‘Muito já foi dito sobre a Guerra do Iraque, sob os mais diversos ângulos, mas quase nada se falou da participação dos jornalistas que acompanham o conflito, suas impressões e o tratamento dado a seu trabalho pelas redes internacionais de televisão ou jornais. É sobre isso que escreve a jornalista pernambucana Paula Fontenelle no livro ‘Iraque, A Guerra Pelas Mentes’. Resultado de mais de um ano de pesquisa e 30 horas de entrevistas com 18 correspondentes de guerra, o livro examina o tratamento dado ao noticiário não apenas neste conflito, mas também nas principais coberturas de guerras do século XX. É aí que está o diferencial do conteúdo destas 200 páginas.
Como a autora entrevistou também os coordenadores de mídia no Ministério da Defesa britânico, veio à tona a questão da manipulação, voluntária ou não, dos jornalistas responsáveis pelas coberturas. ‘Houve uma perda acentuada de senso crítico e uma complacência, uma manipulação velada da mídia por parte dos responsáveis pelas diretrizes da cobertura’, afirma Paula.
O livro desvenda como esta cooptação da mídia foi conseguida. As estruturas montadas envolviam o Centro de Mídia no Qatar (sob responsabilidade dos EUA), as unidades móveis de transmissão (que recebiam os principais nomes do jornalismo internacional, que saíram do Kuwait rumo ao Iraque) e os ‘engajados’, que acompanhavam os combatentes em suas incursões. Por estarem dividindo o mesmo espaço com os soldados, estes jornalistas acabaram por tornar-se ardentes defensores da ocupação de territórios iraquianos. A intenção de ganhar as mentes dos jornalistas é confirmada textualmente pela declaração de David, Howard, coordenador de mídia do Ministério do Interior britânico, de que o ‘sistema montado rendeu as reportagens positivas desejadas pelo governo britânico, com o grau certo de segurança desejado pelo Ministério da Defesa’. Mas, os jornalistas não se sentiam cooptados, diz Paula. Seu envolvimento se dava de maneira inconsciente.
Uma das fotografias que ilustram o livro é emblemática. A derrubada da estátua de Saddam Hussein, cena que ganhou o mundo como representação acabada de sua derrota e do apoio da população à invasão americana, não passou de manipulação, comenta Paula. Estavam na praça umas trinta pessoas, talvez, várias delas levadas pelos americanos. No entanto, graças a artifícios de enquadramento, tinha-se a impressão de que muito mais gente se aglomerava ali, num festejado acontecimento. O livro traz ainda breves biografias de personagens dessa história inacabada, como o presidente George Bush e o primeiro-ministro britânico, Tony Blair. Também se fala dos interesses envolvidos na invasão.’
IMPRENSA / EUA
‘O declínio da mídia americana’, copyright O Estado de S. Paulo, 7/10/04
‘Livres da ansiedade de imaginar o que poderia acontecer com a sua profissão, se orientada, disciplinada e fiscalizada por um conselho federal sob a hegemonia de sindicalistas enturmados com o governo, os jornalistas americanos que costumam refletir sobre o ofício enquanto o praticam não cessam de topar com motivos crescentes de desalento e perplexidade.
Essa inquietação deveria interessar pelo menos àquela parcela dos brasileiros em posição de atentar para os efeitos cumulativos de um jornalismo, como o nosso, desidratado pela crise financeira da mídia, assediado pelo Estado, prejudicado pela precária formação de boa parte dos seus quadros e confrontado com a tendência do setor para a cartelização.
Porque, à parte as diferenças concebíveis entre os Estados Unidos e o Brasil, em geral, e da atividade jornalística nos dois países, em especial, muito do que atrapalha o sono do pessoal da imprensa americana não há de ser estranho aos seus colegas brasileiros, e muitos dos problemas de credibilidade da grande mídia americana são os mesmos percebidos aqui.
É claro que os brasileiros não foram enganados por uma imprensa que se gaba de sua autonomia em relação aos governos de turno e do ceticismo com que, por definição, recebe as verdades oficiais, mas foi capaz de aceitar e ecoar mansamente as falsidades construídas para justificar a invasão de um país sem a menor condição de ameaçar a sua segurança nacional.
Da mesma forma, não foi no Brasil que dois dos principais jornais e outro, o mais popular, revelaram que um certo número das matérias que andaram publicando recentemente (sobretudo no mais venerando deles) eram fraudulentas, tendo os seus autores se aproveitado da flacidez dos controles internos sobre a autenticidade das informações em via de ser publicadas.
Por fim, não acabamos de saber, graças à relutante confissão de um dos mais respeitados jornalistas do país, responsável por um dos programas de maior prestígio de uma das três grandes redes de televisão, que eram forjados os documentos em que ele se baseou para anunciar que um belicoso presidente da República driblou o serviço militar, nos idos de 1970?
Mas, se não gerou escândalos como o aval às patranhas assustadoras da Casa Branca e a arapuca em que caiu o notável Dan Rather, de 72 anos, do programa 60 Minutes, da CBS, além dos engodos de Jayson Blair no New York Times, Janet Cooke no Washington Post e Jack Kelley no USA Today, de alma leve a imprensa brasileira não tem por que estar, tantos os seus erros no dia-a-dia.
Hora, pois, de ver de perto a mais recente fornada de críticas jornalísticas ao jornalismo americano – a exemplo do artigo A mídia, perdendo o rumo, de David S. Broder, do Post, de 26 de setembro, e da conferência, duas semanas antes, Jornalismo debaixo de fogo, de outro veterano, Bill Moyers (que foi secretário de Imprensa do presidente Johnson), da rede pública PBS.
Broder mira a cobertura da campanha eleitoral nos Estados Unidos – tema freqüente também do colunista econômico Paul Krugman, quando na pele de (afiado) crítico de mídia. O espírito da coisa está contido no primeiro parágrafo do comentário. ‘Não sabemos ainda quem vencerá a eleição de 2004, mas sabemos quem a perdeu’, avisa. ‘A imprensa americana foi aplastada.’
Para ele, a questão central – igualmente destacada por Bill Moyers – é que os padrões profissionais dos maiores órgãos de imprensa do país caminham para o colapso. O motivo, ‘uma disseminada perda de confiança tanto nos valores do jornalismo quanto na viabilidade econômica do negócio da notícia’.
A causa eficiente, a ocupação dos postos-chaves no telejornalismo e, em menor escala, na mídia impressa por estrelas de outras áreas, no lugar de profissionais ‘profundamente imbuídos da cultura e dos valores das redações’. Quem as contrata são executivos, eles próprios alheios à ética do trabalho jornalístico, em busca apenas de uma solução mágica para as quedas de audiência e de vendagem.
Não lhes ocorre que a restauração das normas clássicas do duro ofício de informar poderá fazer diferença. E não lhes ocorre porque é outra a mentalidade da indústria da informação – o que a leva a dar de ombros para o que Moyers chama ‘contrato sagrado’, essencial nas democracias, ‘entre os jornalistas e os que neles confiam para lhes dizer o que puderem sobre como o mundo realmente funciona’.
A cabeça é outra porque outros (e vorazes) são os interesses em jogo. No pano verde das fusões e aquisições de empresas de mídia, a melhoria da qualidade do jornalismo e, por extensão, do debate público importa infinitamente menos do que a posse de mercados onde as escolhas serão cada vez mais escassas, o desempenho dos conglomerados nas bolsas e os prêmios escabrosos pagos aos chefões.
‘Cada fusão’, argumenta Moyers, ‘empurra o jornalismo um pouco mais para baixo na hierarquia de valores nos imensos agrupamentos que dominam o que vemos, lemos e ouvimos.’ Na prática isso quer dizer coisas assim: mais crime, violência, trivialidade e celebridades no noticiário, menos matérias sobre assuntos aborrecidos como práticas de governo e políticas públicas.
Em 1977, na média dos principais diários, revistas e telejornais, uma em cada três reportagens tratava do Estado; em 1997, a relação tinha caído para uma em cinco. Já a proporção de matérias com celebridades subiu de uma em 50 para uma em 14. O estudioso Ed Wasserman, citado por Moyers, nota ‘um palpável senso de declínio, apodrecimento, perda de espinha e ousadia’ na nova mídia.
Se isso é verdade, como parece certo, não é porque a mídia americana se agigantou como empreendimento econômico que ela se tornou independente de todo do governo. Deu-se o contrário: tamanha é a massa de interesses heterogêneos dos nababos da comunicação, passíveis de ser afetados por decisões dos políticos, que a submissão ao poder virou uma estratégia de competitividade.
Como o labirinto de negócios bilionários em que estão envolvidos esses colossos os tornou reféns da boa vontade dos governantes, ‘o business da notícia entrou em guerra com o jornalismo’, na apta síntese de Wasserman.
Não poderia ser diferente quando dois terços dos mercados da imprensa diária nos Estados Unidos foram monopolizados por um punhado de megaempresas.
Publicações mudam de mãos como fichas num cassino. Em 1998, um pequeno jornal de Oshkosh, no Wisconsin, cujos donos eram gente do lugar desde 1830, foi vendido duas vezes em dois meses – e uma terceira vez, em 2000. A cada transação, cortes de pessoal. Os jornais americanos já fecharam 2.200 vagas.
Não acabou.
Em larga parte devido à revolução das comunicações, a informação jornalística passa hoje por um mundo de mudanças que não se sabe aonde vão dar. Mas se sabe que a concentração da mídia no país cujo modelo de jornalismo ainda baliza a imprensa brasileira em coisa boa não dará. É tempo, aqui, de instalar os freios à cartelização que os Estados Unidos tendem a desativar. (Luiz Weis é jornalista)’
NYT
NA COLÔMBIABloomberg News – Gazeta Mercantil
‘New York Times passa a publicar na Colômbia’, copyright Bloomberg News – Gazeta Mercantil, 7/10/04
‘O jornal The New York Times anunciou ontem que lançou sua seção semanal de notícias no El Tiempo da Colômbia. A primeira edição foi publicada domingo passado. El Tiempo se une a um número cada vez maior de jornais que publicam o suplemento, projetado para complementar e ampliar a cobertura jornalística para o público local com notícias do mais influente diário mundial.
O suplemento, conhecido como The New York Times International Weekly, mantém o formato e estilo tipográfico do The New York Times, e inclui novas coberturas, comentários, fotos coloridas e gráficos sobre os Estados Unidos, assuntos mundiais, negócios, cultura e tendências sociais. O suplemento é preparado em Nova York por uma equipe de editores do The New York Times News Services, em conjunto com editores do jornal parceiro.
‘Todos nós, ligados à seção do The New York Times International Weekly estamos satisfeitos com nossa nova parceria com o El Tiempo, jornal muito respeitado na América Latina’, disse Cristian Edwards, presidente do The New York Times News Service and Syndicate. ‘Nosso objetivo com essa seção especial sempre foi de fornecer notícias do momento, minuciosas e precisas, além de detalhes jornalísticos para os leitores internacionais, interessados em um jornalismo de qualidade.’
‘Nossa esperança para essa seção especial sempre foi a de prover uma síntese completa de notícias precisas e oportunas e de artigos especiais aos leitores internacionais que estão interessados em jornalismo de qualidade’, completou Edwards, do The New York Times News Service and Syndicate.’
JUSTIÇA vs. NYT
‘Juiz ordena a prisão de jornalista do ‘NY Times’’, copyright O Estado de S. Paulo, 8/10/04
‘Um juiz federal ordenou ontem a prisão por desacato da jornalista do New York Times Judith Miller, que se negou a revelar suas fontes num caso ligado ao vazamento para a imprensa – por parte de um funcionário da administração do presidente americano, George W. Bush – do nome de uma agente secreta da CIA.
O tribunal, no entanto, concedeu à jornalista o benefício de permanecer em liberdade enquanto apela da decisão, mas reiterou que ela pode pegar até 18 meses de prisão, caso continue negando-se a comparecer para depor.
A identidade da agente, Valerie Plame, foi revelada em 14 julho de 2003, na coluna do jornalista independente Robert Novak. Na ocasião, ele atribuiu a informação ‘a dois funcionários categorizados da administração’.
Antes, o marido de Valerie, o ex-embaixador Joseph Wilson, provou que Bush usou dados falsos ao declarar que o ex-ditador iraquiano Saddam Hussein tentara comprar urânio num país africano para desenvolver seu programa de armas de destruição em masssa. (Associated Press)’