Thursday, 26 de September de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 3107

Uso de computador pessoal cresce no Brasil

Leia abaixo a seleção de terça-feira para a seção Entre Aspas.


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O Estado de S. Paulo


Terça-feira, 1 de janeiro de 2008


INCLUSÃO DIGITAL
O Estado de S. Paulo


Computador em casa


‘Em pouco mais de dez anos, a porcentagem dos lares brasileiros que dispõem de computador cresceu mais de três vezes. Esse equipamento está presente em quase um quarto – ou, precisamente, 24%, segundo pesquisas recentes de instituições especializadas – dos domicílios do País. Em 1996, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, só 6,9% dos domicílios dispunham de um computador. Apesar do rápido aumento do uso doméstico de computadores, o potencial de crescimento do mercado brasileiro ainda é imenso. Por isso, a indústria de computadores, que registrou vários recordes de produção e vendas em 2007, projeta desempenho ainda melhor em 2008.


Segundo a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), que reúne as indústrias desse equipamento, em 2007 as vendas de computadores pessoais no Brasil alcançaram 10,1 milhões de unidades – um aumento de 23% sobre as vendas de 2006. A mais importante fabricante de processadores do mundo, a Intel, projeta para 2008 crescimento ainda maior do que o de 2007, de 25% a 30% nas vendas internas de computadores, o que daria cerca de 13 milhões de unidades.


Há um conjunto de fatores que explicam a aceleração das vendas de computadores pessoais em 2007. Um desses fatores é a eliminação da incidência do PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) nas vendas desse equipamento, que reduziu a taxação em 9,25%. A desvalorização do dólar em relação ao real resultou na queda do preço dos componentes importados, o que igualmente contribuiu para baratear o produto para o consumidor final.


O resultado foi notável. Nas últimas semanas, como constatou a reportagem do Estado, um modelo de mesa de determinada marca, com 512 megabytes de memória, que custava R$ 999 no Natal de 2006, era encontrado por R$ 799, uma redução nominal de 20%.


Ao barateamento do produto juntou-se a generosa oferta de crédito, para atrair mais consumidores, inclusive os de renda mais baixa, o que está provocando uma alteração expressiva no mercado e no uso da internet. Havia uma demanda reprimida nas classes econômicas C e D, que começa a ser aliviada. Essa demanda é atendida por computadores com menos recursos e, por isso, mais baratos.


Famílias que até há pouco estavam afastadas da internet agora têm acesso a ela. E obtêm o acesso por meio da internet discada, que oferece menos facilidades, mas é mais barata do que a internet de banda larga. Assim, o mercado da internet discada, que estava fortemente pressionado pela banda larga (que cresceu 30% em 2007), cresce com grande velocidade. Dos domicílios brasileiros ligados à rede mundial, 49% utilizam a internet discada e 40% dispõem da banda larga (os demais 11% utilizam outras formas de conexão). Ainda há muito espaço para a expansão do uso da internet no Brasil, qualquer que seja o tipo de conexão escolhida pelo usuário, uma vez que, como indica pesquisa recente, 86% dos domicílios não têm acesso à rede.


As famílias de renda mais alta, que já tinham computador pessoal, compram novos equipamentos com mais recursos e mais potentes. E compram também os computadores portáteis, cujo preço caiu ainda mais do que o dos computadores de mesa. Em 2006, o preço médio de um notebook (computador portátil) era 188% maior do que o de um desktop (computador de mesa) com as mesmas especificações. Em 2007, a diferença se reduziu para 68%.


Isso explica o impressionante crescimento de mais de 200% nas vendas dos notebooks em 2007 (2,1 milhões de unidades), na comparação com 2006. Esse crescimento acentuado leva os analistas a prever que, em três anos, as vendas de notebooks ultrapassarão as de desktops (hoje, os computadores portáveis representam pouco mais de 20% do mercado de uso doméstico ou pessoal).


O desempenho das vendas dos computadores para o uso no lar provocou outra mudança importante no mercado. Até 2006, as empresas eram os maiores compradores de microcomputadores. Em 2007, as vendas para uso doméstico representaram 51% do total.’


 


MÚSICA
Jotabê Medeiros


Um show de ano novo


‘Começou. E promete ser um ano tão diversificado quanto 2007, mas (ao menos no primeiro semestre) ensaia uma mudança: devemos presenciar menos megashows e assistir a um desfile de novidades artísticas.


Assim, um dos expoentes daquilo que foi batizado como ‘cena neorave’, o grupo inglês Klaxons, deve desembarcar no País já em março, para o Festival Indie Rock (ao lado dos também ingleses Editors e do americano Yo la Tengo). E há ainda uma lista quente (não confirmada) de novíssimos a caminho, como os franceses do Justice e os suecos do Peter, Bjorn and John.


Mas vamos ao que está certo. O neosoul do sueco Eagle-Eye Cherry abre a temporada, em 16 de janeiro, no Festival de Verão de Salvador (no dia seguinte, ele canta no Via Funchal, em São Paulo, e a seguir no Oi Noites Cariocas, no Rio).


Outro sueco melodioso (apesar do nome), José González volta com seu neofolk ao País para dois shows: no dia 22 de janeiro, no Sesc Vila Mariana, e no dia 23, no Santander Cultural, em Porto Alegre (RS). González nasceu em Gotemburgo, de família argentina, e esteve aqui no ano passado. É freqüentemente comparado a Elliot Smith e Nick Drake. ‘Mas acho que a música que mais me influencia é a brasileira. Adoro Chico Buarque, Vinicius de Moraes. Quando comecei a aprender violão, foi com a tablatura da bossa nova. O jeito de tocar e cantar de João Gilberto é uma grande influência’, disse ele ao Estado, no ano passado.


Simultaneamente, chega a atriz-modelo-apresentadora-cantora Hillary Duff, que se apresenta no Via Funchal nos dias 21 e 22 de janeiro (show extra, já que o primeiro vendeu tudo). É sua primeira vez no Brasil (ela tinha show marcado no País em maio de 2006, mas cancelou por conta de uma amidalite).


O peso chega com o Iron Maiden, nos dias 2, 4 e 5 de março, em São Paulo (Estádio do Palmeiras), Curitiba (Pedreira) e Porto Alegre (Gigantinho). A turnê Somewhere Back in Time World Tour 2008 é uma das turnês de maior fôlego da temporada: até agosto, o grupo terá viajado cerca de 100 mil milhas, passando por 20 cidades em cinco continentes em 7 semanas, o que inclui países como Índia, Japão, Austrália e Brasil.


Continuando na área do peso, já está confirmado para o dia 31 de maio um show do decano grupo de metal melódico escocês Nazareth na casa de shows Helloch, em Curitiba. De acordo com seu site oficial, eles tocam também em São Paulo, no dia 28 de maio, e em Florianópolis, no dia 1.º de junho, mas os locais ainda não foram divulgados.


A chegada dos Klaxons, em maio, além de prometer uma jornada de rock altamente dançável, de combustão instantânea, traz também um lado meio ‘Caras’ para o País, já que o garoto Simon Taylor, líder do grupo inglês, deve casar por aqui (ou já chegar casado) com a cantora brasileira Lovefoxxx, do grupo Cansei de Ser Sexy. É madeira sequinha para a fogueira do colunismo social.


No jazz, o ano já começa quente, com o retorno do quinteto do contrabaixista Dave Holland (até agora, só confirmado para o Mistura Fina, no Rio de Janeiro). Holland esteve aqui no dia 30 de setembro de 2006, e comemorou seu 60º aniversário no palco do Auditório Ibirapuera, acompanhado desse quinteto fantástico que tem o trombonista Robin Eubanks (de quem ele toca a composição Easy Did It), o baterista Nate Smith, o vibrafonista Steve Jones (de quem ele tocou Go Fly a Kite) e o saxofonista Chris Potter.


Já no Bourbon Street Music Club, a maior aposta do ano é o crossover. No caso, representado pelo grupo Bonerama, de New Orleans, banda residente do mítico club Tipitina?s. O grupo é liderado pelos trombonistas Mark Mullins e Craig Klein e, com uma formação típica das brass bands sulistas, investe contra todo tipo de estatuto musical, tocando também Jimi Hendrix, Led Zeppelin, Black Sabbath e Allman Brothers.


A usina sonora do Bonerama chega a bordo de seu terceiro álbum, Bringing It Home, gravado ao vivo no Tipitina?s em 24 de julho de 2007. Como eles, o grupo americano Ozomatli, formado em Los Angeles por filhos de imigrantes, misturando salsa, funk, jazz e hip-hop, seduziu platéias e ganhou um Grammy em 2004. É atração no Auditório do Ibirapuera, no dia 10 de fevereiro.


Outro show confirmado é o do retorno do Earth, Wind & Fire, que chega ao Via Funchal no dia 16 de fevereiro. Lendário grupo de música black americano, a banda levou ao paroximo a mistura de funk, jazz, soul, gospel, pop, rock & roll, psicodelismo, blues, folk, música africana e, em sua época, disco music.


Para os fãs do rock psicodélico brasileiro, há uma grande notícia: a lendária banda brasileira Casa das Máquinas fará um show de retorno no Festival Psicodália, que será realizado entre os dias 2 e 5 de fevereiro no campo, em São Martinho (SC).


A banda Casa das Máquinas foi criada em 1972, quando Netinho e Aroldo, dos Incríveis, descontentes com o rumo comercial que sua banda estava tomando, resolveu retornar ao rock puro. A banda se desfez em 1978, depois de um incidente que resultou na morte de um cinegrafista. Mas tem legiões de fãs até hoje.


O Festival Psicodália reúne algumas das bandas mais interessantes da nova safra psicodélica, como Gato Preto, Sopa, Sopro Difuso, Cores Berrantes e Goya (do Paraná), Tomada (de São Paulo) e Electric Trip, Fantomáticos e Apanhador Só (do Rio Grande do Sul). Tudo num cenário de rios, cachoeiras e mato.’


 


TELEVISÃO
Etienne Jacintho


Bloco cria regras para os anunciantes


‘Para evitar peças publicitárias com conteúdo apelativo, o bloco Pop Box – que vai ao ar das 17h30 às 18 horas e conta com atrações voltadas para crianças e pré-adolescentes de 3 a 12 anos -, da PlayTV, possui regras que restringem anunciantes. A restrição foi um acordo entre a emissora e a Log On, empresa que distribui o conteúdo da faixa infanto-juvenil.


‘Tomamos cuidado na escolha das peças publicitárias’, afirma o presidente da Log On, Eduardo Mace. Segundo ele, anúncios que usam crianças para gerar um apelo comercial e aqueles que vendem alimentos que fazem mal à saúde estão fora do intervalo do bloco.Para definir quem pode ou não anunciar no Pop Box, Mace e sua equipe criaram uma cartilha que une conceitos utilizados por governos de países como a França e o Canadá. ‘Essa é uma responsabilidade não só do governo como também dos pais e da sociedade’, afirma.


Mace lamenta que essa seja uma estratégia isolada na TV hoje. ‘As TVs não enxergam a responsabilidade que têm, mas as empresas estão atentas e a própria Mattel (empresa de brinquedos) já mudou sua propaganda em respeito a esse público.’’


 


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Folha de S. Paulo


Terça-feira, 1 de janeiro de 2008


MEMÓRIA
Carlos Heitor Cony


2008


‘RIO DE JANEIRO – Não sei se o ano que está começando será bom e próspero, como geralmente desejamos aos outros e como os outros nos desejam. Mas o calendário marca alguns eventos importantes que nos obrigarão a refletir um pouco sobre a nossa história.


Um deles é o bicentenário da chegada da corte portuguesa ao Brasil. Muito já se escreveu sobre o assunto ao longo deste ano. Não vem ao caso se devemos reabilitar a figura de d. João 6º, se é que ele precisa mesmo de reabilitação. Ao editar o álbum oficial da Rio 92, pediram-me que dedicasse um retrato àquele que considerasse o carioca mais autêntico, com as virtudes (poucas) e os defeitos (muitos) que formam a personalidade de quem nasce e vive às margens da Guanabara.


Escolhi d. João 6º, com seu chapelão de palha, na sombra e na água fresca de Santa Cruz, arredio da corte, detestando a política, mas gostando de coisas boas, não apenas de frangos assados, mas de música, das artes em geral. Saiu do Rio chorando.


Outro evento é o centenário da morte de Machado de Assis, um carioca enrustido, formal e chato nas lides oficiais, mas gozador e cético em sua obra universal.


Teremos ainda os 40 anos do AI-5, uma data macabra que teve início em 1964 e prolongou-se por mais de vinte anos. Foi o 13 de dezembro de 68 que marcou o momento de verdade do processo ditatorial que atravessamos naquela época. É preciso recordar que o movimento militar de 64 contou com o apoio majoritário e decisivo não apenas das classes dominantes, da quase totalidade da imprensa, da igreja e de grandes parcelas do povo.


Foram precisos quatro anos de violência e repressão para que todos acordássemos e, aí sim, o país ficou realmente dividido entre opressores e oprimidos.’


 


VIDA ONLINE
Afra Balazina


Na Riviera, veranistas trocam praia por internet


‘Orkut, Messenger, e-mail, jogos e até trabalho. Na Riviera de São Lourenço, em Bertioga (litoral norte de São Paulo), muitos trocaram a praia pela rede de internet sem fio e gratuita do shopping do condomínio de alto padrão.


Por volta das 11h de ontem, mais de 20 notebooks estavam abertos sobre as mesas da praça de alimentação. Os usuários têm idades e interesses variados e alguns dividem o computador com parentes e amigos.


‘Hoje deixei a praia um pouco de lado porque queria ver as mensagens dos amigos, saber onde eles estão. E a internet é o meio mais rápido para isso’, contou a estudante Caroline Mazzucchelli, 20.


Bruna Giberti, 17, que está com a família na Riviera desde a última quinta-feira, aproveitava para se inscrever em faculdades nos Estados Unidos. ‘Assim que terminar, vou correndo para a praia.’


Já o analista de sistemas Rodrigo Queiroz, 25, teve de usar o laptop para trabalhar. ‘Na verdade, hoje é um dia de trabalho normal para mim. A sorte é que só preciso estar conectado para poder trabalhar, então não precisei ir embora da praia.’


Alessandro Dalécio Junqueira, 30, que trabalha em cartório, navegava pela internet enquanto o amigo trabalhava. ‘Agora está muito quente. Quando o sol abaixar um pouco eu vou para a praia.’ Para ele, o condomínio é seguro e, por isso, não há problema em sair com o notebook a tiracolo. ‘Se estivéssemos na Praia Grande, por exemplo, teria medo.’


O local é tão seguro que os vigias não deixavam a reportagem sequer conversar com os veranistas. ‘É preciso autorização da associação [de amigos da Riviera]’, disse um segurança.


Sem sofrimento


Quem decidiu sair de São Paulo na manhã de ontem e ir para a praia não sofreu tanto. O trânsito para Bertioga estava bom, sem pontos de lentidão.’


 


OLIMPÍADA
Folha de S. Paulo


TV oficial estréia com briga conjugal


‘O canal esportivo CCTV5 encarou a fúria de Hu Ziwei, apresentadora e mulher de famoso jornalista esportivo local, Zhang Bin. Na transmissão da mudança de nome do canal (rebatizado Olímpico), ela invadiu o estúdio para denunciar traição de Bin.


‘Hoje é um dia especial para o Canal Olímpico, para Zhang Bin e para mim. Há duas horas descobri que ele é um adúltero. Em 2008, todo mundo se interessará pela China, mas, se não pudermos exportar nossos valores, a China não será grande’, disse ela. O vídeo já é sucesso em sites de compartilhamento.’


 


CINEMA
Cássio Starling Carlos


‘Johnny’ complementa ‘Tropa de Elite’


‘No início dos anos 90, ‘a cocaína tinha entrado na corrente sangüínea da cidade’, escreve o jornalista Guilherme Fiuza em seu ótimo livro-reportagem ‘Meu Nome Não É Johnny’ (editora Record). Esta circulação, que conduziu um jovem de classe média a satisfazer sua ambição de ascensão pela via única do tráfico, ganha cores e sons ainda à altura na versão para o cinema.


Para quem não se identificou apenas com o desejo de extermínio do capitão Nascimento em ‘Tropa de Elite’, ‘Johnny’ torna ainda mais claro como funciona o outro pólo de uma história já nossa velha conhecida, em que muito crime combina com pouco castigo.


Sem se deter demasiado em interpretações sociológicas, o filme acaba por enfatizar a ‘polêmica’ a respeito da participação da classe média enquanto cúmplice na ascensão do tráfico no Rio nas últimas décadas.


Entretanto, de modo menos ambicioso que ‘Tropa’, que tenta esboçar o mecanismo desta cumplicidade ‘inconsciente’ ao denunciar sua base mercantil, ‘Johnny’ expõe mais diretamente o poder econômico de transformação social da droga ao se concentrar na trajetória de seu personagem central. O fato de João Estrella ser um garoto como outro qualquer, no Rio dos anos 70, fornece o acréscimo de autenticidade (e de culpa) a esse relato.


Neste sentido, ‘Johnny’ complementa o painel histórico, social e criminal do tráfico feito em ‘Cidade de Deus’ e em ‘Tropa de Elite’, dando a ele o elo que, nestas ficções, aparecia apenas de modo episódico. O jovem comum de classe média é o elemento que faz a circulação, que reúne as duas pontas que se alimentam e se abastecem: a do crime e a da grana.


Ainda uma vez, porém, a ficção dá um jeito de limpar a barra do espectador, para o qual a trajetória de ascensão e queda de João Estrella é oferecida dentro dos critérios da narrativa clássica, com sua lição de moral inequívoca na figura da culpa e da redenção.


Crônica social


De resto, ‘Johnny’ recupera um tipo de cinema bastante salutar em suas ambições comerciais, numa clara inspiração no modelo do qual Antônio Calmon foi prodigioso nos anos 70 e 80. Sem precisar decalcar os modos dramatúrgicos de televisão, o filme recupera o formato de crônica social, com personagens multifacetados e uma dinâmica narrativa bastante eficaz (que o roteiro, assinado pelo diretor Mauro Lima e pela produtora Mariza Leão, guarda da estrutura do livro que lhe deu origem).


Quando Calmon migrou para a TV, o cinema brasileiro perdeu parte de sua habilidade em oferecer, sem pretensões, ao público jovem de classe média filmes capazes de traduzir o espírito de época. Havia naqueles filmes também uma vocação de se comunicar com quem vai ao cinema, sem para isso adotar a via de mão única do escapismo.


Com excelente acabamento técnico e eficiência narrativa, ‘Johnny’ busca restabelecer, de modo semelhante, esta comunicabilidade de um modo profissional, sem ambições desmesuradas e até com uma pitada de consciência social.


Para quem se queixa que o cinema brasileiro só mostra sertanejo e favelado, vem suprir a falta de um personagem à sua imagem e semelhança.


MEU NOME NÃO É JOHNNY


Direção: Mauro Lima


Produção: Brasil, 2007


Com: Selton Mello, Cléo Pires


Quando: pré-estréias a partir de hoje no Eldorado, Bristol, Shopping D e circuito; estréia na próxima sexta


Avaliação: bom’


 


Silvana Arantes


Capitão Nascimento assombrou diretor


‘A popularidade do capitão Nascimento (Wagner Moura), o protagonista de ‘Tropa de Elite’, de José Padilha, ganhou os contornos de uma sombra no trabalho do diretor e roteirista de ‘Meu Nome Não É Johnny’, Mauro Lima.


‘O capitão Nascimento virou herói de um pensamento deturpado da classe média de que traficante tem é que levar porrada da polícia. Como vou fazer o cara que acha que o capitão Nascimento está certo se identificar com a história do [traficante] João Guilherme [Estrella, protagonista de ‘Meu Nome Não É Johnny’]’, perguntou-se Lima. A resposta foi dar ao personagem Estrella (Selton Mello) um caráter ‘engraçado, carismático, bravateiro’, de quem conquista pelo humor.


A solução pela veia cômica e a disposição firme de ‘não fazer um ‘drug movie’ não chega a ser, segundo Lima, sua adesão a uma fórmula de cinema. ‘As fórmulas são [feitas] para errar. De dez filmes que seguem fórmulas, em geral, um dá certo, um empata o jogo e os outros oito dão errado’, afirma.


O diretor diz que seu objetivo é ‘deixar o cara da locadora sem saber onde colocar o filme’. E brinca: ‘Espero que seja nos clássicos, entre ‘E o Vento Levou’ e ‘Cidadão Kane’.


Se renega as fórmulas comerciais, Lima tampouco abraça a idéia do cinema autoral para poucos. ‘Às vezes o cara se acha cult porque ninguém vai ver o filme dele e não lhe ocorre que o filme é uma bosta’, diz.


Ao filmar ‘Meu Nome Não É Johnny’, Lima, 40, diz que procurou imaginar a história sendo contada pelo personagem a um grupo de amigos, num bar. O resultado saiu ‘cronológico, clássico’, define, embora o filme lance mão de flashbacks.


‘Meu Nome Não É Johnny’ foi feito com R$ 5,5 milhões. A produtora Mariza Leão não reclama da falta de dinheiro, mas da dificuldade para reuni-lo.


‘Vi que esse é um tema maldito’, afirma Leão. ‘Para ser fácil captar no Brasil, a história tem que estar distante do eixo empresarial de quem decide.’


São as áreas de marketing que comumente avaliam e aprovam (ou não) projetos de filmes nos quais as empresas aplicam parte de seu Imposto de Renda devido. A operação, de renúncia fiscal, é prevista nas leis de incentivo à cultura.’


 


David M Halbfinger


Festival Sundance trará histórias pessoais e tramas de sobrevivência


‘DO ‘NEW YORK TIMES’ – Histórias pessoais, soluções individuais para problemas sociais e uma vertente inesperada de otimismo vão tomar o lugar das diatribes, das exposições e do clima de mau agouro na edição 2008 do Festival de Cinema Sundance, em janeiro. Entre os 64 filmes narrativos e documentários da competição do festival, 29 são os primeiros longas-metragens de diretores novatos que se expressam numa grande variedade de vozes e pontos de vista, lembrando a diversidade da blogosfera.


Os organizadores dizem que o festival pode proporcionar uma injeção muito necessária de surpresa -mas não necessariamente de rentabilidade- num setor do cinema independente prejudicado pelos resultados desanimadores das bilheterias deste ano. ‘Existe neste momento um certo clima de mal-estar na arena independente’, comentou Geoffrey Gilmore, diretor de longa data do festival, que acontece entre 17 e 27 de janeiro em Park City, nos EUA. ‘Talvez o público esteja encontrando filmes que o deixam exausto, ou talvez ache os filmes demasiado familiares, atendendo demais às expectativas. Este é um festival cujos filmes, independentemente de chegarem ao mercado mais amplo, em muitos casos farão você sair do cinema e querer falar sobre eles.’


Essa vitalidade, segundo Gilmore, vem dos lugares mais inesperados. Sundance, que é ao mesmo tempo uma vitrine da maior importância do cinema americano e bazar livre para executivos do cinema, procura enfrentar o dilúvio anual de filmes, examinando dezenas de possíveis trabalhos candidatos ao longo do ano. Mas, segundo Gilmore, mais de metade dos filmes escolhidos para serem mostrados em 2008 saiu ‘da pilha’. Ou seja, esses filmes não se beneficiaram de divulgação antecipada pela rede de agentes de talentos e vendas, diretores e outros ‘olheiros’.


A política sempre permeia os documentários em Sundance, e os cinéfilos de gorro de lã em Park City poderão ver filmes sobre o sigilo governamental, a dívida nacional e o problema da escassez de água. Mas a edição deste ano é muito marcada por temas políticos tratados em termos humanos. Em ‘Traces of the Trade: A Story From the Deep North’, de Katrina Browne, a diretora explora a história do envolvimento de sua família, da Nova Inglaterra, com o tráfico negreiro. E Christopher Bell, em ‘Bigger, Stronger, Faster*’, trata do consumo de esteróides por seus irmãos.


Os filmes que refletem ‘um senso de sobrevivência, de avançar em nosso mundo’, nas palavras de Gilmore, incluem ‘Greatest Silence: Rape in the Congo’, de Lisa F. Jackson, na qual a diretora entrevista vítimas de estupro. Em ‘Nerakhoon (the Betrayal)’, de Ellen Kuras, um jovem do Laos encara os efeitos devastadores do trabalho que seu pai fez para a CIA na guerra do Vietnã, escolhendo alvos para bombas.


Tradução de CLARA ALLAIN’


 


TELEVISÃO
Cristina Fibe


‘Desperate 3’ traz triângulos amorosos


‘Para quem se decepcionou com a segunda temporada de ‘Desperate Housewives’ depois do premiado début, a terceira, que chega às lojas brasileiras em DVD, é um alívio, apesar de um pouco irregular. As inúmeras reviravoltas (que forçam a acompanhar cada episódio) causam certa oscilação na temporada, que, no entanto, acerta mais do que erra.


O início, centrado na recente relação entre Bree e Orson, é um dos pontos altos: enquanto não se sabe se o futuro marido da metódica dona-de-casa matou sua ex-mulher, Susan se distrai com Ian e cuida de Mike, em coma; Gabi vira escrava da empregada chinesa que teve um caso com Carlos; e Lynette é obrigada a lidar com a filha de Tom fora do casamento.


Os triângulos amorosos aí estabelecidos mudam durante a temporada -mas as complicadas relações que afetam três partes não saem nunca de cena: Edie, que não poderia faltar, começa perturbando a vida de Susan e Mike, para depois causar ciúmes em Gabi com Carlos.


Já Gabrielle, que não é mais Solis, não se esquece de Carlos nem ao levar a sério sua relação com o charmoso candidato a prefeito. Mike, por sua vez, sai do coma e vai à luta contra o casório de Susan e o inglês Ian.


Até Lynette, que nos primeiros episódios fortalece seu casamento ao largar a carreira pela pizzaria dos sonhos do marido, quase perde Tom ao se apaixonar por um chef sem sal. O bônus do DVD traz falhas de gravação, curiosidades e o especial ‘no set com Eva Longoria (Gabrielle)’.


DESPERATE HOUSEWIVES – 3ª TEMPORADA


Distribuidora: Buena Vista


Quanto: R$ 154,90, em média’


 


Bruna Bittencourt


‘Grey’s Anatomy’ se destaca entre as séries de hospital


‘Hospitais são cenário e argumento para séries americanas como a nonsense ‘Scrubs’, a sarcástica ‘House’ e a realista ‘E.R.’. A mais recente a abordar o tema é ‘Grey’s Anatomy’, melhor série dramática no último Globo de Ouro e indicada a mesma categoria na próxima edição da premiação.


A trama de ‘Grey’s Anatomy’ gira em torno de médicos e seus respectivos pacientes. A diferença aqui é uma certa leveza pela imaturidade de seus personagens, reviravoltas e uma agilidade que ‘E.R.’ não possui mais.


Em sua terceira temporada, lançada em DVD, Meredith Grey (daí o nome da série, também um trocadilho com um antigo livro de anatomia, ‘Gray’s Anatomy’) tem que escolher entre o veterinário de seu cachorro (Chris O’Donnell) e Dereck ‘McDreamy’ (Patrick Dempsey). Izzie (Katherine Heigl, melhor atriz coadjuvante de série dramática no último Prêmio Emmy) enfrenta a morte de seu noivo. Cristina (Sandra Oh) e Burke (Isaiah Washington) tentam esconder a incapacidade dele de voltar à operar.


O casal O’Malley (T.R. Knight) e Callie (Sara Ramirez) enfrenta turbulências, e Mark ‘McSteamy’ (Eric Dane) volta à vida de Addison (Kate Walsh), enquanto Richard (James Pickens Jr) se prepara para a aposentadoria. Mas quem rouba a cena é a pragmática Miranda Bayley (Chandra Wilson).


GREY’S ANATOMY – 3ª TEMPORADA


Distribuição: Walt Disney


Quanto: R$ 154, em média’


 


Janaina Fidalgo


Cultura exibe Dominguinhos e Yamandú


‘Desde o início de dezembro, a TV Cultura vem exibindo uma série de especiais musicais. O próximo show que vai ao ar, amanhã à noite, é o de Dominguinhos e Yamandú Costa, em apresentação gravada no Auditório Ibirapuera, em SP.


À parte a introdução do programa, que pode soar demasiadamente didática a quem já conhece a trajetória e o trabalho dos músicos, o especial é mais uma boa chance de ver a bem-sucedida parceria entre dois virtuoses, um da sanfona e outro do violão.


Há uma parte totalmente instrumental (destaque para a interpretação de ‘João e Maria’, de Chico Buarque) e outra com algumas músicas cantadas, inclusive por Yamandú.


Elas são entremeadas por um trecho de bastidores em que eles relembram o primeiro encontro musical. E, aqui, o violonista gaúcho dá um depoimento que resume bem a personalidade de ambos. ‘Entrei com uma sede no palco, tocando milhares de notas para impressionar o Dominguinhos. E ele respondeu tocando quatro notas.


Naquele momento, eu entendi o que era colocar o coração na música’, diz. É este o tom da parceria, iniciada com um disco gravado pela Biscoito Fino: a serenidade de Dominguinhos em contraponto com a inquietude de Yamandú.


ESPECIAL MUSICAL DOMINGUINHOS E YAMANDÚ COSTA


Quando: amanhã, às 20h


Onde: TV Cultura’


 


QUADRINHOS
Pedro Cirne


Ano começa com boas HQs nacionais


‘De Laerte a Bennett, de Marcelo Campos a Flavio Collin, passando por Allan Sieber, André Dahmer, Wander Antunes, Mozart Couto… Este início de ano leva às bancas e livrarias bons exemplares de histórias em quadrinhos brasileiras. Entre as novidades, estão coletâneas, materiais inéditos e espaço até para inovações no formato das publicações.


Um dos lançamentos é ‘Talvez Isso…’, livro com tiras de Marcelo Campos. Primeiro brasileiro a desenhar super-heróis para uma editora grande norte-americana, a DC Comics, Campos apresenta agora um trabalho diferente.


Suas tiras passam longe do colorido cheio de movimentos dos super-heróis. São em preto-e-branco, algumas sem ação alguma, com frases que às vezes falam diretamente com o leitor. ‘Não olhe. Você pode se reconhecer’, provoca uma tira.


‘Foi uma migração não planejada’, conta o outrora desenhista da revista norte-americana da Liga da Justiça. ‘Eu não queria mais contar histórias, não no sentido de narrativa. E as tiras começaram a aparecer com idéias fechadas.’


‘Eu tenho inveja de quem faz tiras’, conta Campos. ‘Há a capacidade de concentração de informação. São apenas três ou quatro quadros e uma porrada de idéias.’


Uma tira por página


O formato do livro acompanha a mudança no estilo do autor. ‘Talvez Isso…’ é uma publicação horizontal, com apenas uma tira por página: 10 centímetros de altura por 21 centímetros de comprimento.


Questionado sobre em que gênero suas tiras poderiam ser enquadradas, Campos fica em dúvida. ‘Não pensei sobre isso. Poderiam ser tiras conceituais ou filosóficas. A tira não precisa ser só de humor, não é?’


Campos tem razão: não precisa ser só de humor. A série ‘Angeli em Crise’, de Angeli, e a fase atual das tiras diárias de Laerte nesta Ilustrada, por exemplo, não se enquadram necessariamente no gênero.


Entretanto, há uma grande identificação dos quadrinhos nacionais com o humor e, em parte, justamente graças a esses dois artistas.


‘A partir dos anos 80, o pessoal de São Paulo começou a formar quase uma escola de quadrinhos’, conta o paranaense Benett, que está lançando ‘Benett Apavora!’, primeiro livro com quadrinhos feitos por ele -tiras bem-humoradas às vezes estreladas pelo próprio Benett.


‘Há uma linha meio undergound, política e de comportamento, que é diferente das tiras norte-americanas e européias e que começou nos anos 80 com o pessoal da [editora] Circo, da ‘Chiclete com Banana’ e da ‘Piratas do Tietê’, afirma Benett, citando as revistas que projetaram nacionalmente os nomes de Angeli e Laerte, respectivamente, ambos com trabalhos publicados na Folha.


‘Para a minha geração, acho que eles foram até mais influentes que o pessoal de ‘O Pasquim’, diz Bennet.


O gaúcho Allan Sieber, que está lançando o livro ‘Mais Preto no Branco’, também cita ‘O Pasquim’, contestador jornal publicado de 1969 a 1991, ao comentar a identidade dos quadrinhos brasileiros.


‘Jaguar, Millôr Fernandes, ‘O Pasquim’… Temos uma tradição bem grande, e de qualidade, nos quadrinhos de humor’, afirma Sieber. Seu novo livro é uma continuação de ‘Preto no Branco’, lançado em 2004, com o mesmo humor ácido e crítico sobre tudo e todos, inclusive ele mesmo.


‘Tenho essa preocupação de retratar a sociedade que eu vejo’, conta o quadrinista Sieber. ‘É bastante autobiográfico: mesmo quando não apareço, são coisas que eu vi e vivi, ou que um amigo meu viveu.’


Entre os amigos de Sieber está o quadrinista André Dahmer, autor de ‘O Livro Negro de André Dahmer’. ‘São livros meio gêmeos, que têm a mesma faixa de humor’, diz Sieber.


As tiras de Dahmer trazem um humor também crítico e com momentos inspirados em sua vida. Há menções a parentes e amigos (como Sieber), ex-namoradas, bebedeiras e tiras sobre seus defeitos -memória ruim, por exemplo.


‘O Livro Negro…’ também traz personagens como o tirano sociopata Emir Saad, o ‘Monstro de Zazanov’; o vidente Mestre Bárbara das Boas Notícias; e a União Brasileira dos Moralistas de Fachada.


Ainda na área de humor, há o lançamento do segundo dos três volumes da coleção ‘Piratas do Tietê – A Saga Completa’. A publicação é cuidadosa com os personagens mais famosos de Laerte.


Neste número, há informações sobre a peça inspirada neles, ‘Piratas do Tietê – O Filme’, encenada em 2003, e a reunião de três histórias dos Piratas com inusitados convidados: Batman, o também heróico Fantasma e o poeta português Fernando Pessoa (!).


Além do humor


Nem só de graça vivem os quadrinhos brasileiros. Um dos lançamentos deste início de ano é ‘Caraíba’, um livro que reúne histórias inéditas de Flavio Colin (1930-2002), um dos maiores nomes dos quadrinhos brasileiros.


Trata-se de um álbum de aventura estrelado por Caraíba, um ex-caçador que se transformou em defensor da natureza. Suas histórias se passam na floresta Amazônica e envolvem elementos da cultura local -Caraíba interage com o Curupira e Iara, entre outros.


Essas histórias foram criadas originalmente para serem publicadas na Itália e eram inéditas no Brasil.


Assim como Colin, o roteirista Wander Antunes também teve passagens pela Europa em sua trajetória nos quadrinhos. Após publicar algumas histórias em revistas brasileiras, Antunes emplacou seis álbuns na França -material este que permanece inédito no Brasil.


Olhar sobre o mundo


E é de Antunes, roteirista radicado em Cuiabá, outro lançamento: ‘A Boa Sorte de Solano Dominguez’, cuja história se passa na Cuba de 1953.


Conta a história de um homem casado com uma mulher lindíssima e que a obriga a se prostituir para bancar seu vício com jogos. Quando ela morre, ele se vê em apuros.


Ilustrada pelo experiente Mozart Couto, quadrinista profissional desde 1979, ‘A Boa Sorte…’ não é uma HQ fácil de ser rotulada em um gênero.


‘Sou ruim com isso, não sei dizer’, afirma Antunes. ‘É um olhar sobre um tipo de mundo. A história de Solano poderia ser no Rio ou em Cuiabá, mas escolhi colocar em Cuba.’


Antunes pondera sobre a falta de gêneros diferentes disponíveis no mercado brasileiro de quadrinhos: ‘Acho que o problema é que se você for a uma banca ou livraria hoje, a oferta de quadrinhos está presa a alguns gêneros’, diz.


Sobre a cara dos quadrinhos nacionais, concorda que a maioria esteja ligada ao humor, mas não só. ‘Não dá para dizer exatamente que sejam a identidade nacional, mas os quadrinhos brasileiros passam pelo humor’, afirma. ‘Mas não sinto a necessidade de buscar uma identidade brasileira. O que eu gosto e busco são boas histórias. Somos tão miscigenados que acho que é natural que isso se estenda aos quadrinhos brasileiros, que têm múltiplas identidades.’’


 


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