TELEVISÃO
A volta da monga, 10/09/07
‘- Bem; eu vou dormir porque amanhã tenho de acordar cedo. – diz um garotão.
– Mas por quê, meu filho? Você só tem aula à tarde! Questiona o avô.
E na seqüência, o garotão que precisava dormir cedo explica que na verdade tem um encontro com uma garota etc.
Ou seja: o comentário totalmente besta do avô serviu apenas de ‘deixa’ para o garotão falar a respeito do encontro.
Concordemos que outras muitas frases bem melhores poderiam ter sido ditas pelo avô.
Concordemos que um marmanjo que estuda à tarde, a não ser que seja um vagabundo de carteirinha, pode e deve ter um milhão de coisas para fazer pela manhã.
Será que exagero ao comentar sobre essa bobagem que vi e ouvi durante um dos capítulos da nova novela da Record, ‘Caminhos do Coração’? Não. Uma novela é feita de diálogos e está cada vez mais difícil suportar os diálogos da maioria das novelas. Dizia-se há muito: estão enchendo lingüiça. Isso resume a qualidade dos diálogos que tenho ouvido: sobra para todos os lados. Nada é preciso. Ouvi Selton Melo em uma entrevista falando quase sobre isso.
Explico o ‘quase’: falava ele sobre o não surgimento de muito bons atores jovens. Um dos motivos: muitos começam pelas novelas cujos diálogos, muito pobres, são apenas uma tentativa de reprodução do dia-a-dia.
Nada contra diálogos que espelhem o dia-a-dia. Mas um bom autor deve saber transformar esses diálogos. A diferença entre o dia-a-dia de verdade e os da ficção é que os da ficção são pensados, elaborados. Logo, deveriam ter mais sabor, maior riqueza, contundência. Não. Estão piores que os de verdade.
De volta à novela da Record, diria que ela é muito corajosa. O tema mutantes, sem a grana, sem os roteiristas, diretores e efeitos especiais de Hollywood, é repleto de perigo. E eu temo que não role.
Ontem demorei para entender que o tal garotão estava ouvindo os pensamentos da mãe, do avô e do pai. E esse, cá entre nós, é um truque simples. Entre outros, teremos o Menino-Lobo. Aqui, a experiência da Monga, a mulher macaco que já encantou gerações em parques de diversão, pode ajudar.
A clínica responsável por esses rebentos esquisitos fica no Guarujá. Por quê no Guarujá? Essa cidade abrigou muitos parques de diversão. Por lá passaram Mongas, meninos-lobo, mulheres barbadas… acho que foi uma escolha natural.
Márcio Alemão é publicitário, roteirista, colunista de gastronomia da revista Carta Capital, síndico de seu prédio, pai, filho e esposo exemplar.’
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