Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Mino Carta

‘Ganhei há dois anos, voltei a ganhar neste. O prêmio Comunique-se, na categoria Executivo de Veículo de Comunicação. Preferiria Diretor de Redação, é o que sou, e fui, por 45 anos. Executivo sugere alguém capaz de conjugar questões editoriais com questões administrativas, e não é o meu caso.

Nem por isso, o prêmio deixa de ser importante, e muito. Surge da eleição promovida pelo site Comunique-se entre 82 mil usuários. E tanto mais significativo para o acima assinado. A meu modo, não passei de um marginal, conforme disse ao pronunciar palavras de agradecimento, diante da fina flor do jornalismo nativo.

Explico. Desde que a minha cabeça foi oferecida pela Editora Abril ao então ministro da Justiça, Armando Falcão, comecinho de 1976, tenho de inventar meus empregos. Não há empresa de comunicação disposta a contratar meus préstimos para cargo adequado à minha experiência. Entendo: tenho fama de encrenqueiro. De incendiário. De resto, o ministro Falcão supunha que Mino fosse codinome, em lugar de singular apelido de Demetrio, meu nome de batismo.

Não me queixo, muito pelo contrário. Coube-me a sorte na vida profissional, sempre estive no lugar certo na hora certa. E contei com companheiros de notável competência, indispensáveis, já que jornalismo é trabalho de equipe. E nunca houve tempo bastante para que me entediasse da profissão.

A qual, de verdade, proporcionou-me largos momentos de diversão, mesmo nas horas aparentemente mais difíceis. Ao constatar, por exemplo, a arrogância e o exibicionismo dos donos das casas em que trabalhei. E à platéia, enfeitada pela presença do prefeito de São Paulo, José Serra, contei como os deuses benignos me levaram a atuar fora do Brasil, nos meus anos verdolengos, e a fazer estágios em alguns dos mais imponentes órgãos de imprensa do mundo.

Disse também como essas experiências me conduziram a percepções melancólicas. Ou dolorosas? O Brasil é o único rincão do planeta em que os jornalistas chamam de colegas seus patrões. Bem como parecem ignorar que sua categoria é, no mínimo, tão decisiva quanto a de quem lhes paga o salário.

Tais as vantagens de um marginal. Confesso que estava a achar a tertúlia um tanto frívola, com a contribuição dos clangores de um conjunto de samba jazzístico, e a despeito do jantar bem servido, e do comparecimento assíduo de um tinto apreciável e de uma cerveja escura idem.

Noite de quarta 14, as palmas estrugiram, e a alegria se espalhou pelas mesas ao ser anunciada por voz retumbante a cassação de Roberto Jefferson. Vitória da nacionalidade? Empolgados, alguns premiados de outras categorias enaltecem a livre imprensa verde-amarela.

Logo eu disse o que pensava. Permiti-me recordar a crise que transcende a política. E recomenda reflexão por parte de jornalistas. Podem ser cassados quantos merecem, e nem por isso conserta-se este Brasil periférico, vice-campeão mundial em má distribuição de renda, recordista em índices de criminalidade, terra da desigualdade crônica e da Daslu.

Despencamos dentro de um cataclismo, que, além de político, é econômico, social, cultural, intelectual. Moral. E soletrei que os inúmeros colegas sentados na sombra, colegas autênticos, é certo, ao falarem de imprensa livre, referiam-se à liberdade de seus patrões, os colegas falsos.

Esclareci não ser petista, e acentuei meu desapontamento com a atuação do governo e do PT, mas vislumbrei no ataque unânime da mídia, em meio a um escândalo que está longe de ser o maior da história do País, os sinais do ódio de classe velho de guerra. E nos donos da comunicação, dignos representantes da elite que dilapidou impunemente o patrimônio Brasil.

Ouvi algumas palmas, e fui abraçado por vários colegas ao descer do palco. Foi mais do que esperava, bem mais. Claro está que o prêmio Comunique-se, belo prêmio, entregue a um marginal, me comove.’



TODA MÍDIA

Nelson de Sá

‘E o inspirador não votou’, copyright Folha de S. Paulo, 19/09/05

‘- E o eleitor mais famoso do PT não votou.

Era Pedro Bial, no ‘Fantástico’. No relato direto da manchete da Folha Online, à noite, ‘Lula não comparece às urnas’.

E na rádio Jovem Pan, ‘o processo de eleições internas foi encerrado sem o comparecimento do presidente’.

De volta ao ‘Fantástico’, com a avaliação do gesto:

– A abstenção do presidente foi sinal claro de que muita coisa vai mesmo mudar no PT. Principal inspirador do Partido dos Trabalhadores, ele passou a manhã e a tarde em seu apartamento, em São Bernardo do Campo, e não saiu para votar.

Lula queria distância do PT, após uma campanha que chegou ao fim com quase todos os candidatos questionando sua política econômica.

Quando não os quase três anos de governo, como fazia Marcus Sokol, na rádio CBN.

Curiosamente, o trotsquista Sokol foi dos raros a negar a ameaça de abandonar o PT, dizendo que não entrou por causa de Lula e não vai sair agora.

Nas incontáveis entrevistas de ontem nos canais de notícias, rádios e sites, muitos petistas não escondiam que devem sair. No Rio, Saturnino Braga, por exemplo, após votar:

– Sabe, não gosto de ficar escondendo jogo. Se acontecer, eu irei para o PDT, sim.

Como ele, muitos mais, como Delcídio Amaral, presidente da CPI dos Correios, a caminho do PSDB. E sobre quem Tarso Genro tratou de dizer, à Globo News, no meio das eleições:

– Quando as CPIs chegam ao momento de verificar desde quando o dinheiro era distribuído para campanhas e a que partidos beneficiava, as CPIs agora [evitam] aprofundar.

E assim, seguiu o presidente do PT, ‘as sessões da CPI têm sido palco exibicionista, de preparação eleitoral’.

Se Lula não foi, indisposto com seu partido, José Dirceu apareceu e tomou a cena.

Foi manchete no Globo Online e outros, com a frase ‘não fujo de responsabilidades’. Dele , no ‘Fantástico’:

– Tenho argumentos, tenho fatos para provar que sou inocente. Do que estão me acusando. Eu tenho responsabilidade política no que aconteceu e, ao contrário de muitos da executiva, da direção nacional, dos principais líderes do PT, eu não fujo das minhas responsabilidades.

Não, ele não deu nomes.

Não faltou, na cobertura, o registro de ‘algumas denúncias de transporte ilegal de militantes em São Paulo’, no dizer da Globo, sem dar detalhe.

Ana do Carmo, deputada estadual em quem o próprio Lula teria votado, surgiu no Globo Online confirmando ‘ter pago a regularização cadastral de 48 militantes’, aliás:

– A R$ 5 cada um.

Em longa reportagem sobre a eleição, o ‘Financial Times’ ouviu Genro e outros, atento desde o título ao risco de racha no ‘partido de Lula’.

Em particular à ameaça de que ‘a esquerda tome o controle do partido’. Encerrando o texto, analisou o ‘FT’:

– Se os esquerdistas ganharem muito terreno, eles poderiam minar o apoio à ortodoxia econômica. Um debate mais aberto também pode tornar os investidores nervosos.

Segundo o jornal financeiro, no Brasil ‘alguns analistas sugerem que o próprio presidente poderia ser forçado a deixar o partido’. Cita um só ‘analista’, Cristovam Buarque, que acaba de deixar o partido, como se sabe. Diz Cristovam, sobre Lula:

– Ele pode ter um futuro fora do PT.

– Estou perdido. Perdido em Brasília, Brasil.

Era o enviado do ‘Washington Post’, em texto de várias páginas na revista dominical, sobre arte, religião e arquitetura em Brasília. Da crise, nem menção.’



FSP CONTESTADA

Painel do Leitor, FSP

‘Viagem’, copyright Folha de S. Paulo, 19/09/05

‘‘Fui designado para representar o PT no Conselho Mundial da Internacional Socialista, em fevereiro de 2004. Legalmente, e conforme a norma do fundo partidário, o PT comprou a passagem aérea para que eu viajasse para Madri, onde seria realizada a reunião. Porém tive de desistir de participar do encontro no último momento por conta de outros compromissos. Logicamente, o PT cancelou a passagem e recuperou o montante. Ou seja, contrariamente ao que foi publicado por toda a imprensa e noticiado pela Folha (‘Fundo bancou viagem de mulher de Genoino’, Brasil, 14/9), não fui para Madri e essa passagem não foi usada.’ Luis Favre (São Paulo, SP)

Resposta do jornalista Rubens Valente – A prestação de contas do PT traz o pagamento da fatura com cheque do Fundo Partidário, sem o indicativo, pelo menos naquela parte da prestação de contas, da devolução de valores. O PT nacional foi procurado no dia para explicar o assunto, mas não forneceu essa versão.’