revelará mais uma mentira ou uma tola ilusão.

Por fim, uma sugestão e uma advertência. A sugestão é ler o livro de Diane, de preferência num fim de semana, porque a leitura é arrebatadora e quem começa dificilmente quer parar antes do final de três centenas de páginas. A advertência: não leve a sério a afirmação do marido da autora, certamente um anglo-saxão típico. Ele diz: ‘Não há nada mais excitante que a pancada do taco contra o couro’, referindo-se ao jogo de críquete em que os praticantes batem com um taco de madeira numa bola de couro vermelho, sob os gritos da multidão. Sob esse aspecto, o próprio livro propõe temas bem mais magnéticos, a começar pelo primeiro capítulo: sexo. Dá para enjoar de algo que é bom? Ou a décima regra do raciocínio econômico: ‘Os maiores ganhos em felicidade parecem vir com o crescimento econômico a partir de um nível de renda baixo, significando que os povos de países pobres ainda têm muita possibilidade de ficar mais felizes à medida que suas economias crescem.’’



JORNALISMO EM CRISE
Carlos Chaparro

‘Em crise, o jornalismo busca novos papéis’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 27/08/04

‘O XIS DA QUESTÃO – A sociedade é hoje protegida por instituições que cumprem a função de zelar pela realização dos fins próprios da democracia. Exemplo: o Ministério Público, os Procons, as CPIs, as Forças-Tarefa, as Agências reguladoras, e tantas outras entidades. De uma forma ou de outra, todas essas instituições se apropriaram de funções e ações que em outros tempos o jornalismo acreditava serem suas. Daí, a crise de identidade que nos afeta. E a questão, que urge discutir: que papel, funções e ações cabem ao jornalismo, não na ditadura, mas na democracia, em sua atual configuração?

1. A crise e seu contexto

Debates de intensidade crescente colocam o jornalismo de hoje em estado de crise. Ao contrário, porém, do que muitos pensam, acredito ser essa uma boa crise – e digo por quê: o jornalismo tradicional perdeu funções, em um mundo que se caracteriza pela capacidade institucional, particular, de produzir e difundir aquilo a que simbolicamente chamamos de notícia. Entretanto, no próprio cenário das pressões a que está submetido, o jornalismo – por seus profissionais e seus estudiosos – começa a tomar consciência disso, o que pode ajudar a delimitar um novo lugar próprio, nos contextos e processos democráticos em que atua.

Cimentado em ideários elaborados para regimes e sociedades que não existem mais, o jornalismo chegou a se auto-proclamar a voz vigilante do povo, e a assumir-se como ‘quarto poder’, nas lutas por liberdade, igualdade e justiça, em épocas e realidades que a cultura política e as práticas democráticas superaram.

A democracia assenta hoje em eficazes mecanismos de auto-sustentação, afirmando-se e aperfeiçoando-se não apenas nos seus aspectos formais (como a delegação do poder pelo voto popular e a relação equilibrada entre poderes independentes), mas, principalmente, pela ação vigilante de instituições que cumprem a função de zelar pela prevalência das leis referentes aos fins próprios da democracia. São exemplo de tais instituições o Ministério Público, os Procons, as CPIs, as Forças-Tarefa, Agências reguladoras, e tantas outras, com responsabilidades especificas em áreas como os direitos fundamentais (individuais e coletivos), a proteção às minorias e a execução orçamentária.

De uma forma ou de outra, e com eficácia jurídica, todas essas instituições se apropriaram de funções e ações que em outros tempos o jornalismo acreditava serem suas.

Ao mesmo tempo, a sociedade organizada ampliou e sofisticou sua capacidade de realizar intervenções diretas na realidade político-social, por meio de Ongs e de uma infinidade de entidades, em todos os campos do agir humano. Com um detalhe, que alterou profundamente a identidade do jornalismo: o que caracteriza o poder de ação dos sujeitos institucionais da contemporaneidade é a capacidade e a competência para o uso da notícia como forma de intervenção. Ou seja: capacidade e competência para gerar e difundir conteúdos noticiosos que antigamente pareciam propriedade das redações.

2. Debate aberto

Quem, entre nós, jornalistas, não reconhece a nova fisionomia do mundo da notícia, ou não gosta dela, perdeu a passada do tempo. É surpreendente que entre nós, jornalistas, ainda haja quem ache que seria preferível termos uma sociedade sem essas instituições, às quais cabe hoje zelar pela substância da democracia, e que, em vez delas, houvesse um jornalismo com funções até de polícia, o tal ‘quarto poder’, suposto guardião dos ideais democráticos – como se isso fosse possível e desejável.

Já li coisas espantosas, como lamentações pelo fato de a Polícia e o Ministério Público chegarem à descoberta de corruptos e outros criminosos antes dos jornalistas – e tomando-se isso como evidência do fracasso do jornalismo. Temos aí, como argumento, a presunção de que, ao jornalista e às suas lutas, convêm mais os regimes autoritários do que os sistemas democráticos.

Não é essa, porém, a discussão que interessa fazer. Não vale a pena venerar saudosismos de um tempo que não voltará ou de um modelo de jornalismo que, na verdade, nunca foi como os saudosistas pensam. O que interessa discutir é o seguinte: que papel, funções e ações cabem ao jornalismo, não na ditadura, mas na democracia, em sua atual configuração?

Na busca de respostas e propostas, voltarei ao tema na próxima semana. Mas o debate fica desde já aberto.’



O GLOBO CONDENADO
Consultor Jurídico

‘O Globo é condenado a indenizar viúva de Jango por danos’, copyright Revista Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), 6/09/04

‘O jornal O Globo foi condenado a pagar indenização de R$ 30 mil para Maria Thereza Fontella Goulart, viúva de João Goulart, por danos morais. A decisão é da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Motivo: a colunista Hildegard Angel noticiou que a viúva estaria sendo investigada por suposta participação na morte do marido.

Com correção monetária, o valor chega hoje a R$ 65 mil, segundo o site Espaço Vital. A decisão ainda não é definitiva. Cabe recurso.

A jornalista publicou em sua coluna no jornal O Globo, de 19 de maio de 2001, uma série de notas afirmando que Maria Thereza iria depor em CPI. Na época, a Câmara dos Deputados investigava a morte de Jango. O título da coluna era ‘Versão de envenenamento de Jango leva viúva a depor…’. O texto tratava da hipótese de envenenamento, da qual a viúva seria suspeita. De acordo com os documentos da CPI, no entanto, a acusação nunca existiu.

Em edição posterior, a colunista admitiu que a acusação contra a viúva teria servido para desviar o foco das investigações. Ela mencionou o relatório do então deputado Miro Teixeira, que isentou a viúva e apontou envolvimento de militares.

Inconformada com a publicação, Maria Thereza Goulart ajuizou ação por dano moral. A 5ª Câmara Cível reformou sentença de primeira instância e condenou o jornal.

A juíza Lindalva Soares Silva, da 11ª Vara Cível do Rio de Janeiro, julgou improcedente o pedido da ex-primeira-dama. Afirmou que o jornal ‘não a acusou de ter participado dos eventos que culminaram na morte do ex-presidente João Goulart, nem mesmo de participação na chamada ‘Operação Condor’. Segundo a magistrada, as informações basearam-se em depoimentos colhidos pela CPI, principalmente no exposto por Enrique Foch Diaz. Ele é autor do livro ‘João Goulart — Um Crime Perfeito’, em que relata uma conspiração para matar o ex-presidente por envenenamento. Maria Thereza apelou.

De acordo com o relator Carlos Ferrari, ‘o que se percebe da leitura dos autos é que a autora da notícia deu divulgação nacional ao que era um simples boato’. Para o desembargador, a notícia foi sensacionalista.

Ele também relatou que a jornalista mudou o tom da notícia em outra edição para ‘amenizar a leviandade’ anterior, criticando as investigações que corriam na Câmara dos Deputados. ‘O que propalou o tal Enrique Foch ficaria restrito a um universo insignificante de pessoas, como é próprio de tudo que é fofoca, não tivesse O Globo publicado a notícia desonrosa’.

O relator disse que o ‘direito de informar não exclui a imperiosa necessidade de investigar o fato’. Atuaram em nome de Maria Thereza Fontella Goulart os advogados Marcelo de Borba Becker e Yuri Grossi Magadan.

A viúva de Jango move ainda ações de danos morais contra o jornal Hoje em Dia/Caderno Brasília e a revista Época. A revista publicou reportagem de capa com o título ‘Loucas de Amor’, em 21 abril de 2003, sobre a novela da rede Globo ‘Mulheres Apaixonadas’. Afirmou que Maria Thereza teria se tornado dependente de álcool devido a traições de Jango. O pedido de indenização, em trâmite na Justiça do Rio, ainda não foi julgado.

No caso de Brasília, a decisão da 1ª Vara Cível foi similar ao acórdão do TJ do Rio. A juíza Carla Patrícia Frade Nogueira Lopes condenou a empresa jornalística Hoje em Dia/Caderno Brasília, a reparar em R$ 30 mil os danos causados a Maria Thereza Goulart. O julgamento ocorreu em maio de 2003. O jornal publicou que a viúva seria suspeita pela morte de Jango. Foi ajuizada Apelação Cível, em trâmite na 5ª Câmara Cível do TJ do Distrito Federal. Processo nº 12.630/2004′



PRÓ-MÍDIA FRACASSA
O Estado de S. Paulo

‘BNDES desiste de programa de ajuda para a mídia’, copyright O Estado de S. Paulo, 3/09/04

‘O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não vai mais criar uma linha de crédito específica para as empresas de mídia. O anúncio da desistência foi feito nesta quinta-feira (02/09), pelo vice-presidente da instituição, Darc Costa.

Costa disse que depois que as empresas de comunicação se mostraram desinteressadas pela ajuda, o banco resolveu colocar à disposição do setor os programas de financiamento já existentes. ‘Abrimos as nossas políticas operacionais e a questão era tratada projeto a projeto e não terá um programa específico’, explicou.

No entanto, o senador Hélio Costa (PMDB-MG), que integra a subcomissão de Educação do Senado encarregada de propor ao BNDES o plano de financiamento do setor, afirma que as empresas de mídia ainda podem fazer uma contraproposta. ‘Temos um documento do presidente do BNDES que deixa um canal para que a comissão faça uma contraproposta’, afirmou.’