A morte do garoto Kevin Espada desencadeou uma histeria (euforia?) anticorintiana na mídia esportiva (tema que já abordei neste Observatório em “Mídia e paixão clubística”, partes I e II). Como objetividade nessa área é difícil de encontrar (Cláudio Carsughi, do UOL, e Paulo Júlio Clement, da Fox, são dois raros exemplos de imparcialidade), a alegria era tanta pelo Corinthians (quase sempre identificado como o time do ex-presidente Lula) estar se dando mal após um ano gerando boas notícias que até um “bem feito” na revista Veja se pôde colher num episódio tão triste quanto este.
Mas os mais excitados, em termos de revanchismo clubístico (com pitadas de político) foram os comentaristas flamenguistas (os rubro-negros parecem ter sido os mais golpeados pela conquista do Mundial de Clubes pelo timão no ano passado – porque o Flamengo foi ultrapassado em número de títulos e porque não perdoaram a pesquisa que deu como empatada a sua torcida com a corintiana).
No Lance!, Assaf embarcou, como muitos, na argumentação da violência para pedir a eliminação do Corinthians da Libertadores, conforme aconteceu com times ingleses no episódio da luta armada entre torcidas na década de 1980, com dezenas de mortos. Só que o disparo do sinalizador não se deu num contexto de violência (e, até o momento, o sinalizador não era considerado uma arma, mas objeto de festa. Ainda mais que, se tivesse atingido outra área que não o olho, não teria ocasionado lesão). Era um momento de comemoração e havia um clima de confraternização no estádio. A tese da violência, aventada por muitos, só se justifica para os que consideram o crime não como fruto de irresponsabilidade, culposo, mas doloso, intencional.
Praga de urubu
Esta foi a certeza do perito criminal Renato Maurício Prado, que em seu blog no Globo argumentou com supostas imagens de que o culpado mirou com mão firme na torcida adversária. Suplantou a polícia e a justiça, nosso anti-corintiano de carterinha.
Outro ardoroso anticorintiano, o rubro-negro Mauro César Pereira, fez vários posts no site da ESPN sobre seu coração dilacerado, sempre direcionando para sua interpretação (que mostra onde lhe doem os calos) de que se o Corinthians quer ser o das “invasões do Maracanã e do Japão” (note-se que o referido comentarista já duvidou das “invasões” em diversas ocasiões), deve ser também o da torcida que vitimou o menino. Não se viu tal comoção do jornalista com o vascaíno morto a pauladas por torcedores do Flamengo.
Duas palavras sobre o caso: sinalizadores são usados há anos em estádios de futebol mundo afora (vide o jogo da Copa do Rei entre Barcelona e Real Madrid) e uma tragédia, algum dia, era inevitável (a não ser que medidas rigorosas sobre sua proibição tivessem sido tomadas, como o serão agora). Quis o destino que fosse com a torcida do Corinthians. Destino não, dirão os esotéricos. Praga de urubu.
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[Silvia Chiabai é jornalista]