‘Começa a 21ª edição do Festival de Sundance, que terá mostras competitivas para estrangeiros
Maior evento do cinema independente, o Festival de Sundance começa hoje à noite em Park City, Utah, no Estados Unidos. Até o dia 30, cerca de 40 mil pessoas vão abarrotar a pequena e charmosa estação de esqui das Montanhas Rochosas para assistir a cerca de 130 longas e 80 curtas, trocar figurinhas e, principalmente, garimpar filmes criativos e inovadores que poderão render centenas de milhares de dólares e criar ídolos quase instantâneos. Os exemplos estão aí para comprovar o poder do Sundance, que pode transformar anônimos em celebridades da noite para o dia, como já aconteceu com Steven Soderbergh, Gus Van Sant e os irmãos Coen, entre outros.
Geoffrey Gilmore , diretor do evento, acha que o Sundance é um festival de descobertas de cineastas, acima de tudo.
– Algumas pessoas costumam falar em descoberta de novos filmes, mas para mim é muito mais uma oportunidade para descobrir novos talentos – afirma Gilmore, complementando que tem lutado constante para que os jovens diretores não fiquem muito deslumbrados e que possam aproveitar esse momento, em vez de se sentirem pressionados para sair do festival como as revelações do ano.
A largada oficial desta 21ª edição acontece numa sessão de gala, com a exibição de Happy endings, de Don Roos. Com um bom elenco, que inclui Ray Liotta, Laura Dern e Lisa Kudrow, o filme trata de três histórias interligadas por dez personagens. Para figurar como um dos 32 longas das duas mostras principais do festival – a de dramas e a de documentários -, o longa deve ser inédito em território americano e ter pelo menos 50% do seu orçamento bancado sem ajuda de nenhum estúdio.
Entre os muitos estreantes, o ator Steve Buscemi participa com Lonesome Jim, seu terceiro trabalho atrás das câmeras. Com um elenco liderado por Casey Affleck e Liv Tyler, o filme segue um homem fracassado que volta a morar com os pais. Na competitiva de documentários, com temas pesados como pedofilia, erros judiciais e guerras, alguns já despertam curiosidade. É o caso de Twist of faith, de Kirby Dick, sobre um homem traumatizado por abuso sexual quando menino; After Innocence, de Jessica Sanders, com o drama de condenados que após décadas na prisão são inocentados; e Why we fight, de Eugene Jarecki, sobre a Guerra do Iraque.
Além das competitivas americanas, o festival passa a incluir nesta edição duas mostras competitivas dedicadas ao cinema internacional, a Documentário Mundial e a Cinema Mundial. Com a criação da mostra competitiva para estrangeiros – até então só americanos competiam – acontece a tão sonhada diversidade proclamada por Robert Redford:
– Desde o início planejávamos direcionar o festival para a diversidade de visões, procurando descartar qualquer caráter discriminatório ou comercial – diz o idealizador e criador do Sundance.
Muitos diretores estão no primeiro ou segundo filme, o que parece ter sido uma intenção dos organizadores.
– Uma das coisas que queremos é descobrir e apoiar novos talentos no cenário mundial. Não é uma seção para autores e mestres – explica Caroline Libresco, programadora do Sundance.
Nessa primeira edição, com 16 títulos, selecionados entre 843 inscrições, os países mais representados são a Coréia do Sul e Argentina, cada um com dois filmes. Da Coréia serão mostrados This charming girl, do estreante Lee Yun-Ki, um retrato de uma funcionária dos correios, e Green chair, de Park Chul-Su, sobre uma mulher condenada por seduzir um menor. A crise argentina funciona como pano de fundo para Palermo Hollywood, de Eduardo Pinto, um thriller sobre marginais adolescentes. O outro portenho é Cama adentro, de Jorge Gaggero, com Norma Aleandro no elenco. A representação latino-americana se completa com Crônicas (Equador/México), de Sebastian Cordero, vencedor do prêmio Sundance/NHK de melhor roteiro latino-americano em 2002.
Da Europa, com nove representantes, destacam-se Stranger, do polonês Malgozia Szumowska, ganhador do prêmio descoberta europeu em 2000, e o espanhol Inconscientes, de Joaquin Orstrell. Praticamente uma exceção entre tantos jovens, o veterano japonês Jun Ichitawa, de 56 anos, participa com Tony Takitani. Baseado no conto de Haruki Murakami, o filme ganhou o prêmio especial do júri e da Fipresci no último Festival de Locarno.
Na Mostra Premiere, os títulos mais esperados são Dear Wendy, de Thomas Vintenberg, com roteiro de Lars Von Trier; The girl from monday, de Hal Hartley, que participa pela quarta vez do Sundance; The ballad of Jack and Rose, de Rebecca Miller (prêmio do júri em 2002, com O tempo de cada um); e Loverboy, primeiro longa feito para o cinema com direção de Kevin Bacon. Na Espectro Americano, mostra destinada a diretores emergentes, um dos mais comentados é This revolution, de Stephen Marshall, com Amy Redford, filha do criador do Sundance, no elenco.’
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‘Sundance abre com tom político’, copyright Jornal do Brasil, 23/1/05
‘O filme Happy endings, de Don Roos, foi muito aplaudido quinta-feira na abertura do Sundance, o evento mais importante do cinema independente mundial. A sessão aconteceu no Eccles, maior cinema de Park City, cidade que desde o ano passado passou a ter a primazia de abrir o festival, privilégio antes concedido a Salt Lake, a capital do estado. O ator e diretor Robert Redford, criador do evento, bem humorado e falante, disse à platéia que o ovacionou que o Sundance é um festival de dissensão.
– Estamos vivendo num mundo caótico, violento e instável para uns e perfeito maravilhoso, ‘tudo bem’ para outros – afirmou, irônico.
Mais sério, complementou que por isso mesmo o foco do Sundance deve ser a diversidade:
– Os diferentes pontos de vista dos cineastas que estão aqui certamente darão ao mundo um recado mais acurado sobre os EUA de hoje.
Antes de passar a palavra para Geoffrey Gilmore, diretor do festival, Redford pediu para a platéia celebrar a expansão do Sundance para a área internacional, com a criação das mostras competitivas para filmes estrangeiros:
– Estamos cumprindo a promessa de ter aqui cineastas do mundo inteiro para, com suas culturas e seus valores, nos mostrar as diferenças.
Gilmore falou sobre a transferência da abertura para Park City:
– Esta cidade é o nosso lar e o festival vai ficar aqui para sempre – disse Gilmore, ao lado de Ross, Lisa Kudrow, Laura Dern e Tom Arnold, do elenco de Happy endings.
Ross aproveitou o clima descontraído da festa para fazer um agradecimento especial ao seu produtor.
– Ele foi o responsável por tirarmos do filme o diálogo que dizia que Tom Cruise era gay. Fiz muito bem em atendê-lo, certamente o mundo ia desabar sobre nossa cabeça – brincou.
Happy endings se desenvolve a partir de três histórias que no final se interconectam: na primeira, pai e filho se envolvem com a mesma mulher; na segunda, um homem pode ser o pai do bebê de um casal amigo; na terceira, mulher que entregou o filho para adoção dez anos atrás se vê às voltas com um chantagista.
Nos bastidores, o festival continua a enfrentar o velho dilema entre ser um oásis para um cinema criativo, original e de baixo custo, ou um grande celeiro para os poderosos estúdios, que levam para Hollywood o que há de mais promissor. Segundo Gilmore, as duas premissas não são necessariamente conflitantes.
– Ao tempo em que há uma grande preocupação dos organizadores de que o filme independente não perca sua essência criativa e inovadora, o festival não pode ignorar a importância do mercado – atesta.
Coerente com o pensamento de Gilmore e, segundo ele, para atender a um pedido dos próprios diretores, este ano foi criado o SIO (Sundance Industry Office), um serviço personalizado para fazer a ponte cineastas/indústria.
Outra alteração envolve a já saturada estrutura local de projeção dos filmes. Assim, neste ano foi criado um novo local de exibição para a competição dramática – uma adaptação em sala de projeção com 700 lugares, do enorme Racquet Club, onde ocorre a cerimônia de premiação. Na parte da programação, a transformação em competitiva da mostra Cinema Mundial, que ampliará a reputação do Sundance como plataforma do cinema independente.
Embora reconheça que o cinema indie de hoje não é mais o mesmo de 20 anos atrás, Gilmore afirma que o Sundance nunca deixou de cumprir o seu papel original, que é o de apoiar e estimular os cineastas independentes de qualquer nacionalidade:
– Graças a este festival, temos hoje muito mais diretores, mais escolas de cinema e mais realidades sendo mostradas através dos filmes.’
Tereza Novaes
‘Filme brasileiro concorre em Sundance’, copyright Folha de S. Paulo, 21/1/05
‘Com o registro da jornada de um elefante branco que atravessou a ilha de Cuba nos anos 60, o diretor brasileiro Vicente Ferraz participa do Festival de Sundance, o mais importante do cinema independente dos EUA, que exibe 120 filmes até o final deste mês em Park City, no Estado de Utah.
‘Soy Cuba – O Mamute Siberiano’ (2004, inédito no Brasil) concorre na competição na categoria documentário internacional.
Trata-se da história do filme ‘Soy Cuba’ (1963), de Mikheil Kalatozishvili (1903-1973), uma megaprodução sobre o começo da Revolução Cubana. O épico consumiu muitos rublos, levou 14 meses para ficar pronto e envolveu 200 profissionais.
Para rodá-lo, o curso de um rio foi desviado, e 5.000 soldados, deslocados para serem figurantes em plena crise dos mísseis, quando os EUA descobriram armas soviéticas instaladas na ilha.
Apesar de todos os esforços, o filme foi um fiasco de audiência nos dois países. ‘Era uma visão eslava e folclorista do Caribe. A diferença cultural incomodou o público’, conta Ferraz, 39.
Trinta anos depois, na década de 90, ‘Soy Cuba’ passou em um festival nos EUA e, desde então, ganhou status de clássico pela crítica norte-americana, com a chancela de Francis Ford Coppola e Martin Scorsese.
Os planos-seqüência do longa são considerados exemplo de virtuosismo. ‘Soy Cuba’ foi lançado no Brasil em DVD.
Ferraz vê uma certa ironia no fato de um filme de propaganda comunista ter sido redescoberto por americanos. ‘Aproveito para fazer uma analogia entre o filme e a história recente de Cuba’, diz.
No documentário, gravado em Cuba, onde o diretor estudou cinema, estão reunidos depoimentos de pessoas envolvidas na produção, além de cenas do original e de seu ‘making of’.
‘Soy Cuba – O Mamute Siberiano’ esteve na programação dos festivais de Havana e Amsterdã e deve estrear por aqui no segundo semestre. A intenção do diretor é fazer também o lançamento em cinema do filme russo-cubano.
Laboratório
Há outro brasileiro em Sundance: Philippe Barcinski, 32, recebe hoje o prêmio Alfred Sloan, dedicado a roteiros que tenham algum apelo científico.
O diretor dos premiados curtas ‘Palíndromo’ (2001) e ‘A Janela Aberta’ (2002) ganhará US$ 5.000, mais um aporte ainda indefinido para a pré-produção de seu primeiro longa, ‘Não por Acaso’, drama sobre dois personagens obsessivos, um engenheiro de tráfego e um jogador de sinuca.
Até ontem ele participava de um disputado workshop para 12 roteiristas -oito norte-americanos e quatro estrangeiros.
O laboratório teve duração de cinco dias e foi bancado pelo Instituto Sundance, que desde sua criação, em 1981, promove atividades para novos cineastas.
Bons títulos de origem independente passaram por essa experiência. Entre eles, ‘Meninos Não Choram’, de Kimberly Peirce, e ‘Central do Brasil’, de Walter Salles, que apadrinhou o roteiro de Barcinski em Sundance.
O workshop funciona como uma troca de idéias entre consagrados e novatos. O brasileiro foi assessorado por Guillermo Arriaga, que assina o roteiro de ‘21 Gramas’, e David Beniof (‘A Última Noite’, de Spike Lee).
‘É um selo de qualidade porque para entrar passamos por um pente muito fino’, diz Barcinski.’
MAD MARIA
‘ONG acusa Globo de ‘destruir’ ferrovia’, copyright Folha de S. Paulo, 23/1/05
‘A ONG Amigos da Madeira-Mamoré, criada em 79 por representantes da sociedade civil para preservar o acervo da ferrovia, acusa a produção de ‘Mad Maria’ e o governo de Rondônia de ter retirado trilhos e dormentes que fazem parte da malha ferroviária para as filmagens da minissérie.
‘Foi um ato de destruição que foi praticado em relação à ferrovia. Em Abunã foram retirados trilhos e dormentes em busca de melhores condições para a realização dos trabalhos’, disse o arquiteto e presidente do conselho administrativo, Luís Leite.
Para realizar as gravações, a Rede Globo pediu autorização à GRPU (Gerência Regional de Patrimônio da União), órgão ligado à Secretaria de Patrimônio da União e subordinado ao Ministério do Planejamento.
O representante da GRPU em Rondônia, Antônio Roberto dos Santos Ferreira, disse que a autorização foi emitida por meio de portaria publicada no ‘Diário Oficial’ da União, em que consta que a emissora terá, até 30 de janeiro, de devolver a área na forma como foi encontrada. ‘Não havia autorização para trilhos e dormentes serem retirados. Se isso ocorreu, devem ser recolocados.’
O secretário da Cultura, Esporte e Lazer de Rondônia, Luis Carlos Wenceslau, disse que funcionários do governo retiraram as peças apenas para o embarque e desembarque de uma locomotiva que estava no museu de Guajará-Mirim (330 km de Porto Velho) e que foi utilizada nas gravações.
Segundo ele, dez quilômetros de trilhos foram recuperados para as gravações e os que foram retirados serão recolocados.
Luís Leite afirmou que a máquina de Guajará-Mirim, fabricada em 1909, não foi devolvida ao local, como havia sido acordado entre o governo e representantes do museu. O arquiteto reclamou ainda que ela foi descaracterizada em sua restauração. ‘A original tinha o número 20. Na minissérie e como está agora, aparece como 5.’
Em documento assinado pelo governador de Rondônia, Ivo Cassol (PSDB), ao qual a Folha teve acesso, consta que ‘tão logo finalizem as gravações da referenciada minissérie, o governo de Rondônia responsabiliza-se por trazer de volta ao pátio do museu a mencionada locomotiva’.
O secretário disse que a máquina será devolvida ao museu da cidade até ‘a segunda quinzena de fevereiro ou início de março’. ‘A locomotiva está sendo vigiada por funcionários do governo para evitar uma possível depredação.’
‘Ela [locomotiva] estava abandonada, enferrujada, corroída, sendo utilizada como banheiro e agora está nova, reformada, pintada, em condições de uso. Esse foi o maior presente que a cidade poderia ganhar.’
Segundo o secretário, as chuvas que são registradas no Estado nesta época do ano e a necessidade de a locomotiva agora precisar ficar em uma área coberta são os motivos do atraso no reenvio da máquina a Guajará-Mirim.
A reportagem localizou a locomotiva na tarde de quinta-feira em uma localidade conhecida como Santo Antônio, a 8 km de Porto Velho. Seis funcionários do governo permanecem naquele trecho vigiando a máquina, que não possuía nenhum tipo de cobertura para sua proteção.
O diretor-geral da minissérie, Ricardo Waddington, negou que a emissora tenha retirado trilhos e dormentes da ferrovia. ‘Eram trilhos soterrados. A reta de Abunã estava sob terra ou sob mato. Nós limpamos a parte dos trilhos, cavamos debaixo dos dormentes e levantamos tudo. Trocamos alguns dormentes que estavam absolutamente podres por outros.’
A Central Globo de Comunicação, por e-mail, informou que, em relação à alteração do número da locomotiva, ‘como a original, que levava o número 5, não existe mais, restauramos a de número 20. Mudamos o número para a minissérie e depois entregamos o original [20], que foi devidamente conservado, aos operários responsáveis pela restauração’.
A Globo diz que as gravações se encerram no final de novembro.
‘As críticas são feitas por pessoas que só querem aparecer’, disse Wenceslau. ‘Nunca fizeram nada para melhorar a ferrovia. Quando conseguimos fazer algo concreto, só criticam.’’
Cassiano Elek Machado
‘TV puxa vagão de relançamentos literários’, copyright Folha de S. Paulo, 23/1/05
‘A minissérie ‘Mad Maria’ está recolocando nos trilhos quase toda a bibliografia existente na praça sobre a dramática a construção da ferrovia Madeira-Mamoré.
Um livro historiográfico, um ensaístico e um romance sobre o episódio, todos eles lançados originalmente antes de 1988, chegam às livrarias com nova fuselagem.
Obra que serviu de base à noveleta televisiva, ‘Mad Maria’, de Márcio Souza, é a única que não tem alterações de texto. Lançado em 1980, o romance ganha reimpressão apenas com nova capa, que incorpora com destaque a sentença ‘Livro que inspirou a minissérie da TV Globo’.
‘Trem-Fantasma’, de Francisco Foot Hardman, por sua vez, volta com mudanças substanciais. Publicado em 1988, o ensaio do professor da Unicamp foi todo revisto (com alterações na redação), ganhou um novo caderno de fotografias e mais um ‘vagão’ (agora traz um capítulo extra).
Também na carona da série global, o trabalho, que antes tinha como subtítulo apenas ‘A Modernidade da Selva’, agora inclui referência à ferrovia Madeira-Mamoré e uma faixa descartável em torno do livro com alusão à série.
O terceiro reeditado é o mais antigo dos três, de 1960. ‘A Ferrovia do Diabo’, de Manoel Rodrigues Ferreira, uma das principais referências históricas sobre a Madeira-Mamoré, volta após mais de dez anos fora das estantes.
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TREM-FANTASMA. Autor: Francisco Foot Hardman. Ed.: Companhia das Letras. Quanto: R$ 47 (352 págs.).
A FERROVIA DO DIABO. Autor: Manoel Rodrigues Ferreira. Ed.: Melhoramentos. Quanto: R$ 29,90 (408 págs.).
MAD MARIA. Autor: Márcio Souza. Ed.: Record. Quanto: R$ 45,90 (464 págs.).’
Folha de S. Paulo
‘Produção levou 20 anos para sair do papel’, copyright Folha de S. Paulo, 23/1/05
‘A minissérie ‘Mad Maria’ foi escrita por Benedito Ruy Barbosa entre 1980 e 1981. ‘Ela quase foi produzida para comemorar os 20 anos da Globo [em 1985], mas não havia tecnologia para fazê-la na época’, lembra Octavio Florisbal, diretor-geral da emissora, que completa 40 anos em abril.
‘Desde que entrei na Globo, há 21 anos, ouço falar de ‘Mad Maria’. Realizá-la é um sonho de vários diretores’, diz o diretor-geral da minissérie, Ricardo Waddington, que a redescobriu em 2003.
‘Hoje temos tecnologia e experiência de produção para fazê-la. Naquela época, o desconforto de gravá-la na selva seria muito grande’, afirma Waddington.
O diretor estudou várias alternativas, entre elas a de construir uma miniferrovia no Rio. Após sobrevoar várias vezes o que restou da Madeira-Mamoré, optou por gravá-la onde a história realmente aconteceu. Sua principal locação é em Abunã, cenário do livro ‘Mad Maria’.
No início de outubro, Waddington embarcou para Rondônia com outros 130 profissionais da Globo. Sob um calor de 35 C, ar muito úmido (‘Era só dar dois passos para começar a suar’) e horários restritos à faixa das 9h às 17h, para fugir dos ataques do mosquito da malária, gravou em Rondônia durante dois meses.
Segundo Waddington, 30% das cenas de ‘Mad Maria’ foram captadas em Rondônia, onde foram arregimentados 150 figurantes. O resto será no Rio, onde se desenvolve outra trama, a dos bastidores políticos da construção da Madeira-Mamoré.
‘Em Rondônia, montamos tendas com ventiladores. Tínhamos banheiros químicos e muitos picolés. Há 20 anos, isso seria impossível’, afirma.
Também contribuiu para a viabilização da megaprodução (orçada em cerca de R$ 12 milhões) o apoio do governo de Rondônia, que investiu pelos menos R$ 500 mil na recuperação de oito quilômetros de ferrovia, no restauro de uma locomotiva e na cessão de operários, médicos e policiais.
Ao todo, a minissérie mobilizou cerca de 400 profissionais em Rondônia. Elenco e técnicos geraram só nos 30 dias que ficaram em Guajará-Mirim, uma das bases de gravações, impacto de R$ 1 milhão na economia da cidade.
A produção da Globo percorreu todo o percurso original da ferrovia, de quase 380 km. A locomotiva que representa Mad Maria, nome da máquina que há um século abria a estrada de ferro, era transportada em carreta.
Outro aspecto que tornou a minissérie viável foi o uso de efeitos especiais. Graças à tecnologia, a Globo economizará em cenários. Para tanto, usará cerca de 20 imagens do fotógrafo norte-americano Dana Merrill, que registrou a construção da Madeira-Mamoré.
‘Vamos trabalhar com computação gráfica. Pegamos uma seqüência de quatro ou cinco fotos. Na última, nós fazemos uma animação em que ela se transforma em uma cena’, diz Waddington.
‘Mad Maria’ também abusará de um recurso, experimentado em ‘Um Só Coração’ (2004), que dará ‘vida’ a fotos antigas do Rio de Janeiro. Paisagens do início do século 20 ganharão veículos e pessoas em movimento.
Como a minissérie é muito violenta, por causa das brigas entre os diferentes povos que vieram construir a ferrovia, efeitos especiais em 3D tornarão possível cortar a cabeça de um operário e as duas mãos de um índio. Acredita-se que 6.000 pessoas morreram na obra, a maioria por doenças.
A Madeira-Mamoré foi concluída pelo empreendedor americano Percival Farquhar (Tony Ramos). O governo brasileiro investiu na ferrovia para compensar a Bolívia pelo território do Acre. A ferrovia iria superar 19 cachoeiras dos rios Madeira-Mamoré que dificultavam o transporte de borracha da Bolívia para o Atlântico, via Amazonas. Mas, ao ser concluída, a borracha entrava em decadência.
Na minissérie, isso é contado com um romance, com encontros e desencontros, em primeiro plano: o de Finnegan (Assunção) e Consuelo (Ana Paula Arósio).’