TELEVISÃO
A nota mais alta da TV
‘Com seus modos delicados e voz efeminada, o americano Chris Colfer era ridicularizado pelos colegas de escola. Sua maior humilhação se deu em um concurso de canto, no qual foi proibido de interpretar um número de um musical da Broadway, porque a direção achou aquilo coisa de mulherzinha. Em 2008, aos 18 anos, o rapaz amargou outro fracasso: foi reprovado em uma audição para uma série de TV. Logo em seguida, contudo, os produtores lhe acenaram com novo teste, para o papel de um jovem gay que busca superar a baixa autoestima devotando-se ao coral da escola. A série era Glee. Seu autor principal, Ryan Murphy, criou o personagem Kurt Hummel inspirado em Colfer – que deu a volta em seu histórico de pária. ‘Chegou a hora de aqueles que me humilhavam pagarem’, disse ele à revista Rolling Stone. Esse espírito de retribuição é um dos nortes da série. Glee fala de um grupo de alunos que, na escala darwinista da escola secundária americana, são tachados de losers (perdedores). Além de Kurt, a turma inclui um paraplégico, uma negra gordinha e uma judia filha de pais gays. Sob a batuta de um professor de espanhol – portanto, ele próprio no último degrau da cadeia alimentar docente –, eles buscam a redenção no clube Glee do título, atividade extracurricular que inclui apresentações de canto e dança. A própria série era um azarão: o musical era tido como gênero apropriado unicamente a reality shows e ao universo pré-pubescente de programas como High School Musical. Fora desses nichos, pontificava-se, seria receita certeira para o fiasco. Lançada nos Estados Unidos no ano passado, Glee revelou-se, ao contrário, um sucesso de audiência instantâneo. Também se tornou uma série cultuada no Brasil, onde terá sua primeira leva de treze episódios lançada em DVD nesta semana, enquanto se aguarda a estreia da segunda parte da temporada inaugural no canal pago Fox, em julho.
Mais importante, Glee ascendeu à categoria de fenômeno cultural. Os CDs com seus números musicais entraram na parada americana. E as versões de hits do passado entoadas por seus personagens colocaram velharias no ranking das faixas mais baixadas do iTunes. Glee se beneficia do interesse do público por programas que exploram os percalços da construção de estrelas musicais, como American Idol e Britain’s Got Talent. Não à toa, a maior revelação desse último, a cantora Susan Boyle – tão improvável quanto os desajustados do clube Glee –, poderá fazer uma participação na série em breve. Glee vale-se de músicas conhecidas, verdadeiros clichês do pop, de forma tão inesperada quanto precisa. No episódio piloto, ressuscitou Don’t Stop Believing, sucesso de 1981 do grupo Journey, para exprimir de maneira verdadeiramente tocante a vontade de vencer dos alunos enjeitados. Em outro episódio, Dancing with Myself, de Billy Idol, embalou o momento em que Artie, o aluno da cadeira de rodas, expressa sua solidão. É como se, ao serem encaixadas na trama, essas canções banalíssimas encontrassem enfim um sentido. Ao perceber a força dessa vitrine, Madonna liberou suas músicas para um programa exibido há algumas semanas. Lady Gaga seguiu seu exemplo. Na próxima terça-feira, vai ao ar nos Estados Unidos o episódio em que o gay Kurt – que já foi pego no flagra pelo pai dançando Single Ladies, de Beyoncé, com um colante preto – soltará suas feras imitando o figurino extravagante da cantora.
O clímax do episódio de Madonna é uma recriação do clipe de Vogue estrelada por uma dublê insólita da cantora: Sue Sylvester, a treinadora masculinizada do time de animadoras de torcida. Interpretada pela atriz Jane Lynch com canastrice ora odiosa, ora patética, a personagem teria participação curta. Mas, graças à habilidade da atriz, impôs-se como vilã – e também como a principal porta-voz da incorreção política de Glee. Transbordante de preconceitos contra as minorias, a megera caricata rouba a cena, mas não é o único canal da subversão. Glee celebra a tolerância, mas o faz sem hipocrisia. Os membros do clube podem ser ferozmente competitivos e até mesquinhos. A cantorinha Rachel (Lea Michele) passa por cima dos colegas diante de qualquer chance de se impor como estrela. Sua rival, a cheerleader Quinn (Dianna Agron), posa de cristã pró-virgindade – mas fica grávida de um bad boy e mente ao dizer que o pai da criança é o cantor-galã do colégio. O produtor Ryan Murphy já havia exercitado a provocação na série sobre cirurgia plástica Nip/Tuck. Homossexual militante, ele se esbalda nas referências coloridas (o termo Glee alude a uma forma antiga de coral, mas também à cantoria alegre – não sem conotação gay). Recentemente, acusou a revista Newsweek de homofobia, por publicar um artigo em que se defendia a ideia de que atores gays não deveriam fazer papéis de machões. Retrucou Murphy: ‘Glee é a prova de que a diversidade é possível. Temos atores homossexuais fazendo personagens héteros, e vice-versa’. Bem de acordo com o espírito instigante da série, ele não informa quem é quem.’
Os palanques vespertinos
‘Na última segunda-feira, Dilma Rousseff desembarcou de helicóptero na sede do SBT, na Grande São Paulo, para gravar uma entrevista que foi ao ar naquela tarde no Programa do Ratinho. Ao ver a pré-candidata do PT à Presidência com novo penteado e toda maquiada, o apresentador não se conteve. ‘Foi aquele japonês chato que consertou o seu cabelo?’, perguntou (Ratinho se referia ao cabeleireiro Celso Kamura). Dilma se submeteu então a mais de vinte minutos de bate-papo. Na semana anterior, o tucano José Serra havia passado por maratona semelhante. E assim se confirma: na atual pré-campanha presidencial, os programas populares ganharam uma relevância inédita. Em março, Serra admitiu pela primeira vez sua candidatura em entrevista ao apresentador José Luiz Datena, da Band. Depois, foi ao policialesco comandado por ele, o Brasil Urgente. Dilma também esteve lá. ‘Serra deu um banho. Já Dilma começou nervosa, mas se recuperou. Acabou sendo bom para todo mundo’, diz Datena.
Ao comparecerem a esses programas, os candidatos têm na mira principalmente as mulheres da classe C, que são parte significativa da audiência deles. ‘Esse público é uma espécie de sensor dos anseios da população. São elas que levam as crianças à escola e vão aos postos de saúde’, diz o cientista político Rubens Figueiredo. Por isso, os candidatos se esforçam para exibir uma linguagem simples e falar de temas que preocupam essa audiência. No Programa do Ratinho, Serra falou sobre segurança e prevenção do câncer no colo do útero, enquanto Dilma enalteceu os programas sociais do governo petista. Mas os dois perseguiam objetivos distintos. Para Serra, interessa consolidar a vantagem nas pesquisas entre as mulheres. Já Dilma deseja quebrar a resistência delas à sua candidatura. Ela passou a entrevista tentando colar sua imagem à de Lula e vendendo a ideia de que é ‘gente como a gente’. No que, aliás, teve uma forcinha. Se havia sido simpático com Serra (e, semanas antes, com Marina Silva), Ratinho estava visivelmente efusivo na entrevista com Dilma. ‘Levanto a bola para todos. Senão os candidatos ficam com medo de voltar’, diz.
Serra e Dilma mantiveram inalterada a média de Datena, na casa dos 5 pontos. No Ratinho, Serra levantou o ibope, com 6 pontos, enquanto Dilma derrubou o índice para 4. A audiência não é, contudo, o que mais conta nesses casos. Para Ratinho, cuja atração é um verdadeiro circo, e Datena, que inunda os lares com sangue, a presença dos candidatos traz respeitabilidade. E isso atende a um cálculo comercial: nada melhor do que uma imagem de seriedade para atrair anunciantes mais qualificados – que, ao contrário dos presidenciáveis, têm sérias reservas aos programas popularescos.’
Bruno Meier
Órfãos da ilha
‘Para além de seus resultados de audiência – ótimos nos primeiros anos, decepcionantes a partir da terceira temporada –, a série Lost é um fenômeno de repercussão. Os mistérios que cercam a ilha do seriado, onde se abrigaram os sobreviventes da queda de um avião que saiu da Austrália com destino aos Estados Unidos, alimentam inúmeros fóruns de fãs na internet, com as mais doidas especulações sobre a chave dos enigmas. Os lostmaníacos discutem cada episódio como quem faz a exegese de um texto sagrado – e até fotos de divulgação como a que aparece acima, em que os heróis estão dispostos em torno de uma mesa à maneira da Santa Ceia, foram microscopicamente examinadas à cata de significados secretos. O criador da série, J.J. Abrams, sempre jurou que sabia exatamente para onde estava conduzindo a história. Os fãs esperam que uma solução abrangente e satisfatória para os muitos mistérios que ele levantou seja dada no último episódio, que será exibido neste domingo nos Estados Unidos e na terça-feira no Brasil, pelo canal pago AXN. Mas, há duas semanas, em um evento pomposo organizado pela rede ABC, em Los Angeles, para celebrar o encerramento do programa, o ator Michael Emerson – que interpreta o manipulador Benjamin Linus – providenciou um choque de realidade. ‘Teremos pontas soltas em número suficiente para passar o resto da vida tentando entender tudo’, disse aos jornalistas presentes.
Repleta de laboratórios subterrâneos, distorções do espaço-tempo, monstros de fumaça e ursos-polares, a ilha tropical de Lost de fato guarda esquisitices demais para explicar em um único episódio final, ainda que com duas horas e meia de duração (e a versão em DVD, que sai em agosto nos Estados Unidos, terá vinte minutos extras). Nesta sexta e última temporada, surgiu um universo paralelo, no qual o avião não caiu. O produtor executivo da série, Carlton Cuse, afirmou ao jornal The New York Times que essa realidade alternativa ‘vai provocar um debate saudável depois da série’ (exatamente: depois da série). Esse volume avassalador de enigmas, somado ao excesso de personagens, tornou-se um problema a partir da terceira temporada – quando se firmou a impressão de que os autores estavam mais perdidos que os sobreviventes do acidente. Com 18 milhões de espectadores nos episódios de estreia nos Estados Unidos, a série teve uma queda brusca de 30% em sua audiência a partir do terceiro ano. Seu final, porém, está muito bem cotado no mercado publicitário americano: um comercial de trinta segundos custará de 850 000 a 950 000 dólares (em um episódio da temporada anterior, o mesmo tempo saía por 210 000 dólares).
Para os fãs brasileiros, a ansiedade de acompanhar a evolução dos enigmas foi mitigada por uma nova forma de ver televisão – pela internet. Sem paciência para esperar a exibição no país, muitos baixavam os episódios de sites piratas logo depois de eles terem ido ao ar nos Estados Unidos. Ainda que irregular na qualidade, a série sem dúvida foi fenomenal no modo como galvanizou a atenção do público em torno de suas esquisitices. Os recém-cancelados Heroes e FlashForward tentaram seguir Lost em sua mistura eclética de elementos – ficção científica, sobrenatural e drama, tudo bem sacudido por uma narrativa que dá saltos no tempo. Mas não chegaram lá. Fringe, também de J.J. Abrams, ainda resiste no ar, mas nem de longe ocasionou a mesma explosão de teorias pela internet – algumas mais criativas (ou doidas, dependendo da perspectiva) do que o próprio roteiro da série (veja três exemplos no quadro ao lado). A aposta da rede americana ABC para substituir Lost é a série No Ordinary Family, sobre uma família que, após um acidente de avião (outro) na Floresta Amazônica, descobre possuir superpoderes. A lacuna que Lost deixa, porém, vai além da televisão: uma legião de fãs ficará órfã dos mistérios da ilha. E, pelo que parece, de solução para eles.
A conspiração das teorias
Três explicações populares em discussões de fãs para os mistérios de Lost
Purgatório
Os passageiros morreram em 2004, no acidente do voo 815 da Oceanic Airlines. Todas as temporadas, portanto, se passariam no além
Ponta solta: seis sobreviventes saíram da ilha na quarta temporada e voltaram para o mundo real. Teriam ressuscitado?
Universo paralelo
O personagem conhecido como Homem de Preto (ou Monstro de Fumaça) consegue liberar o eletromagnetismo (!) da ilha, criando o universo paralelo mostrado na sexta temporada
Pontas soltas: todas. Se o que vale é o universo em que o avião não caiu, então nenhum dos mistérios da ilha precisa ser esclarecido?
Todo mundo louco
Tudo é alucinação dos personagens – estariam todos internados em um instituto, para tratamento de esquizofrenia
Pontas soltas: ilusões compartilhadas por mais de uma pessoa são difíceis de verificar. E, ao longo da série, nas várias cenas do passado dos personagens, todos pareciam bem lúcidos’
INTERNET
A internet de 32 milhões de brasileiros
‘Que sirva de consolo para quem não consegue acessar a internet sem maldizer a velocidade da conexão. No Brasil, entrar na rede sentado no sofá de casa e assistir a clipes no YouTube sem esperar uma eternidade é ainda um privilégio. Mais de 32 milhões de brasileiros, quase metade do total de usuários de internet no país, têm experiência de conexão de banda larga – ou, para ser mais exato, de banda pouco mais veloz do que a quase extinta internet discada – quando visitam uma entre os milhares de ‘lan houses’ encravadas nas zonas mais pobres das grandes cidades e nos rincões perdidos do interiorzão bravo. Esses pontos de acesso à internet, dos quais oito em cada dez são clandestinos, têm seu nome derivado de LAN – sigla em inglês para ‘rede local de computadores’ – e house, casa. VEJA visitou 21 desses estabelecimentos em cinco estados: São Paulo, Rio, Maranhão, Pará e Pernambuco. Em geral, eles funcionam nos fundos de casas particulares ou em pequenos pontos comerciais, como salões de cabeleireiro e videolocadoras. Para aumentarem um pouco o faturamento, seus donos compram uns computadores, instalam neles softwares piratas e contratam um serviço de banda larga cuja conexão é compartilhada por todos os usuários. O resultado é precário. Sem ar-condicionado, a saída muitas vezes é arrancar a tampa dos computadores para que as peças trabalhem perto da temperatura ideal.
Algumas lan houses utilizam conexão via rádio, o que torna a experiência de navegação ainda mais sofrida e intermitente, pois elas sofrem com o mau tempo. Mas isso é do jogo, e tem lan house simplificando a vida das pessoas em lugares onde não existe agência dos Correios nem do Bradesco, duas das instituições mais capilarmente espalhadas pelo Brasil. Entrar em uma delas em alguma cidade praticamente isolada da vida urbana brasileira equivale a voltar à civilização. As lan houses oferecem acesso à internet e, com ele, uma gama de facilidades às quais alguns dos brasileiros mais pobres não teriam acesso de outra forma. Precisa digitalizar e fazer uma cópia em papel do currículo para procurar emprego? Pagou uma conta, mas estão cobrando de novo e é preciso conseguir uma segunda via? Precisa saber se está com o nome limpo no SCPC ou no Serasa? Não é necessário pegar o ônibus ou caminhão e ir à cidade média mais próxima, nem incomodar parentes e conhecidos. Basta entrar em uma lan house. Segundo o Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação, 74% dos usuários de internet das classes D e E recorrem às lan houses em busca de entretenimento ou soluções digitais instantâneas e baratas.
A pernambucana Dejaíra Barbosa, de 34 anos, é uma delas. Agricultora, ela ganha cerca de 400 reais por mês e gasta 4 reais por semana para ficar duas horas na lan house da sua cidade, Manari, no sertão de Pernambuco. Além de ver ‘notícia e horóscopo’, Dejaíra usa a rede para consultar a previsão do tempo. ‘Fico sabendo o dia de plantar e de fazer as canaletas para estocar a água da chuva na barragem.’ Numa cidade em que a água encanada existe há apenas um ano e muitas vezes chega a faltar nas casas por vinte dias seguidos, a informação é uma preciosidade. Manari tem 18.000 habitantes, apenas cinquenta dos quais possuem conexão em casa. A cidade já tem duas lan houses.
Em São Paulo, só na maior favela da cidade, a de Heliópolis, as lan houses de garagem são 42. Tanta concorrência fez Raimunda de Carvalho, dona de um salão de cabeleireiro há três anos equipado com computadores, pensar em agregar um terceiro serviço ao seu já multifuncional negócio. Na entrada do salão, ela pretende acomodar um carrinho de cachorro-quente e vender sucos e salgadinhos. ‘Enquanto o cabelo não fica pronto, o cliente pode entrar na internet e comer um lanche’, diz. Os usuários parecem não se importar em dividir o espaço dos computadores com secadores de cabelo, sanduíches e até uma máquina de lavar – esta sem nenhuma relação com os serviços oferecidos no local: está lá apenas porque Raimunda não achou lugar para ela em casa. Desde que começou no negócio, em 2007, a cabeleireira dobrou sua renda e hoje fatura 2.500 reais mensais com o salão e os computadores.
Um de seus concorrentes em Helió-polis, o comerciante Antônio Rodrigues Filho, diz que não sabe acessar a internet, mas já tem dezesseis computadores interligados no piso superior do seu mercadinho. Especializada em jogos eletrônicos, a lan house de Antônio é frequentada principalmente por jovens barulhentos. Para manter a ordem no local, o comerciante colocou um aviso na parede: ‘Campanha boca limpa: a cada palavrão falado, desconto de 10 centavos (no tempo)’. Ao contrário do que se possa pensar, não parte de lan houses a maioria dos e-mails criminosos espalhados pela rede. Segundo levantamento feito pelo Comitê Gestor da Internet, apenas 13% dos casos que envolvem disseminação de vírus e tentativas de fraudes bancárias vêm desses estabelecimentos. O número de ocorrências do gênero com origem em computadores domiciliares é cinco vezes maior.
As lan houses costumam ser bem-vistas pelas mães. Muitas atribuem a elas um caráter educativo. A empregada doméstica carioca Gleide Gomes, por exemplo, moradora da favela de Antares, Zona Oeste do Rio, conta que não se importa em gastar quase a metade dos 300 reais que recebe por mês para que os seus três filhos frequentem a lan house da vizinhança. Para ela, trata-se de um ‘investimento’. Como a família mora em uma área dominada por uma facção criminosa, ela diz que o passatempo evita que os filhos fiquem pela rua, à mercê dos traficantes. ‘Depois, indo lá, eles aprendem melhor computação’, acredita.
Gleide não está de todo errada. ‘Embora num primeiro momento as pessoas busquem a internet para entreter-se, com o passar do tempo aumentam as chances de elas usarem a rede para fazer algo útil do ponto de vista profissional e econômico’, afirma o inglês Mark Williams, economista do departamento de tecnologias da informação e comunicação globais do Banco Mundial. O economista foi um dos coordenadores de um estudo que prova que, mesmo clandestinas em sua maioria, as lan houses oferecem uma importante contribuição para a economia de uma nação. O estudo, que analisou 120 países, de 1980 a 2006, verificou que, a cada vez que a penetração da banda larga num país emergente cresce 10%, o PIB local sobe 1,4%. ‘Isso decorre do aumento na produtividade e da redução de custos que ela acarreta’, disse Williams a VEJA.
As lan houses são o primeiro instrumento para a disseminação da banda larga, mas seu papel tende a diminuir conforme essa tecnologia avança. Nos anos 90, quando menos gente na Europa possuía a conexão em casa, os cibercafés eram muito mais numerosos no continente. No Brasil, embora o alcance da banda larga ainda seja baixo – atende 21% do total das residências –, o mesmo fenômeno começa a ser observado. Até o ano passado, a maior parte da população se conectava à rede por meio de lan houses. Neste ano, pela primeira vez, a maioria dos acessos passou a ser feita a partir das casas. Um dia as lan houses serão coisa do passado, tão obsoletas quanto as antigas cabines telefônicas do século XX. Mas elas vão ficar na memória de dezenas de milhões de brasileiros como o lugar onde deram os primeiros passos no admirável mundo novo da tecnologia digital da informação.
DEZ HORAS POR DIA NA LAN HOUSE
Embora tenha computador e internet em casa, o estudante Ricardo Henrique de Oliveira, de 16 anos, é um dos mais assíduos frequentadores das lan houses da favela de Heliópolis, em São Paulo. ‘Às vezes passo dez horas seguidas aqui. Não tem graça jogar sozinho’, diz. Ele é craque em games on-line, e sua destreza com o mouse lhe rendeu notoriedade na internet. ‘Já fui o primeiro no ranking brasileiro de Defense of the Ancients (nome de um game popular).’ O sonho de Ricardo é ser jogador profissional de game. ‘Ou, pelo menos, analista de sistemas.’
HORÓSCOPO E METEOROLOGIA
Até há pouco tempo, a agricultora Dejaíra Barbosa, de 34 anos, nunca tinha usado um computador. Foi aprender na lan house de sua cidade, Manari, no sertão pernambucano. O dono do lugar, José Manoel Filho (na foto, com Dejaíra), foi quem teve a paciência de ensiná-la. Agora, Dejaíra acessa a previsão do tempo pelo menos uma vez por semana, para saber quando plantar e fazer canaletas para levar a água da chuva até a barragem. ‘Mas também gosto de ver notícia e horóscopo’, diz.
BAIÃO 2.0
O músico paraense Wellerson Costa, de 19 anos, toca numa banda de xote e baião de Belém (PA). Como nunca estudou em conservatório, aproveita uma das lan houses da cidade para ver vídeos de músicos famosos, copiar partituras e ler textos sobre o assunto. Quando o site está em inglês, Costa recorre ao tradutor do Google. Ele também usa o MSN para conversar com músicos de outras cidades.
CORTE, TINTURA E INTERNET
Há três anos, a cabeleireira Raimunda Bandeira de Carvalho decidiu abrir uma lan house no andar de baixo do seu salão. No começo, seus filhos e marido não gostaram da ideia, mas hoje a acham ótima. O faturamento do salão dobrou com a instalação dos computadores. Raimunda diz que as clientes gostam de usar a rede enquanto esperam a tintura fazer efeito. Neste ano, ela quer crescer ainda mais: em breve, no mesmo espaço vai vender suco e cachorro-quente.
NA ESCOLA, NADA DE COMPUTADOR
Há três anos, a cabeleireira Raimunda Bandeira de Carvalho decidiu abrir uma lan house no andar de baixo do seu salão. No começo, seus filhos e marido não gostaram da ideia, mas hoje a acham ótima. O faturamento do salão dobrou com a instalação dos computadores. Raimunda diz que as clientes gostam de usar a rede enquanto esperam a tintura fazer efeito. Neste ano, ela quer crescer ainda mais: em breve, no mesmo espaço vai vender suco e cachorro-quente.’
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