Existem aqueles que apoiam todo tipo de publicidade, inclusive opressiva, contra os juízes (ministros) do mensalão. Pela minha formação jurídica, não me enquadro nesse grupo. Penso que a garantia do julgamento imparcial e sereno é muito relevante. Se eu fosse réu, iria lutar pelo julgamento mais justo possível (fair trial). O jornalismo justiceiro (comprometido) começou como porta-voz dos desprotegidos, dos injustiçados; tornou-se depois acusador (caso Watergate, por exemplo) e, por fim, transformou-se num empresário moral do punitivismo,ou mesmo em competidor da Justiça oficial, desenvolvendo para isso um sistema de Justiça paralela, que conta com processo próprio, sanção própria, tempo distinto etc.
A culminância do seu papel ativista reside no poder (que as condições sociais lhe proporcionaram) de julgar (paralelamente) não os casos escolhidos, senão a própria Justiça oficial, isto é, poder de censurá-la, de admoestá-la. O jornalismo justiceiro conta com horizontes imprecisos, mas está institucionalizado como o quarto poder (ele fala, agora, até mesmo com o STF, de igual para igual). Como competidor da Justiça oficial, em todo momento o jornalismo justiceiro desvalora os atos oficiais, o seu tempo, o seu procedimento, a sua postura etc.
A “justiça midiática justiceira” é regida por dois princípios: transparência e celeridade. Ela não suporta o que chama de bla-bla-blá da clássica Justiça, tal como evidenciou em editorial a Folha de S.Paulo (20/8, pág. A2), nem tampouco sua linguagem empolada, suas expressões prolixas. No caso do mensalão, diz referido editorial, o STF chegou ao apogeu do espetáculo obscuro e bizantino; tamanha verbosidade seria reflexo do interminável processo? O Judiciário precisa pautar-se por uma disciplina retórica objetiva, direta e sucinta.
Não existem meias palavras
O jornalismo justiceiro, como se vê, vai muito além da crítica às instituições: passa-lhes sermões e ainda orienta a sua forma de proceder. “À prolixidade nos processos, somou-se a loquacidade fora deles”. Juiz não pode falar fora do processo (o puxão de orelhas está dirigido, sobretudo, para o ministro Marco Aurélio). “Também neste quesito, um pouco mais de parcimônia e contenção viriam a calhar”. O quadro (do STF) não é estimulante, “ainda mais se permeado pelos rompantes de suscetibilidade exagerada, resvalando para um narcisismo pueril, nos quais se destaca o relator Joaquim Barbosa, sem que lhe faltem, porém, rivais em redor”.
O jornalismo justiceiro, no entanto, vai mais longe: interfere diretamente e pressiona o voto de cada juiz. Vejamos: “O revisor Lewandowski parece adotar uma estratégia de lentidão, à qual seria levado, conforme se especula, pela tendência a absolver e pelo desejo de inviabilizar o voto, tido por adverso, de seu colega Peluso, que se aposenta no início de setembro”.
Com o jornalismo justiceiro, não existem meias palavras. Tudo é direto e objetivo. A jurisprudência da Corte Suprema norte-americana pode ser invocada (eventualmente) perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, para a discussão da imparcialidade do julgamento. Um clássico caso de publicidade opressiva foi o Sheppard v. Maxwell, por exemplo.
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[Luiz Flávio Gomes é jurista e cientista criminal]