Wednesday, 13 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1313

JT será transformado
em “popular de qualidade”

Em dia de poucas notícias sobre mídia e imprensa nos grandes jornais brasileiros, o destaque é o anúncio, no Estado de S. Paulo, de um novo projeto editorial para o Jornal da Tarde, que será transformado em um ‘jornal popular de qualidade’, de acordo com o Sandro Vaia, Diretor de Redação do Estadão.


Na Folha de S. Paulo e n’O Globo, vale a pena ler interessante texto de Elio Gaspari sobre Juscelino Kubitschek, aproveitando como gancho a minissérie sobre a vida do ex-presidente que está em exibição na TV Globo. Na Folha há ainda dois artigos sobre a crise política e nos dois o presidente Lula não se sai nada bem.


Leia abaixo os textos desta quarta-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Quarta-feira, 4 de janeiro de 2006


CRISE POLÍTICA
Gerald Thomas


A farsa de Lula e Bush


‘A cho que nunca me esquecerei do dia em que vinha andando pela rua 23 com a segunda avenida, em Nova York, quando uma mão enorme e pesada pousa no meu ombro direito e uma voz berra: ‘Stop!’. Eu congelo na hora, sem saber do que se trata. Em questão de um segundo, dez viaturas policiais estavam lá, vasculhando tudo e todos.


Era o dia em que Londres havia sofrido um ataque em seu metrô, dia 7 de julho, e o gosto na minha boca me remeteu aos momentos que se seguiram ao colapso das Torres Gêmeas, em 11 de setembro de 2001, que vi caírem da minha janela, quando morava em Williamsburg, na beira do East River. Agora, moro do outro lado, no mesmo East River, em Manhattan e… aquela mão? O que queria me dizer com aquele ‘Stop!’? Queria que eu parasse o ano prematuramente? Não, certamente não. 2005 foi um ano de dramaturgia péssima.


A popularidade de Bush, assim como a de Lula, despencou, faliu.


2005 foi o espelho quebrado dos anos anteriores, autista, o ano avesso. Nos EUA, a população tomou consciência da quantidade de mortos no Iraque e da insurgência crescente. No Brasil, os escândalos surgiram com a força de um furacão Katrina. Um dilúvio soava e colocava corruptos no banco dos réus e revelava a total ausência ou cinismo absoluto de Lula (um Hamlet tontinho ou, talvez pior, um rei Claudius? Neste caso, um assassino frio, cruel e delirante).


Exatamente como nos EUA: Bush tentava ignorar os escândalos políticos à sua volta até meados de dezembro, quando finalmente admitiu erros no que diz respeito ao Iraque. É a primeira vez que admite um erro. Mas é porque quer se tornar vulnerável para poder reeleger o Patriot Act, esse que torna o país uma miniditadura orwelliana, justamente agora que os escândalos sobre a espionagem e grampos sobre qualquer cidadão americano explodem na mídia.


E então? Aquela mão que me parava com qual autoridade? Da paranóia e da farsa. Combinação perigosa. Já vimos isso. Serei mais preciso: Alemanha pré-guerra. A palavra é autonegação. Tanto Bush como Lula se negam a ver o fracasso à sua volta. Melhor: se negam a assumi-lo, já que o tango político está arrítmico e ninguém mais sabe dançá-lo.


Karl Rove, braço direito do presidente, está em apuros. Praticamente sentado no banco dos réus por ter revelado a identidade de uma espiã feminina da CIA na África, Rove está assim como José Dirceu esteve faz pouco tempo. O Partido Republicano começa a se dividir, assim como o PT. Motivos diferentes, claro. Aqui não foi o ‘mensalão’: a divisão fica por conta do Iraque e da tortura em presos de guerra, que começam a irritar os mais puritanos senadores.


Bush, assim com Lula, tem esse incrível dom de sair pela tangente quando sua popularidade cai: são dois canastrões que deixam a cena e vão se refrescar na coxia enquanto algum coadjuvante toma o palco: esquecem que o teatro político também é feito de diálogo.


‘A economia vai bem!’ é a frase usada pelos dois, como se numa deixa teatral, no mesmo momento… como se fossem sincronizados por satélite. Mas será que vai mesmo? Não sou economista, mas já ouvi que a economia, assim como nosso sistema gastrointestinal, é subjetivo e não há maneiras imediatas de julgá-lo, a não ser que haja um tumor à vista. Com um gasto diário de US$ 60 milhões com a chamada ‘Guerra no Iraque’, o tumor está começando a aparecer.


A verdade é que estamos sendo governados por administrações paranóicas e que estão na contra-ofensiva. E isso pode ser tão perigoso quanto qualquer ataque terrorista.


Com aquele sorrisinho de matar, Bush foi lento em sua resposta quando Nova Orleans foi devastada pelo furacão Katrina. ‘Questões raciais’, berravam políticos e artistas por todos os cantos da grande águia. Mas, assim como já existe uma certa impotência quando se quer falar sobre Lula e sua administração, existe a mesma impotência em criticar Bush: já não existem mais adjetivos. Esgotaram-se todos. Agora, fica-se pasmo diante da TV, já que os dois presidentes têm algo em comum: adoram viajar!


Pasmo ou irado, essa é a sensação deixada por eles e seus desfeitos, posando de alienados, sorrindo, sempre sorrindo. Nada prova nada!


Foi quase como um ‘timing’ teatral. Se ensaiado, não teria dado mais certo. Lula, no Brasil, com os escândalos do ‘mensalão’, CPIs pra todos os lados, e Bush envolvido em escândalos que incluíam quase todos de sua administração e expoentes do Partido Republicano. Olho pro Bono e o casal Bill Gates como as personalidades do ano na capa da ‘Time’ e vejo que os EUA começam a entrar em processo de transição: ou seja, Bush viverá um 2006 nada fácil, uma resistência começa a se organizar.


Aquela mão no meu ombro? O que ela queria? Graficamente, 2005, ela mais se parecia com as garras de um papagaio plantado no meu ombro, berrando no meu ouvido: ‘Stop: fim do primeiro ato!’. Mande baixar o pano, sr. diretor! Mas, com as mãos ao alto, como se num assalto, não sou o dono do palco: sou um dos espectadores numa enorme farsa de horrores!


Gerald Thomas é diretor de teatro.’


Hugo Possolo


De um palhaço para o presidente


‘As elites orquestraram para que eu me tornasse palhaço. O complô da mídia me vestiu roupas largas e sapatões e pintou minha cara. Impuseram-me o papel de idiota. Eu, que não sabia de nada, me senti traído. Apenas fui levado por companheiros de 30 anos de luta que, agora percebo, queriam que eu fosse absolutamente ridículo.


É verdade que, no começo, assumi e dei uma festa no apê. Distribuí metáforas com cara de aforismos e desaforos para quem quisesse ouvir. Afinal, o palhaço pode tudo. Inclusive rir das piadas recicladas que fazem a meu respeito. Sobre o dedo que me falta, o conhecimento que me falta e até sobre a honestidade, que também me falta.


Tudo bem, até que um cantor de ópera bufa fez sua cena de ópera de sabão. Delatou, debaixo de nossa honrada lona tombada pra baixo, que alguns deputados recebiam uma mesadinha extra. Apoiei-me na velha máxima de que ser palhaço é fácil, mas que o difícil é levar isso tudo a sério.


O canastrão de olho roxo logo passou a ser o pop star da nação. Bandido sempre deu mais ibope na televisão. E todo mundo grudou a vida na TV Senado. Encenação com ares de megashow. Fiquei enciumado.


Revidei com o publiciotário. Só que a propaganda premiada do gênio da lâmpada teve a esperteza de divulgar que o dinheiro bom é aquele não-contabilizado que está bem contabilizado nas contas do exterior. E depois, o palhaço sou eu!


Fiquei vesgo, em pânico, com a cara da Sol. Chorei a minha vontade de morar em Miami, onde os americanos falam português. Não deu certo. Afinal, eu também não falo português. Tornei-me um palhaço preconceituoso só porque não vi o beijo gay.


De repente, baixou o clero esclerosado e o presidente da câmara de pneus furados não pagou a conta do restaurante. Veio o dono, passou a fatura e mandou a vida severina pro futuro distante da eleição. Nada de renunciar aos votos do povão. Porque, cá entre nós, coronel burro nasce bóia-fria.


Pisei em ovos. Aí, meus deputados pegaram a gripe do frango e caíram na farra com as galinhas. Mas a cafetina garantiu que eram apenas recepcionistas. Eu preferia que meus deputados estivessem com a febre aftosa. Assim, eu exterminaria o rebanho todo.


Entrei pelo cano de um valerioduto. Caí no buraco negro das pesquisas em que até vampiro ganha de palhaço. Desanimado, comprei uma cueca nova na Daslu. Enchi a danada de dólares e fui gastar na Daspu. Minha bengala típica de palhaço foi enfiada na cabeça de meu pupilo, que agora diz que não sabe se vai votar em mim.


Aproveitei para ver um filme de piratas, que eu adoro saques. Só que me trouxeram os dois filhos do rio São Francisco. E eu boiei. Um padre fez greve de fome e não me deram mais DVD para eu ver, nem nos entreatos.


Citei o futebol, mas a ficção se tornou realidade. Juiz ladrão não é só o que rouba na construção de tribunais.


Ainda tenso, rebolei para francês ver. E quem faturou foi a gravadora do meu artista ministro, curiosamente o grande destaque da festa.


E já era Natal. Enquanto o rei cantava que quer ter um milhão de amigos, meu vice leva um milhão em camisetas. Recebe em grana viva, coisa muito comum para quem não quer saber de onde veio o dinheiro.


Profetizei o velho chavão, de um chavista que sequer trabalha no SBT e não quer saber de políticas globais. Usei a frase de defeito:


– Nunca neste país teve tanta palhaçada mal feita!


Até esta Folha esculhambou-se, neste espaço, onde escrevem ilustres figuras da República, permitindo que um palhaço qualquer fizesse seu deboche.


A coisa estava ficando séria. Então, senti meu nível cair demais. Não comando nem o carrinho de pipoca da Disney. Sou um personagem terminal com um imenso ano pela frente.


Decido, então, fazer a mudança que prometi. Finalmente, deixo de ser palhaço ruim para não me parecer com um presidente.


É bem melhor ser palhaço de verdade.


Já sei! Vou quebrar meu sigilo bancário. Assim, todo mundo saberá que, além do nariz, eu também tenho a conta no vermelho. O vermelho que desbotou da estrela é bom para quem quer ter vergonha na cara.


Sabe, senhor presidente, é tão bom reconhecer-se ridículo, sem a dignidade aparente. É bom ser livre, ainda que no pensamento. É bom dormir com a consciência tranqüila.


Não sei como é para o senhor. Às vezes, repasso um pesadelo que não é só meu. Como escreveu Eric Bogosian, na adaptação de Aimar Labaki: ‘De uma nuvem esfumaçada, vestida numa roupa sadomasoquista, surgirá Regina Duarte me cravando por trás. Arrepiado, sinto sua mão suave subir até a minha nuca, enquanto ela sussurra quente ao pé do meu ouvido:


– Perdeu o medo? Agora perde a esperança!’


Hugo Possolo, 43, dramaturgo, ator e diretor de teatro, é palhaço do grupo Parlapatões. Foi coordenador de Circo da Funarte (Fundação Nacional de Arte), Ministério da Cultura, de maio de 2004 a maio de 2005.’


JK NA GLOBO
Elio Gaspari


O que fez de Juscelino o JK?


‘No dia 8 de maio de 1961, o escritor Alceu de Amoroso Lima escreveu mais uma carta à sua filha. Comentava a popularidade de Juscelino Kubitschek, que deixara a Presidência da República humilhado pela vitória de um candidato que tinha a vassoura como símbolo e programa:


‘O brasileiro gosta é da ‘dolce vita’, e o JK faz sucesso na distribuição de… narcóticos políticos, que adormecem o povo na doce ilusão da ‘prosperidade’. Ao passo que Jânio Quadros é um moralista. (…) O brasileiro é desperdiçado por natureza, de modo que o governante ideal para ele é um JK, que joga dinheiro pela janela, porque o imprime ilimitadamente na cozinha…’


Mal sabia doutor Alceu o tamanho da fraude que o andar de cima empacotara num demagogo desequilibrado. Desde a noite de ontem, as bruxarias de Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira saciam a curiosidade nacional, oferecendo ficção de primeira qualidade numa época em que a realidade é de quinta. O que fez Juscelino se transformar no JK da saudade dos brasileiros?


O progresso? O Brasil de JK cresceu 8,5% ao ano, o do general Emílio Medici cresceu 11%. O sorriso? Fernando Collor também ria. A proscrição e o exílio? Carlos Lacerda, seu pior inimigo, também foi proscrito, até preso. A elegância cosmopolita, como o chapéu gelot que usou ao receber o presidente americano Dwight Eisenhower? Não sabia falar inglês.


JK jogou menos dinheiro pela janela construindo Brasília do que seus sucessores contratando a dívida externa, o acordo nuclear com a Alemanha e o populismo cambial do final dos anos 90. Talvez JK tivesse feito todas essas coisas. Afinal, apoiou o acordo nuclear e tinha apetite por dívidas e dólar barato.


O que fez de Juscelino Kubitschek o JK de 2006 foi a sua capacidade de ser um pouco de cada brasileiro. Ficou parecido com o sonho dos ‘desperdiçados’. Não falava bem do seu governo, muito menos de si.


Passou pela vida pública como se não tivesse inimigos. Odiavam-no, mas não odiava. Batia sem deixar marcas e não levava suas raivas para a agenda do país. Era como se não tivesse contas a acertar. Dirigia sem retrovisor. O JK de 2006 tem o tamanho de seus sentimentos. Vivia de grandiosidades e teve grandes amigos, grandes amores e grandes projetos.


Esse JK não é o de 1960. É criação recente, nostálgica e invencível. Nasceu no coração dos brasileiros entre a tarde de 22 de agosto de 1976, quando o passageiro do banco de trás de um Opala destroçado no quilômetro 165 da via Dutra foi identificado como Juscelino Kubitschek de Oliveira, e as últimas horas do dia seguinte, quando foi sepultado em Brasília, sob as luzes dos holofotes do Corpo de Bombeiros, ao som da multidão. Estima-se que 350 mil pessoas foram às ruas acompanhando seu caixão. Era a maior manifestação pública desde a edição do AI-5, em dezembro de 1968, e só seria superada em 1984, com os comícios das Diretas-Já. Não se gritava ‘Abaixo a ditadura’. Cantava-se:


‘Como pode


O peixe vivo


Viver fora


Da água fria?


Como poderei viver


Como poderei viver


Sem a tua, sem a tua


Sem a tua companhia?’


Desde então, todos os presidentes brasileiros querem ser JK quando crescerem. Um dia algum talvez consiga, desde que aprenda uma coisa simples: Juscelino Kubitschek jamais disse uma má palavra dos brasileiros ou do Brasil. Foi um visionário que acreditou nos dois.


Desdenhava infalibilidades e costumava repetir: ‘Não tenho compromisso com o erro’.’


CASOY DEMITIDO
Daniel Castro


Record ‘turbina’ telejornal e assedia globais


‘A Record está enfrentando dificuldades para definir a dupla (um homem e uma mulher) que substituirá Boris Casoy na apresentação do ‘Jornal da Record’ (‘JR’). Há pelo menos seis meses a emissora vem assediando jornalistas da Globo. O sonho da cúpula da emissora é estrear dois ‘globais’ no telejornal, mas, sem sucesso até agora, deverá optar por uma solução caseira: Celso Freitas (nome já quase certo) e Janine Borba.


Nos últimos meses, a Record sondou desde William Bonner e Fátima Bernardes, titulares do ‘Jornal Nacional’, até Fabiana Scaranzi e Rosana Jatobá. Com a rescisão do contrato de Casoy, na última sexta, a Record investiu contra Sandra Annenberg, que já teria recusado sua proposta.


Nos próximos dias, chamadas devem anunciar um ‘novo’ ‘Jornal da Record’ (com reportagens mais curtas e séries especiais, como o ‘Jornal Nacional’). A mudança deve ocorrer em 30 dias.


O ‘novo’ ‘JR’ terá pelo menos dez repórteres exclusivos (Casoy tinha sete) e novos correspondentes: além de Londres e Nova York, serão abertas vagas no Japão, na África do Sul e no Oriente Médio.


Com a saída de Casoy, o jornalismo foi unificado (o ‘JR’ era independente). Douglas Tavolaro, diretor de jornalismo, ganhou poder. Ontem, as divisórias que separavam a equipe de Casoy dos demais jornalistas foram eliminadas _o que foi chamado de ‘a queda do Muro de Berlim’.


OUTRO CANAL


Igual 1 Com a exibição do arrasa-quarteirões ‘Homem-Aranha’ na sessão ‘Tela Quente’, anteontem, a Globo minou a estratégia do SBT de aumentar sua audiência com filmes no lugar do programa ‘Hebe’, às segundas-feiras. A reprise de ‘Jason X’, pelo SBT, não passou de cinco pontos, menos até do que registrava no horário Hebe Camargo _que entrará aos sábados, a partir do próximo.


Igual 2 Já ‘Homem-Aranha’, que também não era inédito, deu surpreendente média de 47 pontos, mais do que ‘Belíssima’ (46). Coincidentemente, na primeira exibição do filme, em abril do ano passado, a audiência foi a mesma.


Contaminação Sem uma novela das sete forte o antecedendo, o ‘Jornal Nacional’ fechou dezembro com média de 30 pontos na Grande São Paulo. Foi seu pior resultado desde dezembro de 2002, quando marcou 29 pontos. Em dezembro de 2004, a média do telejornal foi de 36 pontos.


Movimento Carlos Massa, o Ratinho, pode ter o mesmo ‘destino’ de Hebe Camargo e Adriane Galisteu: os sábados. Uma ala da direção do SBT defende que ele passe a apresentar um programa de longa duração, durante toda a tarde desse dia. Já existe até nome: ‘Boteco do Ratinho’. Assim, Ratinho deixaria de ter programa diário.’


POLÍTICA CULTURAL
Luiz Fernando Vianna


Antropólogo cria rede de difusão cultural


‘Quando Gilberto Gil assumiu o Ministério da Cultura, em 2003, chamou Hermano Vianna para conversar -o que continua fazendo, ainda que o antropólogo seja um assessor informal e não-remunerado. Ouviu algo assim: ‘O ministério não precisa produzir mais, as coisas já estão sendo produzidas. Precisa é ligar’.


Especialista em ligações culturais, Vianna lança em fevereiro sua mais ambiciosa rede de conexões: o site Overmundo (www. overmundo.com.br). São 27 correspondentes, um em cada Estado do país, escrevendo notas e reportagens sobre as respectivas produções locais e atraindo colaboradores diversos para uma página que tem a descentralização como idéia central.


‘O Overmundo tenta atacar os problemas da circulação da informação e da produção e incentivar uma forma de reflexão sobre esses problemas. Não é uma revista, não é um banco de dados, não é a solução. É um laboratório aberto de criação de ferramentas para as pessoas utilizarem’, diz Vianna.


Inspirado em sites como o britânico Collective e o sul-coreano OhmyNews, mas buscando um modelo próprio, o Overmundo é resultado das possibilidades oferecidas pela internet e das transformações em curso na produção e transmissão de informações.


Assim, os correspondentes do site não são exatamente repórteres, mas ‘animadores’, na classificação de Vianna. São jornalistas e também músicos e escritores, dentre outros ofícios, que não precisam escrever com a imparcialidade idealizada pela grande imprensa. Em vez de editor-chefe, o antropólogo é uma espécie de animador geral que debate as decisões com todos os participantes.


‘O que há de mais legal na internet foi produzido de forma coletiva com o objetivo de disponibilizar informação. Eu me sinto sempre em dívida, pois como eu já usei o trabalho de outras pessoas, que botaram informações e músicas de graça [na rede]! O Overmundo é uma forma de pagar um pouco dessa dívida’, afirma. ‘É cafona dizer, mas as pessoas estão dispostas a dedicar parte do seu tempo ao bem comum. É generosidade intelectual mesmo.’


Ou seja, além de tudo o que a equipe do site botar no ar -incluindo agendas culturais alternativas das capitais-, o Overmundo pretende ser ‘uma comunidade de blogueiros’, segundo Vianna. Hospedará páginas pessoais ou de grupos, tentará aproximar aqueles que têm o que trocar, mas não se conhecem, e receberá colaborações em texto, áudio e vídeo.


‘Todo mundo poderá escrever. Bastará preencher um cadastro e se submeter às regras que ainda não estão definidas. E os textos serão editados coletivamente’, diz.


No caso das músicas, todas as que entrarem no site precisarão estar sob o sistema Creative Commons. Ou seja, poderão ser baixadas por outros usuários e utilizadas do modo que determinar o tipo de licença que o autor escolher. O Overmundo passará, portanto, ao largo dos conceitos de direito autoral e pirataria ainda em voga.


‘Compare o número de artistas contratados por uma grande gravadora com a produção de música que existe no país. É um funil, então tem que escapar por um outro lado. Os fenômenos mais interessantes nos últimos anos foram os grandes mercados de entretenimento popular, como o tecnobrega e o funk carioca, que não dependem da grande mídia’, diz Vianna, um dos responsáveis pela série ‘Mercadão’, apresentada por Regina Casé no ‘Fantástico’.


Além de oferecer um contraponto às grandes gravadoras, o Overmundo também pode mexer com a imprensa cultural, cada vez mais centralizada em Rio e São Paulo, e exportando essas informações para os jornais de outros Estados, que as compram em vez de priorizar a produção regional.


‘Não vai ter reação contrária [da imprensa] porque ninguém está cobrindo o que a gente está cobrindo. Nosso foco é naquilo que não está sendo divulgado.’


Esse arco abrange desde um mestre da guitarrada de Belém até as novidades do rock independente, passando por manifestações indígenas e festejos carnavalescos desconhecidos.


Para batizar o site patrocinado pela Petrobras, o antropólogo foi buscar o título de um poema de Murilo Mendes (1901-75), no qual se fala de um ‘cavaleiro do mundo delirante/ Que anda, voa, está em toda parte/ E não consegue pousar em ponto algum’. Do início dos anos 40, o poema funciona como metáfora para a internet.


Se depender de Vianna, que sonha com uma página organizada pelos próprios usuários, num futuro próximo outro verso se tornará verdade: ‘Overmundo expirou ao descobrir quem era’.’


Folha de S. Paulo


Objetivo de documento é ‘cabeça’ de Sá Leitão, diz cineasta


‘Em reação às novas críticas do secretário de Políticas Públicas do Ministério da Cultura, Sérgio Sá Leitão, o cineasta Zelito Viana disse ontem que um dos objetivos do abaixo-assinado de apoio ao poeta e colunista da Folha Ferreira Gullar é ‘a cabeça’ do assessor.


‘Na verdade, estamos pedindo a cabeça dele. Quem é ele? Trabalho em cultura há 40 anos. Já passamos do tempo de acusar os outros de stalinistas’, disse Viana.


Na última sexta-feira, o documento assinado por 30 artistas foi encaminhado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao ministro da Cultura, Gilberto Gil. O abaixo-assinado é um protesto contra a carta do secretário do ministério publicada no dia 24 de dezembro na Folha.


Nessa carta, o secretário criticava frase de Gullar durante sabatina da Folha e escrevia: ‘(…) Não deixa de ser curioso um comunista criticar algo ou alguém por uma suposta ‘centralização’. A ‘centralização’ não era a marca registrada dos finados regimes stalinistas dos quais Gullar foi e segue sendo um defensor?’.


O ataque de Zelito Viana foi uma réplica a e-mail de Sá Leitão que, por sua vez, respondia ao abaixo-assinado. Nele, Sá Leitão dizia que sua carta não foi uma iniciativa pessoal, mas do ministério. E afirmava ainda que Gullar acionou sua tropa de choque e encontrou eco ‘no ócio de Luiz Carlos Barreto e Zelito Viana’. Dizia também que Barreto está à frente do abaixo-assinado para se vingar de não ter tido projetos aprovados nas seleções de patrocínio da Petrobras e do BNDES, das quais o secretário participou. Barreto não foi localizado pela Folha para responder à acusação.


‘Ele [Sá Leitão] não sabe nada e se arvora de porta-voz. Os caras pensam que o Estado é propriedade deles. Não se pode mais criticar nada? Além disto, se você critica alguém agora tem que ser acusado de de ser stalinista’, acrescentou Viana.’


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O Globo


Quarta-feira, 4 de janeiro de 2006


INTERNET
O Globo


Nova falha no Windows ameaça milhões de PCs


‘SÃO FRANCISCO, Califórnia. Especialistas de segurança em informática alertaram anteontem para uma nova falha nos sistemas operacionais Windows, da Microsoft, que pode ameaçar com vírus e programas-espiões milhões de computadores em todo o mundo. Segundo Mikko Hyppönen, chefe de pesquisas da consultoria de segurança F-Secure, a vulnerabilidade pode atingir qualquer versão do Windows.


– A ameaça potencial é enorme. Provavelmente é a maior vulnerabilidade que já vimos – disse.


A falha permite que hackers infectem computadores ao inserir programas nocivos em arquivos de imagem aparentemente inofensivos. Para que a máquina seja infectada, basta ver na tela, pela internet, uma imagem que contenha o vírus. A ameaça foi descoberta na última semana de dezembro, mas o perigo aumentou no fim de semana, quando hackers divulgaram o código de programa que permite explorar essa falha do Windows.


Programador russo criou solução não-oficial


Em seu boletim de segurança, a Microsoft informou que sabia que a falha vinha sendo explorada. No entanto, a correção oficial da vulnerabilidade só estará disponível para usuários a partir do dia 10 de janeiro. Alguns especialistas em segurança recomendam que a Microsoft disponha, em seu site, de uma correção não-oficial para o problema, criada no fim de semana pelo programador russo Ilfak Guilfanov.’


BELÍSSIMA
Artur Xexéo


Duas ou três coisas sobre a novela das oito


‘Desde sua estréia, ‘Belíssima’ chamou a atenção do espectador pela excelência de seu elenco. Fernanda Montenegro está ótima. Pedro Paulo Rangel está sensacional. Irene Ravache está o máximo. Claudia Abreu está dando um banho. Tony Ramos é um superator. Glória Pires está excelente… Opa, Glória Pires está excelente mesmo?


Glória Pires é uma atriz de personalidade forte e rende mais com personagens de personalidade forte. Convence como a muito boazinha ou a muito má. Rouba a cena como a vilã intratável ou a heroína clássica. E está para nascer uma atriz que chore tão bem em novelas. Mas a Júlia que lhe reservaram em ‘Belíssima’… como fazer um personagem cuja única característica é ser sem graça? Júlia não é feia, nem é bonita. Não é elegante nem mal vestida. Não é tímida nem extrovertida. É apenas sem graça. Sem tintas fortes. E personagens de novela precisam de tintas fortes. É o jeito de o espectador perceber logo no primeiro ou no segundo capítulo o que ele representa na trama. Não há espaço para meios-tons. Júlia é uma protagonista atípica. Não fede nem cheira. E Glória Pires acabou lhe dando uma interpretação no mesmo estilo: não fede nem cheira.


Fala-se tanto do superelenco de ‘Belíssima’ que quase não se percebe que há alguns desastres na escalação da novela. Cauã Reymond, por exemplo. O que é Cauã Reymond? Marcello Antony está provando que não tem força para viver um protagonista e Letícia Birkheuer… foi até maldade escalar a inexperiente atriz para contracenar com o ninho de cobras que desfila pela novela.


É claro que não dá para incluir Glória Pires no time de Antony, Letícia ou Cauã. Mas fazê-la contracenar com alguns deles só faz piorar a inexpressividade com que está levando a sengracice de Júlia. Alguns dos melhores momentos de ‘Belíssima’ acontecem quando o tal superlenco participa da mesma cena. Como quando a câmera se dedica a registrar o embate entre Lima Duarte e Irene Ravache. Ou entre Fernanda Montenegro e Pedro Paulo Rangel. Ou entre Tony Ramos e Cláudia Abreu. Ou ainda – e esta é uma surpresa – entre Claudia Raia e Reynaldo Gianechini. O problema é que Marcello Antony e Letícia Birkheuer fazem parte do mesmo núcleo de Glória Pires. É difícil acreditar que Júlia está mesmo muito apaixonada pelo marido. Ou que exista algum conflito de gerações entre Júlia e sua filha que chegou de Londres.


Para quebrar esta tese, pode-se dizer que Fernanda Montenegro também contracena com a parte mais fraca do elenco. Mas Fernanda, todo mundo sabe, está acima do bem e do mal. Está bem até quando dialoga com um tijolo. Não dá, nesta altura do campeonato, para duvidar do talento de Glória Pires. Ela foi a Maria de Fátima, de ‘Vale tudo’, a Ruth e a Raquel, de ‘Mulheres de areia’, a Maria Moura de ‘Memorial de Maria Moura’. E é esta Glória Pires talentosa que aparece, por exemplo, quando Júlia contracena com Bia Falcão. Ou com Tony Ramos. O personagem da atriz está precisando urgentemente de uma virada. Daquelas que a tornem uma personalidade tão forte que fique acima de qualquer canastrão. Do jeito que está, Glória Pires corre o risco de, pela primeira vez na vida, ficar marcada por uma participação sem graça em novela.


***


No mais, ‘Belíssima’ vai de vento em popa. Sílvio de Abreu acertou como há muito tempo não acontecia. Sua trama mistura com eficiência as doses de comédia, suspense e drama que alimentam uma telenovela diária no horário nobre. Comédia é particularmente difícil de fazer. Principalmente a comédia preferida de Sílvio de Abreu: a chanchada. Misturar chanchada com um drama criminal parece tarefa impossível. Pois o autor enfrentou o desafio e se deu bem. As aparições das ex-vedetes Mary Montilla e Guida Guevara são deliciosas. Os encontros entre Safira e o borracheiro são engraçadíssimos. Sílvio de Abreu demonstra estar se divertindo ao escrever sua novela. As referências a Carlos Manga – outro chanchadeiro militante – e Gilberto Braga provam isso. Melhor: o espectador se diverte com ele, mesmo que não saiba bem o que Carlos Manga tenha a ver com vetedes veteranas ou que não consiga imaginar Gilberto Braga cantando Cole Porter num dos jantares que oferece em seu apartamento do Arpoador.


***


‘Belíssima’ só não me convence na idade de seus personagens. Afinal, com quantos anos está o personagem de Fernanda Montenegro para ter uma bisneta do tamanho de Letícia Birkheuer (na vida real, os netos da atriz ainda não atingiram a adolescência) e, ao mesmo tempo, ter gerado um filho há cerca de 30 anos?


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E para encerrar o assunto, duas ou três revelações. Se o autor respeitar a sinopse – sinopses de novela nunca são para serem levadas muito a sério – o verdadeiro par romãntico de ‘Belíssima’ é formado por Tony Ramos e Glória Pires. Após a morte de Bia – todo mundo já sabe que Bia vai morrer, né ? – Júlia ficará na miséria (a fábrica de lingeries será passada adiante sem o seu conhecimento) e se aproximará mais do grego.’


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O Estado de S. Paulo


Quarta-feira, 4 de janeiro de 2006


JT DE CARA NOVA
O Estado de S. Paulo


Aos 40 anos, JT tem novo projeto


‘O Jornal da Tarde completa hoje 40 anos se preparando para uma nova virada. ‘Nosso projeto é fazer uma atualização da imagem gráfica e, cada vez mais, transformá-lo num jornal popular de qualidade’, adianta Sandro Vaia, da diretoria executiva do jornal. ‘Será um popular voltado para um público seletivo, com uma linguagem clean.’ Para o editor-chefe, Celso Kinjô, a idéia é rejuvenescer o jornal.


‘O padrão original se manteve, o que demonstra que a proposta gráfica inicial era avançada para seu tempo. Era necessário dar uma nova feição ao JT para que continue correspondendo às expectativas da cidade.’ Os planos para o JT nos seus 40 anos também são os de, cada vez mais, colocar São Paulo como personagem principal de suas páginas.


O jornal foi o precursor de uma nova linguagem gráfica – suas capas já foram expostas no Museu de Arte de São Paulo. Deixou a sisudez dos textos tradicionais para aderir a uma forma mais coloquial de expressão e lançou novidades, como os roteiros de cinema, teatro e TV, que logo foram incorporados pelos outros jornais. ‘O JT foi vanguarda e, depois dele, os outros jornais se sentiram compelidos e renovar a linguagem’, lembra Sandro Vaia.


Também foi alvo da censura entre 1970 e 1973. E cada notícia rabiscada com lápis vermelho pelo censor de plantão era substituída por uma receita da culinária brasileira, apimentada com títulos recheados de ironia, como steak à Delfim ou aves à Passarinho. Ainda hoje fazem aniversário outros três integrantes do Grupo Estado: a Rádio Eldorado, criada em 1958, a Agência Estado (1970) e o portal estadao.com.br (2000).’


OESP, 131 ANOS
O Estado de S. Paulo


Renovado, ‘Estado’ faz 131 anos


‘O jornal O Estado de S. Paulo completa hoje 131 anos de existência – 126 dos quais de vida independente, excluindo-se os cinco em que esteve sob intervenção do Estado Novo, implantado por Getúlio Vargas. O aniversário ocorre num momento de profunda reformulação do veículo que começou a circular como A Província de São Paulo, em defesa dos ideais abolicionistas e republicanos, que viraram a página da história, com a adoção do título O Estado de S. Paulo.


Em 2005, o Estado foi o grande vencedor do Caboré, o mais importante prêmio da publicidade e da comunicação brasileiras, na categoria veículo impresso. Também, pelo terceiro ano consecutivo, foi eleito em 2005 o Veículo Mais Admirado em pesquisa da Troiano Consultoria de Marcas, também em parceria com o Grupo Meio & Mensagem.


Para o presidente do Conselho de Administração do Grupo Estado, Roberto Mesquita, esses prêmios são resultado do firme propósito de levar, todos os dias, aos leitores, um produto de qualidade. Foram mais de uma dezena de prêmios relacionados ao projeto de contínua reformulação do veículo, iniciada em 17 de outubro de 2004, quando apresentou aos leitores o seu novo projeto gráfico, complementado pelo lançamento de cadernos e suplementos, entre os quais Aliás, Casa&, Link, Paladar, Guia, TV&Lazer, Vida&, Metrópole, Negócios e Retratos do Brasil.


Os ideais democráticos que inspiraram os fundadores de A Província de São Paulo em 1875 se concretizaram após a proclamação da República, quando o nome de Julio Mesquita já aparecia no cabeçalho da primeira página como redator-gerente.


Pioneiro na venda avulsa, graças à criatividade do francês Bernard Gregoire, que todas as manhãs percorria as ruas a cavalo, gritando as notícias do dia com um pacote de jornais debaixo do braço, o Estado inovou no mercado. Sua tiragem, que começou com 2.025 exemplares, chegava a 18 mil em março de 1897, com a publicação das reportagens de Euclides da Cunha sobre a Campanha de Canudos.


Durante a 1ª Guerra Mundial, Julio Mesquita, que ocupou a direção de 1891 a 1927, escreveu boletins e artigos semanais sobre o conflito. Nesses textos, publicados em livro em 2002, o jornalista tomou posição inequívoca em favor dos aliados.


Além da edição da manhã, a empresa publicava também o Estadinho, vespertino lançado em 1915 que circulou até 1921. Seu diretor era Julio de Mesquita Filho. Na Revolução de 1924, o jornal sofreu as conseqüências de sua neutralidade. Censurado pelos revoltosos comandados pelo general Isidoro Dias Lopes, foi suspenso pelas forças federais do presidente Artur Bernardes. Julio Mesquita foi preso e enviado para o Rio.


Nova fase se iniciou em 1927. Com a morte de Julio Mesquita, assumiram a direção Julio de Mesquita Filho e Nestor Pestana. Enquanto Julio de Mesquita Filho respondia pela redação, seu irmão Francisco Mesquita cuidava da administração.


O Estado, que havia apoiado Getúlio Vargas em 1930, se opôs a ele na Revolução Constitucionalista de 1932, quando São Paulo recorreu às armas para exigir uma Constituição. Presos e mandados para o exílio em Portugal, Julio de Mesquita Filho e Francisco Mesquita voltaram ao Brasil em 1934. Durante o Estado Novo, Julio de Mesquita Filho foi preso 17 vezes. Exilado outra vez em Lisboa e depois em Buenos Aires, estava na Argentina quando a Força Pública ocupou o jornal, em 25 de março de 1940.


O Estado passou cinco anos e meio sob intervenção, período que não se conta em sua história. Só foi devolvido em dezembro de 1945. Seis anos depois, o jornal se mudou para a Rua Major Quedinho, onde permaneceria até 1976. Foi ali que nasceram a Radio Eldorado, em 1958, o Jornal da Tarde, em 1966, e a Agência Estado, em 1970. Sempre no dia 4 de janeiro.


Com a morte de Julio de Mesquita Filho, em 1969, o jornalista Julio de Mesquita Neto o substituiu. O jornal não se dobrou diante da censura imposta pelo regime militar de 1964. Seus proprietários se recusaram a substituir as matérias cortadas pelos censores e, como não podiam deixar espaços em branco, publicaram repetidamente versos de Os Lusíadas, de Camões, no Estado e receitas culinárias no Jornal da Tarde. A censura só acabou em janeiro de 1975, quando o Estado comemorava seu centenário. Após a morte de Julio Neto, em 1996, Ruy Mesquita assumiu a direção.’


ESPN BRASIL
Andrea Vialli


Televisão reforça imagem com projeto de inclusão


‘Misto de documentário e projeto social, o programa Caravana do Esporte, produzido pelo canal ESPN Brasil e levado ao ar em 2005, revelou um novo modo de colocar o tema responsabilidade social em pauta na televisão. Ao longo do ano, o programa levou esporte e noções de cidadania a municípios pobres nas regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste do País, e chegou a atender 8 mil crianças e adolescentes de sete a 14 anos.


Agora, o canal de esportes está em busca de novos parceiros para repetir a iniciativa, que no ano passado foi apoiada por empresas como Peugeot, Vivo e TAM. A meta é atender 10 mil crianças e 1,5 mil professores da rede pública de ensino – que no ano passado receberam treinamento dos atletas de diferentes áreas que a Caravana levou às cidades, como Ana Moser, do vôlei, Lars Grael, do iatismo, Sócrates, do futebol, e Flávio Honorato, do judô.


No decorrer de 2005, a Caravana passou por nove localidades – Alcântara (MA), Soure (PA), Aldeia Kaarapó (MS), Boa Vista do Ramos (AM), Curuçá (BA), Formosa (GO), Palmeira dos Índios (AL), Caracol (PI) e Conceição do Coité (BA). Os locais foram escolhidos a partir de indicação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), com base no critério de baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). ‘Escolhemos municípios onde o Unicef já atuava com programas sociais, mas que não tinham o foco no esporte’, explica Rachel Mello, oficial de comunicação do Unicef.


A cada etapa, a Caravana permaneceu 10 dias na cidade escolhida, onde foram desenvolvidas atividades esportivas como basquete, vôlei, futebol, handebol, tênis e canoagem, voltadas às crianças e adolescentes do local.


O programa fez parcerias com as Secretarias de Educação municipais, de modo que os professores da rede pública de ensino receberam capacitação para inserir a prática esportiva no dia-a-dia das comunidades. ‘Era uma capacitação de 40 horas, teórica e prática. Os professores dessas regiões geralmente não têm acesso a esse tipo de formação’, explica Adriana Saldanha, diretora da Caravana do Esporte.


ESPORTE SOCIAL


Segundo Adriana, incluir o esporte no cotidiano das comunidades carentes traz muitos benefícios. ‘Trabalhamos conceitos como responsabilidade, saber ganhar e perder, até para reforçar a auto-estima das crianças, que é muito fragilizada.’ É a prática do ‘esporte social’, segundo ela, que não tem como principal objetivo formar atletas, mas ser um complemento à escola e ajudar a propagar noções de cidadania. Além do esporte, em cada município foram realizadas ações paralelas com foco em incentivo à leitura, palestras educativas sobre direitos da criança e preservação ambiental, além de aulas de higiene bucal.


Outro objetivo do programa foi mostrar que não são necessários vultosos investimentos em material e estrutura física para trabalhar com esportes no interior do País. No dia-a-dia da Caravana, o improviso criativo se revelou um ótimo aliado. Aulas de basquete e handebol foram dadas em campos de várzea, enquanto nas comunidades pesqueiras do rio Amazonas a mesma rede usada na pesca serviu para a prática do vôlei.


Segundo Rachel Mello, do Unicef, o programa ajudou ainda a fortalecer a identidade dos municípios visitados, ao mostrar os atrativos turísticos de cada localidade, como a cultura sertaneja, indígena e as belezas naturais. ‘É uma riqueza que também precisa ser reconhecida.’


O projeto da Caravana chegou a ser oferecido ao Ministério dos Esportes, no início da gestão Lula, em 2003. ‘Mas na época o governo não deu bola, e resolvemos fazer nós mesmos’, conta José Trajano, diretor de jornalismo da ESPN Brasil e um dos idealizadores da Caravana. O programa rendeu bons índices de audiência e foi um dos finalistas do Prêmio Esso de Jornalismo.


Agora, a direção do canal está em busca de parceiros para viabilizar a segunda temporada da Caravana do Esporte. O custo operacional do programa é da ordem de R$ 600 mil, segundo Adriana. ‘São três carros que cruzam o País e uma equipe de 20 pessoas em cada comunidade. Não é um projeto de alto custo, mas que no entanto traz enormes benefícios’, diz Adriana. ‘A meta é chegar a mais oito cidades indicadas pelo Unicef e atender 10 mil crianças.’’


ENTREVISTA / LIMA DUARTE
Patrícia Villalba


‘Interpreto o brasileiro’, diz Lima


‘A história pessoal de Lima Duarte é tão impressionante quanto a galeria de tipos que ele montou ao longo dos 60 anos de carreira que completou em 2005 no cinema, no teatro e, principalmente na TV, onde estão seus mais famosos personagens. E a maneira como ele conta sua trajetória é tão fantástica quanto a de um personagem de novela. Talvez ou também por isso, vira-e-mexe é ‘acusado’ de interpretar sempre o mesmo personagem. Às críticas desse tipo, sempre deu de ombros e assumiu uma posição que é, de fato, política: ‘Interpreto o brasileiro.’


Este brasileiro, sujeito que passou do meio rural para o urbano numa rapidez incrível de 40 anos, é o estudo de uma vida. É ele mesmo, combinação do show biz que tem um pé na roça. A mãe, América, era atriz de circo; o pai, Antônio, agricultor. Dela, ele herdou o gosto pelo palco e ganhou o nome artístico – o de batismo, Ariclenes Venâncio Martins, pareceu pouco apropriado a um futuro astro. ‘Use Lima Duarte, que é o nome do meu espírito de luz’, aconselhou a mãe, espírita.


Vindo de Desemboque, no interior de Minas Gerais, num caminhão de mangas aos 15 anos, Lima caiu nas graças de uma dona de bordel, Madame Paulette, que o levou para um teste no rádio. O dinheiro que a mãe lhe deu antes de ele sair de casa – uma nota de 500 mil réis – está até hoje presa no mural do seu apartamento em São Paulo, entre fotos, recortes de jornais e várias recordações. ‘Eu não gastei, garota! Passei o diabo, mas não gastei. E hoje eu sou da Globo, viu só?’


Depois de Paulette, vieram os vôos: primeiro, o sucesso como sonoplasta, depois as radionovelas, a inauguração da TV, a direção da revolucionária Beto Rockfeller (1968), O Bem-Amado e seu inesquecível Zeca Diabo (1973), a consagração no cinema com Sargento Getúlio (de Hermanno Penna, 1978), o Teatro de Arena, Sinhozinho Malta de Roque Santeiro (1985) e seu preferido, Sassá Mutema, de O Salvador da Pátria (1989). A idéia era comemorar os 60 anos de carreira e os 75 de vida no cinema – foram cinco filmes, um atrás do outro -, mas a TV que ajudou a fundar não vive sem ele. Lima começou 2005 com uma participação especial em Senhora do Destino e entra em 2006 como o turco Murat, de Belíssima. Muitas histórias, inúmeros detalhes e uma prosa boa, exclamativa, nesta entrevista ao Estado, em seu apartamento. ‘Eu não queria mais fazer novela, mas o Silvio de Abreu (o autor de ‘Belíssima’) jogou pesado: me disse que eu seria marido da Irene Ravache e amante da Fernanda Montenegro. Você acha que eu posso resistir?’


Você participou de vários filmes neste último ano e, não fosse Belíssima, comemoraria os 60 anos de carreira no cinema. Não é no mínimo curioso, para um ator tão consagrado na TV como você?


A verdade é que eu trabalhei muito no ano passado. Depois de Da Cor do Pecado (2004), fiz um filme lindo, Depois Daquele Baile (com previsão de estréia para abril). Tem direção do Roberto Bontempo, com a Irene Ravache e o Marcos Caruso. É tão bonitinho que parece filme argentino, sabe? Voltei a filmar em Portugal, com Manoel de Oliveira – com quem eu já havia feito Palavra e Utopia (2000), como Padre Antonio Vieira – e com Paulo Rocha, com quem fiz O Rio do Ouro (1998), que é um dos filmes de maior sucesso lá. Em Boleiros 2 (Ugo Giorgetti) sou um árbitro e, em A Ilha do Terrível Rapaterra, da Ariane Porto, um vilão.


Mas sua preferida continua sendo a televisão?


Sim. Eu sou o único homem vivo que estava lá na inauguração (em 18 de setembro de 1950). A Hebe Camargo deveria ter ido, ia cantar o Hino Nacional, mas foi namorar. No lugar dela, cantou a Lolita Rodrigues. Eu tinha 20 anos. E já trabalhava na Rádio Tupi desde 1946. Em 1950 veio a televisão e eu fui buscar os equipamentos em Santos. Nós subimos a Via Anchieta num caminhão, soltando foguetes. Um dia, estávamos jogando peteca – eu, o Ribeiro Filho, Walter Foster, a Hebe – e chegou o (Assis) Chateaubriand dizendo ‘o que é isso? vamos construir aqui a televisão’. Há, bem no nosso campo de peteca! Era ali no Sumaré, e levaram dois anos construindo. Um ano depois da inauguração já havia mil aparelhos no País. Você é de uma infância com ou sem televisão?


Com TV, totalmente televisiva.


Eu sou de uma infância sem televisão. Acho que este tema daria uma bela matéria de trabalho para sociólogos, antropólogos e até mesmo jornalistas. Eu era muito pobre, sem televisão, sem rádio nem nada. Deveriam conversar com todos estes velhos como eu, que estão passando do rural para o urbano em apenas 40 anos. Eu levo isso para a TV: meus personagens têm um pé na roça, são meio rurais, meio urbanos. E, ao interpretar, é com essa gente que eu falo. Os que foram jovens comigo, que passaram tantas revoluções, viveram os anos 60. Essa década maravilhosa eu passei no Teatro de Arena.


Você fez teatro depois de já consagrado na TV, um caminho incomum. Como foi?


Em 1961, o Chico de Assis, Augusto Boal e o Gianfrancesco Guarnieri vieram até a Tupi falar comigo. O Teatro de Arena queria fazer uma revolução cultural. Me convidaram para uma peça chamada O Testamento do Cangaceiro e queriam uma interpretação brasileira. Essa foi a grandeza do Teatro de Arena: pôr o brasileiro em cena, porque o teatro da época não tinha isso. Foram dez anos na fronteira, na trincheira mesmo. Eles diziam todos os dias: ‘Esta noite vai morrer um em cena.’ E era uma arena, afinal! A gente interpretava olhando para o público e tentando adivinhar de onde viria o tiro.


Não volta ao teatro?


Não, não gosto. Já trabalho muito com televisão.


Depois do Arena, você dirigiu Beto Rockfeller, a grande revolução das novelas. Foi uma conseqüência do seu trabalho no teatro?


O Beto Rockfeller é um produto do teatro, onde eu aprendi a construir bem um personagem. Em 1968, resolvemos fazer uma novela absolutamente nova, com a experiência que eu tinha vivido no Arena. Mas não poderia ser rural porque não tínhamos condições de reproduzir o ambiente, nem equipamento para ir para a roça. Então, a idéia principal de Beto Rockfeller é a de um sujeito que nasceu na Rua Teodoro Sampaio e queria fazer a vida na Rua Augusta, uma rua de elite. Transpor aqueles cinco ou seis quarteirões era mudar de meio social, e dar a alma por isso. Era uma bela novela. As novelas se dividem antes e depois de Beto Rockfeller. Antes, era tudo O Direito de Nascer (1964), que eu dirigi também. E depois de Beto, tudo virou Beto.


Quando você é chamado pela Globo você tem…


Eu tenho muito prestígio e faço o que eu quero. Mas quando me chamam, geralmente vou. O cotidiano dos estúdios é infernal – egos, vaidades, gritos.


É verdade que você foi cotado para ser vice de Mário Covas, na eleição presidencial de 1990?


Cotado? Não, fui convidado mesmo. Eu fazia O Salvador da Pátria. Sassá Mutema é o meu personagem preferido. Não tinha história, tinha apenas um personagem e a trajetória dele – era a minha história. Ela foi planejada para terminar na sexta-feira que precedia a eleição de domingo.


De caso pensado?


Sim, era o salvador da pátria. No meio da novela, a Globo começou a achar que era a história do Lula. Então, tivemos de mudar. Tive brigas homéricas . Era a história de um personagem que ia do nada ao entendimento. Quando estávamos gravando o último capítulo, os tucanos foram até o estúdio, me chamaram para uma reunião. Era um sábado, e estavam lá o José Serra, o Fernando Henrique Cardoso e o José Richa. O Richa disse que eu era o candidato. Não aceitei. Mas acho que a gente teria posto o Covas no segundo turno, não acha?


Por que você não foi pelo caminho da direção?


Porque eu sou muito bom ator. Nunca me deixaram. O Dias Gomes me disse uma vez: ‘Não sei se prefiro você como diretor ou como ator. Mas faz o Zeca Diabo por enquanto.’ E o poder da direção não me seduz. Os elencos são montados na base da cupinchagem, e isso não é possível. É tão desagradável. Como ator, eu reino sobre mim. Como diretor, você tem de reinar sobre todos, e não quero.


Eu Sou Assim


‘O poder da direção não me seduz. Os elencos são montados na base da cupinchagem, e isso não é possível. Como ator, eu reino sobre mim. Como diretor, você tem que reinar sobre todos, e eu não quero isso’


‘As novelas se dividem em antes e depois de Beto Rockfeller. Antes, tudo era Direito de Nascer. E depois de Beto, tudo virou Beto’


‘Eu tenho muito prestígio e faço o que quero. Mas quando a Globo me chama, geralmente eu vou’’


SBT
Cristina Padiglione


Silvio Santos aposta na frieza


‘Que colega de trabalho o quê? Silvio Santos tem feito cumprir ao pé da letra seu novo método de administrar uma empresa repleta de artistas – e ele próprio é um deles, mas, oras bolas, é o patrão ou não é? O novo princípio do Homem do Baú é: nada de falar diretamente com funcionários. Silvio agora faz questão de manter um interlocutor entre ele e seus artistas. Isso é princípio levado tão ao pé da letra que, dia desses, ao atender uma apresentadora do SBT, Senor Abravanel instalou uma terceira pessoa à mesa de reunião e assim conduziu a conversa com ela, até o fim, dirigindo-se a esse terceiro como se ele fosse um tradutor. Patrão e empregada pareciam falar línguas diferentes. ‘Diga a ela que…’, falava Silvio ao interlocutor. E ela: ‘Diga a ele que…’, respondia a apresentadora.


Foi uma cena bizarra, mas dizem que a funcionária em questão saiu feliz do encontro.


É nesse âmbito que as decisões têm sido tomadas no SBT. Nada de regalias, nada de afagos. Em outros tempos, Gugu Liberato já teria sido convocado a renovar contrato. O acordo vence este ano e paira no ar um certo suspense: adepto a apostas, Silvio Santos estaria jogando com a sorte de que o loirinho ficará no SBT, mesmo se a emissora não lhe oferecer cifras extras. Ao contrário: se for possível, a casa pretende até propor uma redução nos ganhos do apresentador, sob o pretexto de que ele já não fatura mais tudo aquilo que seu programa angariava na era anterior à farsa montada naquele palco torno do PCC.


Enquanto isso, a Record, que já não nutre toda essa paixão por Netinho, acena com portas abertas para Liberato. O problema é que a Record também não prima pelo afago em seu elenco e nisso (só nisso) tem inspirado Silvio Santos. Vale a máxima – Se quiser assim, ok, se não quiser, tem quem queira.’


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