TELEVISÃO
A construção de uma vilã
‘Quando aceitou o convite para viver a Flora de A Favorita, Patrícia Pillar sabia que estava correndo um risco. Aos 44 anos e dona de uma carreira pontuada por personagens do bem, encararia sua primeira vilã, na primeira novela em horário nobre de um autor jovem e disposto a contrariar os modelos consagrados por seus pares mais experientes. A Flora criada por João Emanuel Carneiro entrou em cena como uma ex-presidiária com jeito de santinha injustiçada, revelou-se uma assassina dissimulada e caiu em desgraça à medida que foi engolida por suas carências afetivas. Poderia facilmente descambar para uma vilã memorável, mas caricata, como a Nazaré de Renata Sorrah em Senhora do Destino. No entanto, essa trajetória inverossímil ganhou consistência. Graças a um milimétrico trabalho de construção da personagem, Flora afirmou-se como uma das vilãs mais complexas já surgidas nas novelas brasileiras e fez de A Favorita um sucesso em sua reta final. ‘Ela alcançou o olhar legítimo do psicopata, da falta de sentimento. Inclina levemente o rosto para baixo e ergue sutilmente os olhos, como um predador’, diz a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do livro Mentes Perigosas: o Psicopata Mora ao Lado, usando a foto desta página como exemplo. A trajetória da vilã é a chave para a escalada de A Favorita no ibope. A novela tem audiência média modesta, de 40 pontos. Mas, desde dezembro, vários capítulos chegaram perto dos 50. Aquele em que Silveirinha (Ary Fontoura) troca de lado, aliando-se a Donatela (Claudia Raia) contra Flora, bateu em 51 pontos, o recorde desde o início da trama.
Esse desempenho acabou dando trabalho extra a Carneiro na reta final. Na quinta-feira, a oito dias do gran finale, o destino de Flora foi revelado por um jornal carioca. Irritado com o vazamento dessa e de outras cenas importantes, o autor decidiu fazer mudanças no último capítulo. Na versão tornada pública, a punição reservada à megera era ficar prisioneira de sua fixação maníaca pela irmã postiça Donatela. Ela voltaria para a cadeia, onde, ao vê-la lavando as calcinhas de outras presidiárias, uma novata perguntaria seu nome e ela diria: ‘Donatela’. No novo desfecho, será mantida a punição retumbante que se costuma reservar aos grandes vilões de novelas. Mas o que exatamente acontecerá com a protagonista só será decidido o mais perto possível da gravação da cena. O certo é que, na última semana, a vilã mergulhará cada dia mais na espiral de loucura em que entrou desde que se apoderou do rancho dos Fontini – família em torno da qual giraram muitas de suas crueldades – e cobriu as paredes com cartazes da dupla sertaneja Faísca e Espoleta, que formou vinte anos antes ao lado de Donatela.
Flora continuará terrivelmente má. Vai matar o bandido pé-de-chinelo Dodi (Murilo Benício), esfaquear o comparsa arrependido Silveirinha, infernizar o casamento e a lua-de-mel de Donatela com o repórter Zé Bob (Carmo Dalla Vecchia). Mas já estará vencida. Não pelo tiro que vai levar – na versão original, de sua filha, Lara (Mariana Ximenes); na nova, de Silveirinha ou Irene (Glória Menezes). Nem pela polícia – antes de ser presa, ela ainda fica foragida por algum tempo. O que vai minar a resistência de Flora é a carência de afeto, pano de fundo de todo o seu desajuste. A vilã julga que, na infância, sofreu rejeição das duas pessoas que mais amava – o pai e a companheira de trinados sertanejos. E a heroí-na decide se valer dessa fragilidade como arma para desbancá-la. ‘O afeto da irmã é a criptonita que derrubará Flora’, diz o autor João Emanuel Carneiro, referindo-se à rocha fictícia que é a única coisa capaz de exaurir as forças do Super-Homem.
A construção de Flora foi feita a quatro mãos. O texto é 100% de Carneiro – mas o jeito de ser da megera foi elaborado por Patrícia Pillar à custa de muito estudo e suor (veja o quadro). Patrícia dedicou todo o ano de 2008 à personagem. A imersão tem consequências até mesmo físicas. Volta e meia, ela termina as gravações ofegante. ‘O corpo não sabe que tudo aquilo é de mentira’, diz. Devotada e incansável, ela deu sugestões até no figurino: foi sua a ideia de que as mudanças no visual da personagem fossem graduais. ‘Comecei no teatro, onde a gente precisava participar de tudo. Novela é um trabalho longo, e o perigo é você arrumar uma fórmula de interpretar e se repetir’, diz. Carneiro não economiza elogios. ‘É muito bom quando o ator vai além do que está escrito e encontra a alma de um personagem. Patrícia tornou Flora tão palpável que dá arrepios’, diz ele. O noveleiro se inspirou num personagem de Shakespeare, o pérfido Ricardo III, para criar Flora. ‘Ambos têm em comum o fato de lançar mão da maldade para preencher o seu vazio interior’, afirma.
O nome de Patrícia surgiu como alternativa natural na busca da protagonista de uma novela que tinha como grande lance da primeira fase a ocultação da verdadeira identidade de Flora. A atriz tem uma imagem impecável junto ao público. Tanto pelos papéis que desempenhou ao longo da carreira quanto por sua vida pessoal. O público a admira pelo relacionamento de quase uma década com o deputado federal e ex-ministro Ciro Gomes, pontuado por uma evidente cumplicidade e por flagrantes românticos em bares do Rio de Janeiro e bailes Brasil afora. E pela coragem com que enfrentou um câncer de mama, do qual se operou em dezembro de 2001. Na ocasião, ela quebrou sua tradicional discrição para falar da doença e da importância da prevenção. E não se furtou a aparecer em eventos públicos com os cabelos ralos, em início de recuperação dos efeitos da quimioterapia.
Das dez últimas novelas das 8, metade teve nos vilões um elemento crucial para o sucesso. Algo que não chega a ser surpreendente. ‘Alfred Hitchcock já dizia que um filme é tão bom quanto seu vilão’, diz o experiente autor Silvio de Abreu, que foi supervisor de Carneiro na Rede Globo. Chama atenção o fato de que, das cinco tramas em questão, nada menos do que quatro tenham mulheres nesses papéis. Na opinião de Carneiro, vilãs são mais populares que seus similares masculinos: remetem ao arquétipo da bruxa, da mãe má. Aguinaldo Silva, criador da Nazaré de Senhora do Destino, sustenta que vilões e especialmente vilãs fazem sucesso porque se tornaram os canais de expressão do pensamento politicamente incorreto dentro dos folhetins. Se seus atos são sempre tenebrosos, sua linguagem choca, mas também tem um quê pitoresco, irreverente, que às vezes faz rir. Flora, além de chamar o pai, que sofre de Par-kinson, de ‘tremelique’, vociferou em sua própria festa de casamento: ‘Fora, classe média’. ‘Ela diz o indizível’, diverte-se Carneiro.
Flora é a cereja do bolo de uma trama que, em muitos aspectos, contrariou o modelo em voga no horário das 8. Em vez de buscar inspiração em temas sociais reais e diluir a narrativa em mil subtramas, Carneiro apostou todas as fichas numa história central forte. Ao contrário dos colegas de profissão, que chegam a criar uma centena de personagens, ele elegeu apenas 35 atores para seu elenco. Isso dá muito trabalho aos protagonistas. Patrícia chegou a participar de gravações que duraram quinze horas. ‘Eu tinha só uma bala no revólver. Se o embate de Flora e Donatela não caísse no gosto do público, estaria perdido’, diz o autor. A maior ousadia, contudo, talvez esteja em outro ponto: Carneiro aboliu a tradicional encheção de linguiça que a certa altura toma conta das novelas. A característica mais marcante da trama é o ritmo vertiginoso com que novas situações surgem e são resolvidas. ‘A Favorita tem uma velocidade estonteante’, diz o diretor Ricardo Waddington.
Depois de amargar o pior ibope de estreia de uma novela das 8 em todos os tempos, em razão da estratégia da concorrente Record de levar ao ar o final da primeira temporada de seu folhetim sobre mutantes na mesma noite, a novela estacionou num patamar crítico de audiência. Ainda assim, por dois meses Carneiro ousou desafiar um dos cânones básicos dos folhetins: em vez de prover logo de cara uma heroína com quem os espectadores pudessem se identificar, investiu na ambivalência. Ora se insinuava que Donatela era a verdadeira vilã e Flora a mocinha, ora se dava a entender que era o contrário. O capítulo em que Flora se revelou a assassina lavou a alma do noveleiro: atingiu 46 pontos de média. A partir daí, começou o crescendo que pouco a pouco foi arrebatando o público e transformou Flora em assunto de incontáveis rodas. Suas maldades, por vezes, eram rebuscadas – como o assassinato do patriarca Gonçalo (Mauro Mendonça), cujo plano incluiu um banho de sangue que emulava o do filme O Iluminado, de Stanley Kubrick (a diferença, aqui, é que o sangue foi obtido de forma caseira: Silveirinha tratou de bater no liquidificador peças de picanha tiradas do freezer às pressas). Nas últimas semanas, a atração foi outra: as cenas em que as maldades de Flora foram descobertas pelos principais personagens, como a tontíssima Irene.
Carneiro salpicou A Favorita, ainda, de várias outras ‘subversões’, como ele gosta de dizer. Em seu desprezo pela filha, Flora vai contra o que há de mais sagrado no melodrama: os laços de sangue. ‘O que mais choca as pessoas não é o fato de ela matar – e sim de chamar a filha de ‘purgantezinha’.’, diz. A novela não teve logo de início um par romântico por quem se pudesse torcer. Por fim, investiu em subtramas polêmicas. Havia o clã negro disfuncional, com o deputado corrupto vivido por Milton Gonçalves, sua filha fútil e o filho beberrão – hoje redimidos. Carneiro abordou ainda a homossexualidade de formas diferentes. Primeiro, com Orlandinho (Iran Malfitano), um playboy enrustido patético que chega ao fim da trama sofrendo um processo de ‘des-homossexualização’ – para horror do movimento gay. E há também a história de Catarina (Lilia Cabral), a dona-de-casa que foi feita de gato e sapato por um marido monstruoso até descobrir a amizade com a lésbica Stela (Paula Burlamaqui).
Com tantas inovações, é surpreendente o sucesso da novela junto a um público tido como conservador. Um dos termômetros de que a trama caiu no gosto popular é que está sendo difícil manter segredo sobre o conteúdo dos capítulos. Todos os dias um veículo publica alguma informação, numa disputa semelhante à que se trava em A Favorita em torno do famoso DVD que incrimina Flora. Faz parte do jogo. Mas, mesmo que o autor consiga bolar cenas ainda mais mirabolantes e inesperadas, isso nem de longe será o principal aspecto da originalidade da trama que foi ao ar nos últimos sete meses. O folhetim de estreia de João Emanuel Carneiro no horário nobre será lembrado, principalmente, pela formidável construção de Flora Pereira da Silva.’
ENTREVISTA / SUSANA VIEIRA
‘Ingênua, sim. Burra, não’
‘A atriz Susana Vieira, de 66 anos, casou-se três vezes e teve muitos relacionamentos. Nenhum deles foi tão traumático e expôs tanto sua intimidade quanto o último, com o ex-policial militar Marcelo Silva, que, aos 38 anos, sucumbiu a uma overdose de cocaína em dezembro passado. Bonita, sorridente e com 5 quilos a menos, Susana relata as cenas repugnantes a que foi submetida nos capítulos finais do seu casamento. A atriz conta que o ex-PM lhe surrupiou joias, dinheiro, eletrodomésticos e pretendia chantageá-la. Refeita de golpes na vida real que nem os mais criativos autores de novela foram capazes de imaginar, Susana diz que já conseguiu superar o escândalo e está pronta para amar de novo.
Seu marido, Marcelo Silva, foi preso e expulso da Polícia Militar do Rio por se drogar e espancar uma prostituta em um motel. Depois, a senhora descobriu que ele mantinha uma amante. Em seguida, Marcelo morreu de overdose ao lado dela. Qual foi o pior desses momentos?
Nunca vivi nada comparável ao primeiro grande baque, que foi o episódio do motel. Mas também nada se compara à nossa separação e à morte dele. Nem (a autora de novelas) Glória Perez seria capaz de escrever uma história como essa. Depois do escândalo do motel, perdoei o Marcelo porque jamais imaginei que ele aprontaria de novo. Mas nem o Marcelo nem aquela amante dele (a nutricionista Fernanda Cunha) eram inocentes. Só peço que não escreva o nome dessa mulher junto do de Susana Vieira, que é a vítima.
Muita gente apostou que o seu casamento terminaria depois do episódio do motel.
Eu chorava de saudade do Marcelo. Era uma mulher apaixonada. Ele era sedutor, me amava e a gente transava bem. Aliás, só soube agora que pessoas com deformidade da mente, como ele, transam muitíssimo bem. Não me nego ao amor e estou cheia dessa história de que mulher de 60 anos tem de namorar homem de 70. Sou uma estrela. Não estou nem aí para preconceitos.
As traições de Marcelo têm relação com o fato de que ele tinha quase trinta anos menos que a senhora?
Só diz isso quem se sente no direito de me julgar. Apareceram até uns psicanalistas para falar do caso da Susana Vieira, a sessentona que se casou com um jovem de 35 anos. Eles diziam que eu estava com um garoto. Por favor, quem tem 35 anos não é jovem nem garoto. Jovem é o Cauã Reymond (de 28 anos). Mais velho do que ele já é senhor. Sei o que estou dizendo. Antes de casar com o Marcelo, passei dezessete anos com o Carson Gardeazabal. Quando nós começamos, ele tinha 24 anos e eu, 43. E quer saber? Sou mais jovem em curiosidade, energia e disposição do que o Marcelo e o Carson juntos. Não fico procurando garotão em porta de universidade, mas não tenho culpa se sou desejada por jovens.
Por que a senhora resolveu se casar com Marcelo em vez de apenas namorar com ele?
Foi Marcelo quem quis casar. Pensei: por que não? Por que não me casar de noiva? Não é pecado nem crime. Eu estava apaixonada e não devia nada a ninguém. O problema era que ele tinha 35 anos e era policial militar. Aliás, o preconceito por ele ser PM era pior do que o da diferença de idade. Dias antes do casamento, soube que ele era dependente químico. Lidar com isso, com um adicto, foi uma novidade a mais para mim. Eu acreditei na reabilitação dele.
A senhora já superou a traição, a separação e a morte de Marcelo?
Foi difícil. Não chorei nem gritei, mas entrei em estado de choque. Fui parar no consultório da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva (autora do livro Mentes Perigosas: o Psicopata Mora ao Lado). Precisei de quatro sessões para me recuperar das revelações que a amante dele me fez ao telefone. O stress a que ela me submeteu equivale ao de um sequestro. Perto dessa mulher, a Flora (vilã de A Favorita) é boazinha. As coisas que ouvi dela eram de uma crueldade que nenhuma novela jamais mostrou. Falou até das posições preferidas na cama – tanto as deles quanto as nossas.
A senhora trouxe a mãe de Marcelo, Regina, do subúrbio para a Barra da Tijuca. O que será dela agora?
Minha querida, ela herdou do filho uma conta bancária muito boa, fruto dos desvios de dinheiro da reforma da minha casa. Levou um Polo, que passei para o nome do Marcelo porque ele recebeu mais de 20 000 reais em multas. Além disso, a mãe dele ficou com seis malas de roupas masculinas, 47 pares de tênis e relógios. Tudo de grife. Marcelo roubou minha alma, meu sentimento e muito mais. Pedia que colocassem 2 000 reais a mais em notas de material de construção para embolsar a diferença.
Marcelo a roubou?
Tirou joias, perfume importado e até um aparelho de micro-ondas que ainda estava na caixa. Marcelo pôs a culpa no caseiro. Depois, eu soube pela amante dele que o Marcelo levou o micro-ondas para esquentar comida no flat dela. Quando as joias sumiam, ele também culpava os empregados. Eu não acreditava. Achava que tinha perdido. Ele as tinha dado de presente a ela. A mulher ficou até com meu BlackBerry. Ela me contou que ia escondida aos restaurantes, ensaios de escolas de samba e outros lugares em que estávamos juntos. Eles se encontravam nos banheiros. Transaram na minha casa em Búzios enquanto eu estava na praia. E foi na minha cama.
O que mais a amante de Marcelo lhe contou?
Que ele desviou dinheiro da obra da minha casa. Era para custar 110 000 reais. Saiu pelo dobro. Se ele me dizia que um tijolo custava 12 reais, não checava. Ela sabia de tudo, até de quanto faltava para pagar o telhado. Só soube desses absurdos depois que o Marcelo morreu. Os empregados não diziam nada porque ele os ameaçava. Dizia assim: ‘Antes de falar alguma coisa para a Susana, lembra que sou polícia. Você some’. Sabia que ele pediu à revendedora da Honda que emitisse uma nota superfaturada? Fez a mesma coisa na Volkswagen quando comprei o Polo. Felizmente, ninguém aceitou. Aquela mulher me contou que o Marcelo fez até um filme das nossas transas. Mas eu nunca achei a gravação. Se for verdade, espero que nunca apareça. Mas achei outra, a do chuveiro, no dia em que meu cofre foi arrombado.
Que filme é esse? Quem arrombou seu cofre?
Marcelo. Ele se escondeu atrás da porta do banheiro para me filmar tomando banho de touca na cabeça. Ainda por cima, fazia close das minhas partes íntimas enquanto eu me lavava. Ele ia usar o filme para me chantagear. Isso eu soube pelo pessoal da praia. O cara de uma barraca contou para minha sobrinha que o Marcelo ia cobrar 500 000 reais para me dar a gravação. Achei esse filme quando meu cofre foi arrombado.
Como foi isso?
Um dia depois que a amante dele me telefonou, encontrei meu quarto revirado com o cofre aberto. Nunca dei o segredo ao Marcelo, mas, do mesmo jeito que me filmou escondido, ele me viu abrindo o cofre e decorou o número. Sumiram meus dólares, euros, reais e as joias. Resolvi esconder a moto antes que o Marcelo a levasse também. Aí, descobri no bolso da jaqueta de couro dele o filme do banho e um documento importantíssimo.
Que documento?
O nosso contrato de casamento, que diz que ele não teria nenhum direito a meus bens em caso de separação. O documento estava no cofre. Meu filho, Rodrigo, disse ao Marcelo que ele havia assaltado meu cofre. Ele respondeu: ‘Não fui eu. Eu estava dormindo’. Ou seja, ele sabia que o cofre tinha sido arrombado. Liguei para a Globo para contar do filme. Fui à Justiça pedir a separação de corpos. Falei que corria risco de vida. Os meus empregados contaram à juíza que eram ameaçados. Aí descobri que sabiam dos desvios de dinheiro. Voltei para casa com seguranças e coloquei o Marcelo para fora. Ele disse que prejudicaria a minha carreira. Era uma referência ao filme do banheiro, que, àquela altura, estava seguro dentro do meu sutiã.
O que a deixou mais magoada: ser traída em público ou guardar segredo sobre os roubos?
O pior foi a traição espiritual e calculada dele. Se ninguém me contasse, eu podia estar me enganando até agora.
Como, aos 66 anos, a senhora foi tão ingênua?
Ingênua e generosa. Ainda bem. O mundo não é feito de gente má, ladrões e assassinos? Sou boa. O nosso problema não era a diferença de idade, de nível social nem de formação. Quantas pessoas vieram do nada, viraram famosas e não roubaram? O desnível cultural pode ser suprido por outras qualidades. Namorei o jornalista Renato Machado (da Rede Globo) e casei com Carson, que fazia motocross. Não falava só de vinho e ostras com Renato e nem só de moto com Carson. O Marcelo me beijava muito. Imagina se eu não gostava? Eu, que sempre gostei de sexo, amor e carinho? Se ele me completava nesse departamento, não precisava falar de museu.
A senhora se dizia muito feliz. Essas descobertas apagaram as boas lembranças?
Posso ser ingênua, mas não sou burra. Uma traição de sete meses é uma covardia com uma pessoa famosa. Fui obrigada a ler um artigo de uma revista que me chamava de ridícula. Dizia que eu devia arrumar garotos apenas para transar, e não me casar com eles. Estou cheia de ouvir que velha tem de arrumar garotão só para transar. O que é isso? Se o cara trai, é ele o errado, não nós. Aliás, idade não existe para mim. Em primeiro lugar, sou uma estrela brasileira, como a Fernanda Montenegro e o Pelé. Não se pergunta em que ponto nós três deixamos de ser estrelas por causa da idade. Não somos sessentões, somos estrelas: Marília Gabriela, Elba Ramalho, todo mundo que chegou lá… Em segundo lugar, minha vida não é pautada por encontrar homem. Sempre gostarei de alguém, sempre beijarei e transarei. A gente tem o direito de amar quem quiser. Quem é que não gosta de homem bonito? Homem velho tem ex-mulher que vai encher a paciência e filho que vai chatear. Envelhecer deve ser horrível, mas, como não envelheço, estou ótima.
Podemos concluir que a senhora poderá aparecer em breve de namorado novo?
Podem, sim. Mas não agora. Acabei de sair de um redemoinho. Mesmo assim, já rolou paquera. Estou viva e aberta para tudo, mas ninguém nunca mais toca no meu dinheiro.
Seus colegas a classificam como competitiva e temperamental. Como eles reagiram ao seu drama?
Da melhor forma possível. A ligação mais importante que recebi e que me fez chorar foi a da (atriz) Renata Sorrah, justamente alguém que a imprensa diz ser minha desafeta. Nunca tivemos um ai. Sempre contracenamos, ela como má e eu como boa. Mas Renata estava tão sentida quanto eu. Não crio caso com ninguém. Estou na elite porque sou excelente profissional. Acha que eu seria tão respeitada na Globo se eu fosse esse mau elemento que pintam? Agora, quando contraceno com ator relapso e medíocre, chamo sua atenção, sim, e digo que lugar de estudar texto é em casa. A Carolina Dieckmann trabalha como eu. Aliás, o meu melhor trabalho foi com ela e a Renata Sorrah em Senhora do Destino.
O casamento com Marcelo será um trauma que atrapalhará seus relacionamentos futuros?
Deus me livre de trauma, filhinha. Não tenho trauma nem de pai, nem de mãe, muito menos de ex-marido, ex-bandido. Só quero esquecer que conheci Marcelo Silva. Enquanto o Marcelo estava vivo, fiquei trancada em casa com medo do que ele pudesse fazer comigo. A partir do momento em que, infelizmente, morreu, estou livre. Já sofri. Emagreci 5 quilos de nojo do que ele e a amante fizeram. Só tive pena uma vez: quando vi pela televisão o corpo dele no chão da garagem. Fora isso, só tive raiva, raiva e raiva.’
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