A propaganda de alguns tipos de alimentos para fins especiais (como os do tipo light e diet) tem escamoteado informações relevantes para a saúde do consumidor. Essa é a principal conclusão da pesquisa intitulada ‘A propaganda de alimentos para fins especiais como estímulo ao consumo’, de autoria da biomédica Bianca Ramos Marins.
O projeto recebeu menção honrosa ao ser apresentado sob a forma de pôster durante três congressos, ocorridos simultaneamente e promovidos pela Associação Brasileira de Pós-Praduação em Saúde Coletiva (Abrasco), pela International Association of Health Policy (IAHP) e pela Asociación Latinoamericana de Medicina Social (Alames), entre os dias 13 e 18 de julho deste ano. ‘Este trabalho é apenas um eixo da minha futura tese, que abordará a comunicação na área da Vigilância Sanitária’, esclarece Bianca, atualmente doutoranda da pós-graduação do Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) da Fiocruz.
O trabalho de Bianca inspirou-se em observar as estratégias do mercado para estimular o consumo de alimentos, classificados como ‘alimentos para fins especiais’ pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e dirigidos a públicos populacionais com alguma necessidade, como diabéticos, idosos, pacientes hospitalares, crianças ou atletas.
Trata-se, portanto, de produtos ‘especialmente formulados ou processados, nos quais se introduzem modificações no conteúdo de nutrientes, adequados à utilização em dietas diferenciadas e/ou opcionais, atendendo às necessidades de pessoas em condições metabólicas e fisiológicas específicas’, explica a pesquisadora.
Informações e advertências inexistentes
A biomédica resolveu, então, analisar 20 peças publicitárias veiculadas na imprensa escrita entre junho e outubro de 2006, debruçando-se em questionamentos tais como ‘quem fala’, ‘a quem se dirige’, ‘como fala’, ‘o que fala’ e ‘qual o interesse’. As peças foram extraídas de encartes semanais de dois jornais diários e de nove revistas: duas de atualidades e outras dirigidas ao público feminino ou de ‘vida saudável’. ‘É o tipo de publicação facilmente presente em salas de espera de consultórios e cabeleireiros’, exemplifica Bianca.
A doutoranda encontrou anunciados produtos como barras de cereais, pão de forma, pó para preparação de sucos, leites, adoçantes, embutidos, pizzas, dentre outros. ‘Observei a predominância de alimentos dietéticos, light e infantis, dentro da classificação para fins especiais da Anvisa’, diz. De modo geral, produtos com publicidade feita para atingir as mulheres, propondo o consumo sem culpa, prometendo a combinação entre estética e saúde e associando os alimentos à felicidade, à longevidade, à vitalidade e a uma vida equilibrada.
Na seqüência, a pesquisadora estabeleceu resultados que destacam as estratégias de convencimento adotadas pelos publicitários. São alguns exemplos: alertar, nas peças publicitárias, sobre a necessidade de bons hábitos de vida e de dieta equilibrada, passando-se assim a imagem de que o emissor da propaganda está consciente e preocupado com a saúde do consumidor; patrocinar atividades esportivas com a marca a ser divulgada; explorar fotos ou imagens de felicidade, vitalidade, disposição e saúde mental e física; utilizar termos em outro idioma, para conferir sofisticação aos produtos; utilizar, por vezes de modo inadequado, termos como diet e light; convidar celebridades para conferir legitimidade aos produtos e induzir, em alguns casos, a substituição de refeições pelos produtos divulgados.
Uma importante observação feita pela biomédica foi a inexistência ou tímida apresentação de informações nutricionais e de advertências em relação ao uso do produto nas peças publicitárias.
Mais estudo e investimento
A partir dos dados e dos resultados observados, Bianca pôde chegar a algumas importantes conclusões. A principal, a de que a publicidade examinada desconsidera ou oculta informações necessárias ao esclarecimento do consumidor sobre os aspectos nutricionais dos alimentos divulgados. Desse modo, ‘até que ponto o consumidor tem seu direito à informação correta respeitado?’, pergunta a biomédica. Para ela, a publicidade ‘deveria priorizar a educação e a informação, ao invés de estritamente o consumo’, pois este, quando feito sem o devido esclarecimento, ‘pode ter reflexos na saúde’.
Conseqüentemente, o trabalho discute se a atual regulamentação da propaganda é suficiente, se é possível uma melhor monitoração, se o Estado tem responsabilidade no assunto e se a informação leva realmente a uma escolha crítica por parte do consumidor. ‘O tema pede mais estudos e investimento’, conclui Bianca.
No INCQS, Bianca Ramos Marins é orientada pela engenheira química Silvana do Couto Jacob; no entanto, como sua tese abordará a comunicação na saúde, a biomédica é também orientada pela comunicóloga Inesita Soares de Araújo, do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict), da Fiocruz.
******
Assessor de Imprensa do Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), Fiocruz, Rio de Janeiro, RJ