Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Sobre a telemidiatização da justiça

Fiquei com “uma pulga atrás da orelha” ao ler, neste Observatório, o artigo “A telemidiatização da justiça”, de Luiz Flávio Gomes. Amparado no conceito da sociedade-espetáculo de Guy Debord, o articulista desenha um quadro dramático da justiça sob os holofotes. Até aí, nada demais. Realmente, os comportamentos dos juízes, visivelmente, se alteram diante dos olhos dos telespectadores. Mas daí a dizer que eles se alteram profundamente, cabe uma cautela. Em parte, se percebe uma alteração na forma de julgar da maioria dos juízes ao se sentirem acompanhados pelo olhar do telespectador. Há um endurecimento visível no, normalmente, conciliador tribunal. Quem diz isso com mais propriedade é um frequentador das sessões do STF, Claudio Weber Abramo, da Transparência Brasil. Diz mais: o estilo usual de julgar é o modelo Lewandowski.

No entanto, há quem pense que este comportamento está restrito ao “julgamento do século”, apontando inclusive inumeráveis contradições nas decisões do colegiado. Quem aponta estas contradições é Walter Fanganielllo Maierovitch no artigo “Dúvidas Supremas”, revista CartaCapital número 720, de 24 de outubro de 2012. Como exemplo destas contradições, ele cita o caso do deputado Natan Donadon (PMDB-RO) e do mafioso Antonio Salamone. Na mesma edição, a matéria “Fogos à Hipocrisia” vai mais fundo ao apontar as decisões tomadas em uma sessão extraordinária na manhã do dia 17 de outubro de 2012, quando os ministros rejeitaram a denúncia do Ministério Público contra o ex-governador Anthony Garotinho. Segundo a reportagem o ex-governador “não foi atingido pela teoria do ‘domínio dos fatos’”.

O impacto da midiatização

Quanto ao poder da chamada espetacularização, creio que, realmente, existe um poder cujos limites estão mais no perfil ideológico de cada um do que na ação desta. O articulista dá a entender que até então preponderava a racionalidade, agora substituída pelo paradigma emotivo, voluntarista, performático. Discordo desta visão negativa acerca da transparência propiciada pelo televisionamento das sessões do Supremo como, não tão sutilmente, perpassa na análise de Luiz Flávio Gomes.

Deste momento em diante Luiz Flávio Gomes começa a revelar suas afinidades (a bem da verdade, quando ele fala, no início, na era do populismo penal midiático, já dá para perceber aonde ele quer chegar ideologicamente. A palavra populismo é um mantra usado à exaustão pela direita brasileira). Citando Gilmar Mendes e mostrando- se preocupado com o fato do novo paradigma agregar, além dos quatro pês (pobres, pretos, prostitutas e policiais), gente mais respeitável. Para não ser acusado de elitista, ele embaralha e mistura petistas, citando inclusive Tarso Genro (provavelmente para contrabalançar a citação de Gilmar Mendes), com banqueiros, construtores e, “tucanos privataristas”.

Por ora, penso que ainda que haja um impacto da midiatização sobre o Supremo, ela não tem a dimensão totalizante preconizada pelo ilustre Luiz Flávio Gomes. Para tal faz-se necessária a permanência do mesmo rigor, da mesma severidade e do mesmo espaço midiático quando o banco dos réus for ocupado, por exemplo, por políticos e demais envolvidos no “mensalão tucano” e por Carlinhos Cachoeira e seus “companheiros”.

***

[Jorge Alberto Benitz é engenheiro e consultor, Porto Alegre, RS]