Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Marcelo Bartolomei

‘A televisão brasileira está de olho no mercado internacional. Cada vez mais, as produções utilizam aspectos locais e de regionalidade como características que possam interessar ao público-alvo do exterior, além de adequar seus conteúdos a uma certa universalização de temas.


O mercado de vendas de produtos brasileiros está em alta entre produtoras e emissoras do exterior. Ainda neste ano, o país deve ser tema de uma grande feira internacional de TV que acontece em outubro.


A Rede Globo, que desde 1973 comercializa suas novelas -a primeira foi ‘O Bem Amado’, exibida no Uruguai-, domina o mercado entre as TVs abertas. Exibiu ‘Terra Nostra’, seu produto de maior sucesso, em 84 países e ainda tem expectativas de vender mais, segundo Ricardo Scalamandré, 53, diretor da divisão de negócios internacionais da emissora. ‘As nossas novelas têm qualidade e isso vende’, diz.


Concorrência


A Globo não está mais sozinha. Além das produtoras independentes (leia texto abaixo), outras emissoras também querem brigar por uma fatia do bolo. É o caso da Record, que, depois de obter sucesso com o remake de ‘A Escrava Isaura’, vendeu a novela para Portugal, Venezuela e Equador e deve fechar com Chile, Aruba, Índia, Colômbia, Paraguai, Uruguai e Argentina.


A Rede TV!, surpreendentemente, também entrou no mercado internacional. O azarão Amílcare Dallevo Jr., 47, presidente da emissora, comemora a venda do ‘Teste de Fidelidade’, apresentado pelo humorista João Kléber, para Portugal. ‘Na realidade, a gente nunca ligou muito para o mercado internacional porque estamos arrumando a casa internamente, mas recebemos uma série de convites para comercializar fora do país. Semana passada fizemos uma reunião e decidimos estruturar uma área internacional para comercializar nossos outros produtos’, afirma.


João Kléber já é sucesso em Portugal -segundo Dallevo Jr., na semana passada, o programa teve um share (participação de televisores ligados no canal) de 66%. O programa foi vendido a 10 mil (cerca de R$ 31 mil), quase metade do custo de produção aqui.


Agora, a atração é negociada com a Itália. O plano é vender ainda o sitcom infanto-juvenil ‘Vila Maluca’ e o humorístico ‘Pânico na TV’.


Conteúdo


De acordo com a Globo, o modelo de negócios que a emissora quer seguir é a produção de novelas internacionais. Foi o que aconteceu com ‘Vale Tudo’, que teve uma versão espanhola produzida no Brasil para a Telemundo.


Segundo ele, a Globo já optou por modelos de co-produção com Portugal e Itália. Ele cita ‘Os Maias’ e ‘Esperança’, ambos com gravações específicas nos países e com participação de atores estrangeiros. ‘A influência estrangeira no conteúdo da novela é zero, como foi feito em ‘Esperança’. Quando a gente fala em produção, estamos focando o mercado brasileiro. Tudo o que pudermos fazer para melhorar a venda internacional sem prejudicar o mercado brasileiro, faremos.’


Ele nega que a atual ‘América’ seja feita sob medida para a venda internacional. ‘A gente recebe ligações perguntando quando teremos o produto para venda, dublado. Provavelmente, ela será lançada somente no segundo semestre do ano que vem no mercado internacional. Não é uma grande expectativa, pois o tema é quente somente para os EUA’, diz.’


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‘Independente vê exterior como oportunidade’, copyright Folha de S. Paulo, 15/05/05


‘Sufocados pela produção própria da TV aberta brasileira, produtoras independentes enxergam o mercado internacional como oportunidade de escoamento de seus programas e difusão da cultura brasileira no mundo.


Segundo representantes dos produtores, não há espaço nas grades das emissoras de TV para os independentes, mercado em expansão nos últimos anos. ‘O Brasil acordou para o mercado internacional’, diz Marco Altberg, 51, presidente da ABPI-TV (Associação Brasileira dos Produtores Independentes de TV).


‘O nosso modelo de televisão comercial é diferente dos demais países. Aqui, as TVs não são emissoras, mas se construíram como produtoras. Neste sentido, a experiência internacional é maravilhosa, pois grande parte da grade das emissoras internacionais é de produção independente’, afirma.


‘Queremos colocar o produto independente no mapa, seja por reconhecimento e também por qualidade, além de criar oportunidades de co-produção aqui e lá fora.’


Para atender à demanda, foi criada a associação, que reúne produtoras que desenvolvem trabalhos para a televisão, mas não têm muitas opções de onde exibi-los. A ABPI-TV promove encontros, capacitação e fomento aos produtos brasileiros em feiras internacionais.


Em abril passado, produtores brasileiros participaram do MipTV (Mercado Internacional de Programas de Televisão), na França, onde expuseram seus projetos entre os de 14 mil empresas, com apoio da Secretaria do Audiovisual do MinC (Ministério da Cultura).


Fernando Dias, 35, diretor-executivo da Grifa e vice-presidente da ABPI-TV, diz que o país começa a engrenar num modelo de negócios parecido com o do exterior, o de co-produções para a TV internacional.


‘Existe uma procura por conteúdos brasileiros. Os mercados lá fora têm mecanismos para promover e fomentar a co-produção internacional, com subsídios e incentivos aos produtores’, afirma Dias.


Sua produtora prepara duas séries de documentários com a TV francesa, uma delas sobre cidades-fantasmas.


Célia Catunda, da TV Pingüim Animation, engrossa o coro dos insatisfeitos com as emissoras de televisão brasileiras. ‘O mercado de animação praticamente inexiste. Tive mais facilidade de vender fora do Brasil do que aqui, onde as emissoras estão muito fechadas’, afirma.


Atualmente, sua produtora -há 15 anos no mercado com trabalhos para emissoras como Cultura, TVE, TV Escola, Canal Futura e Globo- finaliza um longa-metragem espanhol de animação, inicia outro e projeta uma série de 26 capítulos sobre um personagem criado para a internet. ‘O custo do Brasil é menor’, diz, justificando a entrada no mercado internacional com apoio da ABPI-TV.


Roberto Dávila, 41, da Teleimage/Moonshot, também se entusiasma com a co-produção internacional. Ele está em Cannes (França) nesta semana para acompanhar o festival de cinema e fechar três co-produções. ‘O Brasil está na moda e é um país favorável à produção’, diz.


Sua empresa vendeu a novela ‘Metamorphoses’, exibida no Brasil pela Record, para o mercado asiático. ‘Temos muito trabalho pela frente, especialmente em co-produção’, garante Juliana Algañara, 31, produtora-executiva da Teleimage/Moonshot. Segundo ela, serão produzidos 30 telefilmes, uma série de 13 episódios, uma série sobre turismo e outra de desenhos animados, além de dois documentários sobre a história do Brasil, em parceria com países de língua espanhola.


Amílcare Dallevo Jr., presidente da Rede TV!, nega que a televisão brasileira restrinja o espaço às produtoras independentes. ‘Se o programa for bom, ele tem espaço’, afirma.’




AMÉRICA
Daniel Castro


‘Caubói de ‘América’ apanha da língua’, copyright Folha de S. Paulo, 15/05/05


‘Uma das estratégias da Globo para chamar a atenção de suas novelas no exterior é usar atores estrangeiros nas tramas. Primeiro foram os portugueses. As novelas da Globo passam antes em Portugal, depois nos demais países. A Globo já foi sócia da emissora portuguesa SIC, com quem tem acordo de exclusividade no país.


A novidade nos corredores da Globo é um ator norte-americano, que até setembro do ano passado falava pouquíssimas palavras em língua portuguesa. O texano Lucas Babin, 25, está no elenco de ‘América’ não apenas porque é verossímil peões norte-americanos nos rodeios brasileiros mas também pelo desejo da Globo de tornar a novela um grande sucesso nos Estados Unidos.


Nos EUA, a Globo tem parceria com a rede hispânica Telemundo, que exibe suas novelas dubladas em espanhol. ‘O Clone’ (2001/02) foi um fenômeno de audiência na Telemundo. Autora de ‘O Clone’, Glória Perez quer repetir o sucesso com ‘América’, que trata de tema de interesse dos hispânicos: a imigração.


Intérprete do peão Nick, Babin tem sido alvo de críticas de telespectadores, que não conseguem entender direito o que ele fala. O ator confessa que já sofreu muito com a língua. Entre setembro e janeiro, estudou português quatro horas por dia. Vai voltar a ter aulas.


‘Português é muito mais complicado do que inglês. Gostaria que o povo tivesse paciência, porque quero aprender mais e falar muito bem. Foi difícil no começo. Agora estou fazendo cenas com mais facilidade’, diz Babin.


O ator afirma que a maior dificuldade é entender o que se fala em português. ‘É mais fácil falar’, conta. Babin também sofreu para entender o personagem, o que talvez justifique sua atuação ‘sofrível’.


‘Eu gostaria de saber mais [sobre o personagem], mas não sei. Ele prometeu dar dinheiro para Sol [Deborah Secco] pagar sua viagem para os Estados Unidos e não deu. Agora sei que ele é um filho da mãe. Acho interessante, estou aprendendo o personagem e interpretando melhor’, afirma.


Babin confessa que não é muito conhecido nos Estados Unidos. Fez alguns filmes obscuros e uma ponta no seriado ‘Sex and the City’, em que era paquerado por um personagem homossexual. ‘Eu espero que mais gente assista a ‘América’ nos Estados Unidos. Acho que o assunto imigração é interessante’, diz.


O americano foi parar no elenco de ‘América’ por acaso. No ano passado, viajou para conhecer o Rio e aproveitou para fazer um desfile (ele era modelo) na Fashion Rio. Lá, conheceu o jornalista Alex Lerner, que o apresentou a Glória Perez e Jayme Monjardim (então diretor-geral da novela). Fez testes e foi aprovado.


‘Fiquei muito entusiasmado. Achava que poderia aprender com atores brasileiros’, lembra. Até então, tinha pouco contato com a teledramaturgia brasileira. Foi apresentado a ela rapidamente, por uma amiga brasileira que mora em Los Angeles, que lhe mostrou uma fita VHS de ‘O Clone’.


‘Eu assisti um pouco, vi o Murilo Benício. Nunca pensei que estaria trabalhando numa novela brasileira. Quando me vi numa, pensei: ‘I can’t believe’ [Não acredito]’, diz.


Babin nunca foi caubói, como seu personagem, apesar de ter crescido em uma cidade repleta deles. Ele acha estranho o fato de personagens americanos de ‘América’ falarem em português, e não em inglês. ‘Poderia ter mais inglês. As cenas no México tiveram muito espanhol’, diz.


Galã português


Outro estrangeiro atualmente no ar na Globo é o português Ricardo Pereira, 25, que interpreta o bom-caráter Daniel Cascaes em ‘Como uma Onda’, novela das seis. Na produção, contracena com a também lusitana Joana Solnado.


Pereira é o primeiro estrangeiro a fazer um protagonista em novelas da Globo. Seu trabalho tem convencido diretores da emissora. Seus olhos verdes têm arrancado suspiros das telespectadoras. Ele já chegou a ser um dos atores que mais recebem cartas na emissora.


O ator já fez várias novelas em Portugal, mas nenhuma delas lhe deu o espaço de ‘Como uma Onda’. Diz que a produção o deixou mais conhecido em seu próprio país. ‘A novela está fazendo muito sucesso em Portugal’, conta.


Pereira foi parar na Globo por meio de testes. ‘Já era para eu ter feito novela aqui. Novelas brasileiras com atores portugueses fazem mais sucesso lá fora’, diz.


Assim como Lucas Babin, Ricardo Pereira quer fazer outros trabalhos no Brasil, mas não pretende se fixar aqui. ‘Quero experimentar outros mercados, como os Estados Unidos. Espanha e França eu já fiz.’’




SAIA JUSTA
Nina Lemos


‘Luana Piovani rouba a cena em ‘Saia Justa’’, copyright Folha de S. Paulo, 15/05/05


‘‘A Luana Piovani é ou não é mal-humorada?’ As especulações sobre as alterações do estado de espírito da atriz foram o principal assunto do evento de lançamento da nova fase do programa ‘Saia Justa’, que aconteceu na última quarta, em SP. Piovani é uma das novas ‘saias’, termo adotado pela direção do GNT para designar as apresentadoras do programa de maior audiência do canal, que reestréia na próxima quarta, às 22h30, com novas integrantes, após cinco meses fora do ar.


As considerações sobre o humor de Piovani fizeram com que outra nova apresentadora do canal, a ex-modelo e atriz Betty Lago, tomasse as dores da colega. ‘Como assim, ela é mal-humorada? Jornalista fala umas coisas e não explica.’ A pergunta era retórica, mas uma repórter resolveu rebater: ‘Luana, você é mal-humorada, sim. Você já me tratou mal quando estava entrando na Ilha de Caras e também em uma festa. Hoje foi a primeira vez que você sorriu para mim’. ‘De onde você é, meu amor?’, perguntou Piovani. ‘Do ‘Leão Lobo’.’ ‘Ah, do ‘Leão Lobo’? Então tá, né?’, devolveu uma irônica Piovani.


Nada mais adequado do que discussão de relacionamento entre entrevistada e repórter em uma entrevista coletiva para lançar um programa feminino.


Tudo no lançamento do programa fez o estilo ‘mulherzinha’. O cenário escolhido foi o sofisticado bar Baretto, no hotel Fasano, nos Jardins (zona oeste de São Paulo). Com atraso de cerca de uma hora, as novas ‘saias’ entraram em fila, maquiadas, de salto alto. São elas, além de Lago e Piovani, a filósofa Márcia Tiburi, Mônica Waldvogel (a única que sobrou do programa antigo) e a escritora Gisela Rao, que terá uma coluna de dicas de sexo.


Foi difícil tirar o foco de Piovani. Inclusive porque jornalistas insistiam em fazer perguntas do estilo: ‘O que significa aquilo que você escreveu no seu blog?’. Ela disse que não iria responder e preferiu falar do programa. ‘Esse era o emprego que eu estava procurando. Estava desempregada. Fiz uma aparição no programa e fiquei implorando para ser contratada. Fiz cara de cachorro abandonado e acho que funcionou.’


A participação dela no programa, em 2003, foi explosiva. A atriz engatou uma discussão com a polêmica Fernanda Young. As duas se exaltaram, e Piovani acabou falando (alto) a frase: ‘Cara, vocês são muito em cima do muro’. ‘O que aconteceu foi que divergimos. Ela tinha uma opinião, eu tinha outra. O clima foi ficando quente, a gente é mulher, aquela coisa. Não foi grave. A gente saiu numa boa. Adoro a Fernanda e tenho planos de trabalhar com ela’, respondeu, nada mal-humorada.


Tirando o foco da musa, descobrimos que a filósofa Márcia Tiburi não gosta do ‘rótulo de filósofa’. ‘Esses rótulos, né? Não vou dar aula de filosofia, além de filósofa tenho uma filha, sei cozinhar’, disse, não explicando o que uma professora de estética e metafísica vai acrescentar a um programa sobre mulheres.


As cinco parecem estar ‘superamigas’. Riem juntas. Trocam segredinhos. Bom sinal, pelo visto. Segundo a diretora do GNT, Letícia Muhama, a amizade entre as antigas integrantes do ‘Saia Justa’ era uma das coisas mais importantes do programa. ‘Elas ficaram muito amigas por conta do trabalho, se viam toda semana. E, com esse grupo, parece que vai acontecer a mesma coisa’, disse.


Ela parece ter razão. Inclusive porque elas já se defendem. ‘Eu falava muito. Agora estou tentando me controlar. É que trabalho desde muito jovem com o microfone na mão. Agora tenho 29 anos e estou aprendendo a ouvir. Espero que essas mulheres acrescentem coisas na minha vida’, disse Piovani. As colegas, na hora, demonstraram solidariedade: ‘Luana, você também vai acrescentar’.


As cinco também já aprenderam a rir uma das piadas das outras. ‘Vou mostrar coisas no meu quadro tipo como esconder da sua empregada evangélica o seu vibrador’, diz Gisela Rao. ‘A Gisela tem uns números, ela parece um Joemir Betting do sexo’, completa Mônica Waldvogel.


Depois de uma hora e meia de entrevista, as cinco posam abraçadas. E parecem, de fato, uma banda pop feminina. Ser uma ‘saia’ é sinônimo de pop star.’


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‘‘Talk show’ muda de cenário e de conteúdo’, copyright Folha de S. Paulo, 15/05/05


‘A nova fase do ‘Saia Justa’ é como se fosse um novo programa. ‘As únicas coisas que permanecem iguais são o nome e a Mônica [Waldvogel]’, explica Letícia Muhama, diretora do canal pago GNT.


O cenário foi refeito pela cenógrafa Daniela Thomas, que se inspirou na forma de um útero. ‘Temos também uma grua que faz uns enquadramentos com os quais brincamos, chamando de planos penetrantes’, disse.


De acordo com Waldvogel, que, além de apresentadora, é uma das idealizadoras do programa, uma coisa continua a mesma. ‘O programa literalmente é um ‘talk show’, e a nossa conversa permanece a atração principal.’ Segundo Muhama, a principal qualidade do novo time de apresentadoras é a diversidade.


O ‘Saia Justa’ estreou em 2002 com Waldvogel, a atriz Marisa Orth, a escritora Fernanda Young e a cantora Rita Lee. No ano passado, esta última deixou o programa e passou a ser substituída por convidadas eventuais.


A cantora Marina Lima chegou a ser uma das integrantes do programa, que ficou fora do ar por cinco meses para estrear em novo formato.


‘Não é fácil escolher as participantes de um programa como este. A conversa entre as apresentadoras precisa fluir bem’, diz Waldvogel.


Novidades


Entre os novos quadros do programa, está a coluna de sexo de Gisela Rao. E também um chamado ‘Saia no Banheiro’, que vai mostrar flagras de conversas femininas.


Outro quadro novo é o ‘Lado B’, em que os homens tirarão suas dúvidas sobre o universo feminino. ‘Isso não significa que um homem vai ter uma cadeira e sentar com a gente no cenário’, brinca Waldvogel.


Também está nos planos do canal de TV por assinatura que o programa tenha maior participação do público por meio de reportagens externas.’




A LUA ME DISSE
Bia Abramo


‘Falabella e Talma operam milagre às sete’, copyright Folha de S. Paulo, 15/05/05


‘Enquanto ‘América’ afunda num mar de cenas patéticas, na novela das sete tudo vai bem: Miguel Falabella e Roberto Talma estão conseguindo um pequeno milagre com ‘A Lua Me Disse’. Vez por outra, uma novela consegue criar e ainda cair no gosto do público. Sem fazer concessões estrambóticas, sem humilhar a inteligência do público, a novela vem mantendo índices de audiência em torno dos 34 pontos, o que é considerado bom para o horário.


Esse feito de ‘A Lua Me Disse’ evoca, claro, a fase de ouro de Silvio de Abreu no mesmo horário, com ‘Guerra dos Sexos’ e ‘Sassaricando’. Com ingredientes parecidos aos usados por Falabella, Abreu marcou época com novelas de humor ao mesmo tempo inteligente e escrachado, tramas movimentadas, personagens memoráveis (semanas atrás, na festa da Globo, escondida entre uma série de obviedades, uma das imagens mais divertidas era a de Fernanda Montenegro e Paulo Autran numa cena de pastelão em ‘Guerra dos Sexos’).


Não é só na receita que Falabella e sua co-roteirista Maria Carmem Barbosa se aproximam de Abreu em ‘A Lua Me Disse’. Há também uma espécie de identidade de procedimentos, ou seja, a manipulação consciente das convenções do gênero, que ora são respeitadas e aparecem em sua forma mais eficiente; ora são anarquizadas. O espectador, ao mesmo tempo em que pode usufruir do prazer do previsível, é também surpreendido e até afrontado. Claro que tudo no âmbito modesto do entretenimento televisivo, mas, ainda assim, bem mais do que se espera das novelas atuais, conferindo à obra um ar quase ‘autoral’.


Em ‘A Lua Me Disse’, essa autoria, ainda que seja quase uma impropriedade pensar nesse termo em relação à novela, passa por um equilíbrio muito delicado entre o humor e o escracho -há graça, há piada e há um sentido do dramático como há tempos não se via em novelas. Mais do que tudo, até agora a novela tem conseguido manter uma notável consistência narrativa -os personagens movem-se de acordo com um roteiro bem definido na cabeça dos autores, há sentido de passagem de tempo, continuidade etc. Em uma palavra, só a preocupação e o respeito pela dramaturgia exibidos em ‘A Lua Me Disse’ fariam desta a melhor novela no ar nos últimos tempos.


Mas há mais. O elenco parece bem à vontade para trabalhar nesse diapasão entre a comédia e o dramalhão. Assim, Débora Bloch e Aracy Balabanian fazem uma ótima dupla de peruas-parasitas; Arlete Salles como a suburbana bem-sucedida também funciona, Wagner Moura e Marcos Pasquim de galãs de araque são interessantes; e a própria Adriana Esteves tem conseguido fazer de sua ‘neutralidade’ uma espécie de virtude.


Resta torcer para que Falabella & equipe mantenham a coragem de nadar contra a corrente da deterioração da dramaturgia, caso a audiência oscile.’