Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Aposentadoria por invalidez

Os aposentados por invalidez estão na mira do governo, noticiou o jornal Folha de S.Paulo no caderno Mercado (22/8). A Previdência, ainda segundo a matéria, desembolsa R$ 60 bilhões por ano com o pagamento desse benefício, que é oferecido a 3, 2 milhões de pessoas. O governo quer melhorar o sistema de reabilitação e reduzir o dispêndio em R$ 25 bilhões. Não me senti informado com a notícia. Restaram mais perguntas que respostas.

Talvez eu seja um leitor exigente demais para as circunstâncias, mas a cada dia que passa me sinto menos satisfeito com o novo jeito da mídia impressa informar seus leitores. A impressão é de que a notícia agora vem pela metade, como se repetisse apenas um sinal de governo ou de alguma outra instituição. Editores e repórteres demonstram haver perdido a capacidade de questionar um o trabalho do outro e também a saudável atitude de apurar e editar com o pensamento voltado para os interesses do leitor.

Encontro sempre, durante a leitura dos grandes jornais brasileiros, uma variedade muito grande de assuntos que são abordados pela superfície. Pincei um deles – esse da aposentadoria por invalidez – apenas para mostrar a quantidade de perguntas que, a meu ver, ficou sem resposta. Gostaria de saber, por exemplo, – e a matéria da Folha não diz –, quais as causas mais comuns da invalidez, se acidentes de trabalho, se acidentes de trânsito, se bala perdida, criminalidade, fraude. Gostaria de saber se a melhor proposta para reduzir o dispêndio seria mesmo melhorar a reabilitação ou combater as causas da invalidez ou talvez as duas coisas ao mesmo tempo.

É possível “desaposentar”?

A matéria diz que a qualidade do sistema de reabilitação dos inválidos para o trabalho decaiu muito desde a década de 1970, quando o país era modelo mundial nessa área. Gostaria de saber também porque decaiu. Aumento de demanda, falta de investimentos, negligência governamental? Como o Brasil se encontra hoje em relação a outros países em reabilitação? E na incidência da aposentadoria por invalidez?

As estatísticas do Ministério da Previdência, segundo a notícia da Folha, mostram que atualmente 18,7% dos benefícios concedidos são referentes a aposentadorias por invalidez. Na avaliação do governo, o limite aceitável para esses casos seria de 10%. Mais perguntas: o que o governo quer dizer exatamente com “limite aceitável”? Ele pode negar aposentadoria a um inválido que seja realmente inválido? A Previdência enfrenta ações judiciais por não reconhecer casos de invalidez? Pode vir a enfrentar uma onda de ações no caso de tornar mais rigorosos os critérios de avaliação ou reavaliação? Temos algum caso no Brasil de inválido ao qual tenha sido negada aposentadoria?

A notícia da Folha de S.Paulo diz também que “o objetivo (do governo) é criar métodos mais modernos de reavaliação física e profissional dos trabalhadores com base em novas tecnologias”. A frase atiçou-me ainda mais a curiosidade. Quer ela dizer que os inválidos de hoje em dia não são inválidos, ou apenas que a Previdência é incapaz de determinar se uma pessoa está ou não apta para o trabalho? É possível “desaposentar” um aposentado por invalidez? Que nova metodologia de “reavaliação” é essa? Que país a adota e com que grau de eficácia?

Informar ou colaborar

Ah, ainda faltam algumas perguntas sobre prazo, cujas respostas parecem relevantes a quem deseja se informar devidamente sobre o assunto. A meta de redução de R$ 25 bilhões de desembolso vai ser atingida em quanto tempo? Quanto crescem ao ano as aposentadorias por invalidez no Brasil? Quanto crescem lá fora? E por que crescem no ritmo que crescem?

Posso ser injusto com a Folha, mas na condição de mero leitor fiquei sem saber se a intenção, no caso dessa matéria, foi a de informar seus leitores ou apenas colaborar com o governo tornando pública uma de suas inquietudes.

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[Dirceu Martins Pio é ex-diretor da Agência Estado e da Gazeta Mercantil e atual consultor em comunicação corporativa]