Faz muito tempo que não leio a Veja, tendo apenas comprado o número da semana passada para ver a matéria sobre a Osesp e o amigo Arthur Nestrovski.
Eis que, como ex-assinante, recebo pelo correio um convite promocional.
É uma obra-prima de imaginação mercadológica mal dirigida.
Na cobertura do envelope, uma intrigante mensagem.
Marcelo,
Perguntei por que faltava o seu nome e ninguém soube explicar. Veja como, logo depois, tudo ficou resolvido.
Hum. Vamos ver? Abro o envelope.
MARCELO,
(é sempre bom ver o nome da gente assim em letras grandes)
a reunião de ontem foi muito importante para mim e você tem tudo a ver com isso.
(ele nem imagina o quanto).
Toda a nossa equipe checava os nomes das pessoas que continuavam assinantes de VEJA.
(precisa ser uma equipe grande para fazer isso, eu acho).
Algumas depois do primeiro ano de assinatura. Outras depois de dez, vinte anos e até mais.
Gostoso foi comprovar que era uma seleção de gente extremamente diferenciada, ativa e participante, que faz a diferença no meio em que vive.
(deve ter sido bem gostoso, mas um bocado trabalhoso também. Quantos assinantes tem a revista, quinhentos mil? Um milhão? Para eles terem “selecionado” esse milhão de pessoas no meio da população brasileira, e depois comprovarem que a seleção foi bem feita, puxa, não invejo. Mas o importante é que EU, MARCELO, tinha tudo a ver com a importância dessa reunião).
Gente como Marcelo Penteado Coelho
(Não disse? Olha eu aí!)
Quando perguntei por que você não estava mais entre os assinantes de VEJA, algumas possibilidades apareceram.
(Vamos ver se ele acerta)
Marcelo perdeu o prazo de renovação, por algum motivo.
(aí não vale: qual o motivo? Ainda está frio…)
Ou viajou na hora de renovar e esqueceu.
(está certo, como sou uma pessoa diferenciada, eu viajo muito. Mas como é que não percebi, na volta de meu “périplo”, que Veja não estava mais me aguardando, empilhada na bandeja de prata que meu mordomo costuma usar para me trazer, toda manhã, os principais periódicos do Ocidente?)
Ou está dando um tempo…
(é, foi o que fiz com a Ana Paula Arósio e a Maria Fernanda Cândido)
Ou…
Interferi diretamente.
(escute, que mal pergunte, quem é você afinal?)
Tenho uma ideia clara na cabeça.
(ah, deve ser alguém da Veja mesmo).
Se Marcelo ainda não voltou é porque está só esperando uma boa oportunidade e ainda não soubemos criá-la.
(engenhoso, rapaz! Você sabe bem que MARCELO COELHO é astucioso e preza suas oportunidades de investimento. Faz como na Bolsa ou no dólar: espera as cotações baixarem para comprar).
Foi quando todos tomamos a decisão de trazer você de volta.
(nossa, como vocês aguentaram ficar tantos anos com saudade de mim?)
Criamos a oportunidade que você espera.
(nossa, gêintche… num acreditcho…)
Começamos com o maior desconto que podemos dar: 50%
(es poco, corazón. En las calles de Buenos Aires muchas chicas más guapas que vos ya me hicieron ofertas más despudoradas).
Ou seja, você vai assinar VEJA pela metade do preço.
(legal traduzirem 50% por metade do preço. A clientela, por mais diferenciada que seja, às vezes se confunde na matemática).
Mais uma página de explicações e, finalmente, fico sabendo quem escreveu a mensagem. É Marcia Donha, gerente de assinaturas da revista Veja. Não colocou a fotografia junto.
Mas como se trata de uma carta pessoal e carinhosa, quem sabe eu respondo.
MARCIA,
Obrigado por dizer que eu faço falta. Pensei que vocês nem ligassem para o fato de eu ter suspendido a assinatura há tanto tempo. Toda a sua equipe, durante esses anos, parece ter se preocupado mais em cultivar um público limitado, preconceituoso, consumista e sem nenhuma sofisticação cultural, disposto apenas a ver numa revista a confirmação de suas ideias simplistas sobre o mundo, incapaz de notar o tom partidário e editorializado de matérias pobres em conteúdo informativo, além de pronto a aplaudir o estilo hidrófobo de seus colaboradores. Fico feliz: estão pensando em me reconquistar. Mas achar que eu estava esperando esse descontinho para voltar… francamente. Só volto quando ganhar as obras completas de Lya Luft encadernadas de brinde. Cobro caro para vocês terem o meu amor de volta. Não sou desses que acodem a qualquer trocadinho, viu, MARCIA?
Um beijo, fofa.
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[Marcelo Coelho é colunista da Folha de S.Paulo e integrante do Conselho Editorial do jornal]