"Em sua ilustrada coluna, Mônica Bergamo informou ontem que ‘o Rio de Janeiro não respondeu aos apelos da campanha de desarmamento’. É ‘o quarto do ranking’, atrás ‘do campeão São Paulo’, de Pernambuco e do Rio Grande do Sul.
Seria o caso de dizer: bem feito, quem manda criar movimentos e campanhas e modas, que depois são usadas para mais críticas ao próprio Rio? Melhor do que isso, no entanto, será dizer que a população não marginalizada do Rio nunca foi de andar armada, logo, é possível que não tenha o bastante para disputar o glorioso título.
No Nordeste e no Sul, mesmo as capitais preservaram longamente o costume de ter arma, inclusive arma branca, originário dos períodos de desbravamento e, depois, de conflitos pelo domínio de terras e pelo predomínio político. Quanto a São Paulo, não é só a reconhecida concentração de boas almas, é também a maior concentração populacional. E a comparação numérica entre as populações estaduais talvez contribua para a definição do tal ‘ranking’. Mas nenhum desses lembretes, provenientes só da curiosidade sobre os fundamentos não publicados do citado ‘ranking’ -diminuiria o grande feito do ‘campeão’.
O problema do novo campeonato é conter o mesmo mal da campanha que o inspirou. Quem tem armas para maus fins não as entrega, continua armado. E não só de revólveres e carabinas se faz a violência das cidades tomadas pela criminalidade, como sabem os intelectuais e jornalistas, e até certos mendigos cujas mortes mal figuraram na mídia do ‘campeão’ e nela foram esquecidas antes que sejam desvendadas.
Ao ‘campeão’, uma salva de tiros, perdão, de palmas. (Os tiros me ocorrem assim porque sou do antro de criminosos que, sabe todo jornalista de São Paulo, é o Rio)."
Mônica Bergamo / Hector Babenco "Casca de banana", copyright Folha de S. Paulo, 14/09/04
"Ainda não terminou a polêmica entre o cineasta Cláudio Assis, de ‘Amarelo Manga’, que insultou Hector Babenco, de ‘Carandiru’, no Grande Prêmio TAM de Cinema Brasileiro, na quarta passada. Assis invocou o fato de Babenco ter falado mal de Lula na Argentina como um dos motivos de sua contrariedade. Assis guarda em suas gavetas uma entrevista publicada em março pelo diário ‘La Capital’, de Mar del Plata. A coluna localizou a reportagem, pela internet, nos arquivos do jornal.
Nela, o ‘La Capital’ faz a seguinte pergunta ao cineasta argentino: ‘Lula o decepcionou?’. E Babenco: ‘Sim, com Lula eu me decepcionei. Não imaginei que o Brasil, que era uma república de bananas sem nenhuma tradição constitucional, poderia gerar um presidente como Fernando Henrique Cardoso, um professor com prestígio internacional. E daí passar a um torneiro como Lula…isso não acontece em nenhum lugar’.
Continua Babenco: ‘Mas, uma vez que chegou ao governo, Lula não traiu seus ideais, senão que se deu conta de que não estava preparado para o exercício da política, que é uma profissão como qualquer outra. Hoje está cada vez mais deprimido, bebendo cada vez mais e com o partido totalmente carcomido, com os fundamentalistas do partido, que são como os xiitas, querendo que o Estado seja dono de tudo.’
Curiosidade: a entrevista de Babenco foi publicada dois meses antes do artigo em que Larry Rohter, do ‘New York Times’, afirmava que o país se preocupava com o ‘hábito de bebericar’ do presidente. Lula, na ocasião, tentou expulsar Rohter do país. A coluna procurou Babenco para falar sobre as agressões de Assis e a reportagem do ‘La Capital’.
Folha – Quando houve o episódio com o Cláudio [Assis], nós quisemos entrevistá-lo. Você recebeu nosso recado?
Hector Babenco -Eu recebi. Mas, perante um ato de demência, eu recomendo serenidade e distância. É a única coisa que eu posso dizer.
Folha -Ele nos enviou uma reportagem do jornal ‘La Capital’, em que você diz que ‘Lula está deprimido e bebendo cada vez mais’.
Babenco -Você faça o que você quiser.
Folha – Eu só estava querendo saber…
Babenco -[interrompendo] Eu não tenho condição de te responder nada. Você já foi tremendamente feia comigo. Me senti tremendamente mal amado, não respeitado. Você se utilizou de um jornalismo baixo calão. Estou te ligando simplesmente para não te dar a chance de dizer que não respondo a teu telefonema.
Folha – Nós sempre telefonamos para você. A que episódio você se refere?
Babenco -Eu preferiria me manter ausente dessa discussão. O jornalismo que você faz, a mim não me interessa.
Folha – Agora, essa entrevista aqui [do jornal ‘La Capital’]…
Babenco -Um abraço grande, Mônica, querida. Tchau.
[desliga o telefone]."