Quando perguntam sobre nossa profissão, seja ela qual for, a gente costuma falar sempre das dificuldades de ser quem é. Esse é um hábito desenvolvido coletivamente: tendemos a focar nossa atenção mais no problema do que na solução. Sites como Reclame Aqui revelam esse impulso de despender mais esforços para reclamar do que para elogiar. Enxergar o potencial que existe em cada um de nós para criar mundos possíveis não é uma tarefa simples, ainda mais quando falamos da mídia brasileira.
O jornalismo é uma profissão que carrega em sua essência a mudança. Ele acompanha a sociedade, como indica o termo “comunicação social”. As novas gerações de jornalistas estão encarando o mercado com sonhos inéditos e criando oportunidades que nunca existiram antes. Hoje, fazer diferente não é uma escolha, mas uma condição para passar pelo caos que consome as redações como fogo ardente.
O heroísmo clássico atrelado ao fazer jornalístico tornou-se um discurso manjado que não cabe mais a esse profissional híbrido. Acredito que as bases do jornalismo tradicional ainda são democracia, justiça e liberdade. Não há indícios reais dessa figura romântica criada pelos filmes de Hollywood, mas desejo coragem a esse herói que nunca existiu para que ele surja das cinzas.
Com menos visibilidade está o jornalismo com propósito e impacto social. Nos últimos anos, percebo essa modalidade jornalística, fortalecida pelas redes sociais, se construir nas ruas, favelas e periferias. A essência do jornalismo brasileiro é política, os primeiros jornais tinham fortes discursos políticos. Ainda hoje, conseguimos ver esse reflexo em qualquer veículo. Estou tão vacinado que não consigo ter mais uma visão romântica ou a ideia de isenção jornalística. A informação sempre está a serviço de alguém ou de algo. Cabe a nós fazer a leitura e o diagnóstico correto sobre a narrativa que o jornalista e o grupo de comunicação para o qual atua adotaram.
Ultimamente, tenho estudado a imprensa negra no Brasil e descobri como ela foi importante para o processo de abolição da escravatura e sua influência nas revoltas de negros. Descobri figuras interessantes, como o jornalista Paula Brito, criador do jornal O Homem de Cor (1833), considerado um dos mais importantes da imprensa negra brasileira do século XIX. Digo “descobri” porque nossa história está escondida sob a ótica de um olhar afetado pela miopia racial que precisamos educar. São justamente essas descobertas que me motivam e dão sentido à minha caminhada.
Para mim, ser jornalista vai muito além de todos esses conceitos românticos e utópicos. Minha ideia parte de um lugar onde coloco os pés descalços na terra e sinto o que ela tem a me dizer. Busco fazer um jornalismo com os olhos mais abertos e atento à realidade brasileira. Da minha laje na favela tenho uma visão muito mais ampla do mundo que a de uma cobertura no Leblon. A cada trabalho que realizo, firmo um compromisso com a verdade, a nossa verdade, uma verdade que talvez tenha sido esquecida nos livros da escola.
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Leonne Gabriel é um jovem jornalista em formação, graduando em Comunicação Social – Jornalismo e Publicidade e Propaganda na PUC-Rio. Atua como estagiário de inovação no Globo Lab Dados, laboratório de soluções tecnológicas da Rede Globo em parceira com o Ecoa PUC-Rio. É ganhador do Prêmio ANF de Jornalismo na categoria Educação e do Prêmio Ubuntu de Cultura na categoria Jornalista Revelação.