‘O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal brasiliense, de cujo janelão vê-se a marca do pênalti onde se acocora o ministro Ciro Gomes, resolveu matar saudades do Rio de Janeiro e leu, no seu jornal carioca favorito:
A Tribuna da Imprensa de sábado, dia 22, estampou no alto da primeira página a reprodução das primeiras páginas de cinco jornais estrangeiros que focalizavam o discurso de posse do segundo mandato do presidente dos EUA. Foi uma página criativa. A manchete do Le Monde dizia: Europe, Irak, Iran, Chine: ce que le monde attend de George Bush. Ao legendar, o jornal cometeu um deslize na tradução e interpretou assim, pela semelhança da palavra: Le Monde: todos devem atender Bush.
Janistraquis, que está careca de saber que attend significa espera (e isso basta para, brevemente, qualquer um ser nomeado embaixador em Paris), se lembrou dos bons tempos de ginásio, quando inaceitáveis alunos de Francês traduziam desta forma a frase Le livre de l’enfant est très joli: o livro do elefante é tijolinho… E esta outra, Le lion est le roi des animaux, assim, digamos, interpretada por futuros legendadores, legendaristas, ou melhor, legendários da Tribuna da Imprensa: O leão quis voar, desanimou.
Rei Momo
Na voz do carnavalesco (no bom sentido, é claro) William Bonner, o Jornal Nacional noticiou:
(…)A história do Rei Momo é mais uma contribuição da mitologia grega. Segundo a lenda, Momo era o deus da galhofa, dos delírios, adorava uma festa, mas fazia tanta bagunça que acabou expulso do Monte Olimpo. E veio parar justamente no Brasil.
Foi no carnaval de 1934, que surgiu o monarca da folia. Resultado de uma brincadeira entre colegas de redação de um jornal.
‘Tinha um cara gordo na redação e não houve nem eleição, foi escolhido ‘voluntariamente’, pelo seu físico avantajado e aí, puseram a roupa nele e ele saiu de Rei Momo’, conta Haroldo Costa.
Janistraquis considerou um absurdo a notícia se referir a ‘um jornal’ e foi pesquisar na internet. O Guia dos Curiosos escreveu:
O primeiro Rei Momo foi instituído pelo jornal carioca A Noite, em 1933. O escolhido foi o (magérrimo) compositor Silvio Caldas.
A mesma versão nos concede o pesquisador João Oliveira Souza, professor-mestre do Departamento de Filosofia e Teologia da UCG, e aí meu secretário fez soarem os tamborins:
‘Considerado, embora tenham esquecido que Sílvio Caldas era também cantor, e brilhantíssimo, o Guia dos Curiosos merece crédito; e a opinião do professor, esta é definitiva; ora, o homem ensina Teologia na Universidade Católica de Goiás e tem acesso a todos os arquivos, até os miseravelmente pagãos!!!’
Pizza à moda
O considerado Cleber Bernuci, diretor de nossa sucursal/interior paulista, com sede em Americana, passava o guloso olhar mediterrâneo pelo UOL quando deparou com esta notícia realmente espetacular:
Pizzaria italiana é multada por servir pizza com dente na borda
ROMA (Reuters) – Um restaurante italiano que vendeu uma pizza com um dente humano assado na borda foi multado em cerca de quatro mil dólares por falta de higiene (…) O cliente, não identificado, achou o dente enquanto mastigava um pedaço de pizza em dezembro de 2000. Ele pagou a conta, mas recusou um outro jantar para acertar as coisas e preferiu uma ação legal.
Bernuci, cujo sobrenome revela o especialista em boas massas, considerou o episódio deveras bizarro porém tem certeza de que o cliente teve culpa nessa história:
‘Não há dúvida de que o homem pediu a pizza al dente!’
Janistraquis, que só confia nas pizzas feitas pelo mestre Silvio Lancellotti, teve uma reação tipicamente nordestina:
‘Arriégua, considerado; arriégua!!!’
Fumacê
O endereço eletrônico da coluna sofreu engarrafamento pior que o das marginais paulistanas, porque todos os leitores encaminharam pra cá essa trágica notícia divulgada no Comunique-se:
EFE: Morre de enfisema popular apresentador de TV Johnny Carson
Los Angeles (EUA), 23 jan (EFE).- O apresentador americano Johnny Carson, que durante 30 anos deleitou os espectadores de ‘Tonight Show’, da rede NBC, morreu neste domingo em sua casa de Malibú (Califórnia) de um enfisema.
Segundo confirmaram seus familiares, Carson, de 79 anos, morreu em paz, rodeado de seu parentes mais próximos.
Um dos leitores, o considerado jornalista e escritor Sérgio Augusto, escreveu:
‘Pra mim, o enfisema sempre foi impopular, sobretudo entre os fumantes.’
Janistraquis, ex-tabaquista inveterado, arriscou:
‘Considerado, ainda bem que o enfisema foi popular; se fosse pulmonar, Carson não teria morrido ‘em paz’, como diz a matéria. O sujeito que morre de enfisema pulmonar solta guinchos medonhos, pela inexorável falta de ar; minha tia Cota…’
Aí cortei-lhe a palavra, pois dói-me ouvir novamente a história dos últimos instantes da velhinha que fumava, todos os dias, cinco maços de Liberty Ovais.
Livro útil
O considerado leitor Paulo Valentim d’Almeida escreve para recomendar a todos nós o livro de Argemiro Ferreira O Império Contra-Ataca: As guerras de George W. Bush, Antes e Depois do 11 de Setembro (Ed. Paz e Terra):
Volta e meia vou a ele para uma consulta. Pode dizer aos seus leitores (o Newton Carlos foi o primeiro a observar e escrever) que é também um livro útil para consultas, tal o volume de informações, especialmente os numerosos links Internet para documentos, discursos, etc. O leitor vai direto ao site da Casa Branca onde está o discurso do império do mal, ou o discurso do Bush em Yale no qual disse aos alunos que se forem ruins de estudo, podem virar presidente (como ele); e se sairem do curso no meio, podem virar vice-presidente (caso do Cheney).
Viva o Brasil!
As duas mais deliciosas notinhas dos últimos dias foram publicadas na coluna do considerado Ricardo Boechat no Jornal do Brasil:
Emirados 1
Com 15 mil habitantes, Quissamã, no eldorado petrolífero fluminense, está testemunhando um surto de nepotismo. Seu novo prefeito, Armando Carneiro, do PSC, nomeou a mulher, o irmão, a irmã, uma cunhada, a sogra do irmão e dois primos para cargos de confiança.
A família tem cachorro – mas as vagas acabaram.
Emirados 2
Mais ousado que o prefeito de Quissamã foi o vereador Zequinha Sales, eleito pelo PMDB.
Como assessores de seu gabinete ele contratou a mulher, três filhos, dois irmãos, uma nora, uma cunhada, dois sobrinhos e o marido de uma sobrinha.
A família não tem cachorro.
Mas o gato está cheio de esperanças
Nota dez
O melhor texto da semana nasceu da indignação desse grande jornalista que é Lúcio Flávio Pinto, editor do Jornal Pessoal, de Belém do Pará, agredido por escrever um artigo sobre as Organizações Rômulo Maiorana, o mais poderoso grupo jornalístico do norte do país. O Observatório da Imprensa reproduziu a íntegra do texto:
TACAPE LIBERAL
Comunicado ao público
(…)Não me intimidarei. Continuarei a fazer o jornalismo que sempre fiz ao longo de quase 40 anos e a reagir a todas as violências, contra mim e contra terceiros. Tomarei também as providências administrativas e judiciais cabíveis contra esse cidadão que se considera acima do bem e do mal, dono do Estado.
Como não estou à venda, não sou covarde e jamais me curvei aos prepotentes, mesmo que esteja ao seu alcance o maior dos poderes, faço minhas as famosas palavras da lendária heroína espanhola, La Pasionária: ‘No pasarán’. Não passarão sobre mim pessoas indignas como Ronaldo Maiorana.
Errei, sim!
‘CHEIRO BOM – Para anunciar a chegada ao mercado de um produto inibidor de odores, o bem-nascido caderno Modo de Vida, do Jornal da Tarde de São Paulo, perpetrou este título: Adeus chulé. Meu secretário entusiasmou-se: ‘Considerado, que elegância! Que estilo! Que esmero, requinte e donaire! Chulé. Palavra sublime que combina perfeitamente com o mimoso Caderno. É pena que tenha faltado a vírgula no título; Adeus, chulé ficaria bem mais formoso.’ (julho de 1995)
Colaborem com a coluna, que é atualizada às quintas-feiras: Caixa Postal 067 – CEP 12530-970, Cunha (SP) ou moacir.japiassu@bol.com.br).’
LÍNGUA PORTUGUESA
‘Pecados da crase’, copyright Jornal do Brasil, 31/01/05
‘Para suprir deficiências escolares no ensino do português, vários intelectuais estão publicando livros que ajudam a falar e a escrever melhor. Alguns volumes resultam de colunas mantidas semanalmente em jornais e revistas. Outros professores têm ido ao rádio e à televisão com o fim de atender à demanda, que, aliás, é muito alta. Já não são poucas também as empresas que recorrem a profissionais que lhes prestam consultoria e apoio na forma de palestras, oficinas e cursos curtos.
Sérgio Nogueira Duarte da Silva, que me antecedeu aqui no Língua Viva, vem fazendo um trabalho notável nessa área e acaba de publicar um livro indispensável. Trata-se de O Português do dia-a-dia: como falar e escrever melhor (Editora Rocco, 298 páginas).
Ambos fomos alunos de Guilhermino César, um professor que, por excesso de modéstia, se ocultou no Brasil meridional de tal forma que seu talento não chegou a merecer a devida atenção. Tantos se vangloriam de tão pouco, ele passou a vida mantendo incompreensível silêncio sobre seus livros. Fascinava-o a prosa, o verso e o ensaio alheios.
Foi dos melhores professores que o Brasil já teve. Doutor honoris causa pela Universidade de Coimbra, não era o tipo de docente que depois se tornou dominante no Brasil, com mestrado e doutorado. Ao contrário, Guilhermino César ensinava língua portuguesa e suas literaturas, além de outras disciplinas, como quem ensinasse música de ouvido. E citava pelo prenome Graciliano Ramos e Cyro dos Anjos como quem citasse colegas de bar. Carlos era Carlos Drummond de Andrade, que, aliás, escreveu belo poema sobre o amigo: Seqüestro de Guilhermino César.
Sérgio Duarte Nogueira da Silva trata de temas relevantes e muito pertinentes com exemplos claros, didáticos, no melhor sentido que tais adjetivos qualificam o ato de ensinar. Tomemos o exemplo da crase. Ilustra os conceitos com frases simples. Na página 143, faz um elenco de casos em que a crase não pode ocorrer. E ensina: é impossível ocorrer crase: I – antes de palavras masculinas: ‘viajou a serviço, gostava de andar a cavalo’. II – antes de verbos: ‘começou a redigir, prefiro isso a aceitá-lo na empresa’; III – antes de artigos indefinidos: ‘referia-se a uma antiga lei, ofereceu prêmio a uma velha funcionária’. IV- antes de pronomes indefinidos: ‘entregou o livro a alguém, sempre se refere a qualquer funcionário’. V- antes de pronomes demonstrativos: ‘estamos atentos a essa tendência, ofereceu prêmio a esta aluna aqui’. VI – antes de pronomes pessoais: ‘ofereceu o prêmio a mim, entregou a ela tudo que pediu’. VII – antes de pronomes de tratamento: ‘entreguei o documento a S. Exa., ele disse a V. As. que não viria’. VIII – antes de palavra no plural (quando o ‘a’ estiver no singular): ‘não obedecia a leis pouco conhecidas, o desentendimento levou-o a situações constrangedoras’. IX – antes de substantivos repetidos, nas locuções adverbiais: ‘ficou cara a cara, está frente a frente’. X- antes de qualquer nome feminino tomado em sentido genérico ou indeterminado, isto é, sem artigo definido: ‘não fui a reunião nenhuma, ela é candidata a rainha do carnaval’. Sérgio explica que ‘não fui a reunião nenhuma’ equivale a ‘não fui a encontro nenhum’. E que não há crase em ‘ela é candidata a rainha de carnaval’ porque se substituirmos ‘rainha’ por ‘rei’, temos que dizer ‘ele é candidato a rei do carnaval’ e não ‘ao rei do carnaval’.
Simples, claro, objetivo, repleto de exemplos, o livro é de grande ajuda para todos os que têm interesse em, por razões profissionais, por consciência ou por gosto, aperfeiçoar uma ferramenta de trabalho e um instrumento de exercício da cidadania, a língua portuguesa.’
CRÔNICA
‘Millôr’, copyright Veja, 2/02/05
‘Jornalistas perguntam
(Ah, como perguntam!):
1. O que é que o senhor acha que houve de mais marcante no século XX?
Sem ter pra onde escapar (os aeroportos viraram rodoviárias de quinta, os aviões nacionais, pra decolar, esperam mais subvenções, a natureza fechou os aeroportos de Nova York depois de destruir meu hotel preferido, na ilha de Shoy-ton, na Indonésia, e, afinal, nada adiantava mesmo, pois meu dinheiro estava todo lá no Banco Santos), respondo:
R.: O mais marcante do século XX foram, sem dúvida alguma, o meu nascimento e a minha sobrevivência em boa parte dele. Caso contrário o século não existiria e eu não estaria respondendo a bobagens como essa. Acredito que em outras partes do Brasil e do mundo o mais importante tenha sido, para si próprio, o nascimento de cada um. O ser humano não escapa de si mesmo. Pelo menos até agora. A tecnologia está aí mesmo desdizendo qualquer afirmativa peremptória.
No mais, o século XX, admirável mundo novo, acabou com um dos sentimentos essenciais ao ser humano – o espanto. Espanto, nunca mais. No século XX criaram-se o automóvel, o cinema, o avião, a televisão, a cura da poliomielite, a homossexualidade triunfante, o computador, o celular, o câncer no duodeno, a viagem à Lua, a aids, a internet, a cópula sem erotismo, a imprensa desintelectualizada, a fotografia do átomo numa fração 32 milhões de vezes menor do que o nanossegundo. Assim o século XX pôde rir do século XIX, que não acreditou na luz elétrica, não acreditou na mecanização em massa, não acreditou no tear (vide luditas), não acreditou que o automóvel ia substituir o cavalo nem percebeu que o cavalo era meio burro. Mas o século XXI, este já está rindo do século XX como o século dos babacas. Acreditaram em tudo. Até no nazismo, no fascismo, e no comunismo. Por medo de parecerem velhos, retrógrados ou reacionários. Tiveram medo até de entrar numa instalação de excrementos e, diante de uma pintura fecal, resumir sua crítica: ‘Como fede!’
Mas, espanto, nunca mais.
(A não ser que a tecnologia crie um chip de espanto.)’