Correio Braziliense, 15/3
Lázaro Guimarães
O cérebro antenado da nova geração
Os jogos em vídeo e as redes sociais modificam a relação com o espaço, o tempo e a construção da identidade, segundo o psiquiatra Serge Tisseron, publicada no jornal Le monde . Esta é a realidade constatada no dia a dia das sociedades no mundo inteiro, desde que implantados os sistemas de comunicação sem fio e a internet, até mesmo em locais onde os costumes mais se assemelham aos da mais remota Antiguidade, numa estranha convivência de véus, tangas e teclados.
Indagado se os pais tinham razão de se preocupar com os efeitos da exposição das crianças e dos adolescentes às telas de computadores, de consoles ou de televisão, Tisseron, autor de Faut-il interdire les écrans aux enfants ? (2009, éd. Mordicus, Paris, em parceria com Bernard Stiegler), respondeu que eles deveriam apenas regular as atividades dos filhos, distribui-las, para que não ficassem demasiadamente ligados às atividades lúdicas proporcionadas pela moderna tecnologia. A receita é leve: nem a lassidão do deixa estar, nem o estrito controle autoritário.
A academia americana de pediatria recomenda aos pais, em guia editado em 1999, impedir o acesso à tela das crianças antes dos dois anos (os especialistas concordam hoje em estender esse tempo aos três anos) e a limitar a uma hora por dia, na faixa de três a seis anos; duas horas, entre seis e nove anos; e três horas para aqueles além dessa idade. Trata-se, assinala o psiquiatra francês, de duração real global, incluindo televisão, computador e jogos.
Explica o psiquiatra que os pais devem regular o tempo de jogo porque na adolescência não se adquiriu ainda a possibilidade de autoregulação dos impulsos. Os jovens têm dificuldade de seguir as decisões que eles consideram mais razoáveis, como as de alternar a brincadeira com o estudo, o esporte, a conversa com os amigos e com os familiares.
A revolução da era digital sucedeu várias outras, como a da escrita, da imprensa, do rádio, da televisão, e cada uma delas provocou mudanças sensíveis de comportamento. Se, por exemplo, a televisão causou maior isolamento e passividade, prendendo as pessoas em suas casas diante de produções prontas, as oportunidades de interação criadas pela internet, com as redes sociais, o correio eletrônico e os blogs, e os celulares multifuncionais provocam ondas de reaproximação, de troca de ideias, de amplo debate dos mais diversos temas. Ontem, as praças e os cinemas ficavam vazios, pois as pessoas estavam assistindo novela. Hoje, os jovens combinam, por mensagens de texto por via eletrônica, encontros nas ruas, nos bares, ou para assistir a um filme em terceira dimensão. Onde há opressão, chegam a derrubar velhas ditaduras.
Ninguém está mais escravizado pela sua circunstância espacial, como na época de Ortega y Gasset — que, por sinal, já antevia a revolução das massas. O tempo agora é real e o lugar é o mundo.
É por isso que os psiquiatras reunidos pelo jornal francês em mesa redonda concordaram em negar a teoria de Aviel Goodman de que haveria vícios sem substância, na figura do vídeo-adicto. Hoje não há entre os especialistas consenso quanto ao vício virtual ou aos jogos de vídeo, porque esses jogos evoluem e alcançaram o nível da socialização via internet.
O ser humano adora se divertir, mudar, mas não se pode dizer que existe o vício da diversão, da brincadeira. É isso que faz hoje a maior parte dos adolescentes, que, no videogame ou nas redes sociais, brinca com os companheiros. O único problema é com aqueles que insistem em jogar sozinhos. Os psiquiatras recomendam que os pais estimulem os filhos a participar de jogos coletivos.
Nas redes sociais, ninguém está sozinho. Os jovens, revelam as pesquisas, preferem encontrar no Facebook, no Messenger ou no Twitter, conhecidos e pessoas da sua idade. Já os adultos buscam o desconhecido, movidos pelo desejo de aventura.
Magistrado e professor