DIRCEU
Mais vivo do que nunca
‘No dia 24 de janeiro, o ex-secretário-geral da Presidência da República, nos anos Fernando Henrique, Eduardo Graeff publicou na Folha de S.Paulo um duro artigo contra a anunciada compra da Brasil Telecom pela Telemar, que depende de uma mudança ad hoc na legislação do setor para se consumar. Mas o tema central do artigo Vão-se os sonhos, ficam os anéis é o ex-ministro e deputado cassado José Dirceu, cujas atividades como consultor internacional – leia-se facilitador de negócios que de alguma forma envolvem o poder público – foram descritas em reportagem de grande repercussão na revista Piauí. No que o texto talvez tenha de mais substantivo, Graeff atribui a Dirceu ter ligado `uma coisa à outra´ – as suas próprias atividades no mundo dos negócios e a operação da Telemar.
Nas suas palavras: `Ele mencionou para a revista uma conversa que teria tido com Lula sobre os milhões investidos pela Telemar na firma de videogames do filho do presidente (Fábio Luiz, o Lulinha). Lula teria mandado Dirceu `não encher o saco´ com o tema da sorte grande de Lulinha.´ E comenta, sarcástico: `Chateação indelegável, já que precisam da assinatura dele no decreto que beneficia quem beneficiou seu filho.´ Dirceu retrucou com o artigo Os sonhos estão mais vivos do que nunca, publicado na Folha de quarta-feira. Nele, acusa o ex-assessor presidencial de `lançar mão de informação desmentida por mim´ – o trecho da reportagem da Piauí sobre sua conversa com Lula. De fato, assim que os jornais reproduziram as passagens mais quentes da matéria, entre as quais aquela, ele negou que tivesse reclamado de Fábio Luiz ao pai.
Teria havido, na sua versão agora reiterada, o equivalente a um erro de pessoa: o Lulinha a quem criticara seria `um jornalista´ e o motivo da crítica teria sido o `acompanhamento estapafúrdio que fazia sobre (sic) o governo em seus trabalhos jornalísticos´. E explica: `Evidentemente, ao falar de reportagens erradas, com declarações atribuídas a mim e ao presidente sem que as tivéssemos prestado, eu não poderia estar me referindo a Fábio Luiz, que não é e nunca foi jornalista.´ De quebra, ele aproveita para atacar meios de comunicação não identificados, pelo tratamento a seu ver leviano dado ao `negócio absolutamente legal´ entre essas companhias (Telemar e Gamecorp), com a presumível intenção de `desgastar o chefe de Estado´.
Os americanos têm uma imagem muito expressiva para designar indícios indisfarçáveis de um fato, quando não há provas cabais de que tenha ocorrido. É smoking gun, a fumaça que sai do revólver depois de um disparo que não se presenciou. Nesse sentido, arde nos olhos a fumaça que sinaliza o trabalho de corretagem do ex-capitão do time de Lula na venda da Brasil Telecom à Telemar, passando, naturalmente, pelo arranjo legal sob medida destinado a torná-la possível. Tudo, decerto, em nome de `nossa moral socialista e nossa missão no combate do povo brasileiro por sua libertação´, como escreve Dirceu. Cada qual é livre para crer que as suas ações estão a serviço desse ideário. Ou para crer que a sua influência no governo e no PT seja `zero´, como disse à juíza que o interrogou semanas atrás na condição de réu no processo do mensalão.
Ainda assim, mandaria a equanimidade admitir que ele pode estar certo, e a revista, errada, no episódio – que muito explicaria – da sua conversa com o presidente sobre o Lulinha. Mas essa possibilidade desmorona de imediato quando se lê a contestação da repórter da Piauí, Daniela Pinheiro, ao desmentido de Dirceu, publicada no Painel do Leitor da Folha de quinta-feira. Se não por que `as declarações do ex-ministro, pelo contexto em que foram feitas, não davam margem a ambigüidade´, por ela revelar que perguntou ao seu entrevistado: `O senhor está falando do Lulinha da Gamecorp? E José Dirceu respondeu: `É´.´ (De resto, o jornalista a quem alega ter se referido nunca foi conhecido por esse apelido, ressalta a repórter. E ele, de seu lado, já lembrou que não mais trabalhava na imprensa quando Lula chegou ao Planalto.) Entre a palavra da entrevistadora e a do seu personagem, a escolha é óbvia para todos que conhecem uma e outro.
Diga Dirceu quanto queira que os seus sonhos estão mais vivos do que nunca. Mais vivo do que nunca está ele – com os seus bons negócios intermediados junto a quem a sua influência seria zero.’
IMAGEM
Idéias de nova imagem para os políticos de sempre
‘O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), foi aconselhado a retirar pequenas bolsas de gordura abaixo dos olhos e se submeter a aplicações de botox, além de fazer uma reconstrução dos sulcos da face e da boca, sem necessidade de licitação. Um dos nomes do PSDB para disputar a Prefeitura de São Paulo em outubro, o ex-governador Geraldo Alckmin é um bom candidato a microimplante capilar e correção de pés de galinha.
A única mulher cotada, até aqui, para a disputa na capital paulista, a ex-prefeita e atual ministra do Turismo, Marta Suplicy (PT), precisa renovar o botox e dar um volume generoso às bochechas.
Brincadeiras de mau gosto? Nada disso. Essas são as sóbrias recomendações do cirurgião plástico Fábio Cunha, de Brasília, médico de dezenas de deputados e senadores, políticos preocupados com a imagem. A pedido do Estado, Cunha analisou a estampa dos principais candidatos a comandar a maior cidade do País.
As sugestões de mudança no visual dos políticos não vieram apenas de um profissional de cirurgia plástica. Especialista em aparência, a professora e consultora de moda Suzy Okamoto também analisou o estilo e o comportamento dos pré-candidatos à prefeitura paulistana. `Os políticos, de modo geral, insistem em cortes de cabelos inapropriados´, anotou Suzy, ao analisar Kassab. Por `inapropriado´ se entende, segundo ela, os cortes ultrapassados, fora de época. Marta também foi alvo de críticas. `O cabelo com muito fixador fica fake demais.´
Não basta apenas cuidar do corpo. Entre os conselhos, a consultora de moda apontou a necessidade de a ministra renovar o guarda-roupa. `A prefeita é muito elegante, mas igualmente rígida. Ela ganharia mais votos se ficasse mais feminina e mais delicada.´ Suzy ainda recomendou à ex-prefeita acessórios, especialmente brincos pequenos e de pingente, que dariam `um certo balanço´. E mais: `Falta profundidade aos looks dela. Ela pode mudar as texturas para aproximar mais do olhar.´
Ao avaliar o estilo de Alckmin, Suzy sugeriu uma ida rápida a uma ótica. `Ele precisa mudar os óculos. Os dele parecem os do Maluf´, advertiu. `Óculos mais arrojados fariam a diferença, criariam foco no rosto, desviando a atenção dos parcos cabelos.´
Enganam-se, porém, os que acreditam que as dicas de estilo e as recomendações para procedimentos estéticos valem apenas para políticos com mais de 40 anos. Segundo Fábio Cunha, é muito comum homens e mulheres com apenas 30 anos recorrerem a uma dezena de métodos diferentes, incluindo o botox.
Pré-candidato à Prefeitura de Salvador, o deputado ACM Neto (DEM) tem apenas 29 anos. Passou no crivo do cirurgião plástico, mas ganhou algumas dicas de Suzy. Ela sugere que ele deixe de ser `um jovem com aparência de velho´. Explicou: `Elegância não é sinônimo de grife e tampouco parecer sisudo.´
A especialista recomendou que ACM assuma a baixa altura que tem (menos de 1,70) e utilize – `Por que não?´ – sapatos com salto. `O salto levemente alto, até para os homens, é questão de estilo. E isso é histórico.´
Suzy aconselhou ACM Neto a mudar o corte de cabelo e o dos ternos. `A impressão que se tem é de que usa ternos muito maiores que ele e tudo muito escuro. É possível vestir de uma forma mais jovem. Um terno bem cortado e levemente mais curto que o tradicional com uma camisa de padronagem diferente o deixaria mais jovem e faria toda a diferença´, opinou.
A preocupação com a imagem virou uma obsessão entre os políticos. Roberto Jefferson (PTB), deputado cassado que denunciou o escândalo do mensalão, estava entre os parlamentares da chamada bancada metrossexual quando circulava pelo Congresso. Outras duas figuras consideradas vaidosas entre os políticos são os senadores tucanos Arthur Virgílio (AM) e Álvaro Dias (PR).
Virgílio é adepto da procaína, anestésico que virou febre na década de 80 e é recomendado, principalmente, por médicos geriatras. Não há comprovação científica do benefício da droga, mas os adeptos asseguram que ela `aumenta o pique´ e dá sensação de bem-estar. Dias é considerado um dos congressistas mais estilosos, por ter sido um dos pioneiros do implante capilar em careca de político. Além disso, se preocupa com a pele do rosto e com o seu vestuário.
Quando o assunto é calvície, além de Dias, recentemente também recorreram a um microimplante capilar o ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, e o ex-ministro da Casa Civil e deputado cassado José Dirceu (PT-SP). Foram atendidos por um especialista do Recife.
A preocupação com a imagem chegou também ao presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), tido como `caipira´ pelos próprios colegas de Parlamento. Antes mesmo de assumir o comando da Casa, aderiu ao Pilates e renovou o guarda-roupa.’
Patrícia Campos Mello
Marqueteiro ajuda a transformar Obama em fenômeno político
‘Por trás do sucesso da campanha do senador Barack Obama está David Axelrod, um marqueteiro político que se especializou em tornar candidatos negros atraentes para grandes fatias do eleitorado. Axelrod, com seu bigode farto e jeitão informal, é considerado o melhor estrategista político fora do eixo Washington-Nova York.
Operando a partir de Chicago, ele coordenou a campanha de Deval Patrick em 2006, primeiro governador negro de Massachusetts, atuou na campanha de reeleição de Harold Washington, primeiro prefeito negro de Chicago, e do próprio Obama, quando ele foi eleito senador, em 2004. Como prova de que não é bom apenas com políticos negros, Axelrod também já trabalhou para outros três pré-candidatos à presidência, todos brancos: Hillary Clinton e Chris Dodd, também quando concorreram ao Senado; e John Edwards, na campanha presidencial de 2004.
´Axelrod é o que eu chamo de uma banda de um homem só – ele é bom de fazer campanhas, formular a mensagem, fazer os anúncios de TV e escrever discursos´, diz Paul Green, diretor do instituto de política da Roosevelt University e especialista em campanhas políticas. `Ele é um estrategista brilhante´, descreve Green, que conhece Axelrod há mais de 20 anos e foi co-autor de um livro com Obama.
Segundo um coordenador de campanha democrata, Axelrod é um sujeito de princípios, `mas não é madre Teresa de Calcutá´. Ele ganha, e muito bem, nas campanhas. Recebeu US$ 1 milhão da campanha de Obama até agora (o que não é muito, comparado com os US$ 4,3 milhões de Mark Penn, marqueteiro de Hillary Clinton). Ele traz consigo a `república de Chicago´ para o centro do marketing político americano. Dos 200 assessores de Obama, cerca de 100 são de Chicago.
Axelrod apostou em Obama quando o candidato resolveu concorrer ao Senado contra candidatos muito mais conhecidos e bem financiados. `Axelrod foi essencial para dar seriedade ao início da trajetória nacional de Obama´, diz Green.
SEGREDO
A combinação de mensagem certeira e organização eficiente explicam o sucesso da campanha de Obama. A capacidade de arrecadar recursos e animar voluntários para trabalharem duro pelo candidato estão no centro dessa estratégia.
Mas é a mensagem bem sintonizada que vem fazendo de Obama um fenômeno. Axelrod teve a sensibilidade de detectar o desejo de mudança versus o status quo. E Obama era o candidato ideal para personificar a inovação.
´Mark Penn é um especialista em pesquisas eleitorais. Axelrod é um estrategista´, diz Michael Fauntroy, professor da George Mason University e especialista em questões raciais na política americana. `As campanhas de Hillary e Obama são um reflexo da formação de seus coordenadores.´
Axelrod, nova-iorquino de 52 anos, é um jornalista arrependido. Mudou-se para Chicago em 1972, para cursar a Universidade de Chicago. Dois dias após se formar, foi contratado pelo Chicago Tribune, onde teve ascensão meteórica – tornou-se colunista de política aos 27 anos.
Em 1984, desistiu do jornalismo e entrou na campanha do político Paul Simon ao Senado. Daí não parou mais. David Wilhelm, que trabalhou com ele na época, diz: `Uma das razões de Axelrod ser tão bem-sucedido é que ele acredita. Ele é um idealista que se importa com seus candidatos e suas posições.´
Segundo fontes, Axelrod não se dá com Penn, o marqueteiro de Hillary, e não deixa de dar suas alfinetadas: `O público dá valor à honestidade, à franqueza. As pessoas não querem alguém que consulta seu especialista em pesquisas antes de cada decisão´, disse o estrategista à revista Time.
Mas não se pode dizer que o discurso de Obama também não seja ensaiado e repetitivo – ele costuma usar teleprompter em seus comícios. O uso da mensagem de `esperança´ do senador é muito parecido com o que elegeu Deval Patrick. Foi Axelrod que inventou o mote Yes, we can (´Sim, podemos´, por sinal também usado na campanha de Patrick).
Em termos de políticas, os dois pré-candidatos democratas pouco divergem. Mas é a visão do senador que está conquistando eleitores. Obama é o futuro, Hillary é o passado. Foi com essa mensagem que o marqueteiro de Obama levou seu candidato a vencer em 23 das prévias – diante de 14 de Hillary.
Enquanto isso, a campanha de Hillary mira desesperadamente nas primárias de Ohio e Texas para deter o embalo do senador. Hillary sofreu oito derrotas seguidas desde a Superterça. Apesar de a ex-primeira-dama garantir que tudo vai bem e s Estados grandes é que interessam, há sinais claros de crise em sua campanha.
Hillary trocou a cúpula da campanha – saiu a coordenadora Patti Solis Doyle e seu vice, entraram Maggie Williams e seus assessores.’
TELECOMUNICAÇÕES
Mudança nas teles põe de lado o consumidor
‘Apesar do crescimento e do dinamismo do mercado de telecomunicações, os clientes estão longe de satisfeitos. As operadoras costumam liderar a lista de queixas do Procon. A competição na telefonia fixa e na banda larga é muito limitada. O governo prepara uma mudança de regras para viabilizar a compra da Brasil Telecom (BrT) pela Telemar (Oi), sob o argumento de que o País precisa de uma grande operadora nacional.
A mudança, porém, não resolverá os problemas enfrentados no dia-a-dia pelos assinantes, só os dos acionistas das empresas . No momento em que se define uma nova política de telecomunicações, o consumidor parece ter sido esquecido. As três concessionárias locais – Oi, BrT e Telefônica – controlam mais de 90% do mercado de telefonia e 74% da banda larga.
O mercado de telefonia fixa está em declínio, apesar dos bons resultados das operadoras. Existem consumidores que preferem o celular, mesmo pagando mais caro pelo minuto falado. O engenheiro Rubens Antonini desistiu de ter telefone em casa quando se mudou. `Fiquei só com o telefone celular.´
A decisão teve alguns motivos, sendo o principal o preço da assinatura. `Seria um valor muito alto para algo que eu iria usar pouco. A maioria dos meus amigos usa a mesma operadora de celular que eu, então é mais barato falar por esse meio´, explica Antonini.
´Quando preciso fazer ligações interurbanas ou internacionais, uso o Skype, pela internet. O número fixo tornou-se desnecessário.´
Para o engenheiro, outra crítica às operadoras fixas é a falta de clareza nas faturas. `Existem os planos em que você paga um valor xis por tantos minutos. Aí, você escolhe um subplano que, para alguns números ou cidades, têm outro valor. Aí, têm as cobranças de outras operadoras. Tudo isso junto na fatura é muito complicado para a maioria das pessoas.´
Ele acha que o preço da assinatura – R$ 39,80 no plano básico – é alto. `Se houvesse mais concorrência, seria menor. Por isso tantas pessoas migram para outras opções, principalmente a internet.´
As empresas de TV a cabo são hoje as principais concorrentes das teles. Entretanto, a oferta dos pacotes triple play, que combinam dados, voz e imagem, ainda é bastante limitada. Onde existe concorrência, os clientes conseguem descontos.
A consultora de beleza Edna dos Santos Oliveira havia conseguido 12 meses de desconto no seu Speedy Light, banda larga da Telefônica, há quase dois anos. Ela ia desligar o serviço porque achava muito caro, mas a empresa reduziu a conta em 50%. A nova promoção ia vencer e os atendentes da operadora não queriam renová-la.
Porém, uma semana antes de a Net chegar com o Vírtua, serviço de banda larga via cabo, ao seu bairro, Edna recebeu uma ligação da Telefônica, renovando a promoção e lhe dando descontos no telefone fixo. Ela assinou um plano mais barato e um pacote de TV paga da TVA, da qual a Telefônica é sócia. `Eu já tive muito o que reclamar há três ou quatro anos´, afirma Edna. `Acho interessante que hoje são eles que entram em contato comigo.´
O webmaster Fabio Emerson Pinto mora em um bairro que ainda não é atendido pelo Vírtua, da Net, e não teve tanta sorte na negociação com a Telefônica. `Fiquei mais de uma hora falando com o atendente. Quando eles pedem para aguardar, tenho a impressão de que eles consultam o sistema da Net para saber se o Vírtua está disponível no bairro.´’
***
Empresas querem abertura total para aquisições
‘A carta encaminhada pela Associação Brasileira de Concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado (Abrafix) à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), na semana passada, pedia três coisas: que as concessionárias fixas possam ter controladores em comum, que as operadoras de celulares possam se unir, e que as operadoras locais possam controlar empresas de TV a cabo e distribuir conteúdo.
O objetivo do documento era servir de base para a mudança de regras para viabilizar a compra da Brasil Telecom (BrT) pela Oi (antiga Telemar). O ministro das Comunicações, Hélio Costa, deu o sinal verde para a agência trabalhar na primeira mudança. Caso acabe com a proibição de controladores em comum entre as concessionárias, a Anatel vai permitir não apenas a compra da BrT pela Oi, mas a participação da Telefônica e da Embratel, que pertence à mexicana Telmex, no jogo de consolidação.
´A regra deve valer para todo mundo´, disse o executivo de uma fabricante de equipamentos que participou, na sexta-feira, de um encontro para discutir o caso Oi-BrT na Câmara Americana de Comércio de São Paulo (AmCham). `Se eu fosse do planejamento estratégico da Telefônica, ou mesmo da Embratel, não iria me preocupar. É só esperar cinco ou seis anos para ir lá e comprar as operadoras.´ Nesse caso, iria por terra o discurso da empresa nacional.
A solução encontrada pelo governo, no caso da supertele, foi um acordo de acionistas, também chamado de golden share. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) teria preferência de compra se outro controlador decidisse sair da empresa e também um prazo para encontrar um investidor nacional.
´A limitação ao capital estrangeiro poderia vir num decreto presidencial, pois se trata de uma política pública´, afirma o advogado Fabio Kujawski, especialista em telecomunicações. O governo, no entanto, deve evitar restrições ao capital estrangeiro na regulamentação. `Isso poderia gerar questionamentos jurídicos e até discussões na OMC (Organização Mundial do Comércio).´
Raul Aguirre, diretor-gerente da A.T. Kearney para a América Latina, acredita que a união entre a Oi e a BrT teria efeitos benéficos. `A Oi entraria bem mais forte em São Paulo como uma operadora nacional de celular´, diz o consultor. Ele discorda que a aquisição diminuiria a competição na telefonia fixa. `A atuação de uma na área da outra é mínima´, explicou. `Falar em competição potencial é tratar de um mundo de hipóteses.´
A empresa criada pela compra da BrT pela Oi seria dominante em todos os Estados, com exceção de São Paulo. Ela ficaria com 63,6% da telefonia fixa, 16,7% do celular e 41,9% da banda larga. `A Anatel e os órgãos de defesa da concorrência precisam preservar a competição´, diz Luiz Fernando Moncau, advogado do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). `Não dá para liberar geral.´
Para ele, uma união entre a BrT e a Oi pode aumentar o custo de entrada de novos competidores no mercado onde as empresas atuam. `Existe a possibilidade de uma concorrer com a outra´, afirmou Moncau. `Com a aquisição, seria eliminado um possível competidor, num setor em que existe uma grande barreira de entrada, que é o custo da infra-estrutura.´
Segundo Moncau, alguns argumentos positivos têm sido usados para justificar a compra da BrT pela Oi, como a universalização da banda larga, mas eles ainda não foram comprovados.’
LITERATURA
Um ato de descoberta
‘Philip Roth, que fará 75 anos em 19 de março, é um dos escritores vivos mais aclamados dos Estados Unidos. Seu romance de 1969, O Complexo de Portnoy, lhe rendeu fama, e ele ganhou o Prêmio Pulitzer de 1997 com Pastoral Americana. Muitos de seus romances têm como protagonista o alter ego ficcional de Roth, Nathan Zuckerman. Zuckerman reaparece no mais recente trabalho de Roth, Exit Ghost, que a Companhia das Letras lança no Brasil em junho, no qual ele volta a Nova York depois de muitos anos de reclusão na Nova Inglaterra rural.
Sr. Roth, quantas vezes tentou matar Nathan Zuckerman, o herói ou narrador de tantos romances seus?
(Risos) Não sei… vocês sabem?
Três vezes. Uma vez em Traições.
Ó, claro, tinha esquecido desse.
E depois, novamente, em O Avesso da Vida, aos 44 anos. Ele está bem vivo de novo, está com 71 agora, mas em seu novo livro, Exit Ghost, o senhor o mata mais uma vez.
Eu não o matei. Só o mandei para casa.
´Para sempre´, foi o que escreveu. Isso faz alguma diferença?
Com certeza.
Nathan Zuckerman é um escritor que vivia isolado no campo – um pouco como o escritor Philip Roth -, mas depois ele volta a Nova York. Estará tentando escapar da velhice, tentando se revigorar de novo?
Bem, talvez ele tente, mas acho que este último livro é, de fato, sobre a vida o abandonando. Ele já não tem uma luta interior. Momentaneamente, há uma explosão de luta e virilidade, mas aí ele foge.
Será o fim de Zuckerman?
Será.
Por que deseja acabar com seu personagem mais famoso?
Eu nem sei se desejava chegar a um fim. Simplesmente aconteceu, sabe, até onde me lembro. Quando comecei o livro, não me lembro de ter pensado que este seria o último.
Não tinha um plano quando começou o livro?
Acho que não. A história simplesmente antecipou o fim. E a maneira como ela se desenrolou, houve um complemento e um desfecho. No começo, porém, tudo que havia era a idéia da sua volta. Vocês conhecem a história de Rip Van Winkle? Rip Van Winkle adormece por 20 anos, e aí acorda. É isso que acontece com a volta de Zuckerman à cidade. Eu precisava descobrir o que ele iria descobrir – o que iria ver, como seriam as pessoas, em especial, como seriam esses jovens. Foi um ato de descoberta, como a maioria de meus livros.
O que ele descobre são telefones celulares.
Ele ainda vive na era da máquina de escrever. E aí ele vê pessoas falando sozinhas.
O pano de fundo do livro é a eleição de 2004. Por que ela foi importante para o senhor?
A decepção foi muito sentida, em especial pelos jovens. A mim me pareceu um momento histórico forte. Achei que ele proporcionaria uma cor forte, cor de fundo.
Em outras palavras, escolheu o pano de fundo por razões puramente técnicas?
Eu sempre quero que se passe alguma coisa no livro além do tema principal. E sinto que isso me deu uma oportunidade para todos eles se comportarem e agirem e se exaltarem por causa da eleição. E me permitiu dar vida ao jovem casal e também marcou a diferença entre Zuckerman e eles.
Ele é cínico e eles são furiosos.
É isso, embora eu diga que ele é cínico porque está acabado. Ele acabou com aquilo.
O senhor ainda se interessa por política? Está acompanhando a eleição de 2008?
Infelizmente, sim. Não acompanhava até cerca de duas semanas atrás – até quando ela não era real. Aí assisti aos debates das primárias de New Hampshire, e os republicanos são tão incrivelmente impossíveis. Assisti aos democratas e me interessei por Obama. Acho que votarei nele.
O que o interessou em Obama?
O que me interessa é o fato de ele ser negro. Sinto que a questão da raça neste país é mais importante que a questão feminista. Acho que a importância para os negros seria enorme. Ele é um homem atraente, é inteligente, é tremendamente articulado. Sua posição no Partido Democrata é mais ou menos boa para mim. E acho que seria importante para os negros americanos se ele se elegesse presidente.
Isso poderia mudar a sociedade, não poderia?
Poderia, sim. Diria algo sobre este país, e seria uma coisa maravilhosa. Não sei se vai acontecer. Eu raramente voto em alguém que ganha. Será o beijo da morte se vocês escreverem em sua revista que eu vou votar em Obama. Ele estará acabado.
As discussões em torno de Obama me lembram seu personagem Coleman Silk, o herói de A Marca Humana, que é um negro com a pele invulgarmente e resolve inventar uma biografia judaica. Estamos nos referindo a questões de pertencimento, de comportamento correto ou errado. Barack Obama é suficientemente negro?
Sei que essa discussão existe, mas acho que vai desaparecer se ele conseguir a nomeação. A realidade da sua candidatura vai apagar isso. Qualquer pessoa metade branca e metade negra é considerada negra, de qualquer forma. Basta uma gota de sangue.
Para os brancos o considerarem negro, sim. Mas a questão é se os negros o consideram negro.
Eles o farão na seqüência da eleição. Se ele conseguir a nomeação.
Não está interessado nos Clintons como um casal? Eles não serão figuras literárias?
Oh, esse lado novelão. Eles são extremamente agressivos, eu acho que eles dirão ou farão qualquer coisa para vencer, mas não, eles não me interessam como um casal. Bill Clinton era interessante como presidente – não sei o que ele é agora. Acho que eles jogam demais com essa agressividade, e as pessoas se irritarão com isso.’
Luiz Zanin Oricchio
Um debate acirrado sobre o futuro da literatura na França
‘A Magazine Littéraire de dezembro promove um debate interessante entre dois escritores – Phillipe Sollers e Richard Millet – em torno do tema: `qual o futuro da literatura?´ São escritores de gerações diferentes. Sollers nasceu em 1936; Millet, em 1953. Ambos trabalham na mais do que famosa Gallimard. Editora que lançou um livro-bomba de Millet, que causou choro e ranger de dentes em meio à intelligentsia francesa. Désenchantement de la Littérature (Desencantamento da Literatura) é esse texto abusado, que muitos chamaram de `panfleto´.
Millet recusa a denominação. Diz que escreveu um ensaio, dirigido à inteligência, não ao fígado. Segundo o texto introdutório da Magazine, o livro foi recebido sob uma saraivada de críticas praticamente unânimes, que questionavam inclusive a `maison´ Gallimard sobre a oportunidade de publicar uma obra daquelas. `E, no entanto, eu nada mais fiz do que exprimir minhas inquietações em relação à literatura francesa, cujo futuro me parece incerto´, defende-se Millet.
Nossa época, acredita o autor, assiste a um corte profundo entre gerações de escritores. Os mais jovens, ou pelo menos um bom número entre eles, usaria a literatura como instrumento de promoção social. `O livro transformou-se em produto´, espanta-se. Distingue entre o normal desejo de reconhecimento, algo humano e intemporal, e o processo de instrumentalização da arte para transformar rapidamente um anônimo em popstar.
Sollers vai em socorro do colega, mas talvez não da maneira como este esperava. Solidariza-se pela maneira destemperada como o ensaio foi tratado. E filosofa: `As críticas são fruto da indignação, e, como dizia Nietzsche, ninguém mente mais do que um homem indignado.´ Concorda que a literatura corre perigo, mas não tira desse fato as mesmas conclusões que Millet.
Millet, em seu texto, responsabiliza alguns preceitos do politicamente correto, entre eles a apologia do democratismo e a suposta `mestiçagem´ da sociedade francesa, pelo mau momento da literatura. Diz que pertence a uma geração que aprendeu a pensar com a razão e não com as conveniências dos bons modos. Afirma que não glorifica a democracia, da mesma forma que seu compatriota famoso Tocqueville, que Millet alinha entre os `grandes reacionários, as pessoas mais interessantes para o pensamento´. Diz que não é fato que a sociedade francesa seja `mestiça´ ou `multicultural´, como passou a ser de bom tom afirmar. Não doura as palavras: `Não vejo porque seria obrigado a acreditar nessa nova religião da mestiçagem, com essa metáfora racial que me desagrada, não por ela mesma, mas porque se transformou em ideologia!´.
Pode-se dizer que a posição de Millet é elitista. A tal ponto que ele desconfia do futuro da literatura não pela falta de escritores, mas de leitores! E Sollers o tranqüiliza, se é que se pode usar este verbo: `A literatura foi sempre pouco lida, isso não é de hoje´. A mesma coisa para todas as artes. Lembra Cézanne, segundo o qual a arte se destina a um número muito pequeno de pessoas, `uma verdade profunda´, conclui Sollers.
É possível popularizá-la? Sollers acha que o escritor deve tentar atingir um número maior de pessoas, mesmo que seja através dos meios eletrônicos, indo à televisão, concedendo entrevistas, etc. `Pensemos em Voltaire e Diderot: eles não sairiam da TV, caso ela existisse´. Quer dizer, é preciso estar antenado em seu tempo para divulgar idéias e mesmo esta arte restrita, a literatura.
Já Richard Millet não suja as mãos nessa guerra por espaço. O que você faz?, pergunta a Magazine Littéraire. `Eu escrevo (pausa). E isso é tudo.´’
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