INTERNET
Olívia Fraga
Na era virtual, uma posse ‘tuitada’
Ela abalou. Dilma Rousseff, trabalhada no laquê – cabelos by Celso Kamura – e
nas pérolas de brincos, pulseira, colar e na cor discreta do tailleur (cortesia
da estilista gaúcha Luisa Stadtlander), tomou posse em Brasília e foi o tópico
mais comentado do Twitter no mundo. À tarde, apenas com a tagline #possedilma,
pipocavam na tela 30 novos tweets por minuto, repercutindo do corte e reflexos
aloirados do cabelo ao repertório da banda militar Dragões da Independência – a
multidão que assistia à posse cantou junto os axés de Ivete Sangalo, Claudia
Leitte e as canções de Roberto Carlos. Da internet, os analistas amadores
decretavam que aquilo já havia virado micareta.
Entre frases de apoio e a emoção de eleitores e simpatizantes, os usuários
viram delicadeza nas palavras do (longo) discurso da presidente eleita quando
citou a fala de Riobaldo, personagem de Grande Sertão: Veredas, de Guimarães
Rosa (‘A vida…o que ela quer da gente é coragem’); o sisudo tailleur
azul-marinho da filha Paula Rousseff, ao lado da mãe no Rolls Royce que as levou
até o pé da rampa do Planalto. Os tuiteiros também fizeram graça das gafes do
dia – e a maior das gafes, no Twitter, foi a presença de José Sarney na
cerimônia de posse no Congresso: durante a execução do Hino Nacional, o
microfone do presidente do Senado permaneceu ligado. As desafinadas renderam uma
saraivada de comentários.
Humoristas e famosos acompanharam a posse. Rafinha Bastos, apresentador do
CQC, falou do ‘charme de trator agrícola’ da presidente ao descer a rampa.
Fernanda Takai, convidada para abrir o show da posse, comemorava: ‘chegou a vez
de uma mulherzona, né?’ Foi elogiada n o Twitter. O apresentador Luciano Huck
desejou sorte: ‘que Deus te ilumine, @dilmabr. Que você leve este país para o
caminho do bem’. O estilista Alexandre Herchcovitch ouviu e não gostou do
discurso.’Não citou os gays quando falou de liberdade!’. A atriz Betty Lago
estava mais de olho na ética que na estética. Tuitou: ‘o Brasil está na moda mas
é cafona’ (horas antes de se ouvir, em Brasília, o hino do Corinthians, enquanto
Lula se despedia do poder). Foi retuitada e criticada.
Musa. Mas a grande sensação foi Marcela, mulher de Michel Temer, 43 anos mais
nova que ele. A vice primeira-dama fez pose de deusa romana em seu conjunto de
blusa marrom, ombro à mostra e trança loura (que alguns julgaram ser aplique).
Subiu a rampa com o marido e ao topo: a musa instantânea foi o 3.º tópico em
comentários do mundo. ‘Essa aí não honra o nome ‘Palácio do Jaburu’, decretaram
os tuiteiros.
O QUE OS POLÍTICOS TUITARAM
Alexandre Padilha, ministro (@padilhando)
‘Discurso de @dilmabr: aplaudi qdo falou de crescimento e combate a pobreza,
chorei nas menções a ditadura e GRITEI MESMO qdo falou do SUS !!!’
Fernando Pimentel, ministro (@pimentelminas)
‘A posse da Presidenta Dilma consolida a trajetória do Brasil rumo ao
desenvolvimento sustentável e justo! Viva o sábio povo brasileiro!!’
ACM Neto, senador (@ACMnetoMOBILIZA)
‘Desejar sorte à presidente e virar as costas nesse momento, seria não ser
coerente com as palavras ou negar o desejo de progresso ao Brasil.’
Marina Silva, senadora (@silva_marina)
‘Na posse, Dilma reafirmou os históricos compromissos do PT com educação,
saúde e combate à miséria. A novidade ficou para o meio ambiente’
‘À presidenta (como ela gosta de ser chamada) Dilma Rousseff, meus votos de
um bom governo’
Cesar Maia, ex-prefeito do Rio (@cesarmaia)
‘Déficit fiscal, desequilíbrio externo, inflação crescente. Segura Dilma. ‘E
agora José?
A festa acabou………E agora José?’
Manuela d ‘Ávila, deputada federal (@deputadamanuela)
‘Essa mesa da Câmara dos Deputados, que nunca teve uma mulher na sua
composição, tem agora sentada a primeira Mulher presidente do Brasil’
‘Desejo muito sucesso aos ministros e ministras. São parte fundamental para
Dilma colocar em prática o discurso’
PT Nacional (@ptnacional)
‘OBRIGADO MILITANCIA!
A tag #posseDILMA em primeiro lugar no TT MUNDIAL. Uma verdadeira HOMENAGEM a
Dilma presidenta do Brasil’
Aloysio Nunes, senador (@Aloysio_Nunes)
‘Desejo felicidades à presidente @dilmabr. Cumprirei meu dever na oposição.
Sem adjetivos: oposição mesmo’
IRÃ
Omid Nikfarjam, Mcclatchy – Tribune Information Services
Censurar livros no Irã, o pior emprego
Tenha pena dos pobres censores de livros no Irã. Desagradando a autores,
editores e leitores, eles se deparam com uma lista de livros que precisam ser
lidos e aprovados antes de poderem ser distribuídos ao público em geral. A
quantidade de obras que aguardam avaliação é tão grande que há rumores sugerindo
que elas já ultrapassaram os limites da sala onde são armazenadas no Ministério
da Cultura e da Orientação Islâmica e agora se espalham pelos corredores do
edifício.
De acordo com o governo, há cerca de 7 mil editoras no Irã. Mesmo que apenas
mil dessas editoras submetessem anualmente cinco livros aos censores cada uma,
isso representaria um volume de 5 mil textos para os censores darem conta. Não
surpreende, portanto, que uma editora afirme ter cerca de 70 romances e livros
de contos à espera da avaliação, enquanto outra diz ter tido nos últimos dois
anos entre 50 e 70 livros na fila da censura simultaneamente.
Autores e tradutores dizem que costumam esperar até três anos para que seja
tomada uma decisão sobre a adequação de seus livros. O trabalho dos censores
sempre foi envolto em mistério, mas comenta-se que nunca há mais de 20 deles
trabalhando ao mesmo tempo.
Para piorar a situação, depois que Mahmoud Ahmadinejad foi eleito presidente
em 2005, uma de suas primeiras medidas foi exigir que todos os livros aprovados
no mandato de seu antecessor, o presidente Mohammad Khatami, fossem revistos, o
que criou imensa carga de trabalho atrasado. Os censores tiveram de ler obras já
publicadas, além do interminável fluxo de novos títulos, conferindo linha por
linha para verificar sua compatibilidade com os ‘valores centrais islâmicos’ que
o novo governo queria ressaltar.
Minha tradução de Riso no Escuro, de Nabokov, tornou-se vítima dessa censura
retroativa: eram 7 mil exemplares em três edições, mas os censores agora a
consideraram ‘impublicável’. O mesmo aconteceu com centenas de outras obras,
sejam originais iranianas ou ficções estrangeiras traduzidas para o farsi.
A censura do Estado começou muito antes do governo de Ahmadinejad. Ela não é
mencionada na constituição iraniana, mas uma lei apresentada pelo Ministério da
Cultura em 1985 está em vigor desde então. Sob essa legislação draconiana, os
editores precisam primeiro obter com o ministério uma licença para cada livro
que pretendem vender.
Privilégios. Mas, na prática, os censores analisam somente as obras de
literatura, de arte e de teoria e crítica literária, que correspondem a cerca de
40% dos livros publicados no Irã. Os textos religiosos e os manuais são isentos
de controle, e suas editoras especializadas, em sua maioria com sede na cidade
religiosa de Qom, gozam de privilégios como generosos subsídios governamentais.
Recentemente, algumas figuras de destaque no mundo da literatura se manifestaram
contra a política atual de censura.
Em outubro, Mostafa Rahmandust, autor e tradutor de livros infantis, usou uma
coluna no jornal Khabar Daily para chamar as políticas atuais de ‘afronta à
inteligência dos leitores’. Enquanto isso, os editores dizem estar frustrados
com a recusa do ministério em indicar situações em que a decisão do censor
poderá ser favorável. Há quem afirme que esses obstáculos fazem parte de uma
estratégia do governo para desestimular a produção literária e rumores, segundo
os quais o ministério teria elaborado uma lista negra com os nomes de editoras
de destaque, como a Niloofar e a Qoqnoos.
‘Eles pretendem esmagar as editoras mais conhecidas e impedir os autores e
tradutores de trabalhar com romances, gênero que consideram corrupto e
ocidental’, garantiu um autor e tradutor que quer ter o anonimato preservado. Se
esse for de fato o plano, ele não está funcionando.
Como disse recentemente um editor veterano, que também não quis se
identificar: ‘Nenhum regime totalitário durou para sempre. Estou no ramo dos
livros há 50 anos e não tenho planos de mudar de atividade.’ / TRADUÇÃO DE
AUGUSTO CALIL
Omid Nikfarjam é jornalista e tradutor iraniano e escreve para o Institute
For War & Peace Reporting, organização sem fins lucrativos que treina
jornalistas para trabalhar em áreas em situação de conflito
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