O maior destaque do primeiro dia útil de 2006 nos jornais é a entrevista concedida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao programa Fantástico, da Rede Globo, exibido no domingo. Todos os três maiores jornais brasileiros destacaram a frase de Lula de que o PT vai ‘sangrar’ até recuperar a credibilide e deixaram em segundo plano as críticas do presidente à imprensa.
Outro assunto que permanece na pauta é o caso da revelação de espionagem, autorizada pelo presidente George W. Bush, a cidadãos norte-americanos e turistas, sob o pretexto de combate ao terrorismo. Os três jornais apresentam nesta segunda-feira reportagens sobre a defesa de Bush das escutas e grampos realizados pelo seu governo.
O Estado de S. Paulo traz ainda uma interessante matéria sobre a publicação pela revista Science, o mais importante periódico científico do mundo, de uma fraude: a falsificação das pesquisas com células-tronco do sul-coreano Hwang Woo-Suk. Segundo a reportagem, ‘todos os estudos submetidos para publicação passam por um processo chamado peer review, ou revisão por pares, no qual são avaliados por cientistas independentes da pesquisa. O estudo de Hwang, no qual ele dizia ter produzido 11 linhagens de células-tronco embrionárias clonadas de pacientes, não foi exceção’, diz o texto. ‘Na semana passada, após muitas denúncias, a Universidade Nacional de Seul descobriu que todos os dados do trabalho eram baseados em apenas duas linhagens de células-tronco, e não 11, e que essas duas não haviam sido produzidas por clonagem, mas por simples fertilização in vitro. Ou seja, a pesquisa foi completamente forjada’, completa a matéria.
Segundo o Estadão, o editor-chefe da Science, Donald Kennedy, ‘defendeu o processo de revisão da revista. ‘É muito difícil para o processo de peer review detectar erros que não são evidentes ou interpretações de resultados intencionalmente errôneas’, disse ele, quando a extensão da fraude ainda não era totalmente conhecida. ‘Não dá para pegar tudo.’’
Leia abaixo os textos desta segunda-feira selecionados para a seção Entre Aspas.
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Folha de S. Paulo
Segunda-feira, 2 de janeiro de 2006
LULA NO FANTÁSTICO
Lula diz que PT vai ‘sangrar’ para recuperar credibilidade
‘O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o PT ainda vai ‘sangrar muito’ para recuperar a credibilidade perdida depois das acusações de uso de caixa dois e corrupção que resultaram na crise política do ano passado, mas disse acreditar que o partido tem ‘salvação’.
‘O PT cometeu um erro… Um erro que é de uma gravidade incomensurável. Todo mundo sabe -e sabe o PT hoje e sabe quem cometeu os erros- que o PT cometeu um erro que será de difícil reparação pelo próprio PT. O PT vai sangrar muito para poder se colocar diante da sociedade outra vez com uma credibilidade que ele conquistou ao longo de 20 anos’, afirmou Lula em entrevista gravada no dia 29, que foi ao ar ontem à noite no programa ‘Fantástico’, da Rede Globo.
A afirmação do presidente foi feita ao comentar a declaração do repórter Pedro Bial sobre entrevista anterior, realizada em Paris, na qual Lula disse que o caixa dois do PT era prática sistemática da política brasileira. Em seguida, Lula disse que o PT vai recuperar sua credibilidade.
‘Acho que [o PT] tem salvação porque o PT é um partido muito grande. E numa família, quando alguém comete um erro qualquer, você não pune a família inteira. Vai ser punido quem cometeu o erro. E a legenda continuará com a mesma grandeza com que fez política nestes últimos 20 anos.’
Lula também declarou que recebeu como uma ‘facada nas costas’ as denúncias sobre o esquema montado pelo PT com o empresário Marcos Valério. Esse trecho da entrevista de 35 minutos já havia sido divulgado na semana passada, quando repórteres assistiram parte da gravação.
O presidente afirmou que se sentia traído por ter dedicado parte de sua vida, inclusive com suas crianças dormindo na calçada e vendendo camisetas, para construir o PT, um partido para mudar a forma de fazer política.
Sobre sua alegação de inocência em relação às denúncias, Lula disse, com o dedo em riste, que gostaria de receber pedidos de desculpas, pela ‘leviandade’ dos que fazem julgamentos precipitados.
‘Com relação à minha pessoa, a única coisa que eu peço a Deus é que, quando terminar tudo isso, aqueles que me acusaram peçam desculpas. Só peço isso. Não quero, não quero nada mais do que isso. Peçam desculpas.’
Durante grande parte da entrevista, Lula repetiu a importância de o governo, Ministério Público, Polícia Federal e CPIs investigarem as denúncias. E disse que fez a sua parte, assim como o PT, quando os casos vieram à tona.
Evasivas
Muitas vezes as declarações serviam para que se esquivasse de responder diretamente as perguntas. Foi esse o caso quando foi questionado se sabia (dos esquemas de corrupção). Primeiro, Lula disse que só há três hipóteses de saber das coisas: ‘Quando você participa da reunião ou quando alguém que participou te conta ou quando sai uma denúncia’.
Em seguida, o jornalista insistiu dizendo que o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares era próximo do presidente.
Lula, então, afirmou: ‘O que é importante… O que é importante não é se você sabia ou não, porque, se eu tivesse condições de saber, não teria acontecido. Esse é o dado concreto. Se eu tivesse condições de saber, não teria acontecido. Na medida em que eu soube, naquilo que diz respeito ao presidente da República, as providências todas foram tomadas. Foi afastado quem deveria ser afastado. Foi punido quem deveria ser punido. Agora, a Justiça faça a sua parte. E, no caso do PT, o PT fez a sua parte’.
O presidente pediu que não se condene ninguém antes de haver provas conclusivas. Citou como exemplo, a situação do ex-ministro José Dirceu, cujo processo ainda estaria inconclusivo, diferentemente do ‘Delúbio, que assumiu a responsabilidade’.
Reeleição
Lula não respondeu se será candidato neste ano. Disse que ainda há muito trabalho a fazer e que tem tempo, ‘lá pelo meio do ano’, para definir se tentará a reeleição. Disse, porém, que além de trabalho a fazer, tem frutos a colher.
‘Não tenho pressa. Quem tem pressa são os meus adversários. Eu não tenho pressa. Eu tenho que governar o Brasil até o dia 31 de dezembro e tenho muita coisa para fazer. Muita coisa para fazer. E muita coisa para colher. Porque você sabe que é assim: você planta, rega e um belo dia você começa a colher’, afirmou.
Lula disse que este ano será ‘o ano do povo brasileiro, porque está tudo engatilhado, está tudo preparado, está tudo armado para que o Brasil tenha um forte crescimento, uma forte distribuição de renda, muito emprego para esse povo e quem sabe a gente construir junto o Brasil que nós sonhamos há muito tempo construir’.
Ele citou números e feitos de seu governo, sobretudo nas áreas econômica e social, criticou a imprensa por não dar mais espaço para realizações positivas e disse que fez a sua parte, ao responder sobre a impossibilidade de realizar reformas (trabalhista, sindical e tributária) em ano eleitoral.
‘Não pode [fazer as reformas]. Deixa eu lhe contar. A minha parte eu cumpri. Nós criamos um Fórum Nacional do Trabalho em que participaram empresários, trabalhadores e o governo. Apresentamos uma proposta que está no Congresso Nacional. Não posso bater escanteio e marcar o gol ao mesmo tempo. Enviei o meu projeto ao Congresso Nacional e eu espero que ele vote.’’
MÍDIA CONTROLADA
Livro acende o necessário debate em torno da censura
‘A liberdade de expressão é uma das mais importantes conquistas democráticas da história. Todos os países do mundo passaram a maior parte de sua história sem desfrutar desse bem, atualmente considerado indispensável para o convívio social construtivo.
Os brasileiros conquistaram esse direito há muito pouco tempo. Mesmo assim, ele ainda sofre ameaças graves, como se percebe em diversas iniciativas de poderes políticos diversos com o objetivo de restringi-lo ou mesmo eliminá-lo simplesmente.
O jornalista e professor Sérgio Mattos acaba de lançar um livro de extrema utilidade para a preservação dessa prerrogativa. Com extraordinário poder de concisão, ele traça em ‘Mídia Controlada’ um histórico abrangente da censura no Brasil e no mundo.
Para demonstrar como é atual e necessário esse tipo de debate, Mattos abre o seu trabalho com exemplos muito recentes de tentativas de atentar contra a liberdade de expressão neste país por parte de instrumentos de Estado.
Para não se ater ao Poder Executivo, origem das três situações citadas, Mattos talvez devesse ter incluído a ação de juízes, que têm determinado apreensão de livros e proibido a veiculação de informações sobre determinados temas em veículos jornalísticos.
Mas isso, de modo algum, diminui a importância e a abrangência do estudo de Mattos, que analisa diversos países, inclusive os Estados Unidos, sociedade onde a liberdade de expressão talvez esteja mais enraizada e, mesmo assim, como mostra o autor, ainda sofre intimidações, como se observa desde o 11 de Setembro de 2001.
No Brasil, apesar do artigo 220 da Constituição de 1988, formalmente continua a viger a Lei de Imprensa (a 5.520, de 1967) do regime militar.
Embora tenha sido relegada à irrelevância, ela sobrevive e pode ser usada se alguém desejar fazer assim -como o presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992) no processo que moveu contra Otavio Frias Filho, diretor de Redação da Folha, em 1991.
Essa é uma das inúmeras demonstrações absurdas de como o emaranhado de leis cria obstáculos para a consolidação das instituições no país. É essa rede de conflitos e inoperância que permite a ocorrência de abusos desmedidos contra a liberdade de expressão, apesar do claro desejo dos constitucionalistas para que isso não acontecesse.
Mattos discute se deve haver uma nova lei de imprensa. Cita os que alertam para o perigo de criar uma ‘indústria das indenizações’ se o anteprojeto em debate no Congresso vier a ser aprovado com o texto atual.
Talvez o mais recomendável seja simplesmente não haver nenhuma lei de imprensa. Que os excessos do usufruto da liberdade de expressão sejam punidos pela lei penal comum, que já prevê sanções a quem cometa calúnia, injúria e difamação.
A experiência nacional é que a fartura de instrumentos legais, longe de auxiliar a sociedade, com freqüência a prejudica. Mattos se restringe em seu livro à ação do Estado no cerceamento (ou tentativa de) à liberdade de expressão.
Poderia, se o quisesse, ampliar o espectro e analisar como a criação de oligopólios econômicos da iniciativa privada também coloca em risco esse direito.
A convergência de meios de comunicação e a concentração setorial na economia se constituem em poderosos instrumentos capazes de ferir aos interesses da cidadania, como se tem visto em diversos incidentes nos EUA e em outros países.
É legítimo, porém, o objetivo do autor de se ater apenas à relação entre Estado e meios de comunicação. Afinal, é ele quem tem o monopólio do poder de censura formal e é dele que, com freqüência, emanam os principais atentados à liberdade de expressão.
O problema principal desse tema deriva do fato constatável e bastante humano de que todos são a favor da liberdade de expressão quando fazem o papel de estilingue, mas se sentem tentados a impedi-la quando passam à condição de vidraça.
Raros são os que mantêm a coerência de princípios quando se sentem prejudicados pelo uso da liberdade de expressão. Esses, especialmente quando chegam à condição de governantes, são os grandes heróis desse direito.
Felizmente, a sociedade brasileira teve a sorte e o engenho de ter contado com pessoas capazes desse prodígio no período em que os alicerces da democracia foram erguidos no fim da década de 80.
Ainda há muito a ser feito para que todo o edifício democrático se consolide. Manter, expandir e garantir a liberdade de expressão é uma das tarefas mais fundamentais para tanto.
Livros como o de Sérgio Mattos, capazes de motivar e ampliar o debate sobre esse tema, são instrumentos importantes para que isso ocorra.
Carlos Eduardo Lins da Silva é jornalista e diretor da Patri Relações Governamentais e Políticas Públicas
Mídia Controlada – A História da Censura no Brasil e no Mundo Autor: Sérgio Mattos Editora: Paulus Quanto: R$ 30 (232 págs.)’
GRAMPOS NOS EUA
Bush afirma que espionagem doméstica antiterror é ‘limitada’
‘DA ASSOCIATED PRESS – O presidente dos EUA, George W. Bush, fez ontem uma forte defesa do seu programa doméstico de espionagem ao afirmar que se trata de uma iniciativa limitada a rastrear apenas chamadas aos Estados Unidos.
‘Parece lógico para mim que, se sabemos da existência de números de telefone associados à rede Al Qaeda ou de alguém próximo a ela e eles estão fazendo chamadas telefônicas, faz sentido descobrir o porquê’, disse o presidente americano. ‘Eles nos atacaram antes e vão nos atacar de novo.’
Bush falou a repórteres durante visita a militares feridos em combate. Ele disse que o vazamento da informação de que havia uma determinação secreta para grampear americanos suspeitos de ligações com terroristas provoca ‘um grande dano à nação’.
Questionado sobre como responde às críticas de americanos preocupados com sua privacidade, Bush disse que, ‘se alguém da Al Qaeda está lhe chamando, gostaríamos de saber por quê’.
O presidente americano disse que respeita as liberdades civis da população. ‘Este é um programa limitado destinado a impedir ataques nos Estados Unidos da América. E eu repito, limitado. Creio que a maioria dos americanos entenda a necessidade de descobrirmos o que o inimigo pensa.’
O Departamento da Justiça começou a investigar o vazamento da informação ao jornal ‘The New York Times’ que resultou numa reportagem publicada no mês passado sobre procedimentos de espionagem sem mandado judicial conduzidos pela Agência de Segurança Nacional depois do 11 de Setembro.’
TELEVISÃO
Record prepara horário com série bíblica
‘De hoje a quinta-feira, a Record exibe a série norte-americana ‘Moisés’ (‘Moses, the Lawgiver’), uma produção de 1975 em quatro capítulos. É o pontapé para um mês cheio de seriados e a preparação para a primeira ‘sitcom’ própria da emissora, ‘Avassaladoras’, que estréia dia 23 e é produzida em parceria com a Fox.
A série bíblica ‘Moisés’ é dirigida por Gianfraco De Bosio e tem Burt Lancaster (1913-1994) como protagonista. Filmada no Egito, foi uma das primeiras grandes produções bíblicas para a televisão dos EUA.
A série cristã narra a história de Moisés desde criança, passando pela lendária viagem de 40 anos à Terra Prometida e culminando no dia em que ele recebe os Dez Mandamentos de Deus. Será exibida às 23h15.
Não é a primeira investida religiosa da emissora, que tenta, com a nova programação, provar que não tem mais sua grade atrelada à Igreja Universal, do bispo Edir Macedo -no Natal, por exemplo, exibiu ‘Jesus de Nazaré’ (1976), filme mais associado ao catolicismo. Em 1995, período em que a Record mantinha uma programação mais acentuadamente evangélica, o canal mostrou o momento em que o bispo Sérgio von Helde chutou a imagem de uma santa católica.
Além de ‘Moisés’, a emissora comprou um pacote de séries produzidas recentemente nos EUA para exibir diariamente na sua programação noturna.
No dia 4, começa ‘As Mágicas Mais Perigosas do Mundo’, que vai até o dia 11, às 22h30. A série coloca pessoas situações de risco de morte como entrar num caixão com ratos carnívoros.
A partir do dia 9, também em quatro capítulos e exibida sempre às 23h15, a emissora apresenta ‘Spartacus’, série de 2004 sobre a história da Gália do ano 72 a.C.
Já no dia 17 estréia, no mesmo horário, ‘Hitler, a Trajetória do Mal’ (2003), produção que conta a ascensão do Terceiro Reich, com o surgimento da Alemanha nazista. A série vai até dia 19.
Depois da estréia de ‘Avassaladoras’, que será semanal, a emissora ainda estréia, às 23h30 do dia 24, a série ‘O Julgamento das Bruxas de Salém’, que vai até o dia 26. A série se passa numa colônia de Massachussetts, em que garotas foram acusadas de ser bruxas.’
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O Globo
Segunda-feira, 2 de janeiro de 2006
CRISE POLÍTICA
Governo Lula gastou R$ 8,6 milhões com festas e propaganda em 2005
‘BRASÍLIA. Criada para fiscalizar o gasto do dinheiro público, a ONG Contas Abertas fez um balanço mostrando que de janeiro até 29 de dezembro de 2005, as despesas com festas e publicidade de ações oficiais do governo Lula chegaram a R$ 8,6 milhões. O levantamento foi feito com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi).
O valor é superior às despesas com o programa de prevenção para emergências e desastres, que gastou R$ 2,3 milhões para obras como contenção de encostas, canalização de córregos e desobstrução de galerias.
Defesa, Itamaraty e Fazenda gastaram mais
Os campeões em gastos foram os Ministérios da Defesa, Relações Exteriores e da Fazenda. A Defesa usou R$ 3,2 milhões em gastos que incluíram desde o jantar de despedida para os participantes da 2 Reunião de Coordenação da Doutrina Militar do Exército, na Churrascaria Espeto de Ouro, em Brasília, ao aluguel de jogos de mesa e ‘toalhas trabalhadas’.
O Ministério das Relações Exteriores atingiu a cifra de R$ 2,8 milhões, dos quais R$ 1,3 milhão remetidos para seu escritório financeiro em Nova York a fim de atender solenidades nas embaixadas brasileiras no exterior.
Outro dado que chama a atenção da ONG é o gasto de R$ 557,9 milhões com viagens e R$ 1,12 bilhão com diárias para servidores do Executivo, Legislativo e Judiciário. Até 10 de dezembro de 2005, os números mostram que a União gastou em publicidade R$ 230 milhões. Do total, foram destinados R$ 94 milhões para promover as ações do próprio governo. O resto foi gasto em publicidade institucional dos três poderes.’
GRAMPOS NOS EUA
Bush defende escuta apesar de forte pressão por depoimentos no Senado
‘WASHINGTON. O presidente dos EUA, George W. Bush, voltou ontem a defender a realização de escutas pela Agência Nacional de Segurança, depois que uma reportagem revelando resistência no Departamento de Justiça à implementação da prática aumentou a pressão para que autoridades fossem chamadas a testemunhar no Senado sobre o programa secreto de grampos.
Uma reportagem do ‘New York Times’ publicada ontem revelou que James Comey, vice do então procurador-geral dos EUA John Ashcroft, preocupado com a legalidade do programa, recusou-se a dar prosseguimento a ele em 2004. A Casa Branca, então, pediu ajuda a Ashcroft, então hospitalizado em razão de uma cirurgia na vesícula biliar.
– Esse programa é importante para proteger os americanos – disse Bush, após visitar soldados feridos num hospital no Texas. – Estamos em guerra.
O presidente disse ainda que o programa se restringe a alguns ‘poucos números’ telefônicos que receberam ligações internacionais de reconhecidos membros da al-Qaeda.
– Se alguém da al-Qaeda está ligando, queremos saber por que – disse Bush.
O senador democrata Charles Schumer, de Nova York, membro do Comitê Judiciário, disse que vai pedir a convocação de Comey, Ashcroft, do atual procurador-geral, Alberto Gonzales, e do chefe de Gabinete da Casa Branca, Andrew Card.
– As revelações de hoje realmente aumentam as preocupações sobre o assunto. Se Comey, que era um dos principais promotores a lutar contra o terrorismo, disse que o programa violava a lei isso chama a atenção – afirmou Schumer.
Uma reportagem do ‘New York Times’ publicada há duas semanas revelou que Bush autorizou o programa para o monitoramento, sem aprovação judicial, de telefonemas internacionais e e-mails de americanos suspeitos de relações com terroristas estrangeiros.’
INTERNET
Voipbuster
‘No meio do atual frenesi do Skype, que há poucas semanas passou a receber pagamentos em reais e se integrou ao sistema Telelistas, recebi uma ligação no meu telefone fixo. Era o meu amigo Paulo Pinto, veterano BBSzeiro das antigas, aliás, Sysop do primeiro BBS no Brasil. Ele estava usando um sistema alternativo ao Skype chamado VoipBuster, marca registrada da Finarea S.A., uma empresa da bela cidade de Lugano, na Suíça. O VoipBuster, tal como o Skype, também faz chamadas ponto-a-ponto gratuitas, ou seja, se ambos usuários tiverem o software em seus computadores, não pagarão nada para conversar, exatamente como ocorre com o Skype. Mas na hora de competir com o SkypeOut, o VoipBuster tem duas vantagens. A primeira delas é que o custo da ligação é menor do que a do Skype em quase todas as destinações. A segunda e melhor das vantagens é que o VoipBuster faz ligações gratuitas para telefones fixos nos seguintes países: Alemanha, Áustria, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, Grécia, Holanda, Irlanda, Luxemburgo, Noruega, Suécia, Suíça e Taiwan.
O software ainda está em beta, mas é bem estável. Há no site da empresa um fórum para discussões e tirar dúvidas. Quem quiser experimentar as ligações gratuitas para os paises enumerados acima precisa saber do seguinte detalhe: para usuários não-pagantes as chamadas têm duração limite de um minuto. A menos que você tope comprar dez euros de crédito. Essa grana fica valendo como depósito, liberando você do limite de tempo. Se apenas telefonar para os países grátis, sua grana permanecerá intocada no VoipBuster. Só começarão a lhe cobrar quando você ligar para localidades fora da lista gratuita. Se não ligar nunca, então a princípio você morre nessa grana mesmo.
O VoipBuster ainda não oferece a todos (mas planeja oferecer) um serviço similar ao SkypeIn, em que você ganha um número telefônico válido no qual pode receber chamadas normais que caem na sua linha de voz-por-IP. Alguns usuários cadastrados estão ganhando um número Voip-IN gratuito, mas não todos. Estes, no caso, são advertidos que se usarem regularmente o tal número ele não será desativado. Mas se deixarem de usar ele morre.
Com relação à rapidez com que as ligações se completam, quem já usou SkypeOut para chamadas internacionais sabe que ele demora um pouquinho para tocar do lado de lá. O VoipBuster é bem mais rápido para fechar a chamada. O download é gratuito e pequeno (1,67 MB). A versão atual é a 2.08 build 252. Nos testes que tenho feito, a qualidade sonora é um pouco inferior à do Skype.
O Skype tem várias funcionalidades que o VoipBuster ainda não possui, mas o diferencial de poder usar o ‘VoipBusterOut’ de graça para ligações de um minuto é de tirar o chapéu. Vamos ver quanto tempo sobrevive este serviço oferecendo esta mamata. É possível que seja apenas um chamariz para atrair moscas, digo, nós, novos usuários. Vale lembrar que, quando foi lançado, o VoipBuster exigia um depósito de apenas um euro para liberar o usuário do limite de um minuto. De lá para cá este valor decuplicou.
De resto, novas opções de voz-por-IP não param de aparecer, gratuitas ou não: JSkype, VBuzzer, Monster Communicator e o já manjado SIPphone, que funciona em parceria com o Gizmo Project. Muitas outras ainda surgirão, pelo menos até que as teles decidam em peso acabar com a brincadeira. Algumas delas já estão bem adiantadas nos preparativos e não vai demorar muito para trancarem qualquer tráfego VoIP. Ou pelo menos tentarem.
Essa briga tem tudo para ficar muito boa e lembra um pouco o que aconteceu quando o formato MP3 para músicas caiu no gosto popular. Fizeram (e estão fazendo) de tudo para coibir o tráfico de canções que é feito usando softwares P2P. Mas é só abrirem processo contra um distribuidor e fecharem-no que logo aparecem dez outros das sombras e a festa continua. Se é para burlar esquemas de proteção, a rapaziada sempre encontra uma saída inteligente.
Na semana passada, por exemplo, um internauta alemão se deu ao trabalho de selecionar as mil canções estilo flashback mais famosas da História, gravou-as todas em MP3, renomeou todos os arquivos para JPG e divulgou os links na rede para qualquer um que quisesse baixar o material. Se algum provedor barrava download de MP3 sem olhar as entranhas do arquivo, então este alemão furou o esquema, e com uma idéia bem simples.
No caso do VoIP, agora que a coisa também virou xodó unânime e planetário, podem vir com as barreiras que quiserem pois, mais cedo ou mais tarde, aparecerá alguém com uma sacada genial para superar os novos obstáculos.
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Os links de hoje estão em
O Globo
Varejo online dos EUA cresceu 30% no Natal
‘WASHINGTON. O varejo tradicional dos Estados Unidos teve uma temporada de Natal de pouco crescimento, mas as vendas por internet no período cresceram 30% em relação ao ano anterior. Segundo informe divulgado ontem pelo banco de investimento Goldman Sachs, pela Nielsen Net Ratings e pela Harris Interactive, as vendas natalinas do setor no país chegaram a US$ 30 bilhões.
O varejo por internet respondeu, no ano passado, por 27% do total das vendas nas festas de fim de ano nos EUA. No ano anterior, essa fatia era de 16%. ‘O comércio eletrônico continua ganhando espaço entre os consumidores na temporada natalina, por sua conveniência, suas opções de produtos e seus preços mais baixos’, informou o relatório. O período de Natal corresponde a cerca de 25% das vendas anuais do varejo nos Estados Unidos. A Wal-Mart, maior varejista tradicional do país, teve um aumento de apenas 2,2% nas vendas na temporada de Natal de 2005.’
LÍNGUA PORTUGUESA
O mundo sem gerúndio
‘Em algum lugar do passado, era estudante na faculdade de jornalismo. O professor de Técnicas de Redação, Nilson Lage, ensinava as normas para se chegar a um leve texto de reportagem. Orientava sobre a importância de parágrafos curtos, de se cortar prolongamentos na narrativa dos fatos, e aí citou:
– É aconselhável evitar o gerúndio.
Fiz da sugestão uma obrigação. Passei a exercitar os cortes até não mais usar o tal gerúndio, ou seja, a forma invariável da flexão verbal, resultante da mudança do ‘r’ final do infinitivo em ‘ndo’: cantando, sofrendo, sentindo, pondo, e que corresponde a um adjunto adverbial; às vezes aparece regido da preposição ‘em’ (‘Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa’, publicado pelo GLOBO).
Da faculdade em diante, este hábito virou um curioso vício. É impossível mensurar o volume de textos que redigi como jornalista, professor universitário e, atualmente, como consultor empresarial. Todas as linhas, inclusive as particulares, sem gerúndio. No banheiro de casa, de picardia, tem uma placa: ‘Sorria!!! Aqui também você é filmado’ – e não, ‘Sorria!!! Você está sendo filmado’, conforme a frase-padrão sobre a presença de câmeras que consideram todos bobos e suspeitos.
Este vício teria a simpatia do escritor Graciliano Ramos, que jogava tinta no gerúndio sem pena: ‘Ele torna o texto impreciso e pastoso.’ Vira hoje referência para os adversários do hábito de se exceder nesta forma verbal aqueles que colocaram em circulação na internet o ‘Manifesto contra o gerundismo’. Ouvir das atendentes de ‘0800’ frases como ‘uma vez comprando o senhor vai estar recebendo o produto…’, causa arrepios em quem ainda preza e briga contra o vale-tudo na língua portuguesa.
Não há dúvida: quanto menos gerúndio se utiliza maior clareza e objetividade se consegue no conteúdo do texto. Sorrateiro que só ele, o gerúndio traz a tendência para a ampliação da narrativa e, por conseqüência, embaraço das palavras e idéias. Se a pessoa procura evitá-lo, melhor será a precisão, a compatibilidade entre o texto e o fato. Destacados escritores e jornalistas são fortes aliados no combate ao gerúndio para que possam levar aos leitores os acontecimentos, as histórias e opiniões de forma nítida, sem prolongar, sem espichar em demasia os parágrafos.
Importante: nesta guerra antigerundismo é necessário dar significativo desconto para o meio religioso. Transmitir esperança, falar da ação pelo próximo, fazer devoção exigem a presença do gerúndio: ‘Indo por este caminho, você vai chegar lá!’; ‘Estaremos fazendo vigília pelos menos afortunados’; ‘Rezando encontraremos Deus’.
As pregações religiosas necessitam passar o sentimento de continuidade, de salvação em andamento, de um amanhã próspero e, na insistência-persistência dentro deste ambiente, são inevitáveis os sermões e as mensagens benzidas do início ao fim com verbos no gerúndio.
Como não poderia deixar de ser, escrevi um livro (‘Gestão & Marketing: agressiva solução para levar a sua empresa ao lucro’, editora J. Di Giorgio) sem gerúndio. Confira.
JOSÉ RENATO DE MIRANDA é consultor empresarial. E-mail: rdemiranda@uol.com.br.’
Levy Pinto de Castro Filho
Revogaram o idioma?
‘Convocados para as nove, nós nos apresentamos às oito da manhã num confortável ‘resort’ situado numa bela cidade serrana do Rio de Janeiro. Recebidos com um farto ‘brunch’, estávamos todos ansiosos, pois a programação do evento anunciava que o primeiro ‘speech’ ficaria a cargo do diretor-presidente de uma consagrada instituição brasileira incumbida regimentalmente do desenvolvimento educacional.
Logo no início da fala, o palestrante demonstrou ter ‘expertise’ sobre o assunto e, após sua primeira intervenção, fomos convidados para um saboroso ‘coffee-break’.
Na parte da tarde, foi feito um ‘feedback’ sobre os principais temas matinais e passamos a um estudo de ‘cases’ envolvendo ‘surveys’, ‘benchmarks’ e muita ‘accountability’.
No dia seguinte, divididos em grupos de estudos, participamos de um ‘brainstorm’ envolvendo hipotéticas situações recheadas de ‘take holders’, ‘networks’ etc. etc. etc.
Como o encontro era, exclusivamente, com servidores da administração pública e, definitivamente, não havia nenhum interesse ou participação, ainda que indireta, de alguma multinacional, em determinado momento, já exausto, lembrei-me de que eu era advogado (ou seria ‘attorney’?) e me ocorreu que o artigo treze da Constituição Federal estabelecia que ‘a língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil’. Teria eu negligenciado por não perceber que o mencionado dispositivo legal já houvera sido revogado?
Ao fim do evento, um pouco mais ‘little fat’, tive a infeliz certeza de que os anos no funcionalismo público haviam me distanciado das aulas de inglês. Eu me vi obrigado, então, a recorrer aos ensinamentos de um bom e técnico dicionário de línguas, para derrubar a ‘chinese wall’ em que me encontrava e, assim, preparar este ‘paper’ que será levado às mãos da minha chefia imediata, a fim de que a mesma possa ter a exata noção do desenrolar daquele ‘business meeting’. Caso contrário, meu nome corre sério risco de aparecer nas páginas do próximo ‘Official Daily’.
‘The end.’
LEVY PINTO DE CASTRO FILHO é advogado.’
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O Estado de S. Paulo
Segunda-feira, 2 de janeiro de 2006
LULA NO FANTÁSTICO
Lula diz que PT ‘vai sangrar muito’ e cobra desculpas de acusadores
‘Após um ano conturbado pelas denúncias de corrupção que atingiram em cheio o seu governo e o seu partido, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu a ‘instituição’ PT que, segundo ele, não pode ser condenada pelos erros de alguns de seus integrantes, mas admitiu que o partido ‘vai sangrar muito’ para recuperar a credibilidade junto ao eleitorado.
Em entrevista ao programa Fantástico, da Globo, o presidente voltou a afirmar que não sabia do esquema de caixa 2 atribuído a assessores próximos. ‘A única coisa que eu peço a Deus é que, quando terminar tudo isso, aqueles que me acusaram me peçam desculpas.’
Em pouco mais de 35 minutos da entrevista, concedida na última quinta ao apresentador Pedro Bial, o presidente reafirmou que ainda não decidiu se disputará a reeleição: ‘Eu não tenho pressa. Quem tem pressa são meus adversários’. A seguir, os principais trechos.
PT
‘O PT é um partido muito grande. Muito grande. O PT é um partido de quase um milhão de filiados. Um partido espalhado. Se três, quatro, meia dúzia, dez, quinze ou vinte pessoas de uma organização política cometem erros, não significa que o partido todo está cometendo o mesmo erro. O partido tomou as decisões, o partido tem uma nova direção e o partido sabe que vai ter que fazer um trabalho imenso para recuperar o prestígio que ao longo dos anos conquistou junto à sociedade brasileira. Portanto, o partido tem consciência da gravidade do problema. Tem consciência da encalacrada em que se meteu. E tem consciência que somente a verdade é que vai poder dar ao partido outra vez a credibilidade que ele conquistou a duras penas nesse País. (…) Primeiro, o PT cometeu um erro. Um erro que é de uma gravidade incomensurável. Todo mundo sabe que o PT cometeu um erro que será de difícil reparação pelo próprio PT. O PT vai sangrar muito para poder se colocar diante da sociedade outra vez com uma credibilidade que ele conquistou em 20 anos.’
CRISE POLÍTICA
‘Se há indícios, tem que ter uma investigação séria e que eu quero que ela seja feita para o Zé Dirceu como eu quero que ela seja para mim, como eu quero que ela seja feita para você. A investigação tem que ser feita com a maior seriedade. (…) Com relação à minha pessoa, a única coisa que eu peço a Deus é que, quando terminar tudo isso, aqueles que me acusaram peçam desculpas. Só peço isso. Não quero, não quero nada mais do que isso. Peçam desculpas. Porque também a leviandade tal como ela é feita muitas vezes, ela tem um preço. E eu acho que é precipitado, errado fazer qualquer julgamento precipitado da pessoa.’
SABIA OU NÃO SABIA?
‘Só tem três hipóteses de você saber das coisas. Você está comigo aqui no terceiro andar e tem gente trabalhando no quarto andar, no segundo andar, nos ministérios. Nem eu nem você sabemos o que está acontecendo. Então, como é que você sabe? Quando você participa da reunião ou quando alguém que participou te conta ou quando sai uma denúncia. (…) O que é importante não é se você sabia ou não, porque se eu tivesse condições de saber não teria acontecido.’
REELEIÇÃO
‘A minha preocupação nesse instante é que eu tenho um ano para governar este país. Eu tenho muita coisa para fazer no Brasil esse ano e eu não estou nem um pouco preocupado com problema eleitoral. (…)Eu não tenho pressa. Quem tem pressa são os meus adversários. Eu não tenho pressa.’’
GRAMPOS NOS EUA
Bush defende com ênfase espionagem interna
‘Durante uma visita a soldados americanos feridos em combate, o presidente dos EUA, George W. Bush, defendeu ontem energicamente o programa da Casa Branca de espionagem dentro do país, criticado por estar sendo feito sem autorização judicial.
Bush foi até o Centro Médico Brooke, do Exército, em Fort Sam Houston, no Estado do Texas, onde se reuniu com soldados feridos e seus parentes. Em uma conversa com os jornalistas, ele rebateu as críticas que recebeu da imprensa, oposição e mesmo de membros de seu próprio partido, o Republicano, pelo fato de ter autorizado a Agência de Segurança Nacional (NSA, pela sigla em inglês) a vigiar as ligações telefônicas e e-mails internacionais de pessoas nos EUA com supostos vínculos terroristas.
Vários políticos democratas e republicanos consideram que Bush extrapolou seus poderes constitucionais e foi além da legislação especial aprovada para combater o terrorismo, após os atentados do 11 de setembro. O programa foi adotado depois dos ataques de 11 de Setembro de 2001 contra o World Trade Center, em Nova York, e o Pentágono, em Washington.
‘Parece-me lógico que, se sabemos que há um número de telefone vinculado à Al-Qaeda (a rede terrorista de Osama bin Laden) ou que há uma pessoa vinculada à Al-Qaeda, e estão fazendo ligações, faz sentido que investiguemos do que se trata’, argumentou Bush. ‘Eles nos atacaram antes e voltarão a nos atacar.’
Bush reiterou sua opinião de que o vazamento para a imprensa da existência de seu programa de espionagem clandestino no país causou um grande dano à segurança nacional. ‘Este é um programa limitado que busca impedir ataques contra os EUA e, repito, é limitado’,
O jornal The New York Times, que no dia 16 revelou a existência do programa de escuta sem autorização judicial, sustentou na semana passada que a espionagem afetou milhares de pessoas.
Ontem o New York Times publicou que James Corney, o principal assessor do ex-secretário de Justiça John Ashcroft, estava preocupado com a legalidade do programa da NSA e se recusou a prorrogá-lo em 2004.
‘Se Corney, um dos mais importantes perseguidores do terrorismo neste país, considerava que o programa violava as leis, isso nos leva a perguntar como o presidente e o vice-presidente mudaram essa política’, comentou o senador democrata Charles Schumer, membro do Comitê Judicial do Senado. Schumer afirmou à imprensa que pedirá ao comitê a convocação de Corney, Ashcroft, do atual secretário da Justiça, Alberto Gonzales, e do chefe de Pessoal da Casa Branca, Andrew Card. EFE E AP’
CASOY DEMITIDO
Casal ocupará vaga de Boris
‘Diretor de jornalismo da Record, Douglas Tavolaro tem dois meses para reformar o Jornal da Record, agora sem Boris Casoy. Nesse período, a jornalista Heleine Heringer está escalada para comandar a bancada, interinamente.
A idéia para substituir Casoy é nomear um casal de apresentadores – qualquer semelhança com o conceito do Jornal Nacional, cujo cenário já inspira o Jornal da Record, não será mera coincidência. Faz algum tempo que a Record tentava convencer Casoy a dividir a bancada com uma mulher, em vão.
Não que ele se recusasse a repartir os holofotes com alguém. O caso é que Casoy fez fama justamente nadando na contramão dessa coisa de casalzinho em bancada. Seria contraproducente, a essa altura da vida, pisar na identidade que lhe garante ser quem é para aderir ao modelo alheio.
Mas a Record já não quer um diferencial, quer exatamente mais uma cópia da receita avalizada pelo outro canal – a Globo, sempre a Globo. Na sexta-feira, a direção da Record manifestou a Casoy a decisão de anexar o Jornal da Record ao núcleo de jornalismo da emissora.
O noticiário sempre funcionou fora dessa alçada, com diretor (Dácio Nitrini) e equipe exclusivos. Como a independência interna do seu jornal era coisa rezada em contrato, Casoy achou melhor pedir o boné.
A direção da casa já previa que ele não aceitaria a unificação. Trocando em miúdos, foi uma saída provocada. Não sem pagamento de multa, isso não. O contrato de Casoy venceria em novembro de 2006 e é em cima dessa data – e do gordo salário do homem – que será calculada a dívida de Edir Macedo.
Na Record, fala-se que o novo apresentador não será Paulo Henrique Amorim nem Carlos Nascimento, nome que tem circulado como alvo do canal para este ano.’
FRAUDE NA SCIENCE
Como a ‘Science’ publicou uma fraude?
‘Pesquisadores das áreas de biomedicina e bioética chegaram ao fim de 2005 em perplexidade pela falsificação das pesquisas com células-tronco do sul-coreano Hwang Woo-Suk. Confirmada a fraude, uma das grandes perguntas que precisa ser respondida é como uma mentira tão grande conseguiu ser publicada em uma das mais respeitadas revistas científicas do mundo, a Science. ‘A revista falhou, sem dúvida’, disse ao Estado o presidente da Sociedade Brasileira de Bioética e professor da Universidade de Brasília, Volnei Garrafa. ‘Ou o comitê editorial foi enganado ou se deixou ludibriar.’
A Science é publicada semanalmente pela Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS) e compete com a britânica Nature pelo status de principal periódico científico do mundo. Todos os estudos submetidos para publicação passam por um processo chamado peer review, ou revisão por pares, no qual são avaliados por cientistas independentes da pesquisa. O estudo de Hwang, no qual ele dizia ter produzido 11 linhagens de células-tronco embrionárias clonadas de pacientes, não foi exceção.
Por se tratar de uma pesquisa de grande impacto, entretanto, os resultados foram publicados originalmente online, em versão ‘express’, em maio, três meses depois de o trabalho ter sido submetido e apenas uma semana depois de concluída a revisão. A versão final, em papel, só foi publicada em junho.
Na semana passada, após muitas denúncias, a Universidade Nacional de Seul descobriu que todos os dados do trabalho eram baseados em apenas duas linhagens de células-tronco, e não 11, e que essas duas não haviam sido produzidas por clonagem, mas por simples fertilização in vitro. Ou seja, a pesquisa foi completamente forjada.
Em entrevista coletiva no dia 22, o editor-chefe da Science, Donald Kennedy, defendeu o processo de revisão da revista. ‘É muito difícil para o processo de peer review detectar erros que não são evidentes ou interpretações de resultados intencionalmente errôneas’, disse ele, quando a extensão da fraude ainda não era totalmente conhecida. ‘Não dá para pegar tudo.’
‘Os revisores examinam os dados supondo que a pesquisa foi realizada de maneira correta. Não se pode, a priori, desconfiar que algo tenha sido forjado’, avaliou o geneticista e especialista em bioética Francisco Salzano, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
De maneira geral, pesquisadores ouvidos pelo Estado acreditam que o escândalo sul-coreano comprova a confiabilidade do processo científico, já que a fraude foi detectada. Se não pelo peer review, dizem, seria pela validação dos dados em outros laboratórios.’
***
Mais avanços com células-tronco
‘O mesmo pesquisador que em 1998 isolou a primeira linhagem de células-tronco embrionárias humanas – dando início a um dos campos de pesquisa mais promissores e polêmicos da biomedicina moderna – conseguiu mais um avanço importante na área. James Thomson, da Universidade de Wisconsin-Madison, nos EUA, relata em um estudo publicado hoje a derivação das duas primeiras linhagens dessas células em meios de cultura livres de produtos animais. Um detalhe técnico aparentemente insignificante, mas que aumenta significativamente a possibilidade de aplicação terapêutica das células-tronco embrionárias no futuro.
Hoje, como regra, as células-tronco embrionárias (CTEs) humanas são cultivadas em laboratório sobre uma camada de células embrionárias de camundongos, chamadas de feeder cells, ou células de nutrição. Elas fornecem um substrato nutritivo para o desenvolvimento das CTEs e ajudam a manter as células em seu estágio embrionário indiferenciado, mas podem também ser uma fonte de contaminação.
Em janeiro de 2005, um estudo publicado na Nature Medicine revelou que todas as linhagens de CTEs existentes estavam contaminadas por uma molécula produzida pelas células de camundongo, chamada Neu5Gc, que poderia detonar uma resposta imunológica perigosa no organismo humano em caso de transplante.
Ficou evidente que, se a intenção a longo prazo é utilizar essas células em pacientes para o tratamento de doenças, os cientistas precisavam descobrir uma maneira de cultivá-las sem o uso de produtos animais. Foi o que fizeram agora os pesquisadores do WiCell, um instituto de pesquisa mantido com recursos privados de ex-alunos da universidade. ‘Esta é a primeira vez que conseguimos derivar novas linhagens celulares em condições completamente definidas de cultura totalmente livre de produtos animais’, afirma Thomson, diretor científico do WiCell. ‘Esse trabalho nos ajuda a superar uma das maiores barreiras para o uso terapêutico dessas células’, diz a pesquisadora Tenneille Ludwig, primeira autora do estudo publicado na revista Nature Biotechnology.
Tanto as feeder cells de camundongo quanto o soro bovino – outro ingrediente animal da receita clássica de cultura – foram substituídos por produtos de origem humana.
DIFUSÃO
O avanço obtido em Wisconsin é boa notícia para pesquisadores de todos os países – inclusive do Brasil, que pretendem começar a trabalhar com as células-tronco embrionárias humanas neste ano. O WiCell é um dos maiores centros de referência para o estudo e a produção de CTEs. Além de fazer pesquisa, o instituto dá cursos sobre cultivo de células e vende amostras de linhagens para laboratórios no mundo todo.
‘A descrição de um coquetel definido de nutrientes, além de livrar as linhagens de componentes animais, será muito útil no estudo de fatores capazes de interferir com a estabilidade cromossômica dessas células’, disse ao Estado o brasileiro Stevens Rehen, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Após alguns meses de cultivo, as linhagens do WiCell passaram a apresentar números anormais de cromossomos (aneuploidia) – outro grande desafio no cultivo das CTEs. ‘Uma possibilidade é que linhagens de células-tronco só possam ser utilizadas por alguns meses após sua derivação’, avalia Rehen, que estuda o problema. ‘Em todo caso, os resultados enfatizam a necessidade de mais pesquisas sobre o cultivo e a aplicação de células-tronco.’
As CTEs são extraídas de embriões de apenas cinco ou seis dias. Elas guardam a capacidade de se transformar em qualquer tipo de célula do organismo, o que leva muitos a apostar nelas como ferramenta terapêutica para o tratamento de vários tipos de doenças. As duas linhagens do WiCell foram criadas a partir de cinco embriões doados para a pesquisa, segundo o instituto.’
DIRETÓRIO ACADÊMICO
Jornalista, iluminador da história
‘O jornalista Carl Bernstein – famoso no mundo inteiro depois da série de reportagens, escrita com Bob Woodward, que revelou o escândalo Watergate e derrubou o presidente Richard Nixon, em 1974 – não forma com o time dos corporativistas. Sua crítica, aberta e direta, aos eventuais desvios das reportagens representa excelente contribuição ao jornalismo de qualidade. ‘O importante é saber escutar’, diz Bernstein. ‘As respostas são sempre mais importantes que as perguntas que você faz. A grande surpresa no jornalismo é descobrir que quase nunca uma história corresponde àquilo que imaginávamos.’
O comentário é uma estocada nas atitudes de engajamento, arrogância e prejulgamento que corroem e desfiguram a reportagem. ‘Os jornalistas, hoje, trabalham com um monte de preconceitos’, sublinha. ‘Fazem quatro ou cinco perguntas para provocar alguma polemicazinha de nada, mas evitam iluminar a cena, fazer compreender.’ Com a autoridade de quem sabe das coisas, Bernstein dá uma lição de maturidade profissional.
O bom jornalista ilumina a cena, o repórter manipulador constrói a história. A distorção, no entanto, escapa à perspicácia do leitor médio. Daí a gravidade do dolo. Na verdade, a batalha da isenção enfrenta a sabotagem da manipulação deliberada, da preguiça profissional e da incompetência arrogante. Todos os manuais de redação consagram a necessidade de ouvir os dois lados de um mesmo assunto. Mas alguns procedimentos, próprios de ranços ideológicos invencíveis, transformam um princípio irretocável num jogo de faz-de-conta.
A apuração de mentira representa uma das mais graves agressões à ética e à qualidade informativa. Matérias previamente decididas em guetos sectários buscam a cumplicidade da imparcialidade aparente. A decisão de ouvir o outro lado não é honesta, não se apóia na busca da verdade, mas num artifício que transmite um simulacro de isenção, uma ficção de imparcialidade. O assalto à verdade culmina com uma estratégia exemplar: repercussão seletiva. O pluralismo de fachada, hermético e dogmático, convoca pretensos especialistas para declararem o que o repórter quer ouvir. Mata-se a notícia. Cria-se a versão.
Certos setores da imprensa, vez por outra, têm caído nessa tentação antijornalística. Trata-se de uma prática que, certamente, acaba arranhando a credibilidade. O leitor não é tonto. A verdade, cedo ou tarde, acaba se impondo. O brilho da pauta construída com os ingredientes da fraude é fogo de artifício. Não é ético e não vale a pena. Ainda não conseguimos, infelizmente, superar a síndrome dos rótulos. Alguns colegas não perceberam que o mundo mudou. Insistem, teimosamente, em reduzir a vida à pobreza de quatro clichês: direita, esquerda, conservador, progressista. Tais epítetos, estrategicamente pendurados, têm dupla finalidade: exaltar ou afundar, gerar simpatias exemplares ou antipatias gratuitas.
Sucumbe-se, freqüentemente, ao politicamente correto. Certas matérias, algemadas por chavões inconsistentes que há muito deveriam ter sido banidos das redações, mostram o flagrante descompasso entre essas interpretações e a força eloqüente dos números e dos fatos. Resultado: a credibilidade, verdadeiro capital de um veículo, se esvai pelo ralo dos preconceitos.
A reportagem de qualidade é sempre substantiva. O adjetivo é o adorno da desinformação, o farrapo que tenta cobrir a nudez da falta da apuração. É importante que os responsáveis pelas redações tomem consciência desta verdade redonda: a imparcialidade (que não é neutralidade) é o melhor investimento.
A precipitação e a falta de rigor são outros vírus que ameaçam a qualidade. A incompetência foge dos bancos de dados. Na falta de pergunta inteligente, a ditadura das aspas ocupa o lugar da informação. O jornalismo de registro, burocrático e insosso, é o resultado acabado de uma perversa patologia: o despreparo de repórteres e a obsessão de editores com o fechamento. Quando editores não formam os seus repórteres, quando a qualidade é expulsa pela ditadura do deadline, quando as pautas não nascem da vida real, mas de pauteiros anestesiados pelo clima rarefeito de certas redações, é preciso ter a coragem de repensar todos os processos.
Autor do mais famoso livro sobre a história do jornal The New York Times, Gay Talese vê alguns problemas a partir da crise que atingiu um dos jornais mais influentes do mundo. Embora faça uma vibrante defesa do Times, ‘uma instituição que está no negócio há mais de cem anos’, Talese põe o dedo em algumas chagas que, no fundo, não são exclusividade do diário norte-americano. Elas ameaçam, de fato, a credibilidade da própria imprensa. ‘Não fazemos matéria direito porque a reportagem se tornou muito tática, confiando em e-mails, telefones, gravações. Não é cara a cara. Quando eu era repórter, nunca usava o telefone. Queria ver o rosto das pessoas. Não se anda na rua, não se pega o metrô ou um ônibus, um avião, não se vê, cara a cara, a pessoa com quem se está conversando’, conclui Talese.
A autocrítica interna deve ser acompanhada por um firme propósito de transparência e de retificação. Uma imprensa ética sabe reconhecer os seus erros. As palavras podem informar corretamente, denunciar situações injustas, cobrar soluções. Mas podem também esquartejar reputações, destruir patrimônios, desinformar. Confessar um erro de português ou uma troca de legenda é fácil. Mas admitir a prática de prejulgamento, de engajamento ideológico ou de leviandade noticiosa exige pulso e coragem moral. Reconhecer o erro, limpa e abertamente, é o pré-requisito da qualidade e, por isso, um dos alicerces da credibilidade.
A todos, feliz 2006!
Carlos Alberto Di Franco, diretor do Master em Jornalismo, professor de Ética da Comunicação e representante da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra no Brasil, é diretor da Di Franco – Consultoria em Estratégia de Mídia Ltda. E-mail: difranco@ceu.org.br’
INTERNET
Brasil bate recordes na internet
‘O brasileiro bateu em 2005 todos os recordes da internet mundial. No rastro das vendas dos aparelhos que permitem ouvir músicas (MP3) e imagens (MP4) baixadas da internet, foi a população que mais usou o serviço. Também liderou o número de horas de navegação e o uso de comunicadores, sendo o MSN, o popular Messenger da Microsoft, o mais usado.
Quando o assunto são comunidades, a exemplo do Orkut, o País ocupa a segunda colocação, atrás apenas do Japão, onde muitos dos usuários também são brasileiros que estudam e trabalham naquele país, os chamados dekasseguis.
Os dados são de pesquisa Nielsen/IbopeNet Ratings, que monitora o que ocorre em 11 países. Em novembro, por exemplo, 12,52 milhões de brasileiros navegaram na internet utilizando computadores em seus domicílios, um aumento de 17,5% em relação ao total verificado em janeiro. O número de horas diárias navegadas atingiu 17 horas e 53 minutos, fazendo do País o líder no uso.
Mais foi a música o principal destaque do ano. Em novembro, 5,6 milhões de visitantes únicos entraram em sites em busca de música para cópia (download), 65,5% mais que em novembro do ano passado. ‘O aumento da oferta de downloads legalizados, a maior disponibilidade da banda larga e a popularização de tocadores de MP3 e outros padrões digitais ajudam a impulsionar esse uso’, diz Marcelo Coutinho, diretor-executivo do Ibope Inteligência.
Segundo Coutinho, o iTunes, site da Apple criado para dar suporte ao iPod, é emblemático da tendência verificada no País e tem tudo para ter registrado forte impacto em dezembro, com até crianças pedindo aparelhos de presente.
‘Embora os sites mais visitados sejam os canais de música dos grandes portais, a parte exclusiva do iTunes registrou 340 mil usuários únicos em novembro no Brasil, ou seja, crescimento de 261% ante novembro de 2004’, observa ele.
Para Alexandre Magalhães, coordenador de análises do Ibope/NetRatings, a internet, ao lado dos celulares, necessita de inovações para conquistar novos usuários. Ele reconhece que, em números, o País tem ainda poucos usuários, mas esses usam todas as ferramentas disponíveis e são os que tornam o Brasil um centro de referência no uso da mídia.
‘É um retrato da nossa realidade, com forte concentração de renda.’ Só que hoje, com a disponibilidade de computadores em escolas, reforçados por programas de inclusão digital, isso está mudando.
Os próprios celulares, extremamente disseminados por todas as faixas etárias e de renda, com 82,3 milhões de aparelhos em operação até novembro, de acordo com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), também têm contribuído para popularizar a internet, especialmente depois das câmeras digitais acopladas aos aparelhos. A febre dos ring tones, aqueles toques musicais de aparelhos de telefonia móvel, também contribuiu para o grande número de downloads.
Magalhães vê hoje duas tendências principais no terreno da internet. A primeira é perda da importância da língua, com o uso de carinhas e palavras compactadas ou imagens, a exemplo de Blogs, os Fotologs, Comunidades e Instant Messengers. O que permite aos usuários, mesmo sem conhecimento de línguas, manter comunicação com várias pessoas no mundo. E o brasileiro é que mais usa ferramentas das conversas em tempo real e tomou de assalto um projeto de comunidade de internautas, como o Orkut.
A segunda tendência são os jogos, com alguns usuários vivendo como seus personagens, a exemplo dos RPGs (Role-Playing Games). E qualquer novidade, diz Magalhães, fascina o brasileiro, que entra com força na rede para participar e garantir ao País a liderança no uso dos novos serviços. Na sua avaliação, quanto mais informais forem as ferramentas apresentadas e quanto mais oferecerem a possibilidade de convivência virtual, mais sucesso terão as iniciativas.
O usuário da internet quer participar, ser protagonista e não apenas assistente ou coadjuvante, por isso o sucesso dos blogs e fotologs.’
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O corpo fala nas campanhas, para gordinhas e magrelas
‘Os americanos adoram listas, do melhor e do pior, dos mais ricos aos mais pobres, dos mais belos aos mais feios, dos bem vestidos e dos mal trajados. É uma tradição da imprensa e assunto obrigatório nas rodas de conversa, no trabalho e no lazer. O respeitado jornal econômico The Wall Street Journal divulgou na virada de ano a sua lista com as melhores e piores campanhas publicitárias de 2005. Entre as melhores está a campanha mundial ‘Real Beauty’ (beleza real), da Ogilvy para o Dove, da Unilever, e entre os piores a da cadeia de lanchonetes Carl’s Jr., estrelado pela extravagante Paris Hilton, que tem cara e corpo de Barbie.
Duas campanhas, aliás, que caem como luvas para ilustrar um extenso estudo da professora Tânia Márcia César Hoff, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) intitulado Corpo e Imaginário na Publicidade Brasileira, em que mostra a influência do corpo no imaginário popular. Nos anos 20 e 30, por exemplo, ser gordinha, ter face e bochechas rosadas eram sinônimo de saúde, o inverso da palidez e da magreza de ‘barbies’ como Paris Hilton.
‘Na década de 20, o corpo era representado na relação saúde-doença, entendendo-se saúde como força física. O corpo saudável era robusto, corado e gordo. Conforme informações contidas no texto dos anúncios, o Elixir de Inhame ‘depura, fortalece, engorda’ e o Nutrion ‘é o melhor remédio contra a fraqueza, a magreza, a debilidade…’, diz Tânia no estudo.
No rastro desses produtos, o sabão Aristolino se vendia como o melhor contra cravos e espinhas, Rugol prometia combater as rugas com eficácia e o Saúde da Mulher, garantir uma vida saudável. O Leite de Magnésia, em frascos azuis, um ânimo na forma de cálcio, e o fortificante Biotônico Fontoura – que por sugestão de Monteiro Lobato inovou no marketing com o Almanaque do Jeca Tatu – uma tentativa de levar vida saudável, gordinha e robusta aos rincões do País.
Segundo Tânia, a intenção de modificar o corpo não mudou dos anos 20 para agora, onde a oferta de produtos é bem maior e cultiva-se o ideal de beleza, com vários gramas a menos. Se modelos como Gisele Bündchen vivessem nos anos 20, teríamos que correr aos medicamentos para ganhar vários quilos a mais. Cintura de Barbie, então, nem pensar.
Já o sabonete Dove procurou, ao contrário, levar para as campanhas a mulher real. O presidente da Ogilvy Brasil, Sergio Amado, é um entusiasta dessa estratégia que soube conversar com o consumidor, usando a sua expressão, sejam essas mulheres magras, gordas, brancas, ruivas ou negras.
Tânia diz, porém, que em todas as campanhas publicitárias em que o corpo fala está implícito o desejo de modificá-lo, de torná-lo mais atraente. Nem Dove escapa dessa intenção. A diferença é que mostra à consumidora que ela continuará a ser a mesma, embora mais bem cuidada, com pele mais macia e hidratada. Seda, também da Unilever, deixou de lado, por sua vez, os alisantes e vendeu produtos para cabelos de homens e mulheres negros, sem maquiagem, em campanha criada pela JWT.
Em comum, essas campanhas responderam ao desejo da população em se ver nas telas. O mesmo que motivou a mídia a buscar histórias reais, num caminho que rendeu glória e também tremendas dores de cabeça a jornais como The New York Times, onde repórteres como Jayson Blair forjaram personagens e histórias. Na outra ponta, ajudou a dar musculatura, em vários países, a programas como o Big Brother.
E se a realidade do corpo e da vida tomaram de assalto a comunicação, a Matell correu para dar conteúdo à Barbie em filmes e novos amigos, ainda que bonecos. Paris Hilton ficou sozinha e levou a pior nas páginas do The Wall Street Journal.’
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