Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Rainha manda mensagem de Natal pelo YouTube

Leia abaixo a seleção de segunda-feira para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Segunda-feira, 24 de dezembro de 2007


RAINHA ONLINE
Folha de S. Paulo


Com mensagem de Natal, rainha Elizabeth lança canal real no YouTube


‘Elizabeth 2ª é pop. Antenada com seu tempo como poucos governantes, a rainha britânica lançou ontem seu próprio canal no site de compartilhamento de vídeos YouTube, o Royal Channel.


O mote é a divulgação de sua 50ª mensagem natalina televisiva -a monarca de 81 anos, segundo o Palácio de Buckingham, quer assim que seu discurso seja ‘mais acessível às platéias mais jovens e àqueles em outros países’.


Mas a oferta vai além: no site é possível assistir à coroação, a investiduras, ritos fúnebres, discursos e festas da Casa de Windsor. As cerimônias de casamentos reais também estão disponíveis -uma pérola é o filme mudo das bodas da rainha-mãe, morta em 2002, em 1923. São ainda apenas 18 vídeos, com a promessa de que o canal seja alimentado regularmente.


Na terra da mãe de todas as TVs e rádios públicas, a BBC, a sintonia de Elizabeth 2ª com os súditos vem de longe. ‘A rainha sempre se manteve a par de novas formas de comunicação com o povo’, lembrou o Palácio. Em 25 de dezembro de 1957, ao levar ao ar seu primeiro discurso de Natal televisivo em uma época em que o aparelho começava a se popularizar nos lares britânicos, a monarca dissera esperar ‘que o novo meio tornasse sua mensagem natalina mais pessoal e direta’.


No ano passado, o discurso de Natal passou a ser divulgado em podcast, formato cada vez mais explorado por políticos mundo afora. E a mensagem televisiva, pela primeira vez, será transmitida neste ano em alta definição.


Ontem, o vídeo real do Natal de 1957 era o destaque do site, adornado com fotos do Palácio de Buckingham e da Guarda Real. A página se anuncia como ‘o canal oficial da monarquia britânica’.


O YouTube foi fundado em 2005 e, no ano passado, foi comprado pelo Google com ações que valiam na época US$ 1,65 bilhão -mais de cem vezes o valor de seu faturamento comercial no ano.


NA INTERNET – veja o site real em www.youtube.com/theroyalchannel’


 


O MÉDICO DOENTE
Fernando de Barros e Silva


Feliz Natal, dr. Drauzio


‘SÃO PAULO – Drauzio Varella tem um talento incomum para contar histórias. Sabe fazê-lo como poucos jornalistas. É uma qualidade acessória para um médico com trabalhos sociais tão relevantes.


Mas não é o doutor, e sim o paciente que faz de seu novo livro, ‘O Médico Doente’, uma pequena preciosidade. Drauzio descreve em detalhes a evolução da doença que por muito pouco não o levou à morte. O hipocondríaco que vive em cada um de nós dá pulos de satisfação.


Drauzio contraiu febre amarela no final de 2004, numa de suas freqüentes viagens ao rio Negro. Sua vacina estava vencida fazia 20 anos. O médico tão atento à saúde dos outros e tão zeloso com a sua própria se vê traído por um descuido miserável, talvez excesso de confiança, alguns diriam por um ato falho.


Seis dias depois dos primeiros sintomas, já internado, sob doses pesadas de morfina, ele tenta pegar um copo d’água. Mal consegue sustentar o peso do braço. No domingo anterior, quando voltou a São Paulo, havia corrido 18 km no Minhocão. O vírus o destruíra.


Imaginei, escreve Drauzio, ‘o que pensaria se fosse o médico de alguém naquelas condições. Consegui fazê-lo com tal realismo que tive a impressão febril de estar em pé, de camisa de colarinho e gravata, olhando para mim, deitado, de pijama, trêmulo de frio, com náuseas, os olhos amarelos, o fígado aumentado, a voz fraca, a fala entremeada de silêncios involuntários. (…) Ao olhar para mim em pé a meu lado, achei que os olhos do médico evitaram os meus. Senti vontade de perguntar se havia saída, mas recuei, porque o induziria a mentir’.


A descrição da sensação de estar, à beira da morte, alheio e indiferente a tudo e a todos é um dos momentos mais fortes do livro. Tal honestidade não é para qualquer um. Mas o médico, desta vez, foi enganado pelo paciente, que sobreviveu. Ateu convicto, Drauzio não tirou do episódio nenhuma lição metafísica. Mas nos faz refletir um bocado sobre a brevidade e a loteria da vida. Brindemos. A todos, feliz Natal.’


 


ARTE EM PAUTA
Ruy Castro


À prova de roubos


‘RIO DE JANEIRO – Na madrugada de quinta-feira, em SP, ladrões penetraram no Masp e, em três minutos, subtraíram duas telas: um Picasso (menor, mas sempre um Picasso) e um Portinari, este familiar até para ignorantes plásticos como eu. Duas peças de difícil comercialização para receptadores com um nome a zelar. Se os fulanos tivessem ficado dez minutos no recinto, talvez escolhessem material mais fácil de passar nos cobres.


Na véspera, em Brasília, a Presidência da República devolveu uma escultura de Elisa Bracher que até há pouco enfeitava os jardins do Palácio da Alvorada, constando de um feixe de toras de madeira, tipo casualmente empilhadas, com cinco metros de altura. Corria em palácio que a primeira-dama Marisa Letícia, conservadora nas artes em geral, desaprovava a proposta conceitual da obra -que, como se não bastasse, fora uma encomenda de sua antecessora.


Pois, nesse caso, acho que o prejuízo foi de dona Marisa. Pelo que vi nas fotos, as toras caíam muito bem na fachada do Alvorada. Quase tudo em Brasília, mesmo os palácios de 1960, tem um aspecto de abandono ou de prematuramente roto, e aqueles troncos no gramado davam um cálido ar de canteiro de obras ao cafofo oficial.


Por outro lado, já que a escultura de Elisa não atendia aos padrões estéticos de dona Marisa, deveria ter sido doada ao Masp. Queria ver se, mesmo que ficasse à mão, dando sopa no vão livre sob o museu, haveria ladrões com tutano para surrupiá-la. Afinal, pesa dez toneladas.


Outra maneira de o Masp se garantir contra futuros prejuízos é trocar todo o seu inestimável acervo pelas ‘instalações’ produzidas por nossos artistas nos últimos tempos, à base de paçoca, maçãs podres, larvas ou pererecas. Se nenhuma delas for roubada, ótimo. Se for, o problema é do ladrão.’


 


Mônica Bergamo


Nizan quer presidir o Masp


‘O publicitário Nizan Guanaes vai se lançar candidato à presidência do Masp. Ele já faz parte do conselho do museu. Acha que a candidatura servirá para abrir debate público sobre a situação da instituição. ‘Sou candidato mesmo que seja para perder’, diz.’


‘A FAVOR DO MUSEU’


Nizan afirma que sua decisão ‘não é contra o Julio Neves [atual presidente do Masp], mas a favor do museu’. Ele diz que ‘uma cidade como São Paulo não pode ter um museu nesta situação sem que haja uma profunda discussão sobre seus problemas’. As eleições vão ocorrer no fim de 2008, quando Neves completará 14 anos de mandato.


DIVISOR


A candidatura do publicitário será um divisor de águas: pela primeira vez desde 1994, quando foi eleito para o cargo, Neves enfrentará uma dissidência, ainda que Nizan declare não ser contra ele. Em outubro, Neves afirmou à Folha que não pretendia ser candidato novamente. Poucos acreditaram.


EMERGÊNCIA


E o Ministério Público de SP vai convocar Julio Neves para uma reunião de emergência nesta semana. Os promotores, que já investigam a situação do Masp há meses, querem que ele acelere a entrega de documentos que detalham a situação financeira do museu. A promotora Mariza Schiavo Tucunduva pretende investigar se o furto na instituição tem relação com a crise que ela enfrenta.’


 


RADIODIFUSÃO
Elvira Lobato


Governo ignora limite para concessões de canais de TV


‘Apesar do discurso oficial pela democratização da mídia, o governo Lula derrubou, na prática, o limite de propriedade de concessões de radiodifusão que vigora desde os anos 60. Com anuência do governo, o bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, é acionista de três emissoras de TV no Estado de São Paulo: duas como pessoa física e uma por meio de pessoa jurídica.


O limite estabelecido no decreto-lei 236 (de 1967), que está em vigor, é de duas TVs por Estado. Foi extrapolado em junho de 2005, quando a Rádio e Televisão Record S.A -concessionária da cidade de São Paulo- comprou, de bispos da Iurd, 30% da TV Record de Franca.


Macedo já possuía duas concessões de televisão em São Paulo, como pessoa física. Ele tem 90% da concessionária da capital (os outros 10% estão em nome de sua mulher, Ester Bezerra) e 63% da TV Record de Rio Preto.


O Ministério das Comunicações declarou à Folha que aprovou a transferência das ações da emissora de Franca por entender que o limite se aplica apenas a pessoas físicas.


A interpretação é contestada por especialistas ouvidos pela Folha. Na opinião do ex-ministro das Comunicações Juarez Quadros do Nascimento e de três advogados consultados, a transferência foi ilegal.


Para o consultor jurídico da TV Cultura de São Paulo, Fernando Fortes, a TV Record de Franca estaria passível de perder a concessão.


A avaliação dele é de que, se prevalecer a interpretação do ministério, o limite de propriedade de radiodifusão cai por terra.


As empresas do setor, tradicionalmente, burlam o limite, registrando as concessões em nome de diferentes membros da famílias, mas a artimanha é considerada legal, porque, individualmente, os acionistas ficam dentro do limite.


Pessoa jurídica


O caso de Macedo pode abrir caminho para que um mesmo acionista controle número ilimitado de emissoras, por intermédio de pessoas jurídicas.


Até 2002, pessoas jurídicas não podiam ser acionistas de concessionárias de rádio e televisão. Apenas pessoas físicas -brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos- eram admitidas.


Há cinco anos, o artigo 222 da Constituição foi alterado para permitir a participação estrangeira de até 30% nas empresas de mídia.


A emenda -regulamentada pela lei 10.610, em dezembro de 2002- também permitiu a participação de pessoas físicas em até 100% do capital de emissoras de radiodifusão.


Ações das emissoras da Rede Record foram transferidas para a Rádio e Televisão Record S.A, de propriedade de Edir Macedo e da mulher.


O presidente Lula autorizou a transferência indireta do controle da TV Record de Franca em junho de 2005, pelo despacho nº 52.


O ex-ministro das Comunicações Juarez Quadros do Nascimento, que estava no cargo quando a lei 10.610 foi aprovada, diz que o limite de propriedade tem de incluir as participações de pessoas físicas e jurídicas. Para ele, o limite de propriedade de concessões é importante para evitar o monopólio de grandes grupos.


Fortes diz que, por maior que seja a cadeia societária, é preciso identificar a pessoa física existente por trás da pessoa jurídica para o limite de concessões. ‘Não existe respaldo legal para excluir as pessoas jurídicas desse cálculo. Elas não podem ser usadas como subterfúgio’, afirmou.


Para ele, as ações preferenciais (sem direito) também contam no cálculo. A participação indireta de Edir Macedo na TV Record de Franca é com ações preferenciais.


‘O texto é claro: não poderão ter concessão entidades das quais faça parte acionista ou cotista que integre o capital de outras empresas executantes do serviço de radiodifusão além dos limites fixados’, declarou’.


 


Ministério diz que lei trata só de pessoa física


‘O Ministério das Comunicações afirmou que o Código Brasileiro de Telecomunicações de 1962 e o decreto-lei 236 de 1967 só disciplinam as participações acionárias diretas de pessoas físicas em empresas de radiodifusão e que as participações indiretas, por meio de pessoas jurídicas, não são disciplinadas em lei.


Com isso, o ministério entende que os limites de propriedade de televisão -no máximo duas emissoras por acionista, no mesmo Estado, e máximo de dez em todo o país- não se aplicam às ações adquiridas por empresas, como no caso da compra de 30% da TV Record de Franca, no interior do Estado, pela Rádio e Televisão Record S.A, do bispo Edir Macedo.


A informação oficial é que a transferência das ações da TV Record de Franca foi analisada pela Secretaria de Serviços de Comunicação Eletrônica e pela consultoria jurídica do Ministério das Comunicações e, ainda, pela chefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República, com assessoramento da Advocacia Geral da União.


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo o ministério, autorizou a transferência em 20 de junho de 2005, pelo despacho 52, publicado no Diário Oficial da União.


Para o Ministério das Comunicações, não há risco de a concessão da TV Record de Franca ser cassada, uma vez que ele entende que não foram infringidos os limites de propriedade de emissoras estabelecidos pelo decreto-lei 236.


Universal e Record


Procurada pela Folha, a Igreja Universal do Reino de Deus não quis se manifestar sobre o assunto das concessões de TV e recomendou ao jornal que procurasse o Ministério das Comunicações. A Rede Record foi informada do teor da reportagem, mas também optou por não dar entrevista.’


 


RODA VIVA
Mônica Bergamo


Busca


‘Pensando seriamente em sair da bancada do programa ‘Roda Viva’, o jornalista Paulo Markun convidou Ricardo Setti para assumir seu lugar.


Setti declinou.’


 


LIVRO
Lucas Neves


A biografia de Papai Noel


‘Ele já cruzou os braços (por obra de grupos socialistas) para protestar contra monópolios e trustes e serviu de metáfora para as benesses distribuídas por George W. Bush entre os financiadores de sua campanha à reeleição, em 2004.


Também foi garoto-propaganda de sapatos, cremes de barbear, rifles, bebidas alcoólicas e preservativos (feitos à sua imagem e semelhança, seja lá o que isso for), além de combatente simbólico nas trincheiras da Segunda Guerra e dos conflitos na Coréia e no Vietnã.


Nas horas vagas, consta que andou por aí de canoa, prancha, bimotor, tanque e mesmo trenó (puxado por cangurus ou, vá lá, renas) distribuindo presentes e ajudando pais incautos a disciplinar a cria.


A trajetória sui generis do barbudo mais célebre do Pólo Norte é passada a limpo em ‘Papai Noel: Uma Biografia’, do historiador canadense Gerry Bowler. Da gênese do presenteador bonachão à sua apropriação pela máquina capitalista de publicidade e entretenimento, passando pela cooptação do personagem por movimentos sociais e políticos, o livro mostra como ele tem servido a todo tipo de propósito sem se tornar anacrônico.


Em entrevista por e-mail à Folha, Bowler conta que o trabalho de pesquisa sobre o ‘biografado’ levou cinco anos. Ele diz que optou pela não-ficção porque ‘Papai Noel tem uma presença enorme na vida de centenas de milhões de pessoas’. ‘Ele dá emprego a muitos, é parte da vida familiar mundo afora e inspirou um sem-número de histórias, músicas e filmes. Ele é mais real do que muitos seres humanos.’


Exagero ou não, o fato é que, antes de desfilar em trajes vermelhos, o presenteador natalino foi um bispo de carne e osso que viveu no século 4, naquilo que é a costa da atual Turquia.


Nicolau (depois declarado santo, daí a designação Santa Claus em inglês) era um senhorzinho de 1,68 m, nariz quebrado, queixo e testa proeminentes que, por conta de seus milagres, foi cultuado em toda a Europa. Quando vieram as revoluções religiosas do século 16, a adoração a divindades medievais caducou e São Nicolau perdeu cartaz.


Austeridade


A tarefa de presentear passou então a ser desempenhada por uma galeria de personagens que incluía espantalhos, feiticeiras, demônios, fadas e reis. A partir de 1810, eles deram lugar a um Papai Noel ainda austero, com uma vara para castigar os indisciplinados.


Foram o autor William Gilley, em 1821, e o ilustrador Haddon Sundblom, um século depois, que definiram as bases do imaginário que atualmente cerca o personagem. O primeiro introduziu as renas, o trenó e o cenário invernal; ao segundo, couberam as roupas escarlates.


Nessa virada para o século 20, o comércio viu na associação com as virtudes do personagem (pontualidade de entrega e produção artesanal) uma arma para seduzir a clientela.


‘Mas seria um erro ver Papai Noel primordialmente como uma ferramenta do capitalismo. Já havia presenteadores mágicos bem antes da Revolução Industrial e da produção de bens em massa -que coincidiu com o surgimento de Papai Noel. O Natal pode existir sem consumismo’, afirma Bowler.


Caridade x consumismo


A reportagem insiste: mas não é justamente a condição paradoxal do personagem (ícone da extravagância consumista natalina e garoto-propaganda de ações de caridade) que o mantém moderno?


O historiador se sai com esta: ‘Creio que o imaginamos como um sujeito idoso, gordo e bonachão por motivos psicológicos e sociais bem definidos. Ele é velho porque essa é a idade em que se consegue ser próspero e generoso. Ele é gordo porque representa excesso e celebração, não economia e autodisciplina. E é bonachão pois o Natal é época de alegria.’ E arremata: ‘Se Papai Noel não existisse, teríamos que inventar alguém idêntico a ele’.


O que, convenhamos, seria um tanto custoso. No livro, Bowler mostra que, para chegar ao perfil atual, além de fazer incursões pela publicidade, o personagem estrelou filmes (como ‘Milagre na Rua 34’, reprisado ad nauseum por aqui, hoje inclusive -ver pág. E8) e inspirou compositores (vide o Irving Berlin de ‘White Christmas’).


Além disso, surgiu no front repetidas vezes (em cartuns e contos) para levantar o ânimo das tropas com lembranças da vida familiar. Ou da sexual, como fazia uma ilustração gaiata publicada numa revista francesa em 1916, em que se via um Papai Noel trazer aos soldados um trenó cheio de donzelas.


PAPAI NOEL: UMA BIOGRAFIA


Autor: Gerry Bowler


Tradução: Cristina Cupertino


Editora: Planeta


Quanto: R$ 37,50 (255 págs.)’


 


DULCINÉIA CATADORA
Raquel Cozer


Editora alternativa faz livros e arte a partir de papelão


‘Páginas xerocadas de textos de Manoel de Barros, Haroldo de Campos, Jorge Mautner e outros chegam às dezenas a um quartinho de cerca de 20 m2 no subsolo de uma casa na Vila Madalena, onde ganham capas de papelão, pintadas à mão.


Não é bem a idéia que se tem de uma editora, mas é o que, com o argumento de ser também coletivo de arte e trabalho social, o projeto Dulcinéia Catadora vem fazendo há quase um ano em São Paulo.


‘Nada aqui é tradicional nem convencional’, define a coordenadora Lúcia Rosa, 53, artista plástica, enquanto se ajeita num banco ao lado do depósito de livros -uma bancada colorida em que identificar algum dentre os títulos empilhados parece tarefa das mais árduas.


Dulcinéia Catadora é a ‘irmã’ mais nova da iniciativa argentina Eloísa Cartonera, criada em 2003 e cujo trabalho feito por escritores, artistas e filhos de catadores de papelão (que pintam as capas) ficou conhecido no Brasil em 2006, quando participou da 27ª Bienal de SP. Os projetos, independentes um do outro, têm ainda similares no Peru, na Bolívia e no Paraguai.


Dulcinéia não tem subsídio e se ajeita como dá. Ajuda não falta: o quarto-sede foi cedido pelo projeto Aprendiz, os textos são liberados por todos os autores convidados a participar (Haroldo de Campos, que morreu em 2003, liberara os seus para Eloísa Cartonera).


O formato sofreu mudanças por aqui. Lúcia quis somar aos nomes do catálogo autores ‘em situação precária’. Isso coloca, junto com os veteranos do primeiro parágrafo, gente como o ex-sem-teto Sebastião Nicomedes. A pintura das capas também não fica só a cargo de filhos de catadores. Parte da equipe é formada por menores que viviam nas ruas antes de ganharem abrigo em um lar em Pinheiros.


O nome Dulcinéia veio de uma catadora paulistana que, durante a Bienal, proveu a Eloísa Cartonera de material. ‘Acho forte, como ela’, diz Lúcia. Calhou de ser o mesmo nome do amor idealizado de Dom Quixote, o que dá um ar romântico ao projeto. ‘É a nossa micro-utopia’, define a artista.


O ideal vem tomando formas palpáveis. As vendas começaram numa média de 80 por mês e hoje, segundo a artista, chegam a 400. ‘Vamos fazendo conforme a procura’, conta. É verdade que a produção depende mais da venda do mês anterior que propriamente de encomendas. ‘Quando acaba o mês, faço as contas para saber por quantos dias por semana poderei chamar os meninos, e disso depende o mês seguinte.’


Os jovens ganham de R$ 15 a R$ 30 de diária. Os livretos, de até 32 páginas, são vendidos a R$ 5 em locais como a Mercearia São Pedro, em São Paulo, e unidades do Sesc.


História da caixa


‘É um coletivo, não só um projeto social’, esclarece Lúcia. ‘Eles e eu pintamos juntos’, diz. Atenta, no outro canto da mesa, Jucilene Alves da Cruz, 17, camiseta lambuzada de tinta, levanta uma capa recém-pintada. ‘Olha’, diz, orgulhosa, antes de notar o estrago: ‘Ai!’.


Lúcia explica para a reportagem: ‘A gente pinta de um lado só’. E para Jucilene, que tinha pintado o outro lado de uma capa já pintada, diz, com jeito: ‘Desse montinho aí todos já estavam pintados…’. O erro, defende Lúcia, é raro. ‘É lindo como aprendem rápido.’ Entre as lições, está ‘dialogar’ com o papelão. ‘A caixa de papelão tinha uma história, certo? Então, não temos de escondê-la.’’


 


Ex-sem-teto está entre os best-sellers da editora


‘O catálogo da Dulcinéia Catadora lista poetas como Haroldo de Campos e Glauco Mattoso, mas cabe ao ex-sem-teto Sebastião Nicomedes, 39, a honra de dividir com Manoel de Barros o título de best-seller da editora. O que, em cifras modestas, equivale à venda de umas 300 cópias de seu ‘Cátia, Simone e Outras Marvadas’.


‘Manoel vendeu bem mais, mas ele é conhecido’, diz a artista Lúcia Rosa -’bem mais’ é toda a informação sobre as vendas de ‘Auto-Retrato aos 90 Anos’, com textos que o veterano liberou para a Bienal de 2006.


Nicomedes hoje vive em pensões. As ruas ele teve como lar em 2003, após sofrer um acidente durante um trabalho de, como diz, ‘comunicação visual’ (estava pintando letreiros). ‘Quando saí do hospital, meus colegas tinham sumido e fechado a oficina onde eu trabalhava e vivia’, diz o autor, que só tem o ensino fundamental.


Em albergues, escreveu a peça ‘Diário de um Carroceiro’, que ficou em cartaz nos teatros Fábrica e Sérgio Cardoso, em São Paulo, e se inspirou para os poemas de ‘Marvadas’.’


 


CINEMA
Rafael Cariello


‘A Bússola de Ouro’ incomoda religiosos


‘Ao contrário do que pode fazer crer a ladainha de religiosos conservadores nos EUA e até o Vaticano, a ‘Bússola de Ouro’ não aponta para direção alguma. O filme baseado na trilogia do escritor inglês Philip Pullman, ‘Fronteiras do Universo’, estréia hoje no Brasil com seus efeitos especiais milionários e uma miríade dos mais famosos e bem pagos atores do mundo -como Nicole Kidman, Daniel Craig e Eva Green- para contar uma história confusa, que termina de forma anticlimática e com cara de caça-níqueis.


Mas o que leva ao desespero certos católicos do planeta não é a (falta de) qualidade do filme, e sim uma instituição que aparece na obra escrita e no longa, o ‘Magisterium’. Se nos livros ela é explicitamente uma igreja toda-poderosa que pretende controlar e cercear o livre pensamento dos habitantes de um mundo paralelo, no filme ela é desprovida de qualquer caráter religioso, apresentando fumos de governo laico e totalitário.


Em entrevista à imprensa internacional no mês passado, em Londres, da qual a Folha participou, Green já alertava para o óbvio: livro e filme têm que ser pensados separadamente. ‘O ‘Magisterium’, por exemplo, é um pouco diferente. No filme, é um poder que quer controlar tudo. É diferente do livro’, disse a moça, que ainda credita ‘Os Sonhadores’, de Bernardo Bertolucci, como ponto alto de sua carreira.


Questionada sobre uma possível alegoria política do filme, respondeu à Folha, de modo irônico: ‘Você quer que eu fale sobre o Bush?’ Ela tinha razão, seria forçado; mas, no caso do filme, menos do que qualquer comparação com uma igreja.


Conservadores religiosos, porém, não prestam muita atenção em Green. Na semana passada, o jornal oficial do Vaticano, ‘L’Osservatore Romano’, comemorou a ‘baixa’ bilheteria do filme em seu primeiro fim de semana nos EUA (US$ 25 milhões), e afirmou que a história é antinatalina.


Trata-se da saga de uma pré-adolescente -’Lyra Belacqua’, interpretada pela jovem Dakota Blue Richards- em busca das pessoas que mais lhe são caras: um amigo que foi raptado pelo tal governo totalitário, e que é mantido no pólo Norte com outras crianças, e seu tio -Daniel Craig, o mais recente James Bond, como ‘Lord Asriel’-, um cientista que também desafia o poder central e se encontra na mesma região.


Tudo se passa em um mundo paralelo em que as ‘almas’ das pessoas são entidades em forma de animais que as acompanham para todo lado. Os ‘demônios’ das crianças, ainda imaturas, mudam de espécie animal dependendo do seu estado de espírito. Os dos adultos têm algo a ver com seu caráter ou posição social -o do bravo cientista, tio da protagonista, é um tigre, enquanto os de vários serviçais são cachorros. Funcionários moralmente asquerosos do ‘Magisterium’, metade policiais, metade espiões, são acompanhados por insetos.


O projeto, segundo o diretor Chris Weitz, ‘é o maior risco que a New Line’, mesma produtora de ‘O Senhor dos Anéis’, ‘já resolveu correr’. Custou, nessa primeira etapa, US$ 150 milhões. Ele afirma que a idéia é adaptar a trilogia de Pullman -e ele e os principais atores já têm contratos assinados para as seqüências.


‘Mas tudo depende do sucesso deste’, diz o diretor.


O filme acaba apontando para uma continuação, o que cria uma sensação de obra inconclusa ou capítulo de série de televisão. ‘Esperamos não desapontar a platéia’, diz Weitz.’


 


Sérgio Rizzo


Embalagem não compensa falhas da trama


‘Cinema industrial é sempre negócio. Filmes vindos desse espectro respeitam obrigatoriamente a uma lógica comercial que busca prever, entre outros aspectos, o melhor caminho para atingir seu nicho de público. Mas, quando a preocupação com o negócio é hipertrofiada, como em ‘A Bússola de Ouro’, quem padece é o cinema, o que compromete, no fim das contas, o próprio negócio.


Responsável pela trilogia ‘O Senhor dos Anéis’ (2001-2003), a produtora New Line embalou para a mídia a adaptação do primeiro romance da trilogia ‘Fronteiras do Universo’, de Philip Pullman, como se tivesse em mãos algo tão rico, prestigioso e sedimentado no tempo quanto a obra de J.R.R. Tolkien. Não tinha.


Ainda assim, anunciou que contratos já haviam sido fechados para as filmagens de mais dois longas e tratou ‘A Bússola de Ouro’ como primeiro capítulo, com final inconcluso. A decepcionante bilheteria nos EUA talvez encerre tudo por aí mesmo ou force brutal revisão de planos.


Além da diferença de matéria-prima, o diretor e roteirista Chris Weitz (‘American Pie’, ‘Um Grande Garoto’) não é Peter Jackson, o obstinado arquiteto de ‘O Senhor dos Anéis’. O registro imposto por Weitz se pretende épico, mas não contempla adequadamente pré-requisitos do gênero, como construção laboriosa de personagens e de suas missões.


Lorde Asriel (Daniel Craig), tio da menina Lyra (Dakota Blue Richards), e Sra. Coulter (Nicole Kidman), interpretados pelos maiores astros do elenco, são apenas rabiscados pelo filme, mais empenhado nas gratificações do parque de diversões dos efeitos especiais do que nas recompensas de uma boa dramaturgia.


A opção gera problemas costumeiros em superproduções contemporâneas, com destaque, aqui, para a limitação de público: não se trata, como gostaria a New Line, de produto para ‘todas as idades’, e sim de um longa de férias para crianças que pais serão obrigados a assistir para acompanhá-las. Universos de características visuais rebuscadas e criaturas extraordinárias, como o de ‘A Bússola de Ouro’, puderam chegar ao cinema nos últimos anos graças a processos digitais de realização, mas só ampliam seu público se têm algo mais sólido a oferecer.


A BÚSSOLA DE OURO


Direção: Chris Weitz


Com: Nicole Kidman, Daniel Craig, Dakota Blue Richards


Produção: Inglaterra/EUA, 2007


Onde: Bristol 1 e circuito


Avaliação: regular’


 


‘BÚSSOLA’ PODE ANTECIPAR O FUTURO


‘Repleta de paralelos com o nosso universo, como a instituição maligna Magisterium, inspirada na Igreja Católica, a trama de ‘A Bússola de Ouro’ caminha graças ao aparelho do título, que não é bem uma bússola. A heroína infantil Lyra carrega um ‘aletiômetro’, que possibilita antecipar o futuro e checar a ‘verdade’. Existe apenas meia dúzia de ‘aletiômetros’ nesse mundo em que, no lugar da energia elétrica, há o ‘poder anbárico’; e a manifestação do ‘pecado original’, capaz de subverter o pensamento, segundo a Magisterium, é um pó mágico.’


 


TELEVISÃO
Mariana Botta


Ex-vilã, Lilia Cabral vive sofredora


‘A imagem da insuportável Marta, personagem de Lilia Cabral em ‘Páginas da Vida’ (2006/07), permanece no imaginário do telespectador, mas Lilia Cabral já está em outra. Colheu os frutos pela elogiada atuação, sendo a primeira brasileira indicada ao Emmy (Oscar da TV), e se prepara para viver uma mulher submissa na próxima novela das oito da Globo. E sonha emplacar o seriado ‘Luisa’, em 2009. Sobre a próxima novela -sem título definido e que deve estrear em 26/5-, o autor João Emanuel Carneiro nega que a personagem de Lilia possa ter uma experiência homossexual, como foi cogitado, segundo a própria atriz. ‘Não sei de onde tiraram isso, os conflitos dela serão outros’, afirma Carneiro.


FOLHA – Como se sentiu ao ser indicada ao prêmio Emmy?


LILIA CABRAL – Senti-me prestigiada, porque me selecionaram por algumas cenas, o que me deu uma sensação imensa de felicidade, de reconhecimento.


FOLHA – Como foi a premiação?


LILIA – Foram três dias de eventos, com exibição das cenas de todos e mesas de debates. Ninguém de lá entende como funciona uma telenovela.


FOLHA – Esperava por esse reconhecimento?


LILIA – Acho que tudo ocorre na hora certa, vi que tudo o que já fiz valeu a pena. O maior prêmio ganhei na volta ao Brasil: uma carta linda do Marcos Caruso publicada em ‘O Globo’.


FOLHA – Você fará a próxima novela das oito. Como será seu papel?


LILIA – Vou interpretar Catarina, uma personagem que pode passar por um conflito homossexual [o autor nega]. Mas isso ainda não está definido, eu apenas conversei com o João [Emanuel Carneiro, o autor].


FOLHA – Como é a Catarina?


LILIA – Ela tem um marido insuportável e dois filhos. Vai sofrer muito e se sentir humilhada por ele. É filha do personagem do Tarcísio Meira, é dona-de-casa e vive em uma vila industrial, perto de São Paulo.


FOLHA – Como está o projeto do seriado ‘Luisa’?


LILIA – Ficou para 2009. É sobre uma mulher que resolve os problemas dos outros, mas não os dela. [A idéia do seriado] veio de experiências pessoais. A vida exige muito da mulher.’


 


Adriana Pavlova


Canal analisa o espetáculo ‘Milágrimas’


‘Mestre na arte de transformar pessoas comuns em bailarinos, o coreógrafo Ivaldo Bertazzo comanda o especial ‘Milágrimas’, que o canal SescTV exibe nesta noite. Estão lá, num único programa, o espetáculo de dança ‘Milágrimas’, criado por ele em 2005 com adolescentes da periferia de SP, um documentário dirigido por Eliane Caffé em torno do cotidiano desses novos bailarinos e ainda o show da trilha sonora da coreografia.


Construído a partir do encontro da cultura brasileira com a africana, o espetáculo tem três partes. Na primeira, ao som de cantos africanos do grupo Kholwa Brothers (não por acaso, fundamental para a concepção dos movimentos), os 41 bailarinos criam uma série de sons com seus corpos.


Na seqüência, há referências ao passado imperial brasileiro, com uma releitura de danças da época, para, no fim, já nos dias de hoje, surgir uma mistura de funk com dança de rua. Mas o melhor é Bertazzo explicando a criação de ‘Milágrimas’.


O show é uma festa de sons brasileiros e africanos, com a presença dos Kholwa e de músicos daqui. Já o documentário revela os bastidores do espetáculo, mas, sobretudo, mostra quem são aqueles rapazes e moças cujas vidas foram transformadas pela dança. Uma fábula que combina muito bem com a noite de Natal.


ESPECIAL MILÁGRIMAS


Quando: hoje, às 22h


Onde: SescTV’


 


ANIMAÇÃO
Pedro Cirne


‘Persépolis’ traz visão feminina do Irã


‘Marjane Satrapi nasceu em Rasht, Irã, em 1969. Aos dez anos, após ter estudado em uma escola laica e bilíngüe, foi obrigada a freqüentar um colégio religioso e a usar véu. Foi a primeira conseqüência direta em sua vida da Revolução Islâmica de 1979, que derrubou o xá Reza Pahlevi. A história de sua vida desde então, assim como a do Irã pelo seu ponto de vista, estão contadas em ‘Persépolis Completo’, lançada neste mês no Brasil. A vida de Marjane passou por muitas transformações, como ela narra nesta história em quadrinhos autobiográfica. ‘Persépolis’ foi lançada originalmente na França, em 2000. Depois, ganhou continuações, uma por ano, até o quarto e último volume, em 2003. A série foi publicada no Brasil de 2004 a fevereiro deste ano, e o novo volume reúne conteúdo dos quatros livros em uma edição de 352 páginas. Marjane cresceu em uma família politizada e que era contra as mudanças que vieram a partir de 1979 -eles participaram de manifestações contra o uso obrigatório do véu, por exemplo. Em 1980, um de seus tios foi preso pelo governo iraniano e executado como espião.


Migração para a Europa


Com o início da guerra contra o Iraque (1980-88), a situação foi piorando. Em 1983, aos 14 anos, Marjane mudou-se para a Áustria. Seus pais ficaram no Irã, e ela se viu sozinha diante da cultura européia. Além de não falar alemão, enfrentou dificuldades naturais de adaptação, além da adolescência. Queria fazer amigos e namorar, mas tinha medo de perder sua identidade e de não ser mais aceita em seu país. Aos 18 anos, voltou para o Irã.


Após quatro anos na Europa, sentia-se ocidentalizada demais para ser aceita pelos antigos amigos, assim como havia se sentido oriental demais quando foi para a Áustria. ‘Persépolis’ virou um longa-metragem animado com roteiro e direção da própria Marjane e de seu amigo Vincent Paronnaud. O filme estreou neste ano no Festival de Cannes, onde venceu o prêmio do júri; também participou da Mostra de São Paulo (melhor longa de ficção estrangeiro pelo júri popular); e é um dos cinco indicados ao Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro.


Além da qualidade artística, a chave para o sucesso de ‘Persépolis’, a HQ e o filme, é a mesma: trata-se de uma narração autocrítica e bem humorada de tal maneira que se torna difícil não simpatizar com a autora-personagem Marjane.


PERSÉPOLIS COMPLETO


Autora: Marjane Satrapi


Tradutor: Paulo Werneck


Editora: Cia. das Letras


Quanto: R$ 39 (352 págs.)’


 


 


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O Estado de S. Paulo


Segunda-feira, 24 de dezembro de 2007


TRIBUNE
Richard Pérez-Peña


‘Os jornais não acabaram. E não vão acabar’


‘Na quinta-feira, depois de fechar uma transação no valor de US$ 8,2 bilhões que retirou as ações da Tribune Company da Bolsa de Valores, Samuel Zell nomeou a si mesmo diretor-presidente do grupo, anunciou um novo quadro de diretores e gerentes e declarou que a empresa, em dificuldades, vai procurar elevar a receita em vez de reduzir despesas. Na entrevista coletiva à imprensa em Chicago, Zell, que ergueu fortunas com imóveis, fez questão de manter a reputação de ser um empresário rude, engraçado e totalmente contra a corrente.


Ele menosprezou o senso comum de que a indústria jornalística – e a Tribune Company mais especificamente – está sofrendo de uma longa e inevitável contração e declarou repetidas vezes que a Tribune poderá elevar suas receitas. ‘Estou enjoado e farto de ouvir todo mundo falar do fim dos jornais e condoer-se deles’, disse. ‘Eles não acabaram. E não vão acabar.’


Sobre a Tribune, disse ele: ‘Creio que é um investimento de risco muito baixo, mas essa não é a primeira vez que minha opinião diverge da de todos os demais’.


A transação converte a Tribune numa organização sem fins lucrativos de propriedade total de um plano pelo qual os funcionários são proprietários das ações. Mas Zell, que investiu US$ 315 milhões no negócio, tem o direito de comprar até 40% da empresa no futuro. A Tribune é dona dos jornais Chicago Tribune, Los Angeles Times, Newsday, Baltimore Sun e de 23 estações de televisão, entre outras coisas.


Na quinta-feira, a empresa acrescentou cinco membros à sua diretoria, em substituição a quatro diretores que estão saindo. Três outros permaneceram, incluindo Zell, o novo diretor-presidente. A maioria dos recém-chegados tem longa experiência em comunicações, mas não nas indústrias básicas de televisão e jornais da Tribune. ‘Não é uma diretoria na qual temos de ter pessoas que vão impressionar Wall Street’, comentou Zell. ‘Eles tendem a ser pensadores não convencionais.’


Um dos novos diretores é Brian L. Greenspun, que comanda a empresa de investimento de sua família, a Greenspun Corporation, e fez um investimento não especificado na Tribune. A Greenspun Corporation possui várias publicações, entre elas o jornal Las Vegas Sun, do qual Brian é o editor.


Os outros são Jeffrey S. Berg, que dirige a agência de talentos International Creative Management; William C. Pate, um executivo da firma de investimentos de Zell; Maggie Wilderotter, presidente do conselho e diretora-presidente da Citizens Communications, uma empresa de telefonia e internet: e Frank E. Wood, que tem comandado uma cadeia de estações de rádio, um firma de capital de risco e uma empresa de tecnologia de internet. Zell também nomeou dois vice-presidentes executivos: um dos seus ex-lugares-tenentes no ramo imobiliário, Gerald A. Spector, e Randy Michaels, um veterano executivo de rádio e televisão.


CRÍTICAS


Zell fez críticas severas à administração que está de saída da Tribune Company, dizendo que a velha guarda comandava um grupo cujas ‘decisões eram muito demoradas’. ‘Creio que, nos últimos cinco anos, essa empresa passou uma boa parte do tempo reduzindo custos e talvez não tempo suficiente aumentando as receitas. O que essa empresa precisa é de um dono’, disse ele. ‘Precisa de alguém que assuma a responsabilidade por aquilo que a empresa faz.’’


 


ESCUTAS
Sônia Filgueiras


Governo propõe prazo para grampos


‘O projeto de lei elaborado pelo governo federal para regulamentar o uso de escutas telefônicas e ambientais em investigações criminais fixa um prazo máximo de 360 dias ininterruptos para grampos oficiais. Pela proposta, o pedido teria que ser renovado na Justiça a cada 60 dias. Há uma exceção para escutas na investigação de crimes permanentes, como seqüestro e formação de quadrilha, para os quais não há prazo.


Elas poderão ser mantidas enquanto o crime estiver ocorrendo. Hoje, as autorizações judiciais para escutas podem ser renovadas a cada 15 dias indefinidamente.


O projeto também elimina o dispositivo da lei atual que prevê a transcrição do conteúdo de escutas gravadas, tema que divide opiniões no Supremo Tribunal Federal (STF) e preocupa órgãos de investigação.


A proposta deve ser remetida ao Congresso no início do próximo ano e promete gerar polêmica na Câmara, onde as propostas existentes, embaladas pela criação da CPI do Grampo, em outubro, incluem regras bem mais restritivas.


Em relação à norma atual, o projeto do governo detalha procedimentos, reforça controles, tenta eliminar dúvidas jurídicas, mas preserva as investigações da Polícia Federal. Definido em acordo com a PF e o Ministério Público, o prazo de 360 dias e a exceção dada a crimes permanentes são confortáveis e não afetam as grandes operações. ‘A legislação atual não protege o cidadão nem garante as condições para que a PF desbarate as grandes quadrilhas’, explica o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay.


Segundo fontes que acompanharam a discussão do projeto do Executivo, a avaliação do governo é de que o STF está cada vez mais rigoroso no exame de provas obtidas por intermédio de escutas, feitas com base na legislação atual, considerada ultrapassada. Segundo técnicos, é uma tendência que criará cada vez mais obstáculos ao trabalho da Polícia Federal.


‘O projeto do governo virá na hora errada. A suspeita de que os grampos vêm sendo utilizados de forma abusiva tem que ser investigada pela CPI, que oferecerá subsídios para elaboração de uma nova proposta’, diz o deputado e ex-superintendente da PF do Rio, Marcelo Itagiba (PMDB-RJ).


PRAZO MENOR


Na Comissão de Segurança da Câmara, a tônica dos dois projetos substitutivos existentes é apertar o cerco à polícia e às escutas. Em lugar dos 360 dias, eles propõem limite máximo de 60 dias. ‘O uso do grampo está banalizado’, justifica o presidente da Comissão, João Campos (PSDB-AL).


O projeto do governo determina que as partes interessadas no caso terão acesso ao conteúdo dos grampos por meio de cópias ‘identificáveis’, em uma tentativa de conter o vazamento dos diálogos. A proposta também amplia o uso da interceptação ao permitir que seja empregada para investigar crimes punidos com pena de detenção. Hoje, só é válida para casos cuja sanção é reclusão. Com isso, crimes como a ameaça passam entrar na lista.’


 


RAINHA ONLINE
O Estado de S. Paulo


Rainha transmite Feliz Natal pelo ‘YouTube’


‘A rainha britânica Elizabeth II transmite sua mensagem de Natal amanhã pelo site de compartilhamento de vídeos YouTube. Com 81, ela é a primeira monarca a ter seu próprio canal no site, em que também vai divulgar diversos vídeos sobre a família real. Seus votos de boas-festas devem ir ao ar às 13 horas de Brasília.’


 


ARTE EM PAUTA
Antonio P. Mendonça


Seguros para obras de arte


‘O assalto ao Masp, no qual os ladrões levaram um Picasso e um Portinari, abre espaço para algumas colocações a respeito do tema seguro e proteção de obras de arte. Em primeiro lugar é importante deixar claro que a não contratação de seguros para proteger os acervos dos museus e os patrimônios nacionais não é exclusividade brasileira. Como exemplo, basta lembrar o incêndio ocorrido não faz tanto tempo num dos palácios da família real britânica que não tinha seguro, em função do alto custo de uma apólice que o cobrisse adequadamente.


A partir do momento que um palácio real inglês (localizado na pátria do seguro) não tem sequer uma apólice de incêndio, fica fácil de entender por que no resto do mundo, por mais surpreendente que seja, um grande número de monumentos, palácios e museus não são segurados. Quando se fala de seguros desse tipo é preciso ter claro que não se trata de uma única apólice, com uma cobertura ampla, geral e irrestrita.


Não existe seguro com essas características. Cada apólice é pensada para uma determinada situação, com garantias predeterminadas, levando em conta, antes de tudo, seu custo e o patrimônio que se pretende garantir. Assim, normalmente um acervo histórico ou de arte é protegido por meio da contratação de vários tipos de apólices diferentes, cada uma com uma determinada cobertura e uma determinada abrangência, visando a um risco especial. De incêndio a roubo, passando por responsabilidade civil, um museu necessita das mais variadas proteções, cada uma com um preço específico, calculado de acordo com as particularidades dos riscos a serem segurados. Museus com proteções mais eficientes pagam seguros mais baratos e vice-versa.


Nesse cenário, dificilmente uma seguradora daria, tanto para incêndio, como para roubo, cobertura para a totalidade do acervo de maneira ampla ou por um valor global, sem especificar detalhadamente o valor individual das obras seguradas.


A razão disso é simples: o valor dos acervos, instalações e edifícios a serem protegidos.


Dando uma ordem de grandeza, o acervo do Masp é estimado em R$ 17 bilhões de reais.


Imagine o valor do acervo do MoMA ou do Louvre. São quantias estratosféricas, que inviabilizam a contratação de seguros para a totalidade de obras em poder da instituição, por mais rica que ela seja.


É difícil dizer que a política de minimização de riscos desse museu é assim e que a daquele é assado. Entre outras razões, porque não seria inteligente a divulgação das medidas de proteção adotadas e que vão muito além das apólices de seguros, passando por sofisticados sistemas de segurança, alguns secretos, inclusive pelas tecnologias envolvidas e por exigência das seguradoras.


O que ocorre com mais freqüência, quando um grande museu, dono de um valioso acervo, contrata seguros é a listagem das obras que serão seguradas, deixando várias delas, menos importantes, de fora, e assim privilegiar o essencial, na busca de um preço suportável para a instituição.


Além disso, o museu precisa definir contra que riscos ele quer o seguro. O risco de incêndio implica, em caso de sinistro, a perda para sempre dos quadros atingidos, o que pode não ser verdadeiro para as esculturas. De outro lado, o seguro de roubo, que é muito caro, pode ser menos importante pela interligação e internacionalização dos serviços policiais e pela dificuldade da colocação de obras muito conhecidas no mercado negro. O roubado pode ser recuperado. Que o diga a Monalisa, que já foi roubada do Louvre e está, faz tempo, de volta à sua parede.


O furto das duas telas do Masp é uma violência inominável contra a sociedade brasileira, mas está longe de ser a primeira vez que isso ocorre. O Brasil é famoso pelo furto de seu acervo artístico e cultural. Dadas as condições financeiras da maioria de nossas instituições, quem sabe, antes de se pensar em seguros, fosse mais realista investir em sistemas de segurança e na eficiência da polícia.


*Antonio Penteado Mendonça é advogado e consultor, professor do Curso de Especialização em Seguros da FIA/FEA-USP e comentarista da Rádio Eldorado. E-mail: advocacia@penteadomendonca.com.br’


 


LIVROS
Antonio Gonçalves Filho


Um Natal entre grandes intelectuais


‘Com demasiada freqüência heréticos distorceram as Escrituras para seus próprios fins, defende uma das maiores especialistas em temas religiosos, a inglesa Karen Armstrong. Não é seu caso, garante a autora. Ela concorre em prestígio com outros três estudiosos da Bíblia que têm esta semana seus livros lançados por quatro diferentes editoras: o húngaro Geza Vermes, a maior autoridade acadêmica nos Manuscritos do Mar Morto, e os norte-americanos Robert Alter, professor de literatura hebraica, e Garry Wills, ex-seminarista que se tornou professor de história e foi agraciado com o prêmio Pulitzer por Lincoln at Gettysburg, análise original sobre a influência do pensamento grego nos discursos do presidente americano Abraham Lincoln.


Três desses livros são recentíssimos: O Que Jesus Quis Dizer (Rocco, 152 págs., R$ 25), de Garry Wills, Natividade (Record, 190 págs., R$ 32), de Geza Vermes, e A Bíblia – Uma Biografia (Zahar, 276 págs., R$ 39,90), de Karen Armstrong. O quarto, de Robert Alter, A Arte da Narrativa Bíblica (Companhia das Letras, 288 págs., R$ 46), foi publicado em 1980 e não se tornou um clássico por acaso. A associação imediata que se faz entre Alter e Auerbach é justa: poucos intelectuais estudaram com tanta paixão o caráter literário das antigas Escrituras, guiando o leitor pela arte narrativa bíblica. Tanto que Alter se recusa a usar a designação Velho Testamento. Para ele, as narrativas do Velho e do Novo foram escritas em línguas e épocas diferentes e partem de pressupostos literários distintos. Portanto, não lhe pareceu correto reunir os dois testamentos num único quadro de referência crítica.


Alter lança nova luz sobre a Bíblia com sua abordagem diferenciada e o exame minucioso dos textos bíblicos, mas, como sugere o próprio título de seu livro, o foco é a narrativa literária, o que o faz criticar até a versão da Bíblia feita pelo rei James. Faltaria a ela, segundo Alter ‘clareza e precisão filológica’. Geza Vermes, em Natividade, embora não discuta o papel da arte literária na conformação da narrativa bíblica, segue alguns passos de Alter ao analisar as narrativas dos evangelistas. Em busca de suas contradições e das traduções manipuladas pelos mesmos para ‘agradar’ a um público de leitores versados em grego, mas não em hebraico, Vermes argumenta, por exemplo, que Mateus usou palavras do profeta Isaías para dar sua interpretação pessoal sobre a concepção virginal de Maria. Nesse sentido, o seu é o livro mais polêmico. Ele não teme a discussão. Afinal, conheceu todos os lados da religião: nasceu numa família judaica, foi criado como cristão e retornou às suas raízes quando maduro.


Logo nas primeiras páginas desafia o leitor cristão a encontrar nos Evangelhos qualquer indicação de que José, pai de Jesus, fosse um velho. Essa é uma idéia que teria origem no proto-evangelho de Tiago – um evangelho apócrifo, portanto. Ele também afirma que o Novo Testamento em lugar algum sugere que os visitantes do Oriente fossem reis. Magos, sim, mas não um trio. ‘Também em nenhum lugar está escrito que havia três reis, número certamente deduzido da quantidade de presentes relacionados em Mateus’, supondo que cada um deles trouxesse nas mãos ouro, incenso e mirra. E se fosse apenas um portando os três presentes? As narrativas da infância de Jesus, das quais deriva a tradição do Natal, constituem, segundo Vermes, ‘uma grande excentricidade dos Evangelhos’, argumentando que apenas dois dos evangelistas fazem referência à chegada temporal do Messias). Geza Vermes é briguento. Já Garry Wills, não.


Wills assume que o seu não é um livro acadêmico, mas uma obra de devoção. Nada de ‘Jesus histórico’. Para Wills, Jesus como uma pessoa não existe fora dos Evangelhos ‘e a única razão de sua existência é a fé dos seus autores na ressurreição’. A leitura dos evangelhos ‘não é suficiente para saber o que Jesus fez ou disse’. Seus atos e palavras, sim. Muita gente embarcou na canoa errada interpretando literalmente os textos evangélicos. Wills cita uma passagem de Mateus (Mt. 10,34) em que o evangelista transcreve as palavras de Jesus: ‘Não penseis que vim trazer paz à terra, e sim a espada.’ O cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, em seu filme O Evangelho Segundo Mateus, conferiu à frase um caráter revolucionário. Os cruzados, com base nessas palavras, teriam incorrido no mesmo erro, segundo o ponto de vista de Wills. Mas Cristo estaria dizendo que a espada seria usada contra ele e os seus, não por eles, defende. E cita novamente Mateus (Mt. 26,52) num diálogo entre Jesus e Pedro: ‘Põe a espada na bainha, pois quem toma a espada, pela espada morrerá.’’


 


A prosa sofisticada de um livro religioso que seria pura poesia


‘O estudioso Robert Alter, nascido em Nova York há 72 anos, é um homem sofisticado. Já esteve no Brasil algumas vezes, a última delas há dois anos como palestrante da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Dá aulas de literatura hebraica e comparada na Universidade da Califórnia. Além disso, assinou uma biografia crítica de Stendhal e retraduziu para o inglês os livros de Samuel e dos Salmos. Em outras palavras: Alter circula entre o mundo arcaico e o moderno com tamanha liberdade que dificilmente um leitor encontrará companhia melhor para uma visita literária aos textos bíblicos. Por uma feliz coincidência, seu livro está chegando na mesma hora da ‘biografia’ da Bíblia escrita pela inglesa Karen Armstrong , história do livro mais traduzido e publicado no mundo (mais de 6 bilhões de exemplares vendidos nos dois últimos séculos e traduzido em 2 mil idiomas).


Alter fica intrigado como tão poucos se dedicam ao estudo crítico da narrativa bíblica enquanto há tantos arqueólogos atrás de pistas que confirmem as especulações dos teólogos . Claro, antes deles outros ‘escavaram’ o material bíblico, como os respeitados Otto Eissfeldt e Edwin M. Good, mas A Arte da Narrativa Bíblica é menos reverente ao examinar certas passagens como deliberadamente criadas como prosa em substituição ao gênero épico – prosa pronta para virar poesia. Alguns de seus personagens, diz Alter, são caracterizados com tamanha economia que mais parecem criados por algum dramaturgo de gigantesca imaginação – e as histórias de Davi rivalizam em invenção literária com as contadas por escritores contemporâneos como Faulkner, um escritor essencialmente ‘bíblico’ citado em duas passagens do livro.


Karen Armstrong não chega a tanto em seu livro Bíblia – Uma Biografia, mas defende que o conhecimento religioso não pode ser comunicado pelo exame de uma página sagrada. As escrituras não se tornaram Escrituras por serem consideradas divinamente inspiradas, mas porque, segundo ela, as pessoas começaram a tratar esses documentos ‘de maneira diferente’, guardando-os em arca, carregando-os em procissão ou cobrindo-os com incenso. A autora conta que nem todos os profetas antigos – Jeremias, entre eles – eram simpáticos à palavra escrita, preferindo que os conhecimentos religiosos fossem transmitidos de forma oral, justamente para evitar a ‘pena mentirosa dos escribas’.


A exemplo de Garry Wills, Karen Armstrong critica a indústria erudita que transformou o ‘Jesus histórico’ numa fonte de cobiça das editoras. ‘O fato é que o único Jesus que realmente conhecemos é aquele descrito no Novo Testamento’, diz a escritora. A Bíblia, defende, jamais estimulou o conformismo. Ao contrário. Ela concorda com Hans Frei que dizia ser o livro sagrado um ‘documento subversivo’, desconfiado da ortodoxia desde os mais remotos tempos. ‘Donos de escravos interpretam a Bíblia de uma maneira’, observa. ‘Os escravos, de outra muito diferente’, conclui.’


 


Roberta Pennafort


Álbum de Retratos conta a história da arte no Brasil


‘Certo dia, nos idos de 1995, o compositor Moacyr Luz chegou a um show de Nelson Sargento e, numa mesa, avistou o cineasta Cacá Diegues. Estranhou e foi perguntar a ligação entre os dois. Descobriu que eles eram amigos desde que Nelson pintou o apartamento em que Cacá morava (o sambista e artista plástico já foi pintor de paredes). A história inspirou Moacyr a criar a coleção Álbum de Retratos, que homenageia personagens da música, do cinema e das letras reunindo fotografias do acervo particular deles.


A autoria dos livrinhos, que vêm numa caixa, é sempre de outra personalidade – e a ligação entre os dois é contada nas publicações. Os convidados escrevem pequenos textos que servem de comentário às fotos. No caso de Cacá Diegues, foi convocado Nelson Sargento. Cacá é um dos perfilados do segundo número da série, que traz também a história, em imagens, do fotógrafo Walter Firmo (assinada pela jornalista Cora Rónai) e do caricaturista Lan (pelo ator Antonio Pedro).


A primeira caixa celebrou Jards Macalé, Dona Ivone Lara e Turíbio Santos. Ainda virão por aí: Zezé Motta, Bete Mendes, Ruth de Souza, Ferreira Gullar, Ruy Castro e Drauzio Varella. ‘Eu queria pessoas diferentes. Não havia necessidade de mais um livro sobre Vinicius de Moraes’, explica Moacyr Luz, que obteve patrocínio da Petrobrás para o projeto.


Folheando as páginas – que terminam numa cronologia -, encontramos fotografias de bebês, viagens, trabalhos, mães, filhos, netos e 3 x 4 de diferentes fases da vida, que saem dos baús de cada um. ‘É o grande barato dessa história. Não queríamos as fotos manjadas. É legal enxergar na fotografia de infância o futuro do artista’, acredita Moacyr Luz.’


 


CINEMA
Luiz Carlos Merten


Escritor foi ver o filme e aprovou


‘Mais amor ou cólera? Já virou brincadeira entre críticos fazer essa pergunta a respeito de O Amor nos Tempos do Cólera, que o inglês Mike Newell adaptou do romance de Gabriel García Márquez. O filme que estréia amanhã encerrou, em outubro, o Festival do Rio. Vieram o diretor e parte do elenco. O produtor Scott Steindorff disse que o próprio García Márquez aprovou a adaptação. Depois de assistir a O Amor nos Tempos do Cólera numa sessão privada, na Cidade do México, o escritor elevou o polegar, num gesto positivo. É curioso que García Márquez tenha se identificado no filme – ou que pelo menos tenha encontrado nele algum valor narrativo. Para o crítico do L.A. Weekly, publicação independente de Los Angeles – e ele não é uma voz isolada -, O Amor é o pior filme adaptado de qualquer livro de um vencedor do Prêmio Nobel, em qualquer época.


Completam-se, em 2007, 30 anos da publicação de Cem Anos de Solidão, o livro que estabeleceu a reputação de García Márquez e pavimentou sua rota para o Prêmio Nobel de Literatura. A prosa do escritor é riquíssima. Os críticos literários dizem que ele é um dos grandes do realismo mágico e que seria este a melhor expressão do transe latino nas letras. É discutível – a descontinuidade é que nos representa na tela, como prova Terra em Transe, de Glauber Rocha, e ela não deixa de se manifestar em García Márquez. Não por acaso, o escritor e o cineasta fazem parte do movimento de afirmação da identidade cultural da América Latina, nos míticos anos 60.


No Rio, Mike Newell explicou que o maior desafio, ao adaptar García Márquez, havia sido a ‘textura’ da sua prosa. Comparou-a a um tecido finíssimo, que filtra (ou envolve) a realidade. Ele acha que o roteirista Ronald Harwood – vencedor do Oscar por O Pianista, de Roman Polanski – foi fiel ao escritor, mas ambos foram mais fiéis à história de amor, uma das mais belas já contadas. Em entrevista ao Estado, Fernanda Montenegro, que faz a mãe do personagem de Javier Bardem, disse que, na verdade, talvez fosse este o principal entrave à adesão do público. O cinema não conta mais histórias de amor dessa intensidade. A grande atriz buscou exemplos. Citou O Inocente, de Luchino Visconti, e Esposamante, de Marco Vicario. Não por acaso, são filmes italianos dos anos 70, a década em que George Lucas iniciou sua série Star Wars e, desde então, o desenvolvimento dos efeitos especiais virou dominante (com exceções, claro) na produção de Hollywood.


Tudo conspirava contra O Amor nos Tempos do Cólera. A fleuma britânica (do diretor) parece uma coisa alheia à sensualidade de García Márquez e existe o problema do idioma – o filme é falado em inglês, o que parece um crime contra a ‘textura’ da língua de García Márquez. Só isso já parece handicap negativo que chegue, mas o esforço de superação de Mike Newell não é negligenciável. Sombras de Goya, de Milos Forman, também é falado em inglês. Sobre isso, a atriz colombiana Catalina Sandino-Moreno, que participou da exibição do filme no Festival do Rio, sentenciou – ‘Essa história de amor é universal. Está acima da diferença de idioma.’ Logo na abertura, ao ouvir o toque de finados anunciando a morte de seu rival, Javier Bardem apresenta-se à viúva para reafirmar seu amor. Ela o enxota aos pontapés e começa a narrativa em flash-back. Muitos anos antes, o jovem Javier ficou instantaneamente apaixonado. Mas, pobre e poeta, ele foi preterido pelo pai da moça. Ela se casa com um pretendente mais adequado. Passam-se décadas durante as quais o herói adquire prestígio e fortuna, sem nunca deixar de sonhar com a amada. Ele espera – muitos até pensam que é homossexual, por nunca se haver casado, mas o herói é um caçador que contabiliza centenas de mulheres em sua cama. Uma delas, numa cena particularmente fiel ao espírito do escritor, recebe o amante com a chupeta na boca, o que aumenta a voltagem erótica da cena.


Toda a trama de O Amor nos Tempos do Cólera gira em torno dessa interrogação – o herói conseguirá lograr seu objetivo? A obsessão foi o que atraiu Mike Newell, a história de um amor maior que a vida. Existem muitas formas de definir este filme sobre uma espera de 50 anos. Ele trata do embate entre o amor e o desejo, entre a matéria e o espírito, entra a ação impulsiva e a palavra reflexiva. A decisão de filmar na Colômbia acrescentou novos problemas aos já existentes – o clima é úmido, chove muito e o calor é excessivo. Newell não abriu mão de filmar com elenco predominantemente colombiano. Deu um papel importante a Fernanda – o da mãe louquinha – e teve dois grandes colaboradores ligados ao cinema brasileiro, o compositor Antônio Pinto e o fotógrafo Afonso Beato. O esforço é grande, maior do que o filme. Mas, por essa história tão linda, pode-se sentir, sim, mais amor do que cólera.’


 


JACK BAUER
Julia Contier


Ele está de volta


‘A Globo volta a apostar em Jack Bauer durante as férias do Programa do Jô, em janeiro. Mas a sexta temporada da série 24 Horas, protagonizada por Kiefer Sutherland, só deve começar no dia 21 de janeiro, após o Jornal da Globo, e não mais no começo do mês como era de costume nos outros anos. Para o horário, a Globo vai transmitir, a partir do dia 1º de janeiro, o Festival de Sucessos, após Duas Caras, às terças, quintas e sextas-feiras.


Depois do dia 8 de janeiro, os filmes passam a ser exibidos depois do Big Brother Brasil 8. O reality show estréia com mais programas ao vivo e vai ao ar após Duas Caras, de segunda-feira a sábado, e após o Fantástico, no domingo.


Na área musical, a Globo reprisa os melhores programas de 2007. O Som Brasil irá ao ar de terça a sexta feira, até o dia 15 de janeiro, logo em seguida do Jornal da Globo.


Já o programa Por Toda A Minha Vida será exibido nos dias 7 e 14 de janeiro, às segundas-feiras. E nos dias 16, 17, 18 e 19 de janeiro, o Festival de Verão de Salvador anima as noites da semana após o Jornal da Globo e, no sábado, depois do Altas Horas.’


 


 


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