Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Gilberto Dupas

‘Deve-nos causar muita preocupação – enquanto cidadãos responsáveis e educadores – toda vez que uma pesquisa nos recorda a quantidade de tempo que nossos contemporâneos dedicam à TV. Basta assistir, entre enxurradas de propaganda, a uma tarde de domingo ou um horário ‘nobre’ em nossos canais, incluindo os pagos. O fato é que, embora a televisão seja uma concessão pública e um instrumento vital para o debate de valores e definição de condutas, ela se transformou em todo mundo num puro negócio.

A crise da TV Cultura de SãoPaulo, o último canal brasileiro a tentar oferecer conteúdo criativo, é um bom exemplo de como a sociedade civil e as autoridades públicas abandonaram suas responsabilidades e ‘lavaram suas mãos’.

Infelizmente, esse fenômeno se insere na nova lógica global. São centenas de milhões de cidadãos, por todo o mundo, vendo imagens que foram cuidadosamente construídas para atender a objetivos privados das emissoras e de seus anunciantes: elevar índices de audiência e o faturamento dos seus anúncios. A Inglaterra era o exemplo de uma rede pública de alto padrão. Lá se gastam 25 horas em média por semana vendo TV, número semelhante ao de muitos países, inclusive o Brasil. Por aqui, as novelas são líderes de audiência e a inserção de propaganda dentro do enredo condiciona comportamentos e perfis dos seus personagens, transformando- os em vendedores subliminares de refrigerante e sabonete. Diz Jay Blumler que ‘o processo moderno de publicidade tem a força quase irresistível de um ímã que obriga os que penetram em seu campo a adequar-se à sua atração’, moldando não só a política partidária, como a maneira como todos pensam e vivem.

Para Colin Leys, professor da Queen’s University (Canadá) e autor de Market- driven politics – já traduzido no Brasil -, a BBC fornecia gratuitamente noticiários abrangentes, Competentes e imparciais e vários gêneros de programas de alta qualidade; como reciprocidade desse bom uso da concessão pública, o Tesouro lhe repassava uma pequena taxa de licenciamento paga por todos os proprietários de televisores. Com Margaret Thatcher esse processo chegou ao fim; a televisão também foi considerada ‘área industrial da qual se pode extrair lucros num longo período’. A Independent Broadcasting Authority ainda tentou regular o volume de anúncios que podiam ser exibidos por hora e por dia e tentava garantir que os anunciantes não tivessem excessiva influência sobre o conteúdo da programação, trabalho facilitado por um ethos de serviço público fortemente internalizado durante anos pelos profissionais do setor, em sua maioria treinados na antiga BBC.

Mas os dias gloriosos da televisão britânica, enquanto fórum fundamental para as ‘conversas formadoras’ da sociedade britânica, acabaram. A BBC foi forçada a terceirizar e perdeu um terço de sua equipe. Enquanto a remuneração das grandes ‘estrelas’, apresentadores e animadores de auditório subia de forma radical, os demais salários caíram violentamente. Leys lembra que uma comissão criada por Thatcher e liderada por Alan Peacock, famoso economista neoliberal, concluiu em 1986 que ‘a rádio e TV britânica deveria encaminhar-se para um sistema sofisticado de mercado com base na soberania do consumidor’ – em bom português, soberania do anunciante e da empresa proprietária da concessão.

A digitalização dos sistemas fez o resto do estrago, pois exigiu enormes investimentos que só o setor privado estava pronto a fazer. A BBC passou a ter de se dedicar crescentemente a esportes, filmes e até soft-porn, para competir com as empresas privadas. O surgimento de empresas de comunicação gigantescas liquidou de vez com a cultura e o debate de opinião nesse setor. Aracionalização é de que o proprietário de um canal de TV sempre estará disposto a oferecer o que o telespectador quer e, portanto, garantirá a livre escolha e a democracia. Lembrome da RAI italiana e sua bela programação pública antes do flagelo da era Berlusconi. Uma mesa-redonda semanal escolhia temas de relevância social para diálogo aberto de alto nível com uma hora e meia de duração no horário nobre, sem interrupções. Assisti ao debate sobre a suspeita de contaminação por hormônio de uma marca famosa de ‘papinha’ de nenê, envolvendo todos os interessados com liberdade e equilíbrio: a mãe de uma criança supostamente atingida, um cientista e um pediatra importantes, o fabricante da ‘papinha’, um promotor público, um pecuarista, um filósofo especialista em ética e um competentíssimo mediador. Tudo isso acabou.

Na Inglaterra os seriados já são dois terços do que se oferece no horário nobre – com predomínio de temas de detetives e séries policiais – e o tempo para novelas se multiplicou por cinco em duas décadas. A preferência passou para temas ‘reconfortantes’ ou finais ‘felizes’. Os neoliberais defendem-se dizendo que foi a opinião pública que mudou. E que a TV só fez acompanhá-la, em sintonia com o ‘novo’ consumidor, que agora preferiria negócios à política e programas de auditório a Shakespeare. Afinal, como diz Leys, ‘a idéia de um projeto coletivo para mudar a sociedade foi declarada desnecessária; portanto, por que alguém assistiria a programas políticos?’ É claro que os próprios políticos também ajudaram, travestindo- se em marionetes pautadas por seus marqueteiros. A agenda humanista desapareceu. Um produtor inglês lembra que antes ‘havia a suposição de que estávamos do lado dos pobres, dos inferiorizados e dos sem-voz (…). Hoje há a sensação de que os telespectadores não estão interessados (…) em gente pobre, em fracassos’. Prevalece apenas a tirania do ‘ibope’.

Em suma, a prestação de serviços ao público virou paternalismo antiquado e fornecer qualidade a quem paga impostos está fora de moda. Rupert Murdoch, um dos reis da TV mundial, matou a charada: chega de dar ao público o que ele deveria ver; ‘interesse público é oferecer ao público o que lhe interessa’. As forças de mercado não querem uma televisão prestadora de serviços, querem-na como lanchonetes de fast-food. Na TV industrializada os espectadores são ensinados a aceitar um produto barato e padronizado, sem nenhuma escolha, a não ser entre qualidades ruins. Basta andar pelo mundo, ligar as TVs e observar os programas. À exceção do idioma, são todos praticamente iguais, assim como o são hoje os hotéis e os aeroportos. A grande corporação privada e o lucro venceram o espaço público. A idéia da televisão como meio de comunicação e debate da esfera pública, fórum para as ‘principais conversas formadoras da sociedade’, parece coisa do passado.

Mas o grande problema é que, para sobreviver, a verdadeira democracia continua precisando desse espaço mais do que nunca. (*) Coordenador-geral do Grupo de Conjuntura Internacional da USP, presidente do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais e autor, entre vários livros, de ‘Tensões Contemporâneas entre o Público e o Privado’ (Paz e Terra).’



TV / EUA
Cidade Biz

‘Faturamento semestral da TV aberta americana avança 9%’, copyright Cidade Biz (www.cidadebiz.com.br) , 30/07/04

‘O faturamento publicitário das três maiores redes de TV aberta nos EUA – ABC, CBS e NBC – cresceu 7,6% no segundo trimestre, na comparação com o mesmo período do ano passado.

Considerando os seis primeiros meses do ano, a alta foi de 9% em relação ao primeiro semestre de 2003. Entre janeiro e junho, as três redes somam US$ 5,85 bilhões com a venda de publicidade.

Os dados são da Broadcast Cable Financial Management Association. A programação do horário nobre registrou alta de 10% no faturamento. O final da noite experimentou crescimento de 12,1%.’



MENOS BAIXARIA NA TV
Keila Jimenez e Renata Gallo

‘Mundo-Cão ganha tom cor-de-rosa’, copyright O Estado de S. Paulo, 1/08/04

‘No lugar do tom indignado de Marcelo Rezende, na Record, a eloqüência de Paulo Henrique Amorim e Janine Borba, mais 1,20 m de pernas de Ana Hickmann. As esbravejadas de Datena, na Band, perderam espaço para os hipnotizadores de criancinhas – os Cavaleiros do Zodíaco. Na Rede TV!, o Repórter Cidadão vem agonizando baixa audiência, enquanto, no SBT, um misterioso programa sobre celebridades deve estrear amanhã. A programação de fim de tarde da TV não é mais a mesma.

De olho na audiência do horário, composta por donas de casa e jovens, a maioria deles de classe social C e D (como mostra a tabela ao lado), as emissoras resolveram investir no filão popular, mas sem a exploração da miséria alheia. O sangue e as mazelas sociais, cobertas por um rótulo de prestação de serviço, estão dando lugar a noticiários lights, mundo dos famosos e atrações que em nada ferem os direitos humanos.

Há poucos dias a Band tirou quase 50 minutos do Brasil Urgente para dar lugar ao desenho japonês Cavaleiros do Zodíaco, apresentado pela neo-apresentadora Kelly Key, e viu a audiência do horário pular de 3,5 para 6 pontos. Agora é a vez da Record, que, em doses homeopáticas, vai extinguir o Cidade Alerta. Campeão de ibope do mundo-cão, com médias de até 12 pontos, o programa de Marcelo Rezende deve sair definitivamente do ar com a estréia da nova novela da rede, Escrava Isaura, prevista para 27 de setembro.

O processo começa amanhã, quando o noticiário vai ceder uma hora para o Tudo a Ver, programa que mistura jornalismo e variedades – com uma pitada de fofoca, é claro. A crise no gênero também passa pelo Repórter Cidadão, da RedeTV!, que deve ser reformulado em breve. ‘Esses programas policialescos na faixa das 6 da tarde surgiram anos atrás como uma tentativa desesperada de erguer a audiência do horário, que vinha caindo assustadoramente’, fala o diretor de mídia da DPZ, Daniel Barbará.

Barbará explica que o fim de tarde é um horário ingrato, mas importante. É um horário de rotação e é fundamental ter algum programa que alavanque a audiência e aqueça o ibope para, mais tarde, passar o bastão para os programas da faixa nobre, quando a classe AB e a família chegam em casa para ver TV. ‘Só que o público cansou desses noticiários, a fórmula foi se esvaziando. Como a TV vive de mudanças constantes, agora é vez de outra linha de programas ocupar essa faixa horária. Resta saber se dará certo’, completa.

Segundo o diretor Artístico e de Programação da Record, Hélio Vargas, a decisão de inovar as tardes da emissora com o Tudo a Ver não está relacionada com o Cidade Alerta. ‘O Cidade Alerta cumpre bem o seu papel, que é de prestar serviço de informação de trânsito, por exemplo’, diz.

De acordo com ele, a estréia do Tudo a Ver faz parte de uma série de mudanças que a Record está fazendo para buscar mais qualidade na audiência. ‘O Cidade é um tipo de jornal para um segmento e estamos querendo um jornal com uma roupagem nova para agregar outro tipo de público também. Não é uma mudança pontual. Estamos melhorando os produtos um a um’, diz. ‘Não vamos tirar o Cidade Alerta porque é baixaria, porque é ruim, para colocar um de melhor qualidade. Não é isso’, assegura.

Vargas diz que busca com Tudo a Ver a mesma audiência que o programa de Marcelo Rezende tem hoje – entre 8 e 9 pontos – e que os telespectadores do programa policial não ficarão desamparados. ‘Não vamos abandonar o espectador, vamos continuar com helicóptero e dando as notícias importantes’, garante.

Mas dificilmente o novo programa irá ficar duas horas mostrando perseguição policial ou o mesmo acidente de trânsito, como fazia o Cidade Alerta. ‘Não é que vamos mostrar um mundo cor-de-rosa, mas vamos noticiar o que tem de ser noticiado. Talvez um acidente de trânsito não precise ser noticiado e, se precisar, vamos dar um outro enfoque’, explica Célia Pardi, editora-chefe do programa.

De uma forma ou de outra, a julgar pelo perfil do público do TV Fama e do Cidade Alerta, é bem provável que o novo cardápio, com receitas de culinária e moda, agrade.

Para Célia, no entanto, mesmo assim, o saldo é positivo, já que o programa é uma opção de bom gosto. Ela acredita, sim, que o fato de os policialescos estarem se acabando está ligado à conscientização do espectador. ‘A Globo sempre foi de bom gosto, eu acho que os anunciantes estão mais conscientes e o público também.’

Celebridades – Na RedeTV!, é visível a queda de audiência do Repórter Cidadão – o programa está na faixa do 1 ponto de ibope -, mas a emissora pretende continuar investindo no formato, já que as concorrentes vão ‘largar o osso’.

Mesmo assim, o policialesco está longe de alcançar o prestígio de uma das pratas da casa hoje, o TV Fama, que vive de escarafunchar a vida dos famosos e parece ser o mapa da mina para outras redes agora. A atração, que começou tímida na programação da emissora em 1999, figura entre as três maiores audiências do canal e ganhou edições diárias. A mesma importância ganhou o quadro de Leão Lobo, na Band, que deixou de ser parte de uma atração, o Melhor da Tarde, para ganhar um programa solo.

Na estréia da Record, o Tudo a Ver, o mundo das celebridades também terá um bom espaço. A jornalista Chris Flores, da Revista Contigo!, da Editora Abril, é quem irá falar sobre a vida de celebridades. Para ela, a diferença básica entre o trabalho que irá apresentar e o que as outras emissoras atualmente apresentam é que ela é repórter e vai atrás da fonte, não simplesmente reproduz o que a fonte disse aos outros veículos. Para isso, a Record fez uma parceria com a Contigo e irá, por exemplo, adiantar as matérias que estarão na revista antes de ela chegar às bancas.

‘De novo voltamos na história do público do horário, do fim de tarde, que é composto por mais mulheres do que homens. Elas gostam muito dessa coisa de mundo dos famosos’, fala Barbará, da DPZ. ‘Em um país em que se fabricam ídolos de 40 dias é impossível não haver a exploração da fama na TV, faz parte do show.’

O tal gosto despertou o interesse do SBT, que agora exibe o Falando Francamente, de Sônia Abraão, apenas aos sábados. Silvio Santos guarda a sete chaves o nome dos apresentadores – Monique Evans, Décio Piccinini, César Filho, Cacá Rosset e Janaína Barbosa já foram cotados para um novo programa, batizado de Cor-de-Rosa, que foi ‘inspirado’ em uma atração mexicana.

Cor-de-Rosa vai mesclar fofoca e talk show. Todos os dias haverá um convidado e a idéia é que os apresentadores sejam divertidos. ‘Um vídeo que eu vi do programa mostrava o apresentador vestido de feiticeiro, brincando de adivinhar o que vai acontecer na vida do artista. No outro, os dois âncoras andavam de patins pelo estúdio’, conta Cacá Rosset, que não foi liberado pela Record, com quem tem contrato, para apresentar a atração do SBT.

Campanha antibaixaria -O publicitário Barbará ressalta que não foi só o esgotamento da fórmula e o interesse pelas celebridades que decretaram a sentença de morte aos noticiários do mundo-cão. Para o publicitário, a recente campanha pela melhora da qualidade do conteúdo da TV, Quem financia a Baixaria é Contra a Cidadania, encabeça pelo deputado Orlando Fantazzini (PT/SP), pode ter dado o tiro de misericórdia nesses programas.

Em maio o deputado enviou a 14 anunciantes, que costumam patrocinar noticiários como Cidade Alerta e Brasil Urgente, ofícios da campanha informando alguns dos ‘abusos’ cometidos por esses programas e pedindo que essas empresas revissem suas estratégias de marketing na TV. Seis grandes anunciantes desses noticiários responderam ao ofício de Fantazzini, sendo que cinco deles prometeram rever investimentos em programas do gênero imediatamente ou em um curto prazo.

A Casas Marabraz, por exemplo, enviou carta dizendo que a empresa se solidarizou com a causa da campanha e prometeu avaliar melhor, em suas próximas negociações com emissoras, a qualidade dos programas em que estão investindo. O noticiário da Record, por sinal, aparece no mais recente ranking dos programas de baixaria avaliados pela campanha – a lista é feita com base nas queixas do público, recebidas por meio da internet (o site é www.eticanatv.org.br) ou por telefone 0800-619-619 ou 0 (xx) (61) 318-8284.

A atitude de Fantazzini provocou a ira das emissoras, já que o assunto enfim bateu às portas de seus cofres. ‘Alguns dirigentes da TV chegaram a pedir a minha cabeça na Câmara’, conta Fantazzini. ‘Já que os programas não mudaram, era óbvio que, uma hora, anunciantes e o próprio telespectador iriam pressionar. Em algum momento o povo iria perceber que aquilo era espetacularização da condição de miséria, a exploração do seu sofrimento.’

Para Barbará, essa total ‘conscientização’ de anunciantes e público ainda não existe. Ele acredita que a mudança na programação vespertina é só mais uma onda na TV. ‘A TV funciona como laboratório farmacêutico, precisa lançar uma nova droga a todo momento para poder sobreviver ou relançar remédios antigos com nova roupagem’, fala.

‘O que acontece é que, assim como na descoberta de remédios, nem sempre o investimento na novidade compensa o retorno’, continua. ‘Não é todo dia que se descobre um Viagra, ainda mais na TV.’’



Renata Gallo

‘‘Tudo a Ver’ quer herdar platéia feminina’, copyright O Estado de S. Paulo, 1/08/04

‘Quer entender sobre tecnologia, economia, moda, esporte, agronegócios, gastronomia, a vida das celebridades ou segurança? Assista ao Tudo a Ver.

Não, não é slogan da Globo. Trata-se do programa ancorado por Paulo Henrique Amorim e Janine Borba, que estreará amanhã, às 17h30, na Record, prometendo ao espectador um leque gigante de temas. A intenção é limpar o tom de desgraça e assegurar a presença do público feminino, que representa, acredite, 60% da audiência do Cidade Alerta.

Como estrela maior – ou de maior destaque – está a top Ana Hickmann, mas a atração também conta com outros 14 colaboradores. Cada um em sua área.

Do Jornal de Notícias, Paulo Henrique importou os quadros fixos – o programa tem uma infinidade deles – e o bom humor. Como ele já disse algumas vezes e gosta de repetir: ‘Jornal não precisa ser chato’. Luciano do Valle, Nivaldo Prieto e Paulo Calçade falarão de esportes, basicamente futebol, no quadro Papo de Arquibancada. E, como um dos públicos-alvo do programa são as mulheres, tentarão desmistificar o futebol para a platéia feminina. Como exemplificou Calçade na coletiva de imprensa feita pela Record, questões complicadas como ‘O que é um impedimento?’ estarão em pauta.

Fábio Gandour falará sobre tecnologia no Tecnofácil, Luiz Hafes, sobre agronegócios no Campo, onde o Brasil é Maior, Percival de Souza apresentará o Segurança/Insegurança, Eduardo Guedes, sobre culinária no Tá na Mesa, Sophia Camargo, sobre economia no O que eu Faço, Sophia…

Talvez o quadro mais inusitado seja o Assim Não Dá, de Luciano Faccioli.

Faccioli irá percorrer as ruas para tentar flagrar um problema ou até mesmo uma atitude equivocada de um cidadão, como um motorista que está dirigindo na contramão.

O programa ainda terá uma repórter em Brasília e outra em São Paulo. É claro que todos os colaboradores não vão aparecer no vídeo todos os dias. Haverá um revezamento. Nem mesmo Ana Hickmann, a nova aposta da emissora, entrará em cena todas as tardes com seu quadro, Estilo. Mas no dia de estréia, claro, ela estará lá. ‘Vou mostrar como não comprar besteiras por impulso nas liquidações’, conta. A idéia de Ana é começar a dar suas dicas de uma forma generalizada – como usar um terninho básico, por exemplo – para depois especificar o tema – como saber a cor adequada para cada tipo de pele.

Se depender da expectativa de Amorim, o programa tem futuro. ‘O Boni, que é pai de todos nós, fundou o padrão Globo de qualidade e nós vamos ter na Record um padrão de qualidade com programa popular’, afirma o jornalista.’



ENTREVISTA / GERALDO CASÉ
Keila Jimenez

‘‘Cada país vê TV de uma forma diferente’’, copyright O Estado de S. Paulo, 1/08/04

‘Do pai, além do sobrenome, Regina Casé herdou a inquietude, a voz que não se esquece, a vontade de inventar na TV. Geraldo Casé, pernambucano com mais de meio século de televisão, começou no rádio, trabalhou nas TVs Rio, Tupi, Excelsior, Band e, por mais 20 anos, foi uma das cabeças pensantes da Globo.

Além de Regina, Casé tem mais quatro filhos: Cláudia, Patrícia… Opa, mais de cinco: ele também é pai ‘adotivo’ de Pedrinho, Narizinho, Emília e de uma turma e tanto. Casé é um dos criadores da versão mais famosa do Sítio do Picapau Amarelo na TV, a da safra de 1977 a 1986.

No final do ano passado, deixou a rede. Em entrevista ao Estado, Casé – que hoje dirige centros culturais no Rio – fala sobre sua trajetória na TV e conta alguns bons causos sobre o meio. Casos esses que estarão em dois livros que está lançando, um sobre a história da Televisão – TV, Te Odeio Porque Te Amo – e outro sobre as melhores histórias que já passaram pela TV.

Estado – Como você começou trabalhar na TV?

Geraldo Casé – Primeiro trabalhei em rádio com meu pai. Fui para a TV logo que começou, em 1951. Comecei produzindo e dirigindo programas, a maioria deles, infantis. Fiz o Teatro Malasarte e o Fantoche Estrela, eu dirigia e confeccionava os bonecos. Naquele tempo a TV era artesanal.

Estado – Você sempre gostou de programa infantil?

Casé – Sempre gostei de escrever para criança, mas fiz muitos programas para adultos também. No começo montei uma agência de publicidade e fizemos 12 programas. Naquele tempo os anunciantes bancavam as atrações, as agências eram produtoras. Com isso, descobrimos muita gente como Haroldo Costa, o Abelardo (Barbosa, o Chacrinha), e o próprio Flávio (Cavalcanti). Aí eu fui para a Globo, fiz Band, TV Tupi, TVE, Excelsior e depois voltei para a Globo.

Estado – Como surgiu a idéia do Sítio na Globo?

Casé – Fiz uma proposta ao Boni de fazer uma novela para crianças e pré-adolescentes à tarde, ele adorou. Foi o que abriu as portas para o início das novelas da 6 na Globo, que antes não existiam. Então, a Globo conseguiu os direitos da obra de Lobato e me chamou para produzir e dirigir o Sítio. Foi mais de um ano de preparação até entrar no ar.

Estado – Quais foram as maiores dificuldades nessa adaptação?

Casé – A TV não tinha avanço tecnológico e logística. Não tínhamos os efeitos especiais que existem hoje. Fazíamos tudo na base do improviso.

Posso dizer que somos uns dos precursores do uso do croma-key, pelo qual conseguíamos diminuir o Visconde de Sabugosa, fazer um besouro gigante voando. Era uma aventura.

Estado – Foi a maior dificuldade que enfrentou na TV?

Casé – Não. Acho que o pior foi o incêndio na Band. Eu estava deixando a emissora no dia e resolvi ficar para ajudar em função do desastre. No mesmo dia que houve incêndio, peguei o caminhão de externas e levei para o teatro onde a Band gravava espetáculos musicais. Montamos tudo nesse teatro, foi tão de improviso, que parte do material era uma sucata que o Cassiano Gabus Mendes me emprestou, ele tinha guardado isso da Tupi.

Estado – Você sabia que o ‘Sítio’ seria esse sucesso?

Casé – Tinha quase certeza, pois a obra do Lobato é extraordinária e nossa equipe era ótima. Imagine: Benedito Ruy Barbosa era um dos roteiristas.

Conto todo esse processo de criação no meu livro, Quando os Rostos se Iluminam, em fase de finalização.

Estado – E por que o programa saiu do ar?

Casé – Apesar de ser um programa diferenciado, não era lucrativo. Não usava merchandising, não tinha licenciamento. Não tínhamos essa preocupação. E a concorrência começou a apertar.

Estado – Você gosta dessa nova versão do Sítio?

Casé – Não é questão de gostar ou não. É um outro produto, cumpre um objetivo que a emissora está buscando.

Estado – Você vê um futuro trágico para os infantis?

Casé – É difícil. A criança é fonte usada pela propaganda como alicerce do consumo e a TV de alguma forma acaba seguindo isso. No canal aberto a competição é violenta. Pensamos no canal pago, mas o canal pago, como o nome diz , é pago, então a faixa mais pobre, que é justamente quem mais precisa, não tem acesso. É complicado pensar nos infantis…

Estado – E como funcionava seu trabalho na Divisão Internacional da Globo?

Casé – Eu trabalhava na análise e adequação das novelas para que elas pudessem seduzir os compradores lá fora. Fiquei mais de uma década lá.

Estado – O que o marcou do mercado internacional ?

Casé – Cada país vê TV de uma forma diferente. O Uruguai, por exemplo, não compra novela de época. Não gosta. Tem países mais conservadores, que não gostam de novelas muito moderninhas. Mas uma coisa é fato: os maiores compradores da Globo são os países da América Latina. A Itália e a Alemanha foram grandes compradores também, só que no passado.

Estado – Você acha que Terra Nostra foi a grande alavanca de vendas da Globo depois de Escrava Isaura?

Casé – Ela vendeu bem, mas não sei se foi uma alavanca. O mercado mudou muito… A Globo perdeu alguns grandes compradores de uns anos para cá.

Houve uma modificação de comportamento da audiência. Na Alemanha, deixaram de ver novela para ver sitcoms e games. Na Itália, as vendas sofreram uma quebra em função da implantação da TV Montecarlo (canal adquirido pela Globo e já vendido) por lá. As novelas foram todas para a emissora, que acabou não dando certo. E também o Berlusconi (Silvio, hoje primeiro-ministro da Itália) fechou as portas um tempo para qualquer tipo de novela em suas TVs.

Isso mudou o comportamento da audiência italiana. A retomada desses mercados é a grande meta da Globo.

Estado – Como surgiu a idéia de escrever dois livros ?

Casé – Tenho muitas histórias para contar. Já escrevi um livro sobre os bastidores do Sítio do Picapau Amarelo, que está em fase de finalização, e estou escrevendo agora um livro que se chama: TV, Te Odeio Porque Te Amo. Eu conto histórias que ocorreram com pessoas que participaram do início da TV no Brasil.

Estado – Cite alguma.

Casé – Tem um capítulo que se chama: Quando João Gilberto me chamou de ladrão. Fiz um contrato para ele trabalhar por três meses em um programa de TV, toda as segundas-feiras, e ele receberia por mês. No segundo mês ele disse que estava sendo roubado…. Fiquei assustado e perguntei: ‘Por que, homem?’ Ele disse que o mês em que estávamos tinha cinco segundas-feiras e ele só trabalhava quatro segundas por mês. Eu não tinha culpa que aquele mês tinha cinco. Ele rompeu comigo. Anos depois, ele voltou ao programa, mas começaram os problemas de retorno do som, do ar condicionado…(risos) Antes não tinha nada disso… (risos)’