Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Veja


CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA
Veja


Nada a ver com censura


‘Sob muita gritaria, o Ministério da Justiça divulgou novas regras para a
classificação indicativa dos programas de televisão na semana passada. A
portaria 264 é o último lance da reforma iniciada com o lançamento de um manual
que alterou os critérios de classificação por horário e faixa etária. A essência
do sistema em vigor foi mantida, mas com alterações pontuais importantes.
Instituem-se procedimentos que tornam mais difícil para as redes de TV protelar
uma eventual reclassificação de seus programas para horários mais avançados –
hoje, isso pode demorar tanto que a atração termina antes do fim do processo.
Obrigam-se também as emissoras a respeitar a classificação nos estados com
diferentes fusos horários – no Acre, por exemplo, a mesma programação do Sudeste
passa três horas mais cedo atualmente. Já o novo manual estabelece formas de
mensurar o nível de erotismo ou violência presentes em novelas e outros
programas com base no contexto em que a cena é mostrada.


As redes de TV aberta, que já condenavam as antigas regras, bombardearam a
iniciativa. Alegam que ela significa um flerte com a censura. É um argumento
cínico. O que está em jogo não é a liberdade de expressão, e sim a necessidade
de proteger as crianças. VEJA deixou clara sua posição numa reportagem motivada
por excessos da novela Páginas da Vida, em julho de 2006. Cabe aos pais, em
última instância, zelar por aquilo que seus filhos vêem. Mas as emissoras não
podem abrir mão de sua responsabilidade. Os especialistas não se cansam de
advertir que a exposição das crianças e adolescentes a questões como o sexo e a
violência requer cuidados dependendo da faixa etária. A TV aberta tem uma
influência enorme nesse aspecto, já que atinge toda a família. Há mais crianças
vendo televisão no horário nobre, quando costumam ocorrer os problemas, que em
qualquer outro momento do dia.


O Ministério da Justiça não tem o poder de punir as emissoras. Mas, se suas
determinações forem descumpridas, elas podem ser acionadas pelo Ministério
Público e estão sujeitas a multas e até à suspensão das transmissões. As redes
sustentam que esse caráter impositivo não encontra amparo na Constituição de
1988. Está em curso no Supremo Tribunal Federal um julgamento para decidir a
questão. Empatado em 5 a 5, o pleito será decidido pelo voto de Minerva da
ministra Ellen Gracie, nas próximas semanas. É um momento propício para despir o
debate de hipocrisia. O ideal seria que as próprias redes encontrassem uma forma
de controlar seu conteúdo. Infelizmente, isso não ocorre. A Abert, associação
que reúne as principais emissoras, defende que os aparelhos de TV venham a ser
dotados de um dispositivo que permita aos pais vetar certos programas. Há
inclusive uma lei nesse sentido, mas que esbarra na falta de regulamentação e
nos altos custos de implantação. Na falta de alternativas, não há como abdicar
da classificação indicativa.’


TELEVISÃO
Marcelo Marthe


O arrastão da Record


‘Na madrugada de terça para quarta-feira passada, a produção da novela Vidas
Opostas, da Record, ocupou um túnel carioca para gravar uma cena não muito
diferente dos arrastões reais que o lugar já viu. A seqüência de tiroteio entre
traficantes durante um congestionamento requereu o trabalho de 200 figurantes.
Para simular o engarrafamento, foram utilizados sessenta carros. Contou-se ainda
com uma equipe técnica de uma centena de pessoas, que incluía de dublês a
especialistas em efeitos especiais. E tome sangue artificial e tiros de festim –
ingredientes que são o principal tempero da atração da Record. A proposta de
Vidas Opostas é expor a violência no Rio de Janeiro sem meios-tons. Além dos
ataques de bandidos nos túneis, sua trama explorou a guerra pelo controle do
tráfico nas favelas, o uso de celulares nos presídios e a corrupção policial. E
isso tem dado ibope. O folhetim já atingiu médias de até 22 pontos e levou a
Record a ultrapassar a Globo na liderança da audiência por duas vezes, mesmo que
só por alguns minutos. A emissora tinha pressa com a cena do tal tiroteio. Ela
iria ao ar na própria quarta-feira – ou seja, menos de 24 horas depois de sua
gravação -, para fazer frente ao jogo da Copa Libertadores programado pela Globo
para o horário. É nesse dia da semana, quando o futebol afugenta as mulheres da
grade da Globo, que a novela se aproveita do flanco para cravar seus melhores
índices.


A violência nas metrópoles brasileiras volta e meia ganha espaço nos
folhetins. Em 2003, a Globo obteve grande repercussão com o capítulo de Mulheres
Apaixonadas em que uma personagem morria num embate de rua entre bandidos e
policiais. Mas deve-se dar o crédito à Record: embora se revele tosca nos
diálogos e figurinos, Vidas Opostas trata do tema com uma contundência inédita
em novelas. A aceitação disso, é claro, tem tudo a ver com o estado de espírito
dos brasileiros. Por volta de um mês depois de sua estréia, em novembro passado,
a emissora fez uma pesquisa com um grupo de donas-de-casa das classes C e D,
temerosa do impacto das cenas de violência. Verificou-se que elas repeliam uma
certa parcela das espectadoras. A maioria, contudo, não se deixava afetar
negativamente. Diante das tragédias do noticiário e da realidade que sentem na
própria pele, elas nem se chocavam tanto – e queriam mais é ver essas mazelas
escancaradas.


Para além de dar vazão a uma angústia social, contudo, a violência em Vidas
Opostas é bem digerida por outro motivo: ela está a serviço do melodrama. Não
por acaso, a novela só deixou de patinar no ibope quando engrenou o romance de
seu par principal, a favelada Joana (Maytê Piragibe) e o riquinho Miguel (Leo
Rosa). As cenas de violência também têm um óbvio apelo de ação, como não nega o
autor, Marcílio Moraes. ‘Quando um personagem empunha um revólver, o espectador
não fica indiferente’, diz ele. Os bandidos têm, por fim, a função de vilões. O
delegado Nogueira (Marcelo Serrado) é um mafioso que trata sua mulher com
brutalidade (em tempo: a chocante cena em que a estuprou também foi um dos itens
do ‘cardápio’ da semana passada). ‘Psicopatas como ele são ótimos personagens,
por ser violentos e imprevisíveis’, afirma Moraes.


A novela também inova por ter uma favela real como cenário. A Record tinha
dúvidas se seria viável gravar num morro, até descobrir a favela de Tavares
Bastos. O local, bem perto da sede do governo do Rio, deixou de ser dominado
pelo tráfico há alguns anos, quando passou a abrigar um batalhão de polícia. Ou
seja: é uma ‘favela light’. Em sua versão ficcional, os habitantes oprimidos
pelo tráfico um dia se rebelam. Moraes garante que copiou essa história de uma
fonte inusitada: uma peça do dramaturgo espanhol Lope de Vega (1562-1635), que
já foi cultuada pelos comunistas por narrar a vitória de uma comunidade contra
um senhor feudal. Nos anos 60, Moraes foi ele próprio filiado ao partidão. ‘Eu
me decepcionei com a esquerda depois de conhecer de perto a falta de liberdade
nos países do Leste Europeu’, diz.


Vidas Opostas tirou o noveleiro do ostracismo. Em 2002, depois de dezoito
anos na Globo, Moraes foi dispensado. Magoado, chegou a afirmar que um dia
derrotaria a ex-empregadora. Já se pode dizer que está tendo um certo gostinho
disso. Mas, passado o momento de deslumbre, Moraes agora é pragmático. Ele tem
contrato até 2008 com a Record (seus ganhos podem chegar a 300.000 reais por
mês, conforme o desempenho da novela no ibope). Mas não fecha as portas para uma
volta ao antigo lar. ‘Se a Globo me oferecer um bom contrato, por que eu não
pensaria na hipótese?’, diz.’


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