Gorducha, baixinha e dentuça. Impossível conhecer um adulto ou criança que não saiba de quem estamos falando. Personagem mais célebre dos quadrinhos nacionais, Mônica acaba de fazer 50 anos. E continua um sucesso. Sua única concorrente é ela mesma, ou melhor, a versão adolescente dela, cuja revista, Turma da Mônica Jovem, é campeã de vendas entre os quadrinhos no Brasil. A seguir, o desenhista Maurício de Souza, 77 anos, lembra histórias da aniversariante, fala de personagens novos e do que mais vem por aí.
A Mônica, como muitos de seus personagens, surgiu coadjuvante. Como o senhor percebeu que ela podia ser protagonista?
Maurício de Souza – Durante a criação, você nota como o personagem se movimenta, interage com os outros em um roteiro. O público avisa, escreve, telefona. Fico muito antenado nisso. Minha facilidade de desenvolver um personagem em um roteiro vem da ajuda do público.
Ela é um raro exemplo de protagonista feminina nos quadrinhos. Nunca teve medo de a revista não ser lida por meninos?
M.S. – Não pensei nisso porque naquele momento eu estava criando uma personagem baseada na minha filha Mônica. A gente sempre pensa que o filho vai saber resolver tudo, vai vencer. Então, confiei na Mônica, porque estava confiando na minha filha. E, além disso, sou um feminista declarado. Abri as portas para ela fazer o que quisesse e crescer.
Vários de seus personagens foram inspirados em seus filhos. Como eles lidam com isso? Algum ciúme de Mônica?
M.S. – Se alguém ficou enciumado, não teve coragem de falar (risos) . De qualquer maneira, foi essencial o respeito pela criação artística na família. Outros filhos que se transformaram em personagem sabem que alguns não vão virar revista. Mas são todos igualmente importantes. Não há ciúme, há uma concessão. Até com o último, o Marcelinho, que vai ser criado agora.
É um personagem novo?
M.S. – É um personagem que vai mexer com economia. Ele tem agora 14 anos, mas o personagem terá 9. É superoportuno. Que nem outra nova personagem que vem aí, a Claudinha, inspirada na Cláudia Leitte. Ela não vai ter revista, vai permear a história da Turma como uma menina que se prepara para ser estrela. Existe tanta menina assim… Vamos mostrar a Claudinha brincando, usando a escova de cabelo como microfone. Também teremos uma revista baseada nas histórias do menino Neymar, que vai ser separada da Turma da Mônica. Assim como o Pelezinho (inspirado em Pelé), que voltou. E vem aí o “Chico Moço”, que é o Chico Bento jovem. E o maestro João Carlos Martins, que também falará de música, só que clássica. Ele terá o nome de Joca e irá interagir com a Turma. Já temos o desenho.
E a Turma da Mônica Adulta, vai ser realmente criada?
M.S. – Isso é lá para a frente, tem alguns anos de preparação. Será uma série cronológica com a Turma da Mônica vivendo histórias de adultos e envelhecendo com o leitor. Mas ainda coloco uns três, quatro anos para isso ficar pronto. A Mônica será casada e acompanhará bem o que acontece no mundo. É para o pessoal com mais de 20 anos, que já saiu da Turma da Mônica Jovem e pensa: “O que vou ler agora?” Eles podem ler o infantil, mas vamos dar outra opção.
Como se adaptar sem perder a essência do personagem?
M.S. – Quando minha filha fez 3 anos, criei uma cópia psicológica dela. E ela envelheceu com a mesma identidade, com o mesmo vigor. Ninguém muda na essência. Mudam os hábitos, mas o espírito já é talhado.
Muitos leitores da Mônica tradicional são adultos que têm a imagem da personagem da infância deles. Como agradar a eles e às crianças de agora?
M.S. – Com histórias leves, divertidas, mas nunca tatibitate, infantiloide. Mesmo a criança de 7, 8 anos não é assim. Tem a tecnologia na ponta dos dedos. Mostramos a criança como é.
Algum plano de lançar o gibi em versão para tablet?
M.S. – Estamos pensando nisso. Não podemos deixar a Turma de fora desse universo virtual. Daqui a algum tempo você vai ver alguma comunicação pela internet. Mas é uma avaliação errônea pensar que o gibi vai morrer. Em vez disso, podemos formar camadas de plataformas que interagem.
Alguma história o marcou mais?
M.S. – Tantas… Por exemplo, há uma chamada “Os azuis”, que é uma parábola sobre racismo, um assunto tabu. Mas o assunto flui, a criança entende. É de 1973 ou 1974.
Você tem uma enorme equipe no estúdio. Não tem vontade de voltar a desenhar?
M.S. – É lógico! Mas hoje me sobra uma coisa igualmente importante: leio todos os roteiros. E, com essa variedade de roteiristas, é um trabalho coletivo de criação. Sempre vejo um desenho que poderia ter um tracinho melhor, um roteiro que abre outro caminho.
O estúdio também anda investindo em revistas no estilo das graphic novels…
M.S. – Sim, essa aí é outra novidade. É para a gente conquistar o público adulto por outro viés. É o leitor dos álbuns, de produtos mais sofisticados. Também tem muito jovem. É uma experiência que deu certo no primeiro número, do Astronauta, e agora estamos preparando para lançar em seis países da Europa. Estamos convidando pessoas para criar histórias baseadas em personagens nossos, mas com a liberdade de criar um universo para eles, dar outro tratamento. Vamos ter uma da Mônica, dos irmãos Cafaggi, que sai agora em abril, e está linda de chorar.
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[Luiza Barros, do Globo]