Ninguém ouviu a história de Deborah Cogger. Nem professores, nem assistentes sociais. Até mesmo os tabloides acharam o caso muito explosivo para ser publicado. Agora, 38 anos depois de sair da escola reformatória Duncroft, em Surrey, na Inglaterra, Deborah, hoje com 52 anos, conseguiu, enfim, que sua história viesse à tona: ela e muitas outras meninas eram molestadas frequentemente pelo apresentador da BBC Jimmy Savile (morto em 2011), que tinha carta branca para entrar e sair da escola e fazer o que desejasse com as jovens. “A instituição foi escravizada por Savile, que dava o dinheiro que a escola precisava. Éramos incentivadas a chamá-lo de tio Jimmy, mas por trás o chamávamos de pervertido.”
Quando chegou a Duncroft, aos 14 anos, algumas internas alertaram que, no momento em que Savile tivesse a chance, iria tocá-la. “Ele levava discos, cigarros e doces para distribuir e podia percorrer por todos os ambientes da escola. Fiquei lá por dois anos, de 1974 a 1976, e fui molestada duas vezes. Na primeira, ele me agarrou pela cintura, me sentou com força em seu colo e começou a me beijar. A outra foi quando me encurralou na cozinha e apertou meus seios.”
As práticas de Savile não eram um segredo entre as meninas. “Todas nós discutíamos sobre os abusos, contávamos o que ele tinha feito com a gente. Jimmy tinha as suas preferidas, as que o idolatravam e não causavam confusão. Algumas ele levava para assistir seus shows. Não tenho dúvida de que ele fazia o que queria com elas.”
Meninas promissoras, mas indisciplinadas
A escola não parecia se importar, e as meninas que se queixavam perdiam privilégios ou ficavam trancadas em quartos isolados por dias. Depois de Deborah, pelo menos outras seis ex-estudantes declararam aos meios de comunicação britânicos sobre como eram agredidas em locais como o Rolls-Royce do apresentador e os próprios dormitórios. “Jimmy tratava Duncroft como se fosse um parque de diversões para pedófilos”, contou a ex-estudante Toni Townsend ao Daily Mirror.
Duncroft, que fechou na década de 1980, era uma instituição dedicada a meninas academicamente promissoras, mas indisciplinadas. O Daily Mail localizou a ex-diretora Margaret Jones, 91, que declarou que suas alunas eram consideradas delinquentes e, portanto, suas alegações contra Savile eram consideradas loucuras.
Há anos, Deborah tentava expor o caso aos jornais. Este ano, porém, ela leu uma reportagem que mencionava uma conexão de Duncroft com Savile. “Quando soube, falei para mim mesma: ‘Desta vez a minha história virá à tona’.” Em agosto, Deborah foi ao The Sun e, um dia antes da rede de televisão ITV transmitir o documentário que expôs as acusações contra Savile, o jornal publicou a matéria sobre o seu caso.
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[Sarah Lyall e Lark Turner, do New York Times]