Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Um crítico literário para não esquecer

O crítico literário Wilson Martins (1921-2010) tinha a capacidade de ler muito e escrever muito e de expressar com precisão e clareza o que via em suas leituras. Faleceu neste sábado, dia 30 de janeiro. Não digamos a velha frase ‘perdemos um grande…’. Quando um escritor morre, ganhamos finalmente esse autor em sua plenitude possível. O ponto final biográfico é a chance de encontrarmos sua obra completa, consumada.


Pelo conjunto de sua obra, deveria ter pertencido à Academia Brasileira de Letras, talvez no lugar de imortais cuja contribuição para a nossa cultura não chega aos pés do que Wilson Martins fez. Seja como for, a coragem de expressar seus pontos de vista, doessem ou não, gostássemos ou não, é o legado que nos deixa. Coragem de ter opinião pessoal, de pensar por conta própria (como se fosse possível pensar por conta alheia…).


A independência intelectual e a seriedade lhe permitiram, por exemplo, num artigo de 1994, afirmar que desde a década de 80 Cristóvão Tezza, hoje premiadíssimo, já se apresentava, para além dos limites do provinciano, como romancista com categoria nacional. Em outro extremo, em vez de simplesmente recusar um escritor como Paulo Coelho, observa, com serenidade, que este se situa fora da literatura, mas o diz sem intenção depreciativa, com o desejo apenas de apresentar o fenômeno do ponto de vista cultural, fazendo sociologia do gosto literário, no contexto do nosso misticismo popular, que o autor de O alquimista capta e alimenta.


Literatura e jornalismo


Em 2005, levamos um susto quando Wilson Martins sumiu de O Globo: Alberto Dines comentou naquela altura o que tinha de ser comentado, o empobrecimento que este fato representava. Logo depois, no entanto, o crítico consagrado reapareceu nas páginas do Jornal do Brasil e, num dos raros momentos em que a polêmica ainda vem animar a atual vida literária brasileira, demonstrou, em artigo de 2006, a fragilidade da biografia que Daniel Piza escrevera sobre Machado de Assis.


O jornal é bom lugar para criticar literatura, opinar sobre novos e antigos autores – e não apenas trazer as resenhas dos lançamentos e a lista dos mais vendidos. O jornal como lugar, por outra parte, do texto vivo, lugar de formação também. Vale a pena ler, no volume 1 de Pontos de vista (T.A. Queiroz, Editor, 1991), o artigo (de 24/04/1955) no qual Wilson Martins relata seu encontro com Monteiro Lobato em 1938. Com apenas 17 anos de idade, trabalhando num pequeno jornal de Ponta Grossa, teve a experiência decisiva de conversar com um escritor maduro, idealista, que vivia em busca de palavras… e outros minérios.


 


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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br