Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

O efeito Facebook


INFO Online, 4/3


Vinicius Aguiari


‘Facebook quer ter 7 bilhões de usuários’


Ex-editor da revista Fortune e autor da conferência Techonomy, sobre o impacto da inovação tecnológica na atividade humana, o americano David Kirkpatrick é o autor do livro ‘O Efeito Facebook – Os bastidores da história da empresa que conecta o mundo’ (editora Intrínseca, 2011).


Para escrever o livro, Kirkpatrick permaneceu em contato com Mark Zuckerberg durante 18 meses, período no qual realizou seis encontros com o fundador do Facebook. Na obra, o autor descreve as inovações tecnológicas que fizeram do site uma potência, relata como a rede social se tornou uma ferramenta de mobilização social, além de traçar um perfil de seu criador.


Nessa entrevista, Kirkpatrick afirma que o brasileiro Eduardo Saverin foi um oportunista, aponta que não existe risco de uma nova bolha na internet, como a de 1 999, e sentencia: ‘Zuckerberg quer ter 7 bilhões de usuários’. Leia abaixo:


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Em quais partes o ‘O Efeito Facebook’ é diferente de ‘Bilionários por Acaso’, de Ben Mezrich, utilizado como base para o roteiro do filme ‘A Rede Social’?


Kirkpatrick: ‘Bilionários por Acaso’ por acaso não é um trabalho sério de jornalismo. Ele é, conforme diz o próprio autor, parcialmente ficção. Não pode ser considerado um relato sério da história do Facebook, embora alguns elementos sejam baseados em fatos. Meu livro é um esforço cuidadoso para contar a história da companhia com base em muitas entrevistas com os diretores. O livro de Mezrich por acaso só aborda os dias de universidade, na infância do Facebook. Meu livro estuda a história das redes sociais, a criação do Facebook em Harvard, seu crescimento em Palo Alto, e todas as fases de seu desenvolvimento desde então. O livro também explica alguns dos muitos ‘efeitos’ do Facebook no mundo – na política, nos negócios, no marketing, na mídia, na privacidade das pessoas, em suas identidades e em muitos outros domínios.


O que você pensa sobre o uso do Facebook como numa nova ferramenta de mobilização política, como vimos na Tunísia e no Egito nos últimos meses?


‘O Efeito Facebook’ começa com o exemplo político da Colômbia. Menciono o Egito na página seis. Sempre acreditei que esse tipo de impacto ou efeito seria significativo. Acreditei que aconteceria porque o Facebook confere aos seus usuários um poder óbvio dando a cada um deles uma plataforma de divulgação, de um jeito que indivíduos comuns jamais tiveram antes. As pessoas postam para os amigos, e se os amigos clicam em ‘curtir’ ou fazem um comentário, isso reposta a mensagem para todos os amigos deles e consecutivamente. O que produz essa divulgação viral é uma mensagem bem recebida pelos destinatários. Em casos como os da Tunísia e do Egito, a população parece ter alcançado coletivamente o limite de tolerância para a ditadura. Naquele momento, os indivíduos que utilizavam o Facebook para expressar suas frustrações políticas encontraram uma plateia muito receptiva, o que desencadeou a corrente viral e conduziu rapidamente ao protesto e às ações offline, que por sua vez levaram à queda dos regimes.


Algumas redes sociais, como MySpace, Friendster e Orkut, tiveram períodos de sucesso e, posteriormente, enfrentaram uma redução no número de acessos e decaíram. A história do Facebook parece ser diferente. Com a incorporação de novas funções e recursos, o site parece forte como um trator. Hoje em dia o Facebook é imbatível? Por quanto tempo mais ele ainda vai conseguir sustentar sua posição?


O Facebook é diferente do MySpace, do Friendster e do Orkut porque é uma empresa de tecnologia mais sofisticada. O Facebook continua em movimento, construindo novos recursos, melhorando seu produto, porque Zuckerberg teme que, se não for assim, alguém mais astuto ou mais rápido vai aparecer e roubar seu mercado. O Facebook hoje está bem estabelecido e não vai perder seu lugar em nenhum momento do futuro previsível. Porém, nada é eterno. Basicamente, desde que a empresa continue inovando e melhorando seu produto de maneira constante e estável, é provável que ela se mantenha forte. Se reduzir o ritmo, vai começar a fossilizar e decair.


Algum dia, ele será substituído, assim como aconteceu em todas as fases anteriores da tecnologia das comunicações. O Facebook ainda terá muitos usuários em 10 ou 15 anos, mesmo que deteriore completamente, da mesma forma que a AOL ainda conta com pessoas que usam seu e-mail até hoje.


Ainda há tempo para o surgimento de produtos revolucionários na rede como o Facebook, YouTube e Google?


É claro que sim. Ainda há muita inovação a caminho e algumas dessas novas empresas se tornarão muito importantes e muito grandes. Há oportunidades para o surgimento na web de empresas de transmissão de imagens ocupando importante porção do mercado longe da televisão. O comércio digital pode ser aprimorado de várias maneiras. Há muitos novos recursos e funções que se tornarão importantes na medida em que toda internet se torna móvel. O mercado de internet nunca será estático ou ‘travado’.


Qual é sua opinião sobre Mark Zuckerberg ter sido nomeado homem do ano pela revista Time?


Acho que foi uma escolha razoável, embora não creia que isso tenha tido muita importância para ele. Se a designação pretende indicar a pessoa que mais modificou o mundo naquele determinado ano, acho que ele está no páreo, definitivamente. O Facebook tem causado mais impacto em mais lugares do que praticamente qualquer outro produto na história da humanidade, especialmente se você levar em conta o breve período de tempo em que ele existe.


O Facebook está perto de sua IPO (Oferta Pública Inicial, ou abertura de capital na Bolsa). Porém, algumas pessoas falam sobre uma nova bolha no mercado, como aquela de 1 999. O que você pensa sobre isso? O rumor tem alguma lógica?


Não acredito que o Facebook indique o surgimento de uma bolha. Os negócios da companhia e as projeções de lucros são genuínos e concretos. Esse momento não tem nada parecido com 1 999, quando empresas se tornavam públicas com base simplesmente em page views ou acessos, não em uma análise racional de suas oportunidades de negócios. Existem algumas empresas, como a Groupon, que eu acho que são supervalorizadas, mas não vejo nada disso como uma bolha. As pessoas consideram erroneamente impossíveis as realizações comerciais genuínas do Facebook porque elas aconteceram rápido demais.


Mas esse serviço tem realmente o maior índice de tempo gasto pelo usuário de toda a internet. É a maior força em anos a desequilibrar a divulgação online, e é o fenômeno de internet mais autenticamente global de que se tem conhecimento até o momento. E é provável que se torne muito, muito maior. Por isso chamá-lo de bolha simplesmente não faz sentido.


Em seu livro, você não concede muito espaço à questão de Eduardo Saverin [Saverin é o brasileiro sócio e primeiro financiador do Facebook]. Por quê?


Saverin recusou-se a falar comigo por ter feito um acordo com o Facebook. Porém, como ele falou com Ben Mezrich – na verdade, ele foi a única fonte real de Mezrich – podemos ter uma boa ideia de seu ponto de vista. Saverin é o verdadeiro bilionário por acaso – ele trabalhou em regime de meio período durante cinco ou seis meses e hoje tem uma fortuna em torno de quatro bilhões de dólares. É o melhor trabalho registrado na história. Mas ele não contribuiu em grande escala para o sucesso do Facebook. Eu explico o que ele fez para começar o negócio de anúncios, e também como ele foi afastado da equipe em Palo Alto por não acreditar na companhia o suficiente para se mudar e ir trabalhar com eles. Ele festejava em Nova York, enquanto os outros passavam a noite inteira acordados, trabalhando na codificação. Dediquei o espaço que considerei justo, levando em conta o pouco tempo que Saverin passou na empresa. Até onde posso dizer, ele não contribuiu com ideias muito substanciais para o projeto, nunca.


Em sua opinião, quantos usuários Mark Zuckerberg quer alcançar com o Facebook?


Isso é fácil. Ele quer que todos os sete bilhões de habitantes do planeta utilizem o Facebook. Esse é seu objetivo, definitivamente. Ele reconhece que, provavelmente, nunca o alcançará. Mas ele olha para o Facebook todos os dias – com seus 650 a 700 milhões de usuários ativos – e não fica impressionado. Ele acredita que o site pode e deve ficar muito maior. Percebe que esse crescimento vai acontecer nos países menos desenvolvidos, e entre pessoas que utilizam aparelhos móveis. E ele está alterando de maneira cuidadosa, metódica e estável os recursos do serviço e suas funções para atrair esse tipo de usuário.


Hoje o Facebook é avaliado em 50 bilhões de dólares. Que valor ele ainda pode alcançar?


Na verdade, em alguns mercados privados o Facebook opera com uma avaliação superior a 80 bilhões de dólares. Por ocasião de sua provável IPO no ano que vem, ele estará valendo bem mais de cem bilhões de dólares, provavelmente – talvez 150 ou até 200 bilhões. Sem dúvida, será o mais alto capital de mercado de qualquer empresa privada a tornar-se pública. Tenho certeza de que, antes de terminar tudo isso, Mark Zuckerberg será o homem mais rico do mundo. Ele já tem uma fortuna avaliada em 20 bilhões de dólares aos 26 anos de idade. Isso não tem precedentes. O fato de a companhia poder atingir o valor de 50-80 bilhões de dólares em apenas sete anos de vida é algo novo.


O mundo está mudando mais depressa e grandes companhias estão surgindo mais rapidamente. Elas também podem declinar mais depressa, mas até agora não há evidências de que o Facebook tenha começado o declínio.