Não é aleatória a escolha da mídia pelos políticos como bode expiatório para seus infortúnios, como recentemente repetiu o ex-senador Demóstenes Torres (GO) no derradeiro esforço de defesa de seu mandato. Embora concorde em gênero, número e grau com essa parte de seu discurso, o júri de senadores o devolveu à planície, em votação tão rápida quanto a necessidade de estancar a sangria da imagem já combalida da instituição. Não o fez por virtude, pois, mas por autodefesa, confortado por um sentimento geral de repulsa ao colega que, ainda no papel de paladino da moralidade, ampliava as denúncias contra seus pares veiculadas pela mídia, encarnando a personagem refratária aos maus costumes da corporação. Sobravam evidências contra Demóstenes e faltava-lhe o apoio corporativista.
Menos mal, ainda que o pragmatismo travestido de virtude se mova no palco desse teatro de operações de forma lenta e gradual, insuficiente para acompanhar a velocidade que o advento da informática, desde os anos 90, imprimiu à mudança ética na esfera pública impondo aos seus atores novo comportamento. Entre os quais a prestação de contas em todos os níveis.
O modelo político caciquista baseado no controle da informação sucumbe ao avanço tecnológico, sobretudo na investigação e na Comunicação, cenário no qual o episódio dos atos secretos, revelado por este jornal, há três anos, é o exemplo mais bem acabado. Para fugir à fiscalização do sistema informatizado, a administração do Senado dava vigência a atos impressos guardados nas gavetas de seus diretores.
Ruído na linha
Os 25 votos pela absolvição de Demóstenes Torres, contabilizadas as cinco abstenções e uma ausência, devem ser atribuídos à parcela de senadores mais atingida pelo medo do que por solidariedade efetiva ao réu. É uma turma à qual se atribui a “síndrome de Orloff” (eu posso ser você amanhã) e que não escapa a uma peneira fina do exercício do mandato. A advertência constou do discurso do ex-senador e sintetiza a fragilidade do sistema político imune a reformas, mesmo as mínimas, como a que põe fim à figura do suplente – um biônico geralmente escolhido entre os financiadores de campanhas. Caso de Wilder Moraes (DEM-GO), substituto do senador cassado e igualmente comprometido com o contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
Vice-presidente da CPI do Cachoeira, o petista Paulo Teixeira (SP), defende a cassação do suplente de Demóstenes, Wilder Morais (DEM-GO), sob o argumento de que seu mandato é obra de uma organização criminosa. Falta só convencer o PT. O relator da CPI, deputado Odair Cunha (PT-MG), afirmou a interlocutores que até o final de agosto, terá reunido elementos suficientes para recomendar o indiciamento do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), no relatório final, por envolvimento com a organização criminosa de Carlos Cachoeira. A corrida contra o tempo na reunião de provas contra Marconi coincide com o julgamento do mensalão, que terá os petistas como alvo durante todo o mês de agosto.
Num balanço que elabora, o presidente da CPI, senador Vital do Rêgo Filho (PMDB-PB), elogiará a rapidez do Banco Central e da Receita Federal no envio de sigilos bancário e fiscal. Vai sobrar para as teles, pela lentidão no envio das informações de quebra de sigilo telefônico.
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[João Bosco Rabello, do Estado de S.Paulo]