‘Ainda que o conflito de valores seja natural à democracia, nossa Constituição federal é muito clara ao repudiar a censura. Nos últimos dias, os brasileiros foram de alguma forma afetados por duas decisões judiciais em que seu direito à informação foi desproporcionalmente sacrificado, a pretexto de se proteger a imagem e a honra das pessoas.
Nossa Constituição federal, por ter sido redigida logo após a saída de um período autoritário, foi ampla e taxativa ao enunciar os direitos fundamentais que devem merecer especial proteção em nosso Estado de Direito.
O artigo 5.º assegurou a livre manifestação do pensamento e o amplo acesso à informação, mas também garantiu a inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas, o direito de resposta e a indenização por danos decorrentes do exercício abusivo do direito, desde que proporcionais ao agravo sofrido pelo lesado.
A liberdade de expressão é uma das primeiras e mais fundamentais conquistas em face do absolutismo monárquico. Desde Baruch de Espinoza – que reclamava fosse respeitada a liberdade de ‘cada um pensar o que quiser, e de dizer aquilo que pensar’ – pensadores, políticos e artistas já pugnavam pela possibilidade de se exprimirem sem censura. Foi apenas durante as revoluções liberais, contudo, que tal direito foi reconhecido e garantido àqueles que quiserem manifestar com liberdade suas opiniões, inclusive contra o Estado.
Durante o século 20, os textos normativos, das Constituições às declarações de direitos, passaram a se preocupar também com o direito à informação. A proteção ao emissor e às idéias foi estendida aos destinatários das mensagens livremente expressas. O Estado de Bem-Estar Social ampliou sua tutela sobre a comunicação: além de se garantir a livre circulação de informações, buscou-se assegurar que as de interesse público alcançassem os seus destinatários de forma plural, com conteúdo verossímil e verificável.
A plena vigência do regime democrático depende diretamente destas duas garantias: por um lado, a liberdade de expressão, para que nenhuma espécie de arbítrio ou domínio se imponha sobre aqueles que queiram exprimir suas idéias; por outro, o livre acesso às informações, para que a sociedade possa opinar e participar do processo decisório com diferentes fontes de informação que assegurem uma ampla visão dos complexos problemas da sociedade contemporânea.
A liberdade de expressão pode, no entanto, dar ensejo a abusos. No Estado de Direito, o único Poder da República que pode interpretar determinada notícia como abuso ao direito da inviolabilidade da imagem, da honra, da dignidade ou da privacidade e determinar uma correção ou reparação, normalmente a posteriori, é o Judiciário.
No entanto, as decisões judiciais sobre as informações contidas na última obra do jornalista Fernando Moraes e no noticiário sobre a recente crise política do Estado de Rondônia foram tomadas a priori, restringindo o direito do cidadão à informação.
Em minha opinião pessoal, ‘sub censura’, não deveria ter sido esta a decisão dos magistrados, nada obstante a retirada da ação por parte dos deputados de Rondônia. A melhor interpretação constitucional indica que eventuais abusos ocorridos nesses casos poderiam ser coibidos, mas apenas a posteriori. O bem maior a ser protegido nesses casos é claramente o acesso à informação.
O que não se pode admitir é o cerceamento prévio do direito à informação, que protege o interesse da sociedade de receber notícias objetivas, verdadeiras, pluralistas e completas, especialmente sobre assuntos de interesse público, que exigem total transparência. Esse é, com o desenvolvimento de novas tecnologias e na sociedade de massa, o sentido preponderante da evolução da idéia de liberdade de expressão.
Nos casos concretos, tanto no livro Na Cova dos Leões, de Fernando Moraes, quanto na reportagem da TV Globo sobre os escândalos políticos dos deputados de Rondônia, o bem maior a ser protegido é o da informação sobre fatos públicos, sobre nossa História e nossa vida política. Nunca estará afastada a possibilidade de aqueles que se sentirem ofendidos pelas informações veiculadas recorrerem ao Poder Judiciário para pleitearem reparações ou correções. O que nos deve preocupar nesses dois casos é a sombra da censura, que, pairando sobre o Brasil, empobrece a nossa capacidade crítica, macula a República e afronta o Estado de Direito. Márcio Thomaz Bastos, advogado criminalista, é ministro de Estado da Justiça’
MST NA MÍDIA
Demétrio Magnoli
‘O MST e a democracia ‘, copyright Folha de S. Paulo, 19/05/05
‘O guerreiro Josué conduziu o povo na marcha pelo deserto, em busca da Terra Prometida, como lembrou o presidente da Comissão Pastoral da Terra, dom Tomás Balduíno. Na narrativa oficial da Revolução Cubana, os guerrilheiros da Sierra Maestra marcharam pelo campo, cercando as cidades. Os dois mitos inspiraram a marcha do MST até Brasília, que portou um estandarte com a figura de Che Guevara e foi acompanhada por padres. Toda a identidade do MST está contida nessa simbologia sincrética, que se nutre das tradições do cristianismo original e de um comunismo extirpado da cidade, da fábrica e do operário. A terra, um bem da natureza, pertence ao povo de Deus -eis a mensagem.
A plataforma do MST organiza-se em torno da utopia de uma economia autárquica baseada na pequena produção camponesa. O latifúndio, a agricultura patronal, o agronegócio, as grandes empresas e a globalização aparecem como os inimigos do ‘capitalismo num só país’, agrário e familiar, sonhado pelos sem-terra. A plataforma radical permanece no horizonte distante onde se oculta a Terra Prometida. Nos domínios da prática política, o MST pressiona pela aceleração dos assentamentos e por subsídios públicos aos assentados. Em outras palavras, exige apenas o aprofundamento de políticas agrárias conduzidas tanto pelo governo atual quanto por seu antecessor.
Do ponto de vista do MST, a luta pelos assentamentos seria o estopim da marcha do povo rumo à Terra Prometida. Do ponto de vista do governo, os assentamentos funcionam como política compensatória à opção preferencial pelo agronegócio. A experiência da última década evidencia que os assentamentos de reforma agrária, inscritos numa economia comandada pela globalização, geram favelas rurais dependentes de ajuda governamental. Essa ajuda tornou-se, indiretamente, a fonte principal do financiamento do próprio MST.
O MST, contudo, desempenha um papel crucial para a estabilidade da nossa democracia incompleta. A modernização capitalista do campo remove os fundamentos da vida de milhões de camponeses, atirando-os no caldeirão fervente das periferias urbanas e do emprego precário nas cidades e fazendas. O banditismo rural e o extremismo político são frutos comuns do ciclo da modernização e podem ser identificados, juntos ou separados, em contextos tão diversos como os da Sicília pós-Risorgimento, que foi o berço da máfia, do sertão nordestino do início do século 20, onde se difundiu o cangaço, ou do campo indígena peruano dos anos 80, no qual deitou raízes o Sendero Luminoso. Esses fenômenos estão ausentes do Brasil atual em virtude, antes de tudo, da presença do MST.
Rubens Ricupero registrou que a marcha dos sem-terra ‘se cumpre debaixo da mais implacável malevolência de quase toda a imprensa’. De fato, o MST é a ‘bête-noire’ da mídia, que se eriça inteira quando vislumbra uma ameaça à sacrossanta instituição da propriedade privada. O fogo de barragem da má-fé ofusca os fatos: o MST desvia para a redoma da política democrática o potencial de violência imanente à modernização acelerada, conservadora e excludente da agricultura brasileira.
Mas o MST não é imune à dissolução das esperanças depositadas pelo povo pobre no governo Lula. A organização dos sem-terra, que apóia o governo, enfrenta tensões e divisões. Seu eventual fracionamento seria comemorado pelos tolos e pelos incendiários.’
VEJA
vs. ATTUCHUrgente 24
‘Caso Kroll: Absurda persecución policial a un periodista’, copyright Urgente 24 (http://www.urgente24.com/), 18/05/05
‘Un periodista de una de las principales revistas brasileñas ve su nombre afectado por un medio de comunicación competente y por la policía federal de su país, debido una sospecha de corrupción, pero ¿no sería mejor una investigación policial seria acerca del caso antes que la difamación gratuita?
El debate sobre la libertad de prensa y la independencia periodística que afectó a Uruguay la semana pasada -el caso del programa de TV que conducía el periodista Jorge Lanata y fue finalizado antes del término del contrato-, también ocurre en Brasil, pero a escala policial.
El periodista y editor de Economía del semanario brasileño IstoÉ Dinheiro, Leonardo Attuch, terminó ‘escrachado’ por otro medio de comunicación debido a su investigación de un caso de espionaje de la empresa de telefonía Brasil Telecom en contra a Telecom Italia.
El medio colega no tan colega es el semanario Veja, y es problable que Editora Abril se aproveche de la situación para desprestigiar a una publicación de una editorial rival, pero más allá de esto la cuestión merece un análisis más profundo.
El caso de asociación ilícita y espionaje entre empresas y hasta escuchas telefónicas a funcionarios, que llevaba la policía brasileña desde 2004, también fue acompañado por periodistas, entre ellos, Leonardo Attuch.
Entre los distintos reportajes que Attuch publicó, se encontraron entrevistas sigilosas, criticas o cuestionamientos, tanto sobre la estructura del espionaje en sí mismo, cuanto sobre cómo condujo la policía federal brasileña las investigaciones.
El periodista de IstoÉ Dinheiro cuestionó la profesionalidad de los funcionarios del gobierno, principalmente por el desempeño del personal asignado a la investigación.
El descontento de la policía con las publicaciones de Leonardo hizo que ésta pidiera al magistrado interviniente, que autorizara escuchas telefónica al periodista -el juez no lo autorizó- y le incluyera en informes oficiales de la policía con insinuaciones de que el periodista se relacionaba con quienes realizaron ilícitos.
El caso se ventiló desde 2004, pero hasta la semana pasada esta persecución policial de un periodista fue mantenido dentro de las generales del secreto judicial.
Ahora se sabe que la petición de la policía de las escucha telefónicas a Leonardo Attuch, fue negada por el juez, quien alegó no haber indicios de ‘prácticas criminales’.
También ahora se sabe que la policía federal clasificó al editor como sospechoso en sus informes, de acuerdo a la documentación que llegó a la redacción de Veja, rival de IstoÉ, revista del grupo editorial al que pertenece IstoÉ Dinheiro.
Veja acusó la semana pasada a Leonardo Attuch de escribir a favor de los acusados por asociación ilícita.
Lo que Veja nunca contó es que la policía federal jamás se puso en contacto con el periodista de IstoÉ Dinheiro para oír sus explicaciones.
De la misma forma, fue ocultado por Veja que las publicaciones de Attuch en ningún momento fueron cuestionadas por cualquier persona o institución.
Es decir que no existen demandas judiciales por los escritos de Attuch.
Al revés, tras leer las informaciones de IstoÉ Dinero, un diputado del PT (partido del presidente Luis Inácio Lula da Silva), afirmó que la policía no trabajaba en defensa del Estado.
En resumen, la policía federal brasileña en lugar de hacer una investigación seria, difundió rumores (para eludir las sospechas que involucraban a su propio personal) y permitió que otros medios de comunicación ataquen al nombre y al honor de un profesional para responder a sus intereses en el juego de competencia del mercado.
Lo que más afecta la libertad de prensa es el desconocimiento que demostraron ciertas instituciones brasileñas acerca de la existencia de leyes de prensa que están hechas justamente para juzgar posibles errores cometidos por profesionales de este ámbito y que además se basan en argumentos concretos.
‘Si mis reportajes no fueron indagados en los tribunales, concluyo que son verdaderos e irrefutables’, afirmó el periodista de IstoÉ Dinheiro.
En países donde la corrupción, los amiguismos y la competencia ilimitada provocan graves desequilibrios al libre acceso de la opinión pública a la información, resulta difícil practicar un periodismo serio, apoyado en las leyes y en la ética.
Las instituciones buscan proteger a sus integrantes e intereses, incluso cuando ellos actúen en contra de la legislación vigente.
‘La policía federal jamás me buscó. Al revés. Ellos pidieron escuchar mis conversaciones telefónicas durante la instrucción de una causa con secreto sumarial’, dijo Leonardo. Esta petición fue para ‘proteger a los policías’, añadió.’
TODA MÍDIA
Nelson de Sá
‘Apelo muito forte’, copyright Folha de S. Paulo, 19/05/05
‘Da Globo News, à tarde:
– Agora a criação da CPI depende do presidente do Senado, Renan Calheiros.
A Folha Online detalhou que o peemedebista ‘precisa marcar sessão conjunta’ e depois, ‘se os líderes não indicarem representantes, definir quem participa’. Disse Calheiros, no ‘JN’:
– Vamos convocar a sessão, e os líderes indicarão os nomes.
Não deu data para a sessão nem disse se vai indicar nomes, se alguns líderes não o fizerem. De sua parte, os petistas, novos no abafa, se confundiam publicamente no Senado e Câmara. Na Folha Online, à tarde:
– Para a senadora Ideli Salvati, é preciso combinar a decisão com os petistas da Câmara e com o PMDB, partido de ampla participação nos Correios.
Como repisou ontem o líder José Múcio, do PTB de Roberto Jefferson, também no ‘JN’:
– Entendo os companheiros líderes trabalharem para a CPI não ser instalada, porque tem um apelo político muito forte.
O ‘Financial Times’ surgiu ontem com uma primeira reportagem sobre a eventual ‘investigação potencialmente danosa’ para o governo Lula:
– Tradicionalmente, tais investigações prendem a atenção e atrasam a agenda legislativa.
Para o jornal, no título, ‘os rachas na coalizão podem ter preço alto para reformas de Lula’. Em seu blog, o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira foi além:
– Para tentar governar, o governo fica à mercê da corrupção de aliados e correligionários.
Mas o ministro da Fazenda, Antônio Palocci não vê problema, em declaração ao ‘FT’:
– A turbulência política é temporária, enquanto os partidos se assentam com vistas à eleição do ano que vem.
Tanto ele não se preocupa que a primeira manchete do ‘Jornal da Record’ foi ‘Banco Central aumenta os juros novamente’.
Globos e outras traziam novidades dos escândalos político-policiais em Rondônia, Alagoas e agora até em Tocantins. A manchete no ‘Jornal da Band’:
– Dez mil protestam e pedem o afastamento dos deputados acusados de corrupção e do governador de Rondônia.
Mas a atenção do dia foi Campos, no Rio, onde voltou atrás o ex-candidato a vereador do PL que denunciou Garotinho.
Como ressaltou a Globo News, a retratação apareceu num ‘documento enviado por fax à redação da Globo por assessores do PMDB’ de Garotinho. E mais, trazia ‘assinatura reconhecida no cartório em Campos’.
O ‘JN’ contrastou a retratação de ontem com declarações de dois dias antes do denunciante:
– Eu vim aqui e vou até o fim. Não tem nada, não tem nada que me faça voltar atrás agora. Para voltar atrás agora, só se eu sair na rua e me matarem.
A Globo bem que tentou, mas não achou mais o denunciante.
PARA A CADEIA
Na Globo, cenas da tortura de funcionários da Febem por internos
José Luiz Datena, apresentador do Brasil Urgente (Band) que fez história com seus bate-bocas com Marta Suplicy, achou novo oponente. Datena, ontem:
– É um sistema falido! Não podemos ficar vendo essa porcaria que é a Febem. Já estou cheio de falar de rebelião na Febem. Já passou da hora. Vinte e oito rebeliões! Governador, isso é uma piada! De mau gosto!
Na locução ‘em tempo real’ em diversos telejornais da Globo, locais e nacionais, sobre as imagens:
– No telhado, um jovem armado. Sob a mira do revólver, um funcionário da Febem… Dois agentes chegaram a ser agredidos com violência. Nas mãos dos internos, pedaços de pau e de ferro.
Como não deu certo o esforço dos últimos meses para responsabilizar os funcionários da Febem, o governo -e a Globo- cuidam agora de incriminar os internos. Segundo a Jovem Pan, depois ecoada pelo ‘JN’, no fim do dia ‘o governador mandou transferir os internos maiores de 18 para o sistema penitenciário’.
Severino
Severino Cavalcanti criticou a CPI nos sites, mas no ‘JN’ foi destaque por duas ‘photo-ops’. Numa, vestiu boné e posou com manifestantes no Dia contra a Violência Sexual. Na segunda, posou entre velas com familiares de vítimas da violência, em favor da proibição da venda de armas.
Vaivém
A secretária Condoleezza Rice, dos EUA, disse no ‘Washington Post’ que é contra um assento permanente para a Alemanha no Conselho de Segurança.
Ato contínuo, a Alemanha e o Japão anunciaram no ‘Financial Times’ que não querem mais o poder de veto. Só a cadeira.’