‘Com o controle remoto na mão, passeie pelos canais de televisão. A televisão seqüestra as imagens do Brasil e as devolve como mito. A televisão não retrata o país. O país é o que se vê na televisão.
Às seis da manhã, programas religiosos: Deus é fiel, pregação de pastores de terno ou com vestimentas religiosas, mesa-redonda de teólogos sobre São João Batista como precursor de Jesus e o sentido do batismo.
Depois, debates. Discursos no Senado e na Câmara, painéis sobre problemas municipais, meio ambiente, apoio público à arte. Entrevistas de professores e líderes comunitários. Palavras repetidas sem que possamos compreender o significado: cidadania, competitividade, globalização, pequenas empresas, educação .
Num terceiro grupo, documentários sobre ONGs. Uma senhora pobre mantém uma escola de futebol para 150 crianças de favela, com bola de meia e jogadores descalços. Um professor de música organiza grupo de percussão em Salvador com crianças de rua. Ensina música, matemática e informática. Biólogos preocupados com a extinção do monocarvoeiro na mata atlântica e voluntários de uma cidade pequena do Brasil pretendem salvar da extinção os monocarvoeiros e transformar a cidade em um centro turístico a partir da salvação dos macacos.
Nos canais da TV aberta, moças seminuas rebolam ao som de música sem graça enquanto o locutor falastrão faz perguntas cujas respostas certas premiavam o telespectador com eletrodomésticos.
Finalmente, notícias econômicas e financeiras: o fechamento das bolsas em São Paulo, Buenos Aires e Nova York. A desvalorização do dólar, a valorização do real, dos pesos, do euro. Antes do jantar, programas policiais com reportagens sobre seqüestros e chacinas -a violência selvagem da África na periferia das grandes cidades.
Qual o futuro do país? Uma nova Grécia, onde todos debatem na praça pública as leis e o destino comum? Um país religioso cuja salvação depende da fé? Uma terra de homens de boa vontade que trabalham pela educação da infância pobre e excluída? Um país cujo destino é decidido em mercados de valores e de câmbio?
São países diferentes -Wall Street, Jerusalém, Atenas e África com vidas paralelas?
É um país só, aldeia global, onde o país Wall Street determina o desemprego que é consolado pelas promessas das religiões comerciais? Onde pessoas de boa-fé não percebem que a pobreza não pode ser resolvida por cursos profissionalizantes, trabalhos artesanais e cursinhos de futebol?
Os 50 canais à disposição do telespectador apresentam um único programa: um mundo sem graça quando quer fazer arte; de poucos resultados quando trabalha para educar, incluir e melhorar. Místico por razões comerciais. Sem sentido quando procura sentido ou com um sentido que ainda não podemos perceber.’
O APRENDIZ
‘Saiba como será o final de ‘O Aprendiz’’, copyright Folha de S. Paulo, 20/12/04
‘Se você não quer saber quem será o provável vencedor do ‘reality show’ ‘O Aprendiz’, da Record, pare de ler este texto aqui.
O último episódio será transmitido nesta quinta. Parte será ao vivo. A outra parte já está gravada desde a semana passada. O conteúdo ao vivo, o último bloco, será transmitido do teatro da Record. Lá, está sendo montado o cenário da sala de reuniões do programa, onde são feitas as demissões.
Como no original americano, no final do episódio o cenário se abrirá para a platéia, onde estarão os participantes eliminados.
Já estão definidos os dois finalistas: são a gerente de criação Viviane e o engenheiro elétrico Denis.
Pela lógica do programa americano, Viviane é favorita a ganhar o prêmio, um emprego de R$ 250 mil anuais líquidos em uma das empresas do publicitário e apresentador Roberto Justus.
Na última competição do programa, gravada no dia 14, Viviane saiu vencedora. A prova consistia em organizar um leilão beneficente. Os seis últimos eliminados ajudaram os finalistas _três na equipe de Viviane, a Solidez, e três na de Denis, a Ginga Brasil.
Isso, no entanto, não quer dizer que Viviane ganhará o programa. A decisão final cabe ao empregador Justus, que pode surpreender até contratando os dois finalistas.
No episódio de amanhã, serão eliminados dois participantes. Isso se a Record não fizer mudanças nos dois últimos episódios.
OUTRO CANAL
Diplomacia
A Globo deu um ‘presente’ para os cerca de 1.200 militares brasileiros que estão em missão no Haiti. Mandou instalar, na semana passada, em bases das Forças Armadas, cinco pontos receptores do sinal do canal internacional da emissora, que transmite quase a mesma programação que se vê no Brasil.
Domingão
A Band voltou a trabalhar no projeto de um programa dominical apresentado por José Luiz Datena. A atração, de variedades, pode sair até março. A idéia é que o programa seja exibido antes do ‘Jogo da Vida’, de Márcia Goldschmidt.
Novos tempos
A Globo vai lembrar amanhã, no ‘Mais Você’, da primeira novela da televisão brasileira, ‘Sua Vida Me Pertence’, que estreou na TV Tupi em 21 de dezembro de 1951. A efeméride será o ‘gancho’ de entrevista que Mauro Alencar dará a Ana Maria Braga, falando também de sua tese de doutorado sobre novela na USP.
Oceano 1
O mergulhador e documentarista Lawrence Wahba teve um dia de glória na última sexta, quando a Globo exibiu no ‘Globo Repórter’ um documentário feito por ele em 2001, para TVs do exterior, sobre o atol das Rocas.
Oceano 2
Wahba era assíduo fornecedor de imagens submarinas para a Globo, até que a Record o contratou, em maio. E, mesmo trabalhando na concorrência, ele apareceu no ‘Globo Repórter’.’
MTV
‘Cicarelli vai ser ‘cupido’ e penetra na MTV’, copyright Folha de S. Paulo, 19/12/04
‘Será de auditório, na linha ‘Namoro na TV’, o programa semanal que Daniella Cicarelli, a noiva de Ronaldo, apresentará na MTV a partir de março. Segundo a emissora, será bem diferente do extinto ‘Fica Comigo’, de Fernanda Lima.
Cica, como Daniella é chamada na MTV, ainda não assinou novo contrato com a emissora. A expectativa é que isso ocorra até a próxima quinta-feira.
Se fechar com a MTV, a modelo terá ainda outro programa, com 16 episódios, em que será uma penetra. Invadirá festas, eventos e até salas de aulas.
Estrelada e com agenda cheia, ela fará gravações de uma só tacada, uma vez por mês, durante dois ou três dias.
Justo
Vai ter muito choro no ‘Domingão do Faustão’ do dia 26. Tarcísio Meira e Glória Menezes receberão o Troféu Mário Lago, homenagem que a Globo só faz aos que ela considera os melhores dos melhores _até agora, só o receberam os atores Mário Lago e Paulo José.
Esquece
A Record fez na semana passada festa para comemorar ‘os bons resultados do ano’. Exibiu em telão trechos de suas estréias, como ‘O Aprendiz’. Mas não houve nenhuma menção à malfadada ‘Metamorphoses’.
Ficção
Pedro Bial e Glória Maria, que já não apresentam mais o ‘Fantástico’ juntos porque não se suportam, se abraçaram e trocaram ‘beijos técnicos de língua’ na festa de fim de ano do programa.’
TV & MACHISMO
‘Televisão tem gostado de bater em mulher’, copyright Folha de S. Paulo, 19/12/04
‘Da novela da Globo ao ‘rei da baixaria’ João Kléber, ninguém tem dúvida: bater em mulher é o que há.
Bate-se por tudo e por nada; mulheres batem em outras mulheres, homens batem em mulheres… E tudo vai bem na televisão brasileira…
Normalmente, nesta época do ano, fazem-se balanços, retrospectivas etc. Em vez disso, pretende-se chamar a atenção de algo que seria desejável erradicar de uma vez por todas da agenda da televisão no ano que vem.
Entre as várias ultrapassagens de limites do aceitável praticadas cotidiana e indiscriminadamente pela televisão, a violência contra a mulher se destaca tanto pela naturalidade insidiosa com que vem se instalando quanto pelo que significa em termos de retrocesso.
Truque
Neste ano, novamente a novela das oito da Globo conseguiu picos de audiência com uma briga entre a vilã e a heroína.
Não se pode mais tapar o sol com a peneira -o truque veio para ficar. No outro extremo da programação, os testes de fidelidade de ‘Eu Vi na TV’, da Rede TV!, acabam, a três por dois, em pancadaria.
Nesta semana, um personal trainer submetido ao tal teste deu vários safanões na atriz encarregada de ‘tentá-lo’.
Não importa se em contexto francamente ficcional, como é o da novela, se em uma situação aparentemente espontânea, como a armada no programa de João Kléber.
Há diferenças entre cenas e contextos em que acontecem as cenas de brigas e agressões lá e cá, mas, em qualquer dos casos, é assustador pensar que isso passou a fazer parte daquilo que se exibe na TV. Na verdade, mais do que assustador, é preocupante.
Afinal, é como se a TV estivesse reiterando a idéia de que está no horizonte de qualquer mulher ‘ter que’ apanhar, vez ou outra.
Elas são mesmo provocantes, abusadas, indignas de confiança, traiçoeiras, infiéis, más… Mulheres, como os programas evangélicos da madrugada da Record fazem questão em lembrar, são a morada favorita do demônio.
Seja pela natural fraqueza de espírito, seja por inclinação e gosto, no comportamento das mulheres sempre se achará algo de condenável e passível de punição exemplar, não é isso?
É um retrocesso daqueles, revestido do mais ultramoderno cinismo. Porque isso acontece mesmo por aí, não?
A violência está por toda parte e é quase o dever sagrado da televisão registrá-la, certo? Não seria hipócrita ou ingênuo omitir ou ocultar ou ainda, pecado dos pecados, ignorar que a exibição de cenas de violência contra a mulher têm repercussões positivas nos índices de audiência?
O fato é que a TV tem contribuído significativamente para retomar e reforçar a noção de que as mulheres fazem que fazem e acabam merecendo algum tipo de castigo físico. E isso, mais do que assustador, é preocupante.’