Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

José Paulo Lanyi e Fábio José de Mello

‘O pseudojornalista Ucho Haddad teve uma semana nervosa. Haddad é aquele que fugiu de Miami para o Brasil quando percebeu que a casa havia caído para os seus comparsas falsificadores do Dossiê Cayman. Evaldo Haddad Fenerich virou Ucho Haddad, o faz-tudo do submundo virou ‘jornalista’ (conheça essa personagem por meio dos links no pé deste artigo).

Não bastassem os seus, digamos, encontros periódicos com a Justiça, Ucho agora caiu em desgraça com os blogueiros, ao publicar esta ‘informação’, em seu www.ucho.info:

‘Festa de Arromba

Quem pensa que a lama fétida que emerge das entranhas do poder acabou, engana-se. Tido como um dos mais badalados DJ’s do universo, Tiësto (foto), que cobra cachês de US$ 30 mil para cima, tem em sua agenda do corrente ano uma apresentação marcada para a Granja do Torto, mais precisamente em 11 de outubro.

Como o presidente Lula é adepto de música sertaneja e pagode, alguém precisa explicar os verdadeiros motivos para a contratação de Tiësto, o DJ responsável pela sonorização da abertura dos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004.

Considerando que a viagem de Tiësto a Brasília não será por simpatia ao presidente Lula ou algo parecido, tudo indica que se trata de mais uma farra dos primeiros-filhos, que o trabalhador brasileiro terá de financiar. Clique, depois acesse a página ‘schedule’ e confira a mais nova barbárie consumista do presidente Lula, o defensor do povo e dos trabalhadores’.

O blog Surra de Pao Mole deu-lhe, então, uma piaba:

‘Caro jornalista Ucho Haddad,

Nunca havia lido sua coluna e nem ao menos sabia da existência desse seu site. Porém ao receber por e-mail uma cópia de uma absurda matéria entitulada ‘Festa de Arromba’, senti-me na obrigação de investigar a fonte de tamanha ignorância, chegando assim ao senhor.

A acusação contida na matéria é o melhor exemplo do lado mais obscuro do jornalismo leviano, que dispensa investigações e transborda ódio e parcialidade.

‘Granja do Torto’, além de ser o nome da residência oficial da Presidência da República, é também o nome de um local muito utilizado para festas, exposições e rodeios: o famoso Parque de Exposições da Granja do Torto. (cidades.terra.com.br).

Um google. Uma simples consulta ao google com as palavras ‘festas’ e ‘granja do torto’ e sua informação cairia por terra muito antes de pensar se transformar em tão frágil ‘denúncia’. Pouco. Muito pouco mesmo pra quem se auto-intitula ‘jornalista investigativo’.

Duvido que um dia voltarei a seu tão informativo site pra saber se o senhor será profissional a ponto de assumir o erro e se retratar publicamente. Mas penso que isso seria o mínimo que se poderia esperar de quem carrega tantas pedras nas mãos e um .info ao lado do nome. Além de, claro, colaborar para que idéias como a criação do CNJ – Conselho Nacional de Jornalismo não possam ser justificadas.

Saudações,

Psycho’

Outro blog, o Kibe Loco!, quis saber mais sobre Ucho Haddad. E ficou sabendo…

‘CHIFRE EM CABEÇA DE CAVALO?

Se não fosse falsa, a denúncia acima (desmascarada pelo meu amigo Psycho) seria um prato cheio para qualquer humorista. O jornalista Ucho Haddad, autor da nota, deu uma demonstração de como a imprensa pode ser levada pela tal ‘onda de denuncismo’ tão repelida pelo PT.

A agenda do DJ Tiësto (imagem acima) confirma o show no dia 11 de outubro. No entanto, ‘Granja do Torto’, além de ser o nome da residência oficial de Lula, é também o nome de um famoso parque de exposições muito utilizado para festas e shows em Brasília.

Apesar do surgimento quase diário de denúncias e escândalos, é muito importante verificar as fontes e a autenticidade de uma notícia antes de publicá-la. No caso acima, uma simples consulta ao Google evitaria o mico para quem se intitula ‘jornalista investigativo’.

PS – Por falar em jornalismo investigativo, de acordo com o Sindicado (sic) dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo e o Observatório da Imprensa, o jornalista Ucho Haddad (também conhecido como o publicitário (?!?) Evaldo Haddad Fenerich) tem várias passagens pela polícia, uma condenação pela justiça paulista e uma prisão. Ele já foi acusado de apropriação indébita, estelionato, crimes falimentares, falsificação de documento público, falsificação de documento particular, uso de documentos falsos, receptação e ameaça.

Descobri no Google.

PS 2 – Não sei como um político nato desses foi virar jornalista’.

Kibe, nós também não…

Psycho, o incansável, voltou a apontar o seu mouse para a cabeça do elemento. Veja que coincidência ele descobriu:

‘Mais do Ucho

I. Segundo investigações do Kibe, Ucho Haddad (ou Evaldo Haddad Fenerich) tem várias passagens pela polícia, uma condenação pela justiça paulista e uma prisão. Ele já foi acusado de apropriação indébita, estelionato, crimes falimentares, falsificação de documento público, falsificação de documento particular, uso de documentos falsos, receptação e ameaça.

Coisa fina.

II. Agora prestem atenção nos textos abaixo:

[Da lavra de Ucho Haddad]

A casa caiu

Preocupado com a situação cada vez mais complicada do presidente Lula, uma das mais peludas raposas da república petista foi se aconselhar com um dos integrantes do governo do PT e ouviu o que não esperava. Seu interlocutor disse que o melhor seria convencer o presidente Lula da necessidade de inventar uma isquemia cerebral e viajar para Cleveland, nos Estados Unidos, para um suposto tratamento de aproximadamente quarenta dias. Tempos depois, já de volta ao Brasil, Lula se refugiaria em São Bernardo do Campo para uma convalescença, por lá permanecendo enquanto os ânimos da política nacional estiverem aquecidos. Mais adiante, anunciaria sua retirada do cenário político sob a desculpa de cuidar da saúde e da própria vida.

www.ucho.info

[Da reportagem do Comunique-se, reproduzida pelo Observatório da Imprensa:]

Evaldo Haddad Fenerich diz que viajava aos Estados Unidos para se tratar de um câncer linfático. Enviou à Justiça de São Paulo um comunicado (31/05/2000) do Memorial Sloan-Kettering International Center, de Nova York, que o informava de uma consulta com o Dr. Straus em 03/06/2000. O documento versava sobre todos os procedimentos de praxe: entre outras recomendações, orientava o paciente acerca do registro no hospital, do custo da primeira consulta (US$ 1 mil) e de uma eventual internação (US$ 100 mil de depósito). Um dos advogados de Fenerich buscava relaxar-lhe a prisão preventiva, com a alegação de que ele deveria prosseguir com o tratamento iniciado nos Estados Unidos em janeiro de 1998. Fenerich viajaria ‘diuturnamente’ a esse país por causa da terapia. No entanto, de acordo com declaração do próprio acusado à Justiça Brasileira, o tratamento teria começado em 13.06.2000, nesse mesmo Memorial Sloan-Kettering International Center, em Nova York. Fenerich dizia não poder comparecer às audiências (estelionato e outras fraudes) porque o tratamento se alongaria até o fim daquele ano. No processo, até hoje não constam documentos sobre consultas, cirurgias, exames realizados, nada que pudesse comprovar o tratamento nos Estados Unidos. Em um determinado trecho, a defesa de Fenerich argumentava: ele descobrira a doença em 1997, no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Os comprovantes apresentados à Justiça são atestados médicos e exames realizados no Hospital Ipiranga (SUS), de São Paulo, em agosto de 2001. observatorio.ultimosegundo.ig.com.br

[Comentário do Psycho]

A semelhante estratégia sugerida pelo suposto ‘integrante do governo petista’ e a utilizada pelo próprio jornalista para fugir da Justiça seriam apenas uma coincidência, ou talvez esse ‘jornalista investigativo’ sofreria de uma leve esquizofrenia, com tendências a misturar sua própria realidade com suas fictícias e exclusivas notícias publicadas?’

A hora e a vez do Kibe Loko!. Agora, ele foi atrás de um amigão do Ucho, o Giba Um:

‘CHIFRE EM CABEÇA DE CAVALO? (PARTE 2)

Adivinhem só quem também deu a furada sobre o show do DJ Tiësto na Granja do Torto…

[Nota do Giba Um]

Super-DJ na Granja

Quem consultar o calendário de apresentações internacionais do famoso DJ Tiësto, responsável pela sonorização da abertura dos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004 e que cobra cachês de US$ 30 mil para cima, fora despesas, certamente ira se surpreender com uma apresentação marcada para 11 de outubro, na Granja do Torto, residência do casal presidencial. É uma terça-feira, véspera de feriado (data consagrada a Nossa Senhora Aparecida) e, antes de Brasília, o DJ Tiësto passa por eventos e festivais em Dubai, Moscou, Lyon e daqui, segue para uma apresentação dia 14 de outubro, em Buenos Aires’.

Em seguida, o Kibe chamou, em link, uma matéria do Sindicato dos Jornalistas (‘Jornalismo no Mínimo Esquisito’) sobre o jornalismo amigo, a ‘partilha’ de notas idênticas entre as colunas de Ucho Haddad, Giba Um e Cláudio Humberto… Colunismo com notas ‘socializadas’, uma generosidade sem limites…

O bombardeio dos blogs deu resultado. Ucho Haddad escreveria no campo de comentários do ‘Surra de Pao Mole’:

‘Prezado Psycho,

Agradeço pelo e-mail e pela informação. Admito que desconhecia a existência do tal Parque do Povo, sendo que irei reparar o erro na edição de amanhã.

Quanto aos outros comentários creio que, por ainda vivermos em uma democracia, o pensamento é livre. Ucho’.

Resposta do Psycho:

‘Já que ele acredita que ‘o pensamento é livre’, acho mais que merecido que ele saiba o que pensamos de gente como ele.

Já fiz minha parte, façam as suas’.

Ucho voltaria para corrigir-se:

‘Festa de arromba

A notícia publicada anteriormente neste exato espaço continha uma informação equivocada. O evento do DJ Tiësto, que acontecerá no próximo dia 11 de outubro, em Brasília, será realizado na Granja do Torto – nome da residência oficial atualmente ocupada pela família Lula da Silva – mas trata-se de um Parque de Exposições localizado na capital federal. Na agenda do artista está grafado apenas ‘Granja do Torto’, fato que induziu o editor ao equívoco, principalmente por desconhecer a existência do referido parque. Ficam aqui registradas nossas desculpas aos leitores, bem como os sinceros agradecimentos aos que nos alertaram. E se errar é humano, reconhecer o erro é uma virtude. Clique, depois acesse a página ‘schedule’ e confira a agenda do DJ onde aparece registrado apenas ‘Granja do Torto’. Ucho.’

Giba Um faria o mesmo, em sua coluna:

‘Outra granja

A apresentação do famoso DJ Tiësto, dia 11 de outubro, em Brasília, não será na residência presidencial na Granja do Torto: será num parque da cidade que tem o mesmo nome. Ainda bem: Tiësto jamais faria concessões a duplas sertanejas brasileiras ou a Zeca Pagodinho’.

Nesta quarta-feira (24/08), no Kibe Loko!, a nota trinfante do jornalismo guerrilheiro:

‘AÇÃO E REAÇÃO

Menos de 48 horas depois desse post, o site do ‘jornalicitário’ Ucho Haddad saiu do ar, seu colega Giba Um publicou uma retificação e o DJ Tiësto mudou sua agenda de shows.

É bom ver a Lei de Newton vencendo a Lei de Gérson só para variar’.’



CASO PIMENTA NEVES
Eliakim Araújo

‘A Justiça dos ricos e poderosos’, copyright Direto da Redação (www.diretodaredacao.com), 25/08/05

‘A sociedade está sempre cobrando da imprensa maior atenção aos crimes bárbaros que são notícia durante alguns dias, ou semanas, depois vão caindo no esquecimento até que um dia pouca gente ainda se lembre. Um esquecimento muito interessante para o criminoso e doloroso para a família da vítima.

Há exatos cinco anos, no dia 20 de agosto de 2000, aconteceu um desses crimes que alcançou enorme repercussão, sobretudo pelo fato do assassino ser pessoa influente na comunidade, o jornalista Antonio Pimenta Neves, que ocupava o cargo de Diretor de Redação do jornal O Estado de São Paulo. Ele matou com dois tiros à queima-roupa a ex-namorada e também jornalista do Estadão, Sandra Gomide.

O crime chocou a opinião pública pelas circunstâncias em que ocorreu. Pimenta, com forte ascendência sobre Sandra pela posição de chefia que ocupava na redação do Estadão, fez o que os que se julgam poderosos fazem com os que estão em posição de inferioridade: agrediu-a e a ameaçou de morte se ela não retomasse o relacionamento. Sandra manteve-se firme em sua negativa e o resultado foi seu fuzilamento de maneira torpe e cruel, pega de surpresa, sem chance de defender-se.

O mais incrível nessa história, além da crueldade do crime em si, é que Pimenta até hoje não foi julgado. Logo depois do crime, a justiça de São Paulo determinou sua prisão preventiva, mas seus advogados entraram com pedido de habeas corpus no STF que mandou libertar o jornalista por não ver nele nenhum perigo para a sociedade nem o risco de uma fuga.

Isso é o que se pode chamar de uma decisão legal, mas profundamente injusta. Graças a dispositivos legais que não se preocupam com a vítima e à astúcia de advogados, Pimenta Neves, hoje com 63 anos, vive o dolce far niente da liberdade, enquanto os pais de Sandra amargam até hoje a dor da filha morta de maneira covarde.

Foi muito bom a revista Consultor Jurídico trazer de volta o assunto. Pois assim ficamos sabendo que Pimenta não foi julgado porque seus advogados usam e abusam do direito de interpor recursos, agravos e quejandos, procrastinando uma decisão, numa discussão infindável se ele deve ou não ser levado a juri popular. Com certeza, as manobras de adiamento visam ganhar tempo, para que o assassino seja beneficiado pela idade. Aos 70 anos, a pena, se ele for condenado, sofrerá uma boa redução.

Na outra ponta da tragédia, os pais de Sandra lutam desesperadamente para conseguir uma indenização por danos morais. Mas acabaram enfrentando um processo kafkiano para provar na justiça que não tinham condições de arcar com as custas processuais extremamente caras para propor a ação. Só depois de dois anos de peregrinação conquistaram o direito de seguir com a ação sem o pagamento das custas processuais.

Como se vê, nossa justiça continua cega aos clamores das vítimas e de olho bem aberto quando se trata de proteger poderosos que têm dinheiro para pagar advogados que sabem usar as brechas da lei em benefício de seu cliente. Enquanto isso, a família de Sandra enfrenta uma verdadeira corrida de obstáculos para conseguir uma indenização de 80 mil reais. Será que é só isso que vale a vida da jovem jornalista tão brutalmente assassinada?

PS. Os manuais de jornalismo recomendam que não se use a expressão ‘assassino’ a alguém que ainda não foi julgado e condenado. Entretanto, tendo em vista que Pimenta é réu confesso, julguei por bem dispensar a regra. E mesmo sendo réu confesso, Pimenta aguarda julgamento há cinco anos e vive em liberdade. E viva a nossa justiça.

(*) Ancorou o primeiro canal internacional de notícias em língua portuguesa, a CBS Brasil. Foi âncora do Jornais da Globo, Manchete e SBT e noticiarista da Rádio JB. Tem uma empresa de assessoria em jornalismo e marketing.’



JABÁ MÉDICO
Cláudia Collucci

‘Médicos denunciam favores de laboratórios’, copyright Folha de S. Paulo, 29/08/05

‘‘É promíscua a relação entre médicos e a indústria farmacêutica. Muitos se transformaram em garotos-propaganda de luxo dos laboratórios.’ As declarações são do cardiologista Roberto Luiz d’Ávila, diretor-corregedor do CFM (Conselho Federal de Medicina), que tem a missão de julgar as infrações éticas da categoria.

‘São papagaios-científicos’, emenda o clínico-geral Antonio Carlos Lopes, professor titular da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica, que reúne 40 mil profissionais.

O fenômeno não é exclusivo do país, mas, pela primeira vez, médicos brasileiros renomados vêm a público denunciar o lado negro da relação médico e laboratório, que, muitas vezes, estaria calcada mais em benefícios pessoais do que no bem da população.

Lopes, por exemplo, afirma ter sido convidado inúmeras vezes por laboratórios para fazer apresentações favoráveis a determinados remédios. ‘Nunca aceitei. Mas sei de médicos que recebem R$ 5.000, em média, por apresentação, viagem aérea de primeira classe, hotel cinco estrelas, tudo com direito a acompanhante.’

Não há crime na prática, desde que o médico informe, na apresentação, que há um conflito de interesse, já que sua participação está sendo paga pela instituição interessada, conforme determina o CFM e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

‘Ninguém respeita isso. Já cheguei a interromper pelo menos duas mesas-redondas em eventos científicos em razão de conflito de interesse não revelado por parte de certos médicos’, afirma Lopes.

Ele revela ainda ter sofrido pressões para publicar artigos científicos financiados por laboratórios em troca da compra de anúncios na revista da sociedade que preside. ‘Também não aceitei esse tipo de interferência. Tudo o que publicamos passa pelo crivo do conselho editorial.’ Lopes se nega a fornecer os nomes dos laboratórios por falta de provas.

Nos últimos três anos, vários artigos foram publicados pela imprensa internacional informando que a indústria farmacêutica contrata ‘escritores fantasmas’ para elaborarem artigos científicos favoráveis às suas drogas e, depois, paga cientistas renomados para assiná-los.

Neste ano, o ex-editor do British Medical Journal, Richard Smith, denunciou como os laboratórios manipulam os periódicos científicos com pesquisas que fazem seus remédios parecerem muito melhores do que são.

Assédio

Apesar de reconhecer o problema do assédio, o CFM diz que não consegue punir os médicos pois não há denúncias formais sobre as infrações, sem as quais não há como iniciar um processo disciplinar no conselho, ação que poderia levar à cassação do registro profissional do médico.

‘Como muitos se beneficiam dessas vantagens, ninguém denuncia. A maioria dos médicos não vê problema de usufruir de uma ‘delicadeza’ do laboratório. É o que eu chamo de elasticidade moral’, afirma d’Ávila.

Segundo d’Ávila e Lopes, o assédio dos laboratórios sobre os médicos ocorre de várias formas, tais como na distribuição de brindes pelos propagandistas nos consultórios, no oferecimento de viagens em congressos nacionais e internacionais e no pagamento de palestras para falar de pesquisas positivas a determinadas drogas.

Os profissionais mais visados seriam aqueles que lidam com doenças crônicas, como hipertensão e diabetes, e prescrevem remédios de uso continuado. ‘É um cliente em potencial por 20, 30 anos’, diz o cardiologista Raimundo Marques do Nascimento.

Não existem estudos sobre o reflexo dessa prática na população, mas especialistas em bioética supõem que elas podem levar à prescrição de remédios de eficácia duvidosa ou mais caros.

‘Os casos do Bextra e do Vioxx [analgésicos e antiinflamatórios retirados do mercado em razão do risco de problemas cardiológicos] estão aí para nos mostrar que toda cautela é pouca’, diz o infectologista Caio Rosenthal, da Câmara de Bioética do Cremesp (conselho de medicina paulista).

Segundo ele, é comum os médicos, especialmente os de cidades do interior, receberem da indústria farmacêutica convites para jantares, almoços e viagens. ‘Até cruzeiro marítimo já foi feito. Os médicos ficam subvendidos por essas pequenas miçangas. Do ponto de vista ético, isso é deplorável. Mas compreendo que eles fiquem seduzidos pois muitos vivem em situação de penúria.’

Para d’Ávila, há necessidade de mecanismos mais eficazes de controle. ‘É preciso que os conselheiros regionais se empenhem em conscientizar os médicos dos Estados a ter uma análise crítica sobre o viés comercial que existe nesses convites.’

O corregedor conta que já soube de médicos que receberiam ‘salários por fora’ de laboratórios a título de colaboração pela participação em congressos ou outros eventos. Porém, não há provas.

O assédio dos laboratórios atingiria também as farmácias, segundo os médicos. Em troca de vantagens (em dinheiro ou em produtos), elas repassariam informações do receituário aos laboratórios, que cobram fidelidade do médico. ‘São relações espúrias’, resume o médico Marco Segre, professor de bioética da USP.’



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‘Empresa busca ‘fidelizar’ alunos nas faculdades’, copyright Folha de S. Paulo, 29/08/05

‘A aproximação da indústria farmacêutica com os médicos começa nos bancos da faculdade de medicina. Na semana passada, a Folha recebeu um e-mail de uma empresa de marketing que exemplifica essa situação.

A mensagem é sobre a promoção do antiinflamatório ‘Flanax’ (Bayer) entre os estudantes de medicina durante a Intermed, competição que reúne as principais faculdades de medicina do Estado, que acontecerá de 3 a 10 de setembro em Santa Rita do Passa Quatro (SP).

‘A estratégia é demonstrar o medicamento fidelizando os futuros médicos. Para isto, serão distribuídos squeeze Flanax [garrafas para água com o logotipo do produto] e também manuais dos jogos’, diz o texto.

Na avaliação do diretor de marketing da Bayer, Humberto De Biafe, a maneira como foi redigido o texto da ação de marketing não traduz a conduta da empresa nem com os médicos nem com os estudantes.

‘Nossa fidelização é por meio de informação, não pela distribuição de brindes’, afirmou. Segundo ele, a empresa costuma divulgar o produto, vendido sem receita médica, em eventos esportivos, mas respeita as regras impostas pela Anvisa.’



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‘‘Generalização é absurda’’, copyright Folha de S. Paulo, 29/08/05

‘Gabriel Tannus, presidente da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa), considera um ‘absurdo’ as declarações de que práticas antiéticas entre médicos e laboratórios estejam generalizadas.

‘Existem práticas eticamente indefensáveis em toda atividade humana. No caso em questão [a relação entre médicos e laboratórios], não posso dizer que não existam, mas não é generalizado.’

Ele diz acreditar que a resolução 102 da Anvisa, de 2000, estabeleceu regras muito claras para essa relação. As normas definem critérios para praticamente todas as modalidades de promoção: da atuação dos propagandistas ao patrocínio de congressos técnicos e de atualização; dos convites de participação para encontros profissionais à distribuição de amostras grátis.

‘Nos congressos, por exemplo, há uma definição muito clara do que é científico e o que é promocional. Não se pode subestimar a capacidade de a audiência reagir caso algum laboratório extrapole os limites da ética.’

Tannus também discorda da afirmação de que trabalhos favoráveis a determinas drogas estejam sendo apresentados sem a citação do patrocínio, como determina o CFM e a Anvisa.

‘Temos interesse de perseguir e moralizar isso. Se alguém tem uma casuística dessa prática, deveria demonstrá-la. Essas referências já existiram no passado, numa época em que cada um fazia o queria. Agora isso está mudado. As próprias sociedades médicas se organizaram e as indústrias também possuem regras pautadas na ética.’

Propagandistas

Sobre a atuação dos propagandistas, Tannus diz que é função desses profissionais convencer o médico a prescrever o produto que ele representa. ‘Ele não vai ao consultório fazer social. O que ele faz é legal e uma prática no mundo todo. Mas isso dentro de uma ética profissional. Todos passam por programas de treinamento e devem respeitar as regras.’

Em relação à forma de apresentação das pesquisas científicas aos médicos, que, na maioria das vezes só traz um extrato positivo do trabalho, o presidente da Interfarma afirma que não há informações falsas, apenas uma disposição gráfica que torna a leitura mais ágil e fácil.

Segundo ele, a indústria farmacêutica mundial está revisando a forma com que passará a publicar os seus trabalhos científicos para os médicos.

Há hoje um clamor na comunidade científica pedindo a publicação de todos os resultados de pesquisas científicas ainda que eles não sejam positivos ao produto em questão.

Febrafarma

Em nota encaminhada à Folha, a Febrafarma (Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica) afirma defender o estrito cumprimento da legislação em vigor, ou seja, a resolução nº 102, da Anvisa.’



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‘‘Não acho antiético aceitar viagens’’, copyright Folha de S. Paulo, 29/08/05

‘Leia a seguir o depoimento de um médico de São Paulo, que não quis se identificar, contando como se relaciona com os laboratórios:

‘Não me envergonho nem considero antiético aceitar convites de viagens ou presentes de laboratórios. Vou pelo menos duas vezes ao ano a congressos no exterior, nos EUA e na Europa, muitas vezes na companhia da minha mulher, que adora passear e fazer compras.

O laboratório que me convida financia as passagens e as despesas com estadia, alimentação e transporte. Quando apresento algum paper [trabalho científico], recebo uma quantia em dinheiro. Dá trabalho preparar as apresentações e acho justo ser remunerado por elas. Não vejo mal algum.

Não estou roubando nem lesando ninguém. Se esses convites acontecem, é porque tenho credibilidade e sou formador de opinião. Se não fosse a indústria farmacêutica, não seria tão atualizado como sou hoje.

Se a medicina brasileira está ‘up-to-date’ é graças à indústria farmacêutica, não aos órgãos públicos responsáveis pela promoção e financiamento da pesquisa. Acho muita hipocrisia meia dúzia de médicos levantarem a bandeira da moralidade contra os laboratórios. Queria ver o que aconteceria com a medicina se eles retirassem todo o apoio que dão.

Também não vejo mal algum em receitar um medicamento de um laboratório parceiro desde que tenha a eficácia comprovada. Você vai me dizer: e o preço, doutor? Eu digo: não é por uma diferença de R$ 30, R$ 40 que meus pacientes vão deixar de tomar. Seria diferente se minha clientela fosse do SUS ou de baixo poder aquisitivo. Não é o caso.’’



FSP CONTESTADA
Painel do Leitor, FSP

‘Porto de Santos’, copyright Folha de S. Paulo, 27/08/05

‘‘Tendo em vista a reportagem ‘Negócio suspeito dá monopólio à Bunge’ (Dinheiro, 25/8), gostaríamos de fazer os seguintes esclarecimentos: Todos os procedimentos que deram origem ao TGG foram regulares e legais -e nem poderia ser de outra forma, já que se trata de concessão pública. O termo de compromisso firmado em 1991 garantiu à Ferronorte cessão de áreas em ambas as margens do porto de Santos de modo a viabilizar futuros investimentos complementares, necessários ao adequado atendimento dos seus clientes e da ferrovia. O segundo termo aditivo ao contrato 01/97 previa que a Ferronorte poderia contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias e complementares ao arrendamento, bem como a implantação do próprio projeto e de projetos associados. A Lei de Concessões prevê que o arrendatário pode explorar o arrendamento diretamente ou constituir uma sociedade para esse fim específico, opção legítima e legal adotada pela Ferronorte e por grande parte dos arrendatários de instalações portuárias em todo o Brasil. As SPEs foram constituídas pela Ferronorte com a explícita concordância do poder concedente, conforme previsto em lei e no contrato de arrendamento. Os terminais TGG e Termag são fruto de uma concessão de serviço público, atendendo assim não somente aos sócios mas a todos os usuários interessados. Finalmente, todo esse processo tem sido realizado de maneira transparente e foi intensamente debatido pelos órgãos competentes e acompanhado pela imprensa.’ Elias Nigri, presidente da Ferronorte (São Paulo, SP)

Resposta do jornalista Fernando Canzian – Os fatos apontados estão sub-judice e são contestados pelas autoridades que fiscalizam os portos. A Ferronorte obteve inclusive, do porto de Santos, cláusula contratual que prevê ser ressarcida de seus investimentos caso a Justiça considere o negócio ilegal.

Assessoria

‘Em relação à coluna de Janio de Freitas de 18/8, informo que a BDO Trevisan não vai prestar assessoria para a recomposição financeira do PT. A BDO Trevisan realizou para o PT um trabalho de revisão de processos administrativos de controle interno, que já foi concluído e entregue à direção daquele partido. O trabalho dá sugestões para a correção de erros e falhas encontrados nos controles financeiros do PT, porém sua adoção ou não dependerá exclusivamente do cliente. Reiteramos que a BDO Trevisan não fará a implementação das sugestões apontadas nem auditará as contas do PT.’ Karla Terra, assessoria de imprensa da BDO Trevisan (São Paulo, SP)

Psicologia

‘A reportagem ‘Psicólogo fica desobrigado de quebrar sigilo’ (Cotidiano, 26/ 8), sobre o novo Código de Ética do Psicólogo, foi bastante esclarecedora e adequada. No entanto torna-se necessário um esclarecimento. A entrevista apresentou as questões e posições que os psicólogos defenderam no decorrer do processo de construção do código, sendo portanto equivocada a informação de que eu seria defensora da obrigatoriedade da quebra do sigilo. É consenso entre os psicólogos que o sigilo é aspecto inerente à profissão. Os debates se colocaram apenas quanto às referências profissionais para casos excepcionais, quando a quebra do sigilo se impõe.’ Ana Mercês Bahia Bock, presidente do Conselho Federal de Psicologia (São Paulo, SP)

Resposta da jornalista Fabiane Leite – A reportagem deixa claro que a proposta de quebra de sigilo, já descartada, referia-se somente a casos de violência. Essa idéia foi defendida pela hoje presidente Ana Bock, como afirma a aludida reportagem. Em setembro do ano passado, Bock defendeu a mudança em entrevista à Folha.

Testemunha

‘Em carta publicada anteontem nesta seção, sob o título ‘Justiça’, o competente advogado de Milton Neves, doutor Antonio Carlos Sandoval Catta-Preta, menciona meu nome como testemunha de defesa denunciada por falso-testemunho na sentença. Mas o nobre causídico se esqueceu de mencionar que também uma testemunha por ele arrolada, Wellingthon Oliveira, foi denunciada também por falso testemunho. Gostaria que essa retificação fosse feita nessa coluna uma vez que o informante somente se preocupou em resguardar o seu cliente em detrimento da justiça, que deve prevalecer sempre.’ Sylvio Luiz Perez Machado de Sousa (São Paulo, SP)’



VEJA ABSOLVIDA
O Globo

‘‘A imprensa deve informar, opinar e criticar’’, copyright O Globo, 30/08/05

‘A imprensa tem o direito não apenas de informar a sociedade mas também de apresentar críticas ‘ainda que contundentes e sarcásticas’ e especialmente ‘quando dirigida a figuras públicas, com alto grau de responsabilidade na condução dos negócios de Estado’. Este é o teor de uma sentença do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão que poderá servir de parâmetro no julgamento de ações semelhantes contra jornalistas.

Celso de Mello reuniu argumentos que ressaltam a importância da liberdade de expressão em uma sociedade democrática e determinou o arquivamento de pedido de abertura de processo penal contra jornalistas da revista ‘Veja’.

Para Celso de Mello, a liberdade de expressão prevista na Constituição assegura esse direito aos jornalistas:

‘A crítica jornalística traduz direito impregnado de qualificação constitucional (…) pois o interesse social (…) sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar os detentores do poder’.

Em outro trecho da sentença, Celso de Mello afirma:

‘No contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão penal ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse público’.

O ministro ainda escreveu que ‘o exercício da liberdade de imprensa contém os direitos de informar, buscar a informação, opinar e criticar’. E defende que o interesse social pela informação está acima de interesses dos ocupantes de cargos públicos:

‘É preciso advertir, notadamente quando se busca promover a repressão penal à crítica jornalística, que o Estado não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as idéias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais dos meios de comunicação social. Essa garantia básica da liberdade de expressão do pensamento representa, em seu próprio e essencial significado, um dos fundamentos em que repousa a ordem democrática’, diz o ministro.

E acrescentou, na sentença:

‘Nenhuma autoridade pode prescrever o que será ortodoxo em política, ou em outras questões que envolvam temas de natureza filosófica, ideológica ou confessional, nem estabelecer padrões de conduta cuja observância implique restrição aos meios de divulgação do pensamento. Isso porque ‘o direito de pensar, falar e escrever livremente, sem censura, sem restrições ou sem interferência governamental’, representa (…) ‘o mais precioso privilégio dos cidadãos…’

A decisão foi vista como um marco para as entidades defensoras da imprensa:

– A nossa profissão está sendo vítima de assédio judicial. Isso prejudica principalmente a sociedade, que fica sem acesso à informação. Para nós, é uma decisão importante porque resgata o sentido da liberdade de imprensa – disse o presidente da Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj), Sérgio Murilo de Andrade.

A Associação Nacional de Jornais (ANJ) também comemorou a decisão:

– Que a decisão sirva de balizamento para aqueles que se aventurem em ações dessa natureza – disse o diretor executivo da ANJ, Fernando Martins.’