‘Toni Marshall identifica o repórter do Estado. ‘Conversamos há cinco anos pelo telefone, quando Instituto de Beleza Vênus estreou no Brasil.’ Agora, em outra entrevista por telefone, de Paris, ela comenta a série de TV que retirou do próprio filme e que estréia hoje no Eurochannel, da TVA e DirecTV. Três vezes por semana e ao longo de 25 capítulos, o público da TV paga poderá acompanhar a série sobre quatro amigas cabeleireiras e/ou esteticistas. O filme, interpretado por grandes atrizes como Nathalie Baye e Bulle Ogier, era muito simpático. Maria de Medeiros é o nome mais conhecido no elenco da série, que, em todos os capítulos, apresenta sempre um convidado (ou convidada) especial. Anémone é um deles. O caso de Anthony Delon, o filho de Alain, é diferente. Embora apareça pouco, ele é citado desde o começo.
‘O Brasil será o primeiro país a ver a nossa série depois da França’, diz a diretora. Apesar de produzida pela rede franco-alemã Arté, Vênus & Apollo não estreou nem na Alemanha. ‘O trabalho de dublagem está sendo trabalhoso, mas acredito que, até o segundo semestre, estaremos no ar na Arté alemã.’ Na França, Vênus & Apollo foi muito bem recebida. O público gostou, os críticos elogiaram. ‘Não temos muito experiência de ver filmes virarem séries de televisão.’ Arté há tempos queria investir numa iniciativa desse tipo. O sucesso de Instituto de Beleza Vênus e a própria estrutura do trabalho de Toni Marshall – quatro personagens principais, narrativa episódica acompanhando cada uma delas – incentivou a rede a contatar a cineasta. ‘Era algo novo e a novidade, por princípio, me atrai. Achei que valeria investir.’
Foi um trabalho insano. ‘Escrevi o plano geral da série, fiz as mudanças necessárias nos personagens e situações e supervisionei toda a filmagem, além de realizar o último episódio.’ Ela chegou a pensar em dirigir todos os 25 capítulos, mas trombou com a questão do tempo. ‘O ritmo era muito intenso. A duração média da filmagem de cada episódio ficou em três dias e meio.’ Quando viu que não poderia fazer tudo, Toni resolveu convocar só diretoras, de cinema ou TV. ‘Temos muitas e bastante talentosas’, ela observa. Também não deu certo. ‘Nossas diretoras nunca fizeram nada parecido e o ritmo as assustou. Terminei tendo de chamar diretores, que têm mais prática de dirigir episódios e séries para televisão.’
Isto não prejudica feminismo, mesmo ‘light’, de Vênus & Apollo? ‘Nossa série, como o filme, é centrada nas personagens femininas, mas trata das relações entre homens e mulheres.’ Levando adiante a pesquisa que havia feito na época de Instituto de Beleza Vênus, ela verificou que os homens, cada vez mais, estão se preocupando com a aparência e freqüentam esses institutos. Que cuidados exigem? ‘Variados e, para dizer a verdade, tivemos de ter cuidado com os serviços que eles requisitam. Por exemplo, é muito comum os homens pedirem depilações íntimas, mas não seria de bom tom mostrarmos. Ficamos com depilações mais tradicionais, cuidados com a pele e os cabelos, bronzeamento.’ Por que as pessoas dão tanta importância à aparência? ‘Você pode até descobrir, depois, que uma pessoa feia ou malcuidada é legal, mas a primeira impressão será sempre dada pela aparência. Vivemos na era da imagem, na qual o exterior, infelizmente, predomina sobre o interior.’
A diretora artística de Vênus & Apollo gostaria de ter trazido Nathalie Baye e Bulle Ogier para o projeto, mas não deu. ‘Nathalie não quis se comprometer com um projeto de longa duração. Foi até bom, porque desvinculou a série do filme. Você não precisa ter visto o filme para seguir os capítulos.’ O problema de Bulle foi outro. ‘Ela não consegue decorar suas falas em pouco tempo’. E o tempo era fundamental. Tudo foi feito rapidamente, mas no capricho. Toni Marshall surpreende-se ao saber que cinco filmes franceses estão em cartaz em São Paulo. ‘Isso é mais do que apresentam muitas cidades da França.’ Gosta de saber que, no momento da entrevista, Agnès Jaoui está no Brasil, lançando Questão de Imagem. ‘O filme de Agnès e a série têm tudo a ver. Ela é talentosa. Escreve bem e possui grande capacidade de observação.’ Toni conta por que Agnès e ela escrevem os roteiros de seus filmes. ‘Não somos só nós. É uma tradição que vem da nouvelle vague. Escreveremos nossos filmes para que eles fiquem mais autorais.’’
REALITY SHOWS
‘Show de interrogatórios na TV é campeão de audiência no Iraque’, copyright O Estado de S. Paulo / The Guardian, 3/04/05
‘Faltam 20 minutos para o início do programa e os técnicos do estúdio estão inserindo a fita para a transmissão a Bagdá quando morteiros explodem lá fora. Quatro atingem o jardim e três, a rua, abrindo crateras, mas sem deixar vítimas. O pessoal retoma o trabalho, sem se abalar com o último ataque à emissora de televisão.
Exibido duas vezes por dia, Terrorismo nas Garras da Justiça é um popular reality show no Iraque, mas aqueles que disparam morteiros de 62 mm não gostam do programa e transformaram a sede em Mossul do canal estatal Al-Iraqiya no local possivelmente mais perigoso da radiodifusão. Com guaritas no portão, sacos de areia no teto e soldados americanos patrulhando os corredores, o prédio de dois andares lembra uma fortaleza, mas isso não tem impedido os insurgentes de bombardear, seqüestrar e assassinar os iraquianos que trabalham ali.
‘Acho que eles não gostam muito do programa’, diz o diretor da estação, Ghazi Faisal, de 52 anos, subestimando o problema de maneira monumental. A maioria dos funcionários fugiu, mas o chefe permanece, num misto de resignação, desafio e orgulho. Ele não pára de mastigar seu kebab quando os morteiros aterrissam. ‘Sou o homem mais procurado pelos terroristas em Mossul.’
Lançado em janeiro, o programa de uma hora mostra insurgentes capturados confessando uma variedade de supostos crimes e vícios, entre eles pornografia e consumo de álcool. Acuados e abatidos, eles admitem ter atacado as forças de segurança e estuprado e decapitado civis.
O impacto tem sido eletrizante. A Al-Iraqiya era outrora desprezada amplamente como uma insípida porta-voz do governo iraquiano; tudo isso mudou em janeiro, quando Mossul começou a transmitir as confissões para o estúdio principal em Bagdá, presenteando a rede com um sucesso nacional no horário nobre.
Os iraquianos ligam a televisão ao meio-dia e às 21horas para assistir às últimas confissões, que então são discutidas em lares, escritórios, táxis e cafés. Mistura do show de confissões americano Jerry Springer com o ousado boletim noturno britânico Newsnight, o programa é a propaganda mais eficaz do governo contra uma rebelião ainda intensa dois anos depois de a invasão liderada pelos EUA ter derrubado Saddam Hussein.
Funcionários americanos dizem não ter nenhum envolvimento na produção de Terrorismo nas Garras da Justiça, mas saúdam seu impacto. O presidente dos EUA, George W. Bush, tem aumentado os gastos com ‘diplomacia pública’ para conquistar corações e mentes estrangeiros em sua guerra ao terror.
As confissões televisionadas são invenção de um comandante da Brigada Lobo, um ramo do Ministério do Interior iraquiano. Conhecido apenas por seu apelido, Abul Walid, ele telefona a Faisal na Al-Iraqiya para que este envie uma equipe a sua delegacia quando há uma nova turma de prisioneiros pronta para ser filmados.
Visualmente, o resultado normalmente é grosseiro: uma fileira de homens de aparência comum em cadeiras alternando-se para responder a um inquisidor invisível. Mas o efeito é absolutamente convincente. Antes, os insurgentes só eram vistos mascarados, armados e postados diante de um refém trêmulo em vídeos que eles divulgavam na internet, guerreiros santos exalando poder e confiança.
A Al-Iraqiya vira o feitiço contra o feiticeiro, mostrando supostos rebeldes sem máscara, nervosos e humilhados enquanto descrevem terríveis assassinatos e, para o assombro geral, histórias de bebedeira, orgias homossexuais e pornografia.
Eles pegaram em armas não para combater a ocupação, nem pelo Islã, mas porque eram criminosos comuns que queriam dinheiro. Executar alguém rendia US$ 100, diz um homem. Ele praticou decapitando galinhas e ovelhas antes de passar para policiais e soldados.
Os críticos dizem que o programa viola a Convenção de Genebra e questionam a veracidade das afirmações de prisioneiros claramente intimidados. Às vezes, o inquisidor confessa no lugar dos prisioneiros e eles apenas acenam com a cabeça, ansiosos para concordar.
O Ministério do Interior diz que o programa foi uma medida de emergência e indica que ele logo será reavaliado. Enquanto isso, as forças de segurança se regozijam, creditando à mudança do humor público uma grande circulação de informações de inteligência.
Tende a haver uma reação especialmente forte depois de programas que confrontam supostos assassinos com parentes das vítimas. ‘Você queimou meu coração!’, gritou uma mulher cujo filho foi assassinado, golpeando o peito de um grande homem com a barba por fazer. ‘Deus queime seu coração! Que tipo de religião você tem?’ Ele olhava para os pés, evitando os olhos da mulher.
Ativistas pró-direitos humanos temem que o programa marque um retorno às humilhações públicas e confissões forçadas no estilo de Saddam, que minam os julgamentos subseqüentes. Outros reclamam que uma insurgência complexa que inclui radicais islâmicos, ex-seguidores do regime e nacionalistas árabes sunitas está sendo retratada como nada mais que uma coalizão de ladrões desprezíveis, uma caricatura que poderia aprofundar tensões religiosas.
Xiitas e curdos tendem a ser fãs. ‘Antes, esses homens eram como fantasmas. Agora vemos seus rostos e percebemos que eles são criminosos e beberrões de nossa vizinhança. Queremos vê-los enforcados’, diz Ahmad, de 29 anos, um intérprete curdo para as forças dos EUA em Mossul.
Não há números para confirmar a aparente popularidade. Tampouco existe confirmação independente de que os homens são e fizeram o que dizem que são e fizeram. Alguns têm os rostos inchados e arranhados e os modos robóticos de quem foi espancado e instruído por interrogadores policiais fora do alcance das câmeras.
Sem dúvida, os rebeldes genuínos detestam o programa, como provam os ataques com morteiros. ‘Isto realmente os assusta, abala sua segurança e elimina seu anonimato’, diz o capitão Jason Hogan, oficial de inteligência no batalhão americano encarregado de proteger a estação regional da Al-Iraqiya em Mossul.
Um labirinto de vielas cortado pelo Rio Tigre, Mossul é a terceira cidade iraquiana e um caldeirão da insurgência; assim como a popularidade do programa, crescem as ameaças contra funcionários da emissora. Avisos colocados em mesquitas e distribuídos em panfletos têm mantido em casa cerca de 50 dos 60 empregados. No mês passado, homens mascarados seqüestraram uma locutora, Raeda Wazzan; segundo seu marido, ela foi encontrada morta uma semana depois com quatro balas na cabeça. Homens armados também tentaram, sem sucesso, seqüestrar um produtor.
Os estúdios têm vários colchões para aqueles que preferem dormir no trabalho a enfrentar a arriscada jornada de volta para casa. Três funcionários foram levemente feridos quando um morteiro atingiu a entrada principal, mas o maior medo é do seqüestro. Não querem ter o nome divulgado nem ser fotografados.
Os que ainda aparecem para trabalhar dizem fazê-lo pelo salário mensal – mais de US$ 400 – e para desafiar os insurgentes. Khalid Abdulla, de 42 anos, é um comediante e roteirista que agora atua também como porteiro, faxineiro, preparador do chá e eletricista: ‘Somos cinco fazendo o trabalho de 55.’
Além de atuar, seu colega Mohammad Haddad, de 32 anos, produz e dirige o programa da dupla, uma mistura de bate-papo com cenas curtas cada vez mais dedicada a criticar os insurgentes. Seus programas não têm criticado a ocupação, embora uma patrulha americana tenha atirado e matado por engano o irmão de Abdulla em dezembro.
Não é segredo que a estação de TV conta com a generosidade de Washington. Construída em 1969 para transmitir entretenimento leve e propaganda do regime baathista, a rede de Mossul foi bombardeada por aviões aliados na Guerra do Golfo e novamente em 1999.
No caos da invasão de março de 2003, a estação foi saqueada, mas reabriu meses depois como parte da Rede de Mídia Iraquiana, financiada pelos EUA e operada a partir da Zona Verde de Bagdá, pesadamente fortificada.
Os poucos técnicos e jornalistas que ainda vão trabalhar na Al-Iraqiya em Mossul são recebidos por uma segurança similar: emaranhados de arame farpado, barreiras de concreto e veículos blindados de 23 toneladas chamados Strykers estacionados no gramado. Uma guarnição de 95 soldados iraquianos é apoiada por um pelotão de soldados de infantaria dos EUA que passam o tempo livre na cantina jogando dominó e praticando primeiros socorros.
Um técnico disse: ‘Ficamos constrangidos por ter os americanos aqui, mas isso nos faz sentir mais seguros.’’
MANO A MANO
‘RedeTV! estréia série com negros’, copyright O Estado de S. Paulo, 2/04/05
‘Estréia amanhã, às 22h15 na RedeTV! o seriado Mano a Mano, comédia de situação que traz Leandro Firmino – o Zé Pequeno, de Cidade de Deus – no elenco. A série é uma co-produção da emissora com a produtora americana Picant Pictures e parte da trajetória de Marcos Felipe Branco de Barros III (Rafael Maia), jovem milionário que perde o pai e toda sua fortuna. Sem alternativa, ele vai morar na favela, onde descobre que tem um irmão, Robinho (Silvio Guindane). O elenco de Mano a Mano é basicamente formado por atores negros.
Para conviverem, os dois terão de aprender a aceitar as diferenças. Quem também vive na favela é o encrenqueiro Jonas (Leandro Firmino, o inesquecível Zé Pequeno do filme Cidade de Deus), melhor amigo de Robinho.
As situações cômicas extraídas da série vêm justamente das diferenças entre esses dois irmãos: um criado em ambiente de classe média alta, e outro, na favela. Apesar de se estranharem no começo, logo se tornarão grandes amigos.
A produção, com direção de Debbie Allen, teve cenas gravadas no ano passado em morros do Rio de Janeiro e nos estúdios que eram de Renato Aragão (agora são da Record) e teve seus três primeiros capítulos totalmente bancados pela Picant.
Além de Mano a Mano, que tem 12 capítulos, a Picant Pictures tenta emplacar entre os canais brasileiros outros dois projetos: o seriado Milho Verde e Jornal Feliz. A primeira conta a história de um jovem urbano que vai viver com os tios em uma fazenda, e Jornal Feliz narra a saga de um jovem que vira celebridade da noite para o dia.’
MAR SEM FIM
‘‘Mar sem Fim’ mostra vida caiçara’, copyright O Estado de S. Paulo, 1/04/05
‘A bordo de um veleiro, uma equipe percorre a costa brasileira, do Oiapoque ao Chuí, para mostrar as belezas naturais e a situação da população caiçara, sua cultura e seu modo de vida na série Mar sem Fim, que estréia no domingo, às 17h30, na TV Cultura.
O projeto tem como objetivo mostrar o litoral a partir do ponto de vista do continente, uma perspectiva inovadora. Dessa forma, o espectador pode conhecer uma nova paisagem e a realidade pouco mostrada pelas tevês, como ilhas e baías vistas apenas pela ótica de quem está em terra. De veleiro é possível ir a lugares de difícil acesso do litoral – em alguns pontos é impossível chegar por terra – e observar em detalhes as características da flora e fauna locais. ‘A intenção é que o espectador se sinta dentro do veleiro e tenha o panorama do continente, com toda a sua exuberância’, afirma o diretor da série, Fernando Sampaio.
Segundo João Lara Mesquita – navegador experiente e idealizador do projeto -, muitos documentários são exibidos, principalmente pelas redes de televisão fechadas, sobre lugares exóticos, culturas de diferentes países, porém pouco ou quase nada sobre o Brasil. ‘O documentário dá um forte peso às questões culturais e históricas do nosso país, além de mostrar raridades de nosso ecossistema’, explica. ‘Desde que saí da Rádio Eldorado tenho me dedicado ao projeto e, quando estava pronto, apresentei-o à TV Cultura, que se interessou de imediato.’ Além da exibição da série, consta do projeto a divulgação de boletins na Rádio Cultura e no site (www.projetomarsemfim.com.br). Mar sem Fim foi viabilizado graças ao patrocínio da Semp Toshiba e da Porto Seguro Seguros.
Durante as gravações, um dos aspectos que mais impressionaram o idealizador da série foi a situação de abandono da população caiçara pelo poder público. ‘São, na sua maioria, descendentes de negros, índios e portugueses, excluídos e marginalizados. Pessoas que ficaram pelo litoral, oriundos do período das navegações, comunidades que vivem sem luz, sem educação, mas que mantêm vivas as suas tradições. Encontramos, por exemplo, em uma ilha no Maranhão, um grupo de sebastianistas, pescadores albinos que aguardam a volta de d. Sebastião.’
O grupo também é composto pela repórter Paulina Chamorro, que ao chegar aos lugarejos observa o cotidiano, os costumes locais. Alguns lugares são tão isolados, distantes da mídia, que conservam características e organização originais, tais como a pesca artesanal e a construção de pequenas embarcações. Em outros, a equipe se deparou com a ausência absoluta de assistência do Estado, terras sem lei, com caboclos relegados à própria sorte, à mercê de madeireiros ilegais e traficantes de animais. ‘São pessoas que poderiam trabalhar para o governo e contribuir para a preservação ambiental como fiscais. É impressionante, uma região tão rica, com um povo tão pobre como no Pará, por exemplo’, observa Mesquita.
Para Paulina, especialista em meio ambiente, um dos momentos marcantes da aventura foi em Afuá, na Ilha de Marajó, quando encontrou um homem construindo uma canoa. ‘Marcílio criou os filhos fazendo vários tipos de embarcações na Amazônia, porém, com a chegada dos grandes barcos, a pesca diminuiu e, com isso, os empregos também. Acompanhei a decepção dele, pois os filhos não quiseram seguir o seu ofício’, diz e completa: ‘Nessas viagens, as pessoas que encontramos e as riquezas culturais são impressionantes.’’