Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Terra Magazine

TELEVISÃO
Márcio Alemão

Foi bom pra você?, 31/12

‘Adoro retrospectivas, ao mesmo tempo que, a cada ano, elas me deixam mais preocupado. Fico surpreso: ´sério? aconteceu nesse ano?` Fazer o quê? A idade avança, a memória fraqueja e o mundo está cada vez mais lotado de gente. Gente que faz coisas boas e gente que faz besteiras. Uma das minhas promessas para o próximo ano é ter um caderno com dois lados: melhores e piores. Ao longo do período vou fazendo minhas anotações e, ao chegar na última coluna do ano, sem embromações, mandarei a lista. Por ora, vou tentar me lembrar de importantes momentos da Tv no ano que passou.

O pior acontecimento do ano, disparado na liderança, sem a mínima sombra de concorrência foi a Raposa que desrespeitou todos os seus assinantes alfabetizados, todos os os autores, todos os atores e diretores de suas séries e filmes ao dublá-las.

MVB, como sempre, um evento que se destaca, e também não encontra concorrentes, pela falta de inteligência. E o desse ano conseguiu apresentar o momento mais constrangedor dos últimos 5 anos: Barbara Paz, visivelmente alterada… pela emoção, talvez? ao lado de Paulo Cesar Pereio. Supla e seu pai também se destacaram nessa categoria vergonha alheia, mas não chegaram perto de Barbara.

O Alemão do BBB teve todas as chances e provou que não serve para absolutamente nada. Aliás, isso estava óbvio desde a primeira vez que apareceu e abriu a boca. Também é possível acreditar na tese de que lhe faltou o padrinho certo.

Luciana Gimenez continua a ancorar o seu Super Pop. Adriane Galisteu ainda não foi demitida do SBT. Otaviano Costa virou ator. Amaury Jr. foi um dos maiores vendedores de Cds de 2007. Remmy continua no ar. Nelson Rubens continua no ar. ´Toma lá da Cá` continua no ar.

Ainda sobre mistérios, muito estranho o comportamento de Aguinaldo Silva. Fez de tudo para ter muito mais destaque do que sua novela. Não era assim. E falando em velhos autores, tentem ler a entrevista que Walcyr Carrasco concedeu à coluna de Monica Bergamo no dia 26, comentando sobre a acusação de plágio. É breve mas devastadora. Conquistou minha eterna antipatia.

E sobre velhos apresentadores, Raul segurando a onda, Hebe fazendo o de sempre, Fausto e Gugu eternamente iguais, assim como Jô Soares. Xuxa, ao contrário, está tentando descobrir qual a idade do seu público. E o que talvez seja mais complicado: tentando descobrir se ainda tem público.

Quase me esqueço da patriotada dos locutores dos jogos cariocas de inverno e da péssima transmissão de todas as Tvs. Comentei por aqui: nunca tivemos tantos canais esportivos transmitindo a mesma coisa.

Resumindo, um ano sem grandes surpresas. A melhor ficou por conta da melhora sensível do conteúdo do Fantástico e das séries e seriados da Tv americana. Mudanças para 2008? Duvido. Valerá a pena ficar de olhos abertos na TV BRASIL.

Ah, sim! Temos a TV digital e nossa vida nunca mais será a mesma. Não esqueça disso e tenha um feliz 2008.’

RYAN GRACIE
Ricardo Kauffman

A complexidade do pitbull, 4/1

‘Certos acontecimentos são tão ricos em significados e conteúdos que se agigantam quando comparados à ficção. Alguns fatos que temos acesso pela cobertura jornalística trazem à tona a face complexa de personagens até então vistos de maneira unidimensional, caricata.

A trágica história da morte do lutador Ryan Gracie segue um roteiro de extrema qualidade narrativa, que não encontra paralelo fácil nos filmes de artes marciais, crônica social ou de qualquer outro gênero.

Ryan, 33 anos, pertencia à família Gracie, criadora de um estilo de jiu-jitsu que confere ao Brasil status de grande potência mundial desta luta e de vale-tudo, nas últimas décadas. Digno do sobrenome, Ryan foi campeão nas duas modalidades.

No último dia 14, o lutador assaltou um aposentado de 76 anos, armado com uma faca. Disse a ele que estava sendo perseguido, feriu-lhe a mão e levou seu carro, segundo o noticiário. Bateu o veículo roubado logo em seguida, derrubando um orelhão e um banco.

Saiu a pé e abordou um motoboy, novamente com a faca. Mandou ele entregar a moto, se não o mataria. Levou um golpe de capacete da vítima, que ajudada por colegas motoqueiros que se aproximaram, o imobilizou até a chegada da polícia.

Preso num distrito policial foi encontrado morto na manhã seguinte na cela em que permaneceu sem a companhia de outros presos. As circunstâncias de sua morte são obscuras e estão longe de ser esclarecidas.

Um campo de investigação é a atuação (ao que parece, nada ortodoxa) do psiquiatra Sabino Ferreira Neto. Ele aplicara um coquetel de seis medicamentos em Ryan, na noite em que este fora preso.

A família, que chamou e contratou o médico para ajudar a controlar Ryan na delegacia, o acusa de ser o culpado pela morte do lutador. No exame toxicológico feito na véspera foram encontrados traços de cocaína e maconha na urina de Ryan.

Mesmo com tantos fatores ainda a serem esclarecidos nesta história, é possível enumerar alguns que lhe conferem importância simbólica. São elementos que nos ajudam a compreender o contexto em que ela se passa – o nosso.

Não é preciso ser um adolescente morador da Barra da Tijuca para receber os fortes impactos da mensagem contida na figura de um lutador de vale-tudo, o gladiador pós-moderno.

Apesar da selvageria inerente a este tipo de combate, seus praticantes são pintados pela mídia que promove o negócio como atletas, expoentes, ídolos. Mesmo para quem não gosta de ver dois bruta-montes se pegando para valer, às vezes é difícil para qualquer um não deitar os olhos neste espetáculo bárbaro, feito homem medieval a assistir, excitado, execuções em praça pública.

São guerreiros durões, capazes de encarar qualquer parada, de verdade. Um modelo (talvez um fetiche) de autoconfiança, num universo diariamente alimentado pelo medo e insegurança.

Não é à toa que o pai de Ryan, Carlos Robson Gracie declarou, em entrevista ao JB, que seu filho ´era um herói´.

Pois bem, o campeão entre os homens de aço sofria de síndrome de pânico, segundo o próprio pai. Estava apavorado com fantasmas reais ou imaginários quando covardemente feriu um homem de 76 anos.

Disse à polícia que estava sendo perseguido ´pelo pessoal da favela e pelo PCC´. E apesar de ser uma máquina de lutar, foi derrotado por um tosco golpe de capacete. E por uma classe sofrida e nada glamourizada, porém unida e um tanto organizada – a dos motoboys.

Como encaixar fatos como este num filme de Jet-Li, Oliver Stone ou mesmo Quentin Tarantino? O que não se duvida agora é que o herói de carne e osso desta história cultivava fragilidades nada insignificantes no seu jardim secreto, no seu íntimo, como um homem comum.

Para terminar esta fábula real de potencial cinematográfico, temos a imagem do enterro. Numa cena de impressionar Nelson Rodrigues, o cadáver de Ryan foi vestido com quimono e faixa preta. Seu caixão foi carregado na altura dos ombros por seus companheiros musculosos, vê-se nas fotos. O enterro contou com a presença de centenas de pessoas, entre amigos e fãs.

Ryan não foi e nem é o único a ser levado a acreditar, desde criança, que vale tudo para ser forte.’

SUSTENTABILIDADE
Paulo Nassar

Influência de papai Noel, 5/1

‘Fim de ano parece abrir nas empresas o festival da publicidade para além do que é captável pelos sentidos. Pura metafísica, que encharca as mensagens promocionais das grandes cadeias de varejo, grandes empresas – principalmente bancos -, que assumiram sem cerimônia seu lado aristotélico.

A partir do badalar dos sinos anunciando a chegada do Natal e suas indefectíveis promoções no shopping mais perto e do próprio fim do mundo, acelerado pelo aquecimento global, elas deixaram de ser empresas físicas, com atividades de impacto no cotidiano econômico, social e ambiental e se transformaram, por meio da comunicação, em entes que se relacionam com a sociedade a partir de um ponto de vista mental, elevado, transcendente.

É a empresa metafísica como um bom parente, um bom amigo, um bom conselheiro, um bom cidadão, ou alguma coisa que se aproxima da religião. E assim, são boas pagadoras de impostos, se preocupam com os problemas sociais, com a crescente violência, tomam atitudes em benefício dos desassistidos e suas aflições sociais, econômicas e psicológicas. E mais, dão publicidade de seus feitos. Afinal, não basta fazer, importante é dizer que fez.

Neste final de ano, os bancos foram os grandes protagonistas deste tipo de publicidade. Assumiram-se seres metafísicos, agentes ativos da salvação socioambiental do planeta, com direito a repetir à exaustão a palavra-slogan: sustentabilidade. Difícil saber que produto vendem, a depender destes anúncios.

A retórica é comum a todos: ´proteger a natureza da devastação´, ´de não emprestar recursos para quem desrespeita os direitos humanos` etc. Uma conversa intencional, quase o mesmo discurso de organizações não-governamentais e de governo.

O espírito natalino, a figura do esquisito Papai Noel, açambarcado pelo mais puro mercantilismo, oportunidade da promoção rudimentar, parece ter despertado nos comunicadores valores não-monetários, ternuras empresariais como se o consumidor engolisse passivamente qualquer mensagem, diante da realidade física e dura dos balcões, dos escritórios e das linhas de produção, que desconstrói qualquer argumentação metafísica empresarial.

Falar de sustentabilidade como slogan é um exercício perigoso. Apenas como retórica, faz da sustentabilidade uma espécie de bumerangue descontrolado no rumo da credibilidade da empresa e da sua comunicação. E existe um tipo angelical, que habita as áreas de publicidade, jornalismo e relações públicas, opera a comunicação falsa e danosa para a sociedade, para as próprias empresas e para a Comunicação.

É preciso estar atento para esta mensagem empresarial olímpica e sua linguagem politicamente correta, sua fórmula desgastada de mostrar preocupação com a diversidade social brasileira, por meio da publicidade que traz representantes dos inúmeros grupos étnicos, deficientes e etários.

Isto é mordaça intelectual: uma comunicação empresarial que aposentou a criatividade, o bom humor, a irreverência e qualquer possibilidade de trabalhar abordagens inusitadas, na qual a inteligência, que cria valor para a empresa é assassinada pelo falso bom-mocismo de comunicadores despreparados para se relacionar com uma sociedade cada dia mais desvalida.’

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Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.

Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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