Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Villas-Bôas Corrêa

‘O badalado jato de US$ 56,7 milhões, mais conhecido pelo apelido de AeroLula, levantou vôo da Base Aérea de Brasília – seguido pelo desprezado Sucatão para os que sobraram e a garantia da volta, por cortesia da corte – com todas as cadeiras ocupadas pela comitiva ecumênica, montada pelo presidente Lula, em jogada política de inegável competência e habilidade.

Se não havia lugar para todos na numerosa comitiva brasileira para acompanhar o enterro do Papa João Paulo II, na Basílica de São Pedro, a seleção obedeceu aos cuidados presidenciais. E marca um gol de placa para a equipe palaciana, com tão modesto desempenho ao longo dos dois anos e três meses do primeiro mandato.

Nesta, Lula não errou uma. Superou a tosca astúcia texana do presidente George Bush que, além da mulher, a primeira dama Laura e do papai, apenas recrutou o ex-presidente Bill Clinton para enfeitar a comitiva americana. No AeroLula, só ficou de fora dos ex-presidentes vivos o incômodo Fernando Collor de Melo, que registrou o protesto pelo esquecimento intencional. Os demais que usaram a faixa presidencial abrem a lista dos convidados especiais: Fernando Henrique Cardoso e o senador José Sarney. No aeroporto de Roma, incorporou-se ao seleto grupo o ex-presidente Itamar Franco, atual embaixador do Brasil na Itália.

Nas fofas cadeiras seguintes acomodaram-se os convidados abençoados pelo protocolo: o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Nelson Jobim, e os presidentes das duas Casas do Congresso, senador Renan Calheiros e o encrenqueiro deputado Severino Cavalcanti.

Do meio para a cauda, a novidade inspirada na homenagem ao Papa João Paulo II, que fortaleceu o espírito ecumênico como uma das prioridades do seu longo pontificado, com os convites ao rabino Henry Sobel; ao pastor da igreja luterana Rolf Schuenemann; ao sheik Aramando Houssein Salek, da Mesquita do Brasil, representando a religião islâmica e – na tacada de mestre – a mãe-de-santo Aeronithes da Conceição Chagas, da Casa Branca de Engenho Velho, de Salvador, na deslumbrante riqueza dos seus trajes rituais; e que, como boa baiana, acabou perdendo o avião.

De Roma, o presidente viaja para o giro em quatro paises da África, cumprindo oportuníssima agenda montada com a protocolar antecedência.

Afortunada coincidência. Um sumiço de uma semana no preciso momento em que interessa ao governo esticar o manto de silêncio que abafa a série de crises e constrangimento que atormentam o governo. Como se não bastasse a insistência dos sinais, estridentes como o canto da araponga que imita as batidas no ferro da bigorna, agrava-se e raspa no limite do insuportável a situação do novo ministro da Previdência, Romero Jucá, flor do PMDB transplantada para o canteiro da mini-reforma ministerial, diretamente envolvido na trapalhada, muito mal explicada, da grave denúncia de que deu duas fazendas inexistentes como garantia para o empréstimo do Banco da Amazônia (Basa) à Frangonorte, empresa da qual era sócio.

As desculpas do novo ministro, que assumiu com discurso moralizador prometendo reduzir o astronômico déficit das contas da Previdência, não convenceram nem aos aliados do governo. O deputado João Paulo Cunha (PT-SP) desabafou os seus ressentimentos com a turma palaciana cobrando duro do ministro acuado ‘explicações de forma peremptória, porque não é bom para o governo, o PMDB e o Ministério que alguém sob suspeita continue na Previdência’.

O PMDB, que não cultiva tais melindres, defendeu a permanência do ministro com os argumentos de sempre. Mas, o presidente acusou a cutucada e terá que enfrentar o problema quando voltar a Brasília.

Se o caso de Jucá é mais uma conta no rosário de tormentos oficiais, a relação é longa e aumenta a cada dia. Com o fiasco da reforma agrária, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) multiplicou as invasões de fazendas e cobra do governo as promessas não cumpridas do assentamento de famílias acampadas às margens de estradas.

O cobertor da cumplicidade aquece o esquecimento da ameaça do presidente da Câmara, deputado Severino Cavalcanti, de divulgar a lista dos parentes de jornalistas credenciados no Congresso, nomeados, sem concurso, para as mordomias e sinecuras parlamentares.

Os órgãos representativos da categoria, como a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e os sindicatos, estão no dever moral de cobrar do presidente da Câmara que cumpra a bravata.

Ou, então, que justifique as razões do recuo da tentativa de intimidação dos que o incomodam com as críticas aos seus destemperos.’



Fernando Rodrigues

‘Gasto de Lula com publicidade sobe R$ 250 milhões em 2004’, copyright Folha de S. Paulo, 8/04/05

‘A sensação de que o governo federal aumentou o seu volume de propaganda é verdadeira. No ano passado, a administração petista do presidente Luiz Inácio Lula da Silva gastou R$ 867,1 milhões em publicidade. Esse valor é R$ 250 milhões maior do que o consumido em 2003 -uma alta de 40,5% nesse tipo de despesa.

O consumo propagandístico do PT no Planalto quase iguala Lula a seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. O acompanhamento desses gastos só é realizado desde 1998, e o valor mais alto registrado até o momento foi em 2001, com FHC. Naquele ano, o tucano investiu R$ R$ 881,6 milhões em publicidade -só 1,7% a mais do que o petista em 2004.

Os valores são oficiais e foram corrigidos pela inflação do período pelo próprio governo. Os dados serão divulgados oficialmente hoje pela Secom (Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica da Presidência da República), de Luiz Gushiken.

Os R$ 867,1 milhões gastos com publicidade federal no ano passado se referem a toda a administração federal. Estão incluídos todos os ministérios, autarquias, fundações e empresas estatais.

Quando se divide o número entre administração direta (Presidência, ministérios, secretarias e algumas estatais que não concorrem no mercado, como a Infraero), o gasto total é de R$ 222,8 milhões. Já a indireta (estatais que concorrem no mercado, como a Petrobras) gastou R$ 644,3 milhões em propaganda em 2004.

O crescimento percentual do valor gasto de 2003 para 2004 foi quase idêntico nas administrações direta e indireta: de 40,8% e de 40,4%, respectivamente.

Não está incluída na estatística a ser divulgada hoje parte relevante do gasto com propaganda. O governo não diz de forma consolidada quais são todas as suas despesas com publicidade legal (balanços e editais), produção dos comerciais e patrocínio. A estimativa é que consumam de R$ 200 milhões a R$ 250 milhões por ano.

Incluindo os valores que não são divulgados de forma consolidada, a gestão Lula tem despesa anual com propaganda da ordem de R$ 1,050 bilhão. Quando isso é colocado na tabela dos maiores anunciantes do país, só perde para Casas Bahia, que, em 2004, segundo o levantamento Ibope Monitor, gastou R$ 1,6 bilhão.

Os números do Ibope Monitor, entretanto, não são plenamente comparáveis aos do governo. Os dados governamentais são reais e equivalem ao que foi pago. No levantamento do Ibope Monitor, considera-se o que saiu de propaganda e multiplica-se pelo valor das tabelas de preços dos veículos. É comum grandes anunciantes terem descontos na casa dos 50%.

Segmentos de mídia

Como já é praxe, as TVs ficaram novamente em 2004 com a maior parte do bolo publicitário federal: R$ 510,7 milhões (58,9% do total). A novidade é que os jornais impressos voltaram a ocupar a segunda colocação no ranking, com R$ 107,9 milhões (12,4%).

Em 2003, as revistas estavam na segunda colocação como o meio que mais recebeu publicidade estatal federal. Agora, essas publicações caíram para a quarta posição -atrás, pela ordem, de TV, jornais e emissoras de rádio.

Entre os quatro principais meios de comunicação (TV, rádio, jornal e revista), foram os jornais os que mais tiveram um aumento de receitas com publicidade estatal em 2004. Saíram de R$ 63,488 milhões em 2003 para R$ 107,937 milhões no ano passado, um salto de R$ 44,449 milhões (70,01% a mais).

Campeões da propaganda

O governo federal não divulga os gastos individuais dos gastos publicitários de empresas estatais que concorrem no mercado.

O argumento é que a divulgação faria com que empresas como a Petrobras e o Banco do Brasil perdessem competitividade.

A Secom informa apenas o quanto cada órgão da administração direta consumiu em propaganda. Nessa categoria, a Secom é a campeã -gastou R$ 97,034 milhões em 2004 contra R$ 32,148 milhões em 2003.

Essa conta institucional de propaganda foi criada ainda no governo FHC, mas só passou a valer na gestão Lula, quando houve a primeira licitação. Três agências ganharam a concorrência, inclusive a de Duda Mendonça, amigo de Lula e responsável pela campanha eleitoral do petista em 2002. O valor consumido aumentou muito de 2003 para 2004 porque o contrato só valeu a partir do segundo semestre do ano retrasado.

O segundo órgão que mais gastou com publicidade foi o Ministério da Saúde (R$ 66,6 milhões), seguido por Furnas (R$ 13,3 milhões). Na lista dos mais gastadores chama a atenção um novato: a Infraero, que administra os aeroportos do país. No passado, o gasto publicitário anual da Infraero foi sempre modesto, na casa do R$ 1,5 milhão. No ano passado, essa empresa ficou em sétimo lugar entre as que mais gastaram com propaganda, registrando uma despesa de R$ 5,825 milhões.’

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‘Controle de gastos melhorou, diz Secom’, copyright Folha de S. Paulo, 8/04/05

‘Segundo Caio Barsotti, subsecretário de publicidade da Secom, o controle dos gastos publicitários federais tem sido aprimorado durante o governo Lula. Mais valores estariam sendo considerados na conta do que é investido. Essa poderia ser uma das explicações para o expressivo aumento dos gastos em 2004 em relação a 2003.

Os dados sobre publicidade estatal são coletados pelo IAP (Instituto para o Acompanhamento da Publicidade). O IAP é financiado por agências de publicidade e deve receber cópias de todos os PIs (pedidos de inserção) de propaganda que as agências enviam para os meios de comunicação devido a contratos mantidos com organismos do governo.

Nesses PIs fica anotado o que será veiculado, o preço real a ser pago e o período de veiculação. Ocorre que algumas vezes as agências não enviam -ou demoram para enviar- os PIs ao IAP. Em 28 de fevereiro deste ano, por exemplo, o IAP registrava que os Correios tinham gasto publicitário de R$ 47,789 milhões em 2004. ‘Por amostragem, vimos que o valor era R$ 67 milhões’, diz Barsotti. Ele acredita que esse tipo de checagem rigorosa pode não ter sido realizada em anos anteriores.

Nesse caso, o valor gasto pelo governo Lula em 2004, de R$ 867,1 milhões, não poderia ser comparado ao recorde de Fernando Henrique Cardoso, de R$ 881,6 milhões, em 2001.’



Danuza Leão

‘Ah, Lula’, copyright Folha de S. Paulo, 10/04/05

‘Eu queria muito saber quem é o conselheiro particular de Lula. O que aconselhou o presidente a receber para uma festa caipira, a servir feijoada para os príncipes da Espanha e ajudou a fazer a listinha de convidados para o enterro do papa. Afinal, se é para ser um grupo ecumênico -copiando o comportamento do papa-, ninguém pode ser barrado. Se até uma mãe-de-santo foi convidada, por que não um evangélico da Igreja Universal do Reino de Deus? Simples: porque esses já sabem em quem votar em 2006, só pode ser. E se Marisa foi, as mulheres dos outros convidados deveriam ter ido também.

Ah, mas o Bush levou a Laura, e o Clinton não levou a Hillary. E desde quando o Bush é um exemplo em qualquer sentido? É verdade que no grupo dos americanos tinha a Condoleeza Rice, mas essa entra na cota dos homens. E vamos orar com muita fé para que Severino Cavalcanti se comporte discretamente -pelo menos. Eu queria ser uma mosca para saber o que se passou dentro desse avião.

Lula deve ter se arrependido de ter comprado um avião tão pequeno; por uns trocados a mais, haveria lugar para todo mundo e não teria acontecido essa indelicadeza com as mulheres dos ex-presidentes, e até a esposa de Severino poderia ter ido, levando um lanchinho para a viagem: bolinhos de fubá, sua especialidade.

Alguém precisa dar uns conselhos ao presidente; chega de d. Marisa grudada nele em quase todas as cerimônias oficiais com seus terninhos, cada um de uma cor, sorrindo e nunca dizendo uma só palavra. A cada vez que Lula fala de improviso é aquele desastre; ele não entendeu que candidato é uma coisa, presidente é outra. Lula deslumbrou, e adora a idéia de ser um líder mundial. Dá mais atenção a isso do que a ser presidente do Brasil, por isso viaja tanto.

Ele não gostou de ser deputado e nem sei se gosta de ser presidente; até deve gostar, já que quer repetir a dose, mas prefere discursar no exterior, ditando regras para solucionar os problemas do mundo. Mas resolver mesmo, nem os daqui.

Mesmo quem votou nele não está achando mais graça. E é correto mandar seus convidados de volta no sucatão, aquele avião tão perigoso que ele, como presidente, não podia mais usar? Fernando Henrique, que sabe das coisas, vai ficar em Roma e voltar em avião de carreira.

Ok, Lula é presidente de um país católico e é do seu dever estar presente no funeral do papa. Mas já que d. Marisa foi, d. Marly Sarney e d. Ruth tinham que ter sido convidadas; apenas uma questão de delicadeza.

Ninguém aconselha Lula, ele acha que sabe de tudo, mas sugestões a gente pode sempre dar: que tal uma entrevista coletiva no Brasil, uma só, já que não deu nenhuma desde que tomou posse?

Os brasileiros adorariam.’